No próximo sábado assinalam-se 60 anos da assinatura do Tratado de Roma, documento fundador da Comunidade Económica Europeia. Na semana que começa, esperam-nos entorses e mistificações da História das últimas seis décadas no continente europeu, em resposta a mais uma crise do projecto de integração capitalista que assumiu, desde 1992, o nome de União Europeia.
A primeira e, eventualmente, a mais descarada é a apropriação do termo Europa pela máquina de propaganda de Bruxelas e pelos seus agentes. Por mais evidente que a geografia seja, em momentos como os que nos esperam é crucial reafirmar: União Europeia e Europa não são uma e a mesma coisa. Havia Europa há 60 anos, um continente com os seus povos, a sua História e os seus estados. Uma Europa que continua a existir para lá das instituições supranacionais entretanto criadas, por mais que se insista na utilização do termo para as definir.
Mas uma outra mentira histórica surgirá, como acontece sempre, associada ao processo de criação de uns «Estados Unidos da Europa», nas palavras de Churchill: a ideia dos 60 anos de paz no continente. Nada mais falso. Da ocupação parcial de Chipre em 1974 ao conflito que perdura na Ucrânia, passando pelas guerras nos Balcãs, com o dedo da NATO, as últimas seis décadas estão longe de representar um período de paz para os povos europeus.
Não serão de estranhar, nos próximos dias, proclamações grandiosas sobre o passado e o futuro desta experiência. Sobre o seu carácter único, por exemplo, ainda que, oito anos antes do Tratado de Roma, sete estados europeus tivessem criado o Conselho para a Assistência Económica Mútua. Para a construção da teia que hoje forma a União Europeia, as proclamações contaram mais que a realidade e a solidariedade e cooperação entre estados e povos.
Hoje, como tantas vezes no passado, muitos apresentam como saída para a crise «mais Europa», mais integração, menos soberania. Esta é a solução-padrão para todas as encruzilhadas: em 1986, Portugal na CEE resolveria os nossos problemas; em 1999, o euro seria «um escudo contra a crise»; em 2007, o Tratado de Lisboa tornaria a União Europeia (connosco lá dentro) numa potência mundial. Tudo isto feito de costas voltadas para os povos, quando não em conflito. Os referendos repetidos, como na Dinarmarca (sobre Maastricht) e na Irlanda (sobre Nice e Lisboa), são uma imagem de marca: «mais Europa», custe o que custar.
Nesta semana somos chamados a discutir a União Europeia e só o podemos fazer olhando para as consequências que teve, particularmente no nosso país. É o que faremos, procurando sempre o outro lado das notícias.
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