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As eleições, a guerra e o PCP

O primarismo da manipulação está ao nível da propaganda salazarista, quando os comunistas «comiam criancinhas» e se «viam livres dos velhos com injecções atrás da orelha». Mesmo assim, a manobra inspirada em Goebbels continua a fazer o seu caminho.

Há situações na sociedade da «democracia liberal» capazes de atingir picos de absurdo e de falta de pudor político que esgotam a paciência do mais pacato dos cidadãos.

Situações que podem ser fruto do vício político-económico-mediático de confundir o desejo com a realidade; da necessidade de praticar plenamente a ditadura económica neoliberal num quadro de fascização política; de um costume tão enraizado que os praticantes nem dão por ele – um comportamento pavloviano; ou situações que correspondem, nas suas versões mais trabalhadas, ao cumprimento estrito das orientações disseminadas pela miríade de centrais de propaganda política e militar imperial, colonial e globalista.

Não sou militante comunista; circunstâncias que não vêm ao caso fizeram com que assim seja, enquanto sigo o meu caminho profissional de referência, o de ser politicamente incorrecto. Isso não significa que não ache legítimo e compatível com a independência jornalística a opção de militância de um bom número de camaradas, por sinal os principais exemplos do bom jornalismo que ainda se pratica.

As recentes eleições europeias podem ter sido a gota de água, a rotura do limite pessoal de paciência. Talvez porque no meio do aparato circense próprio das campanhas eleitorais do regime, formatadas para ensinar ao povo o que o povo deseja sem o saber, tenha sido possível, em alguns debates e no meio de tanta imbecilidade, tomar o pulso ao nível de irresponsabilidade e de repulsa pela decência da sociedade política em que vivemos.

Esporadicamente vieram à tona alguns temas que têm a ver com a vida quotidiana e até com a própria sobrevivência da humanidade – embora isso não seja inquietação maior da nossa belicosa classe política.

Falou-se de guerra, mas evitou-se o perigoso tema da paz, cuja defesa pode até acarretar acusações de traição à pátria; prestou-se a indispensável vassalagem à União Europeia, fugindo como diabo da cruz da impossível conciliação entre soberania nacional e federalismo; discorreu-se sobre as  ameaças da extrema-direita com a prestável colaboração da extrema-direita lusitana, que afinal nada tem a ver com a extrema-direita nem com as heranças de Pinochet e Salazar; recitaram-se os habituais mantras das alterações climáticas, embora não tanto como os «ecologistas» à moda da sueca Greta e seus patrões Gore, Gates, Soros e o fascista Schwab do Fórum Económico Mundial desejariam; e consagrou-se a NATO, essa fábrica de heróis que, depois do engano de 25 de Abril de 1974, nos devolveu às guerras coloniais e poderá até levar jovens portugueses a «defender a pátria» na Ucrânia. Salazar mandava: «a pátria não se discute»; o regime de democracia liberal ordena: «a NATO e a Ucrânia não se discutem». E cá vamos, cantando e rindo.

Por vezes, nunca com prioridades, afloraram-se temas, dir-se-iam marginais, como os salários ínfimos dos portugueses, a situação dos trabalhadores (e não colaboradores), tratados pela União Europeia como potenciais escravos, a tragédia, igualmente escravocrata, do trabalho precário, de como a educação vai mal, a habitação pior, a saúde péssima.

Com a lógica própria do espírito de campanha, esses assuntos foram sempre impertinentes, ou mesmo abusivamente levantados por uma única força política e abafados tão depressa quanto possível pelas impaciências de quase todos os participantes e as urgências cronométricas dos moderadores.

A única força política que a tal se atreveu foi o Partido Comunista Português, em boa verdade a CDU – mas permitam-me os autênticos e legítimos Verdes e esse espelho de democracia que é a Intervenção Democrática que agora me foque principalmente no PCP, do alto dos seus 103 anos de luta pela liberdade, a democracia e pela soberania nacional; demonstrando que o combate pela democracia é inseparável da luta antifascista, correlação de que a classe política não pode ouvir falar.

«Salazar mandava: "a pátria não se discute"; o regime de democracia liberal ordena: "a NATO e a Ucrânia não se discutem". E cá vamos, cantando e rindo.»

João Oliveira, pela sua maior exposição mediática como cabeça de lista, mas também os outros candidatos da CDU, levantaram os problemas reais dos portugueses, esclareceram, desmontaram a hipocrisia dominante e governante. Fizeram-no dentro de condicionalismos, muitos deles ilegais, sobretudo no que diz respeito aos comportamentos mediáticos. Apesar disso, João Oliveira conseguiu fazer-se ouvir, não se deixou intimidar, meteu na ordem adversários que não sabem o que é debater ideias e até moderadores treinados nos mais primários tiques anticomunistas. Como disse lucidamente João Ferreira, na noite eleitoral na RTP, já é mesmo preciso ter coragem e um indomável espírito de combate para enfrentar o aparelho que montou e impõe ferreamente uma opinião única cuja contestação é silenciada, caluniada e até perseguida segundo os cânones autoritários da democracia liberal – isto é, neoliberal, o fascismo económico.

Inimigo a abater

O PCP foi sempre o alvo mais cruelmente perseguido pelo salazarismo; e agora continua a ser vítima de uma sanha que Oliveira Salazar não desdenharia, um inimigo a abater, um problema a liquidar para que a providencial democracia liberal deixe de ser incomodada.

Os comunistas portugueses lutaram 53 anos sob o regime fascista. Foram lançados nas masmorras, torturados, perseguidos, assassinados durante décadas negras sofridas pelo povo português. O PCP ajudou a juntar forças e a fazer avançar a consciência antifascista e da paz nas entranhas da guerra colonial. 

«João Oliveira conseguiu fazer-se ouvir, não se deixou intimidar, meteu na ordem adversários que não sabem o que é debater ideias e até moderadores treinados nos mais primários tiques anticomunistas.»

Que me perdoem os heróicos militares revolucionários, mas o PCP foi determinante para o apodrecimento e queda do fascismo, foi essencial para a fulminante adesão popular que complementou, deu alento e consolidou a vitória do movimento militar. Tudo fez, e faz, para que ainda se mantenham conquistas revolucionárias, apesar do novembrismo revanchista, desde logo contribuindo para que este não consumasse plenamente o regresso ao passado, como desejaram os que cavalgaram o golpe guiados pela máquina de conspiração norte-americana, da NATO e seus aliados internos.

A legalização do PCP e a libertação dos presos políticos foram, em si mesmas, vitórias populares, conquistas de Abril. Desengane-se quem pensa que eram dados adquiridos com a queda do fascismo. Sectores «continuistas» como os spinolistas tentaram travar e anular o movimento popular à partida, procurando estabelecer uma «democracia» sem o PCP, que não deixaria de ser uma «democracia ocidental», uma democracia liberal como se usa agora dizer. Já em pleno marcelismo circulara a ideia de uma hipotética «transição» com alguns partidos, mantendo ilegal o PCP.

Em paralelo, hoje há na classe política quem sonhe em afastar o PCP de todos os órgãos de poder, designadamente da Assembleia da República e do Parlamento Europeu. Na recente campanha valeu tudo, até fazer eco, como aconteceu com a agência Lusa, de uma publicação atlantista e imperialista, Politico, que identificou os eurodeputados comunistas entre os «maiores amigos de Putin».

Nos centros de decisão da democracia liberal não há muito pudor em excluir o Partido Comunista da intervenção directa nos mecanismos de poder. Reduzi-lo a um partido não parlamentar já seria uma grande vitória para o fascismo em ascensão, sintonizado com a tradicional política da NATO. E o espectro político, do Bloco de Esquerda ao Chega, que considera «democrático» e «civilizado» o regime nazi-banderista da Ucrânia, que começou por ilegalizar o Partido Comunista até suprimir mais de uma dezena de organizações políticas opositoras, não manifestaria incómodo se os comunistas portugueses desaparecessem dos parlamentos onde estão representados. 

No entanto, a História demonstra que o PCP lutou, implantou-se, não se deixou abater e cresceu durante 53 anos sem ter qualquer deputado nem poder actuar à luz do dia. 

A NATO, como já não é segredo, tem organizações clandestinas, como a Gladio, cuja função é impedir que os partidos comunistas da Europa intervenham nos centros governamentais de decisão. A violação dessa norma compulsória, por exemplo, esteve na origem do assassínio do primeiro-ministro democrata-cristão italiano Aldo Moro, em 1977.

Fazer sumir o PCP dos assentos parlamentares não é mais do que uma aplicação simples da ordem atlantista. Os ferrenhos da NATO prefeririam a ilegalização, mas vê-lo fora das instituições já seria uma enorme vitória.

«A NATO, como já não é segredo, tem organizações clandestinas, como a Gladio, cuja função é impedir que os partidos comunistas da Europa intervenham nos centros governamentais de decisão. A violação dessa norma compulsória, por exemplo, esteve na origem do assassínio do primeiro-ministro democrata-cristão italiano Aldo Moro, em 1977.»

Comentadores, analistas e académicos equipados com tapa-olhos, como as mulas e burros que puxam as noras, escandalizam-se com o facto de o PCP ser contra a NATO, um pecado lesa-pátria, lesa-civilização ocidental, lesa-democracia liberal. No entanto, os comunistas não poderiam ter outra posição, porque conhecem as lições do passado tão bem como as do presente. Não esquecem que o fascismo salazarista foi parte fundadora da Aliança Atlântica, distinção que deu gás suplementar ao regime quando ele tremia como varas verdes depois da derrota de Hitler e no turbilhão democrático do fim da Segunda Guerra Mundial. Por outro lado, aplicando o velho dito popular «amor com amor se paga», se a NATO combate o PCP, natural é que o PCP seja contra a NATO. Mas há mais: a esquerda onde o PCP se enquadra repudia a «ordem internacional baseada em regras» como um embuste ocidental para não respeitar o direito internacional; e defende a negociação e a paz como os princípios dos princípios para buscar a solução de qualquer conflito, enquanto os atlantistas dão prioridade à guerra para que no final seja encontrada a «paz».

Ao nível de «comer criancinhas»

Em todas as campanhas eleitorais a estratégia anticomunista vai sendo apurada ao ritmo da fascização do meio político, no interior do qual foram outorgadas chancelas «democráticas» anticonstitucionais a organizações retintamente salazaristas. O desenvolvimento do fascismo, porém, acelerou-se desde que se iniciou a guerra na Ucrânia – em 2014, não em 2022.

O processo gradual de imposição da opinião única neoliberal graças à acção conjunta do poder económico, da classe política e do aparelho mediático de propaganda criou o dogma de que os pontos de vista dissonantes da NATO e da União Europeia representam uma adesão às teses do inimigo, uma identificação com o diabo de estimação, Vladimir Putin, incarnando agora a «ameaça russa», tal como em seu tempo acontecia com o regime soviético. 

Ora, alguma vez pode ser levada a sério ou faz algum sentido a acusação de que o PCP, um partido que defende o socialismo e luta pela erradicação do capitalismo, pode apoiar um sistema que está nos antípodas dos seus princípios de luta, um regime capitalista oligárquico, assente numa tradição retrógrada e no fundamentalismo cristão ortodoxo, como o chefiado por Vladimir Putin? O primarismo da manipulação está ao nível da propaganda salazarista, quando os comunistas «comiam criancinhas» e se «viam livres dos velhos com injecções atrás da orelha». Mesmo assim, a manobra inspirada em Goebbels continua a fazer o seu caminho.

O Partido Comunista é sempre o «inimigo interno», sequela da «caça às bruxas» praticada pelo macarthismo norte-americano, uma «quinta coluna» que precisa de ser removida para que o país cumpra, sem estorvos de maior, a sua política de guerra na Ucrânia, a cumplicidade para com as atrocidades do sionismo na Palestina, as sanções criminosas contra os povos de países indisponíveis para se acomodarem à canga colonial e imperial.

«O processo gradual de imposição da opinião única neoliberal graças à acção conjunta do poder económico, da classe política e do aparelho mediático de propaganda criou o dogma de que os pontos de vista dissonantes da NATO e da União Europeia representam uma adesão às teses do inimigo, uma identificação com o diabo de estimação, Vladimir Putin, incarnando agora a «ameaça russa», tal como em seu tempo acontecia com o regime soviético.»

Salazar e Marcello Caetano sentenciavam que «quem não está connosco está contra nós». A democracia liberal ordena da mesma maneira: quem defende a paz e o diálogo na Ucrânia, quem sempre se bateu, ao longo de mais de 70 anos, contra o colonialismo sionista e pela liberdade do povo palestiniano, está o lado de Putin e do Hamas, isto é, contra nós.

Como tal, há que apontá-lo a dedo na praça pública, fazer tudo, até desprezar a Constituição e as leis eleitorais, para o maltratar e vilipendiar. Há que manipular, mentir, difamar, caluniar, silenciar ou deturpar as suas posições, criar uma imagem de pária que está a mais na política e que serve para perturbar a tão idílica harmonia nacional – todos com a União Europeia, todos com a NATO. 

O fascismo económico neoliberal tem no fascismo político o seu cenário de sonho. Um passo significativo nessa direcção é o cavalheirismo com que a classe política do burgo aceitou a integração e os horizontes governamentais da Iniciativa Liberal e do Chega. Naturalmente, ambos vieram engrossar e reforçar as hostes da guerra contra o PCP: no regime de Pinochet, inspirador dos bem-falantes do fascismo Armani, o Partido Comunista foi proibido e perseguido, os seus militantes e simpatizantes fuzilados no estádio nacional e muitos continuam dados como «desaparecidos»; no salazarismo que serve de referência a Ventura e sequazes, o PCP estava na clandestinidade; e, mesmo já legalizado, não foi poupado à destruição de dezenas de centros de trabalho conduzida por grupos terroristas nos quais se destacaram criminosos que hoje são honrados e venturosos deputados da República.

Ao mesmo tempo que, depois da porta impudicamente aberta pelo Tribunal Constitucional, a classe política acolheu fraternalmente a chegada dos grupos fascistas, a comunicação social e aparelho de propaganda da democracia liberal empenhou-se em passear o Chega e a Iniciativa Liberal ao colo, promovendo-os inicialmente como coisas curiosas e «interessantes» num cenário político estagnado e monótono; e agora como fortalezas do regime, intrépidos apoiantes e praticantes da opinião única, juízes com direito pleno na campanha terrorista contra o PCP. Principalmente quando se trata da guerra da Ucrânia, onde Zelensky é um irmão do peito que dá asas a grupos nazis em toda a Europa; ou da situação na Palestina, em relação à qual as duas variantes do neo-salazarismo se comportam como genuínos militantes do terrorismo sionista – com toda a legitimidade, porque se trata de uma variante do fascismo.

As esquerdas que também colaboram

À esquerda, a pulverização política esquerdista serviu sempre o anticomunismo, porque muitos dos grupos que proliferaram a seguir ao 25 de Abril, hoje fundidos nas organizações mais reaccionárias, desempenharam a preceito o papel atribuído e claramente exposto, por exemplo, na criação de condições propícias ao reviralho de 25 de Novembro de 1975.

Ainda que hoje o panorama seja diferente – apesar de continuarem perceptíveis no PS algumas manifestações doentiamente anticomunistas – a esquerda parlamentar, incluindo grupos que confundem a esquerda com o palrar dos chefes e se derretem com as simpáticas palmadinhas nas costas prodigalizadas pelos media e pela classe política, cumpre a sua parte no anticomunismo.

Uma das estratégias das esquerdas não-comunistas ou anticomunistas que mais serve os interesses do capitalismo neoliberal é a fragmentação das causas que dizem defender, multiplicando focos de luta em vez de incidirem sobre o essencial, isto é, a defesa da paz, a denúncia da guerra e de todos os negócios que dela tiram proveito, a verdadeira salvaguarda dos direitos humanos – de todo e qualquer ser humano – o respeito pelo trabalho e os trabalhadores, o combate sem tréguas contra as desigualdades, em suma, o foco centrado na luta sem descanso pela transformação progressista da sociedade e contra o capitalismo.

O PCP trabalha e combate nesse sentido, porque das causas centrais derivam todas as outras, nenhuma das quais se resolve isoladamente sem alterar profundamente as estruturas sociais e desmantelar o capitalismo. Além disso, clarifica e defende o conceito de liberdade tal como está implícito nos objectivos e conquistas do 25 de Abril: uma liberdade para as pessoas e que deve sobrepõe-se sempre às «liberdades» do mercado, das empresas, do dinheiro.

O racismo é uma doença social inerente ao capitalismo, tal como a marginalização das minorias, o desrespeito pelos direitos da mulher, apesar de inscritos nas leis; o mesmo acontece em relação ao ambiente e às alterações climáticas, à salvaguarda dos animais e da vida selvagem, à segurança alimentar, ao tratamento humanizado e igualitário das migrações e dos migrantes.

O capitalismo, isto é, a «nossa» democracia, garante que tem soluções ambientais mágicas e resolverá o drama das alterações climáticas, mas agrava quotidianamente a situação e gera ainda mais fortunas com os «novos» negócios «verdes». Não existem quaisquer sinais, no regime em que vivemos, do retrocesso de doenças como o racismo e a xenofobia ou os preconceitos contra a comunidade LGTB+ – pelo contrário, avançam a ritmo alarmante. Por muito que as leis os garantam e as quotas sejam tratadas como uma ideia genial, os exemplos de violação dos direitos das mulheres são constantes. Em relação aos movimentos migratórios, ao respeito pelos direitos e a integração social dos migrantes basta olhar à nossa volta e passar os olhos pelas notícias. O problema continuará a agravar-se, com consequências imprevisíveis, porque a idolatrada NATO cria e alimenta guerras sem fim, gerando intermináveis vagas de refugiados em todo o mundo.

«O racismo é uma doença social inerente ao capitalismo, tal como a marginalização das minorias, o desrespeito pelos direitos da mulher, apesar de inscritos nas leis; o mesmo acontece em relação ao ambiente e às alterações climáticas, à salvaguarda dos animais e da vida selvagem, à segurança alimentar, ao tratamento humanizado e igualitário das migrações e dos migrantes.»

As esquerdas das causas fraccionadas não são transformadoras, não ameaçam o capitalismo, não travam nem invertem os sentidos sociais mais negativos, com a agravante de baralhar prioridades, cultivarem a confusão, dispersarem esforços quando a delicadeza e profundidade dos problemas exigem união, organização e convergência de esforços, não a mesquinhez de a «nossa» causa ser mais importante do que todas as outras. E, não poucas vezes, essas esquerdas, sejam falsas ou fofinhas, tão acarinhadas pela trapaceira indústria mediática, servem a classe dominante nas suas campanhas contra os comunistas.

A recente campanha eleitoral exibiu-nos um Livre cheio de ecologias e ademanes de esquerda ao mesmo tempo que defende o fundamentalismo federalista europeu. Ora o quotidiano da União Europeia não deixa dúvidas: ou se é de esquerda ou se é federalista. O federalismo, aliás, é aplicado sub-repticiamente, com as conhecidas e desastrosas consequências para o povo português, mas essa responsabilidade não tem o Livre a coragem de assumir.

O Bloco de Esquerda mantém um flirt com a NATO. As simpatias com o regime de Kiev, que proíbe partidos, assumiu uma censura oficial, restringe o direito à opinião livre e faz circular uma lista à mercê de bufos com os nomes de opositores a liquidar, não traduzem uma escorregadela ocasional. A incapacidade para assumir que a situação na Venezuela é essencialmente uma consequência das asfixiantes e desumanas sanções norte-americanas e da União Europeia; a atracção pelo federalismo europeu; a cumplicidade com o comportamento ocidental destruidor na Síria; e a posição carregada de ambiguidade em relação à operação criminosa da NATO para destruição da Líbia, e que abriu as portas de sucessivas vagas de refugiados em direcção à Europa, identificam um comportamento padrão: afinal, a coerência não é o forte dos bloquistas.

«O Bloco de Esquerda mantém um flirt com a NATO. As simpatias com o regime de Kiev, que proíbe partidos, assumiu uma censura oficial, restringe o direito à opinião livre e faz circular uma lista à mercê de bufos com os nomes de opositores a liquidar, não traduzem uma escorregadela ocasional.»

O PAN, que não sabe muito bem onde se situa no quadrante político, acha meritoriamente, pela voz do seu ex-candidato europeu, que a guerra é uma coisa má porque afecta o meio ambiente e os ecossistemas. A morte de centenas de milhares de pessoas parece ser um inconveniente colateral.

Esquecer as pessoas, desprezar a sua qualidade de vida, os seus direitos humanos sociais e políticos, a afirmação plena da sua dignidade através da saúde, de habitação condigna, de trabalho e salários decentes, da educação e cultura livres, abertas, sem censuras e propiciadoras de elevados índices intelectuais; a negação de condições de segurança e de verdadeira fruição da vida durante o processo de envelhecimento – tudo isto representa a essência do capitalismo. A relação entre o capitalismo e o ser humano é como a da água com o azeite – a incompatibilidade por definição. As esquerdas não-comunistas não são, na prática, anticapitalistas.

O povo tem onde apoiar-se

O PCP actua e luta nos antípodas do cenário próprio da sociedade capitalista, agravado quando a versão fundamentalista neoliberal se expande com ambições globalistas. O PCP é o principal alvo a abater, a alavanca popular capaz de emperrar a máquina trituradora patrocinada por todo o dinheiro disponível no mundo, a voz que nem o salazarismo silenciou.

Por muito que a classe política se desdobre em manobras legais e ilegais para o neutralizar; que a teia mediática propagandística multiplique as mais deslavadas mentiras e as mais vergonhosas calúnias; por muito que os poderes de Estado permitam, fiquem  insensíveis e silenciosos quando esbirros estrangeiros em Portugal ao serviço do nazi-banderismo de Kiev reclamam a sua ilegalização, a exemplo do que fizeram no seu país, o PCP não se intimida, resiste e não deixa o povo desamparado sob os ataques cerrados do autoritarismo conjugado da União Europeia, NATO e outras centrais do imperialismo. Prossegue dia-a-dia, sem esperar pelos circos das campanhas eleitorais, o seu trabalho de formiga esclarecendo, informando, alentando, unindo, organizando, mobilizando, lutando em todas as frentes sociais e políticas, como quem faz acção cívica de cidadão a cidadão para que a democracia liberal, corruptela e cemitério das esperanças libertadas com o 25 de Abril de 1974, entregue de vez a alma ao criador; e seja substituída por uma genuína democracia participativa, antifascista, respeitadora da Constituição e das autênticas liberdades, onde o povo, livremente informado e esclarecido, seja quem mais ordena. Pode parecer impossível, mas as ruas e praças do país encheram-se num ápice quando os corajosos e inesquecíveis cidadãos fardados do MFA avançaram para derrubar a besta fascista, feito histórico em que muitos não acreditavam. 

O povo que fez o 25 de Abril continua, contudo, a ser vítima das famílias oligárquicas, agora ainda mais poderosas, com a cumplicidade de uma classe política usurpadora e que odeia as pessoas. Nada nos convence, porém, que seja impossível, num mundo dinâmico e em mudança permanente, voltarmos a viver novos dias das surpresas. O PCP, independentemente das circunstâncias e das perseguições, continua a cumprir a sua tarefa; os mais desfavorecidos, apesar do poder de uma propaganda tóxica de alcance global, saberão sempre onde apoiar-se. É assim há 103 anos.

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