Abel Mateus foi o primeiro a ser ouvido no regresso dos trabalhos da comissão de inquérito parlamentar às rendas no sector eléctrico e a sua audição passou largamente despercebida pela comunicação social. Mas a apresentação feita pelo responsável pela entidade criada precisamente para acompanhar a liberalização do sector eléctrico foi demolidora para a estratégia política prosseguida por governos do PS, do PSD e do CDS-PP.
O diagnóstico feito no início de Setembro, no Parlamento, é impiedoso para dois dos principais responsáveis políticos pelos polémicos CMEC, os contratos que garantiram elevadas rendas à EDP: os ministros Carlos Tavares (PSD/CDS-PP) e Manuel Pinho (PS).
Ambos consultaram a então recém-criada Autoridade da Concorrência entre 2004 e 2005 sobre a matéria, mas Abel Mateus afirma que as preocupações expressas foram ignoradas pelos responsáveis políticos na elaboração dos diplomas.
Privatização e liberalização criaram um «monstro»
Os problemas no sector, segundo Abel Mateus, remontam à década de 1990 e à decisão de privatizar a EDP. O processo, iniciado em 1997, transformou «um quasi-monopólio público num quasi-monopólio privado». Dois anos antes, o governo tinha estendido os CAE (antecessores dos CMEC) a todas as unidades produtoras de energia da empresa. Os CAE, criados para financiar projectos de investimento, tornam-se num instrumento que garante o rendimento das centrais da EDP à custa de dinheiros públicos. Isto, recorde-se, num quadro em que ia sendo preparada a entrega da empresa a privados.
A existência dos CAE tem sido apontada como o elemento determinante para a criação dos CMEC. O argumento que os responsáveis políticos de então vêm referindo é que era necessário substituir os compromissos do Estado para com a EDP por outros – mudar o nome mas manter a renda garantida.
Concorrência no sector foi um embuste
Para além de apontar as responsabilidades políticas no «monstro», o primeiro presidente da Autoridade da Concorrência afirma que a estratégia para o sector criou «um simulacro de “mercado”, totalmente comandado, com preços, margens e até lucros totais garantidos aos geradores de eletricidade».
Abel Mateus é igualmente crítico da forma como foi subsidiada a instalação de centrais eólicas, já que a imaturidade tecnológica da solução resultou num custo de subsidiação superior a 5 mil milhões de euros entre 2006 e 2018.
Banca, Energia e PPP já custaram 55 mil milhões de euros
O economista sublinhou, no final, que a subsidiação de negócios privados no sector eléctrico, bancário e nas parcerias público-privado já custaram ao País 55 mil milhões de euros. Um valor suficiente para pagar um aumento salarial médio de 100 euros para todos os trabalhadores da Administração Pública durante mais de meio século.
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