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|literatura

Uma casa que nos lê

A reabilitação da Casa Grande de Romarigães, onde viveu o igualmente grande Aquilino Ribeiro, em Paredes de Coura, tardou mas prova o potencial do investimento autárquico no sector cultural.

O humorista Ricardo Araújo Pereira participou na sessão de inauguração da Casa Grande de Romarigães, em Paredes de Coura, a 29 de Julho de 2023. O espaço, onde viver. no século XX, o presidente Bernardino Machado e o escritor Aquilino Ribeiro, é cenário de um dos mais importantes romances da literatura portuguesa, de Aquilino, sendo hoje, após vários anos ao abandono, um centro de literatura e cultura. 
O humorista Ricardo Araújo Pereira participou na sessão de inauguração da Casa Grande de Romarigães, em Paredes de Coura, a 29 de Julho de 2023. O espaço, onde viver. no século XX, o presidente Bernardino Machado e o escritor Aquilino Ribeiro, é cenário de um dos mais importantes romances da literatura portuguesa, de Aquilino, sendo hoje, após vários anos ao abandono, um centro de literatura e cultura. Créditos / Diário do Minho

Após muito se ter falado e discutido acerca da necessidade dos profundos restauros, físicos e funcionais, da Quinta do Amparo (Paredes de Coura), inspiração de uma das obras maiores da literatura portuguesa do século XX – A Casa Grande de Romarigães (1957) - de Aquilino Ribeiro, a autarquia inaugura, a pretexto dos 60 anos da morte do autor, em 1963, o Pólo Cultural que evoca o escritor e a sua superlativa obra. Firmando-se, assim, Paredes de Coura no mapa, enquanto «território literário».

O Minho faz parte da geografia sentimental e literária de um escritor andarilho, que muito se confundiu com os lugares por onde passou e escreveu, e marcou com o seu inigualável apuro literário e lexical.

Nascido a 13 de Setembro de 1885, no Carregal da Tabosa, concelho de Sernancelhe, traçou com palavras as Beiras, suas paisagens, seus bichedos, suas gentes, e seus modos de falar, lendas e costumes (em Terras do Demo ou O Malhadinhas). Depois do liceu em Lamego, a adolescência apanha-o muito contrariado no seminário de Beja, onde sofreu penosamente tal degredo e se tornou fortemente anticlerical. Já em Lisboa, e longe de um ambiente sombrio e obsoleto, refugia-se na leitura como num outro convento, bem mais aprazível, sem muros, sem detestáveis sinetas e missais. Tão arrojado na literatura como na política, adere à causa republicana e à Carbonária, o que lhe valeu, por duas vezes, a prisão e também, por duas vezes, o exílio, em Paris e na Alemanha.

Já sócio da Academia de Ciências de Lisboa, o escritor publica em 1958 o famoso romance Quando os Lobos Uivam, duplamente celebrado pelo conteúdo e pelo inacreditável processo salazarento que se lhe moveu. É pronunciado como arguido pelo crime de abuso de liberdade de expressão, sujeito ao vexame dos interrogatórios, à afronta das mesquinhas diligências processuais. Candidato ao prémio Nobel e apoiado massivamente por um grupo de intelectuais e figuras públicas indignados, o processo é arquivado pelo já mais do que bolorento regime.  No Brasil já saía um livro em defesa de Aquilino: Quando os Lobos Julgam, a Justiça Uiva. Escritor sem medo é, aos 74 anos, um dos promotores da campanha de outro homem sem medo, o general Humberto Delgado .

Era um cosmopolita, um cidadão do mundo que nunca perdeu as graças do campo, e do linguajar das terras. Provam-no os mais de 70 títulos da sua vasta obra, onde os géneros se cruzam, e a criatividade linguística e lexical encontram um expoente notável. Aquilino Ribeiro foi, após o 25 de Abril, reintegrado, a título póstumo, na Biblioteca Nacional, condecorado com a Ordem da Liberdade e homenageado, aquando do seu centenário, pelo Ministério da Cultura. E em Setembro de 2007, por votação unânime da Assembleia da República, o seu corpo foi depositado no Panteão Nacional.

Quanto à importância da Casa Grande de Romarigães, a geografia sentimental e literária portuguesa encontram aí um espaço quase mítico. Morada de Bernardino Machado (3.º e 8.º Presidente da República) e também do próprio escritor que casara, entretanto, com a sua filha, em 1929, quando ambos se encontravam em Paris, no exílio, a casa inspirou um dos romances mais notáveis da literatura portuguesa, considerada unanimemente a obra-prima de Aquilino, publicada em 1957, e que se desenrola ao longo de três séculos de História. A obra oferece à literatura portuguesa o mais assombroso e estudado incipit: «O vento, que é um pincha-no-crivo devasso e curioso, penetrou na camarata, bufou, deu um abanão. O estarim parecia deserto. Não senhor, alguém dormia meio encurvado, cabeça para fora do seu decúbito, que se agitou molemente. Volveu a soprar. Buliu-lhe a veste, deu mesmo um estalido em sua tela semi-rígida e imobilizou-se. Outro sopro. Desta vez o pinhão, como um pretinho da Guiné de tanga a esvoaçar, libertou-se da cela e pulou no espaço. Que paraquedista!».

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