Joe Hill nunca morreu!

Joe Hill personifica essa tradição rebelde nas suas canções, ainda hoje cantadas e reconhecidas no meio sindical em todo o Mundo. Ele permanece como um mártir da luta e um herói que combateu pela transformação da realidade com criatividade, música e poesia.

Joe Hill
Créditos / Arquivo digital do estado do Utah (EUA)

Quando Joel Emannuel Hagglund, órfão sueco nascido em 1879, desembarcou nos Estados Unidos da América, em 1902, acompanhado do seu irmão mais novo, a luta dos trabalhadores americanos já tinha tido desenvolvimentos de fundo com as campanhas das oito horas de Trabalho, oito horas de Descanso, oito horas de Liberdade, Cultura e Educação, e os trágicos acontecimentos de Chicago, do 1.º de Maio de 1886.

Joseph Hillstrom, ou Joe Hill como passou a ficar conhecido, não deixou no entanto de ser uma figura central do sindicalismo industrial americano, mas acima de tudo foi um dos autores do cancioneiro rebelde dos trabalhadores e da sua luta pela liberdade.

«Where the Fraser River Flows» (Joe Hill, 1912)

Joe Hill foi um herói americano cuja carga dramática cresceu no desenvolvimento da luta até a explosão iminente, numa verdadeira tragédia romântica do século XX.

Um emigrante que trabalhou um pouco por todo o território dos Estados Unidos, das docas de Nova Iorque aos caminhos de ferro, nas minas e nos barcos, como madeireiro ou como operário industrial, cruzando a História e o país de costa a costa, do Maine a Cleveland, até São Francisco e à Califórnia.

Participou durante largos meses, com um grupo de operários e revolucionários, na tentativa de derrubar o ditador mexicano Porfirio Diaz, em 1911. Por fim, imortalizou-se como o organizador e agitador da classe operária, o trovador sindicalista que enfrentou o esquadrão de fuzilamento em Novembro de 1915 como inevitável consequência do seu afrontamento à burguesia do Estado do Utah.

«Joe Hill soube reconhecer nas palavras e nas canções o elemento agregador capaz de romper a censura classista e falar de factos reais da vida para assim agitar e reforçar o Sindicato»

 

 

A formação musical aprendida em família na infância da sua Gavle natal, na Suécia, aliada a uma inteligência estratégica digna das grandes figuras históricas, deram a Joe Hill as ferramentas para enfrentar a besta reaccionária que, apoiada na força policial de um Estado rendido aos privilégios de capitalistas zelosos da sua condição, varria à força de bastonada e tiros todas as tentativas de greve e luta organizada dos trabalhadores.

Joe Hill soube reconhecer nas palavras e nas canções o elemento agregador capaz de romper a censura classista, e falar de factos reais da vida para assim agitar e reforçar o Sindicato, a única voz da classe operária e a estrutura capaz de combater a opressão dos patrões e a sua repressão policial.

«There is Power in The Union» (Joe Hill, 1913)

Ele sabia que para unir os trabalhadores, muitos deles analfabetos, eram mais eficazes as canções repletas de humor e consciência de classe, que se decoravam e cantavam em grupo, do que os melhores panfletos ou editoriais de economia.

E com efeito, através das suas canções, muitas delas adaptações de hinos religiosos bem conhecidos, e das suas letras sempre apoiadas numa linguagem popular, referenciada na realidade do dia-a-dia da luta contra os patrões, os fura-greves, os traidores e bufos, ou os pregadores de uma vida gloriosa no reino dos céus depois da morte, Joe Hill tornou-se central no reforço do Sindicato Industrial [Industrial Workers of The World (IWW)], na elevação da consciência de classe. Um distinto dirigente sindical e mobilizador, pioneiro e inspiração maior do movimento folk contestatário nas décadas seguintes, enquanto prosseguia o seu caminho inexorável para a linha de fogo da sentença de morte, que o viria a tornar um mártir da luta dos trabalhadores de todo o mundo.

O desenvolvimento da luta e o papel preponderante que Hill desempenhou naqueles anos enquanto organizador, mas também cantor e atracção principal nos comícios do Sindicato IWW, fizeram dele uma figura bem conhecida dos trabalhadores, bem como de patrões e burguesia.

O seu papel político, mas também a forma como atacava o conservadorismo e a caridade religiosa das seitas e do Exército da Salvação, fizeram de Joe Hill um alvo a abater para uma classe dominante que germinava no caldo cultural de uma América retrógrada, que ainda hoje mostra a sua face nas tiradas xenófobas e racistas do novo Presidente eleito sobretudo com o voto do interior do país. 

Joe Hill viu-se enredado num processo nubloso onde em virtude de provas circunstanciais foi acusado da morte de um merceeiro, ex-polícia, na sequência de um assalto armado em Salt Lake City. 

Joe Hill, que no mesmo dia se dirigiu a um médico por causa de um ferimento de bala, foi detido e acusado, servindo de bode expiatório numa flagrante oportunidade para a autoridade contra-atacar ou, nas palavras de William Spry, à época governador do Utah, usar o processo judicial «para calar a rua que ruge». 

Durante o julgamento não houve reconhecimento testemunhal e Joe recusou a presença dos advogados. Tomou a sua defesa e o movimento sindical organizou-se em petições, chegando o Presidente dos EUA, Woodrow Wilson, a intervir sem sucesso junto do governador Spry do Utah.

No dia 19 de Novembro de 1915 Joe Hill é apresentado frente a um pelotão de fuzilamento e quando lhe perguntaram se tinha algumas últimas palavras, perante os seus assassinos gritou: «Fogo!»

Hoje, 101 anos passados sobre a sua morte, Joe Hill mantém-se como uma figura central do sindicalismo revolucionário, um agitador e organizador cujas palavras e canções lançaram as sementes para o aparecimento de artistas progressistas como Pete Seeger, Woody Guthrie ou Bob Dylan.

Joe Hill personifica essa tradição rebelde nas suas canções, ainda hoje cantadas e reconhecidas no meio sindical em todo o Mundo. Ele permanece como um mártir da luta e um herói que combateu pela transformação da realidade com criatividade, música e poesia.

Armas carregadas de Futuro, para uma luta que continua actual e necessária.

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