|Manuel A. Domingos

Direitos das crianças e pais: a mesma luta

Em Portugal, segundo a UNICEF, uma em cada cinco crianças vive em risco de pobreza e exclusão, tendo como consequência a impossibilidade em usufruir, de forma plena, de todos os seus direitos. 

CréditosJoão Relvas / Agência Lusa

A criança é, segundo a Convenção dos Direitos da Criança ⎯ adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 20 de Novembro de 1989 e ratificada por Portugal em 21 de Setembro de 1990 ⎯, definida como todo o ser humano com menos de dezoito anos, excepto se a lei nacional conferir a maioridade mais cedo. A Convenção também reafirma, no seu preâmbulo, o facto de as crianças necessitarem de protecção e atenção especiais. Para além da família, que tem a responsabilidade fundamental no que diz respeito aos cuidados e protecção, cumpre ao Estado o dever de proteger a criança contra todas as formas de discriminação, bem como de tomar medidas positivas para promover os seus direitos. Todavia, há muito a fazer para que os direitos da Convenção sejam realidade na vida das crianças.

Segundo o relatório Pobreza e Exclusão Social – 2024, da responsabilidade do Observatório Nacional de Luta contra a Pobreza, as crianças, em 2023, protagonizaram um dos maiores aumentos da taxa de risco de pobreza ou exclusão social (+9,2%), ficando-se nos 22,6%. Foi entre as crianças com menos de seis anos que esta situação mais se acentuou, com uma taxa de 21,6% e correspondendo a um aumento de 22,7%. O referido relatório refere que, em 2023, viviam em Portugal 379 mil crianças em risco de pobreza ou exclusão social, registando-se um aumento de 40 mil crianças nesta situação, em relação a 2022.

Em Portugal, e segundo a UNICEF, «a pobreza infantil refere-se a crianças que vivem em agregados familiares cujo rendimento está abaixo de 60% do rendimento mediano nacional». Segundo este organismo, uma em cada cinco crianças vive em risco de pobreza e exclusão, tendo como consequência a impossibilidade em usufruir, de forma plena, de todos os seus direitos, tais como o direito à alimentação saudável, à água e saneamento, ao acesso a serviços de saúde, habitação, educação, participação e proteção.

Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), a percentagem de crianças em famílias com privação material e social aumentou de 10,7% para 11,3%, entre 2021 e 2024. Os dados do INE mostram, também, que uma em cada cinco crianças (20,6%), num total de cerca de 310 mil, integra famílias sem capacidade económica para pagar uma semana de férias por ano, fora de casa, a todos os seus membros.

Todos estes dados apontam num sentido: para garantir os direitos das crianças são necessárias medidas que garantam os direitos dos pais, especialmente em relação à legislação laboral e à questão salarial.

«O referido relatório refere que, em 2023, viviam em Portugal 379 mil crianças em risco de pobreza ou exclusão social, registando-se um aumento de 40 mil crianças nesta situação, em relação a 2022.»

No que diz respeito à legislação laboral, são necessárias políticas que abordem as questões da desregulamentação dos horários de trabalho, em especial aquelas que estão relacionadas com o trabalho por turnos e nocturno (que muitas vezes impedem os pais de se cruzarem com os próprios filhos), sendo ainda de vital importância abordar as questões da precariedade, pois sem estabilidade não é possível enfrentar os vários desafios de acompanhar o crescimento dos filhos. Relativamente à questão salarial, é urgente uma real e verdadeira valorização salarial, que permita aos pais proporcionar e garantir aos seus filhos a protecção e os cuidados necessários ao seu bem-estar, sendo que o salário mínimo nacional actual, no valor de 870 euros, está longe de ser suficiente.

Deveria ser da responsabilidade do Estado a formulação de políticas universais e estruturais que garantissem o desenvolvimento das crianças. Todavia, as políticas implementadas pelos sucessivos governos têm impedido, a título de exemplo, que o Estado faça uma aposta real, e consequente, no investimento em serviços de saúde e educação universais, públicos e de qualidade, bem como garantir a todas as crianças condições decentes de habitação, acesso a uma nutrição equilibrada ou a transportes acessíveis. Na realidade, as políticas implementadas apenas ajudaram à degradação das condições dos trabalhadores e, em consequência, das suas famílias. Políticas que não contribuíram para cumprir os direitos mais elementares das crianças.

Todas as crianças têm direito a um desenvolvimento integral, equilibrado e saudável. Deve-lhes ser garantido o direito a brincar, a disfrutar da natureza e espaços verdes, de equipamentos que fomentem a prática desportiva, a criação e fruição cultural, sem qualquer tipo de discriminações, ou violência, para que os filhos dos homens nunca deixem de ser meninos.

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