550 euros já é salário a mais para os patrões

O «medo» das grandes empresas é sim a diminuição dos seus já volumosos lucros. Enquanto muitas pagam salários de miséria aos seus trabalhadores, esses, que foram peças essenciais para a obtenção desses lucros.

António Saraiva defende contrapartidas para o aumento do salário mínimo nacional
CréditosNuno Fox / Agência Lusa

Os representantes do patronato fazem de tudo para legitimar a ideia de que a subida do salário mínimo nacional (SMN) tem que ser inferior ao que é a proposta do Governo, que são os 557 euros. António Saraiva, o presidente da Confederação Empresarial de Portugal, nos últimos dias, já fez questão de dar os sinais dos patrões: primeiro, dizendo que aceitariam o aumento do SMN se não ocorrerem novas reversões e se a legislação laboral não for alterada. O presidente «dos patrões» admitiu aqui que reversões como a devolução dos feriados, as 35 horas, a reversão das privatizações já foi muito e que agora não deve haver mais. Portanto aumentar salário, mas não mexer, por exemplo, no banco de horas individual, no aumento dos dias de férias ou na «tontaria» (sim, usou o termo) das 35 horas para o sector privado.  Depois disto, veio afirmar que considera os 557 euros salário a mais, acabando por revelar que o valor que os patrões irão propor ficará abaixo dos 550 euros. 

A pressão vem também de instâncias que defendem os interesses dos patrões. É o caso do FMI, que veio «avisar» que o aumento do SMN é uma medida prejudicial. O chefe da missão do FMI em Portugal, Subir Lall, numa entrevista dada ao Público, afirma que os empregadores privados «apenas se sentirem um bom ambiente para investir é que irão contratar mais pessoas e pagar-lhes mais», acrescentando que «se, pelo contrário, a procura de força de trabalho se mantém igual ou se cai porque os custos de trabalho subiram mais que a produtividade, isso vai fazer cair o emprego». O FMI insiste assim em relacionar o aumento do salários com a menor criação de emprego, como forma de chantagem para que não ocorram aumentos. É como se dissessem: «Olha que se os salários subirem, muita gente continuará no desemprego!».

A ideia de que a situação das empresas fica «catastrófica» se aumentarem salários é usada pelos representantes dos patrões para travar os aumentos. Mas na verdade o aumento dos salários até pode beneficiar as empresas. Pode ser um investimento feito com retorno. Na verdade, muitas empresas em Portugal não programam a sua produção e não criam mais emprego porque têm medo que as pessoas não tenham rendimentos para consumir. A partir do momento que se aumentam os salários, e assim o poder de compra dos trabalhadores, as empresas estarão em melhores condições de perspetivar produção e criar emprego. Isto faz tanto mais sentido quando sabemos que 95% das empresas em Portugal têm menos de 10 trabalhadores e a esmagadora maioria delas trabalha para o mercado interno. Ou seja, se não houver procura interna, estas empresas vão passar dificuldades.

Já se estivermos a falar das grandes empresas, os seus gigantescos lucros não justificam nenhum medo. Por exemplo, podemos falar da Jerónimo Martins, dona do Pingo Doce, que registou, em 2015, lucros de 333 milhões de euros, enquanto os quase 90 mil trabalhadores recebem um salário médio pouco acima dos 680 euros. A EDP, que lucrou mais de 600 milhões de euros no primeiro semestre deste ano, ou a Galp que lucrou 247 milhões de euros no mesmo período. O «medo» das grandes empresas é sim a diminuição dos seus já volumosos lucros. Enquanto muitas pagam salários de miséria aos seus trabalhadores, esses, que foram peças essenciais para a obtenção desses lucros. 

Com isto tudo, não é descabida a ideia dos que propõem que o salário mínimo tem que aumentar já para os 600 euros.

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