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União Europeia prepara-se para a guerra

Os ministros da Defesa da União Europeia, incluindo Portugal, aprovaram 16 projectos federalistas militares. Quase metade serão dirigidos por países que têm governos fascistas e aparentados.

Soldados georgianos em partida para o Afeganistão, ao serviço da NATO.
Créditos / NewEurope

O assunto passou despercebido, o que não aconteceu por acaso atendendo ao que está em causa. No passado dia 19 de Novembro, os ministros da Defesa da esmagadora maioria dos países da União Europeia, incluindo Portugal, aprovaram 16 projectos federalistas militares que integram a criação de uma escola de espionagem, a vigilância reforçada desde a atmosfera ao fundo dos mares, o apuramento dos mecanismos de navegação e reacção rápida, a guerras cibernética, química, biológica, bacteriológica e nuclear. Em Bruxelas considera-se que estamos na antecâmara do exército europeu. Uma curiosidade: quase metade dos projectos de integração militar serão dirigidos por países que têm governos fascistas e aparentados.

«[São] 16 projectos militares da União Europeia aprovados em 19 de Novembro, naturalmente à revelia dos cidadãos e das opiniões públicas dos países envolvidos, que apenas se darão conta da parafernália como facto consumado. Porém, são a privacidade e a sobrevivência de todos nós que estão em causa»

Nem uma escola de cidadania ou de democracia; muito menos de direitos humanos. O que a União Europeia está a criar em Chipre, sob gestão da Grécia, é uma escola de espiões, a EU Intelligence School, na qual os agentes do presente criarão a geração da espionagem federalista do futuro e cujo corpo docente terá a prestimosa colaboração das agências da NATO.

Este é um dos 16 projectos militares da União Europeia aprovados em 19 de Novembro, naturalmente à revelia dos cidadãos e das opiniões públicas dos países envolvidos, que apenas se darão conta da parafernália como facto consumado. Porém, são a privacidade e a sobrevivência de todos nós que estão em causa.

O Reino Unido, de saída, a Dinamarca e Malta foram os únicos países que se pouparam a esta epidemia de febre militarista gerada a partir de 2017, quando entrou em vigor a PESCO – Cooperação Política Estruturada Permanente1. Percebendo-se, pelas circunstâncias, que em plena institucionalização clandestina do federalismo a União Europeia entende a Cooperação Política Estruturada como um assunto do foro militar.

Pandemia de espionite

A escola de espiões e o desenvolvimento de um verdadeiro serviço de informações supranacional é um sonho dos buro-tecnocratas de Bruxelas que o Reino Unido travou até chegarem os tempos do Brexit. Diz-se que Londres não queria que fosse criada concorrência em relação ao monopólio dos «Cinco Olhos» – o funcionamento comum da espionagem anglo-saxónica: Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Austrália e Nova Zelândia. Uma inquietação, no fundo, sem razão de ser, porque tudo funcionará a somar contra os cidadãos, não haverá concorrência. E quanto a haver o risco de se espiarem uns aos outros, isso nada trará de novo porque é coisa que já acontece, como Assange e Snowden demonstraram.

Consta em Bruxelas que alguns países manifestaram reservas em relação ao facto de a escola de espiões ficar instalada em Chipre, o que a tornaria muito exposta, por exemplo, a Israel, à Turquia e à Rússia.

Preocupações essas que não parecem procedentes. Qual é o problema com Israel, país que treina a maior parte das polícias da União Europeia e que funciona como «exemplo» nos assuntos de defesa e segurança? E não estará Israel já a tutelar a escola graças à intimidade com o governo de Tsipras, a quem a escola está entregue, e com a própria NATO?

Quanto à Turquia, consegue casar muito bem o fundamentalismo islâmico do governo com a presença na NATO, pelo que não virá daí o perigo de a escola de espiões ser espiada. Aliança Atlântica e fundamentalismo islâmico têm, há muito, a sua cooperação estruturada.

Os russos, sim. Esse perigo existe. Porém, a crer nas notícias que correm mundo sobre a ameaça de Moscovo e a sua lendária espionagem, que pairam sobre tudo, tanto faz, afinal, que a escola seja em Chipre como no Cabo da Roca.

A inegável flexibilidade de Tsipras

Como reconhecimento pela inegável flexibilidade manifestada por Alexis Tsipras perante esta União em fase de militarização da austeridade, o governo de Atenas ficará com mais duas missões além da direcção da escola de espiões: a preparação de tripulações de helicópteros em situações de risco; e a gestão do sistema de forças especiais destacáveis para pequenas operações militares conjuntas.

«[A] materialização da proposta franco-alemã para fundação de um exército europeu […] significa o abandono das ilusões de estabelecer o federalismo por vias abertas e democráticas – ainda que meramente formais – substituídas por uma imposição clandestina protegida pela via autocrática da militarização»

Como é natural, o eixo franco-alemão ficou com uma parte nobre destes preparativos europeus de guerra.

Paris providenciará a nova geração de mísseis de médio alcance Beyond Line of Sight (BLOS); beneficiará e operacionalizará a partilha de bases militares na Europa e no exterior, numa perspectiva de «resposta rápida a crises»; centralizará as soluções de radionavegação de âmbito europeu – posicionamento, navegação e cronometria militar – com base no aproveitamento do sistema Galileu – sistema global de navegação por satélite; comandará, juntamente com a Suécia, o centro de testes e avaliação e, com o Alemanha, o desenvolvimento do novo helicóptero militar europeu Tiger.

A Alemanha cuidará da nova geração de drones para monitorizar terra e mar e coordenará a recolha de informações geometeorológicas e oceanográficas.

O insustentável peso do fascismo

Países governados por partidos fascistas ou aparentados ficarão com sete dos 16 projectos de guerra e integração militar lançados pelos ministros da Defesa da União Europeia.

Itália terá a seu cargo o chamado High Atmosphere Airship, um sistema baseado em balões para esquadrinhar os céus, e outro projecto de espionagem recorrendo a minidrones e microdrones; cabe ainda a Roma, com o auxílio de Paris, o desenvolvimento de uma rede militar europeia autónoma espacial para responder a «ameaças meteorológicas e humanas».

«A militarização da União [garante] ao sistema económico neoliberal aquilo de que mais necessita actualmente: a política exercida em moldes autocráticos. […] Estreitam-se os espaços para convencer a opinião pública global de que uma guerra de enormes proporções é evitável»

 

A Estónia foi encarregada de criar um sistema modular no solo, não tripulado, de navegação cibernética e autónoma para planeamento de rotas e missões militares.

O governo da Áustria, em cuja coligação participa o partido que deu Hitler ao mundo, terá a seu cargo o apoio a missões militares da União no âmbito de um projecto em rede de vigilância química, biológica, radiológica e nuclear para detectar ameaças desse tipo contra as tropas em operação.

A República Checa tem como missão instalar meios de guerra electrónica através da formação de uma força conjunta que, nesse âmbito, supostamente apoiará grupos de tropas europeias em situações de combate.

A Bulgária não foi esquecida pelos confrades. Tem a seu cargo o Divepack, o pacote modular de intervenção submarina vocacionado para assegurar a reacção rápida de missões de forças especiais no mar.

Federalismo subordinado militarmente a Washington

Criado em tempos de Brexit e também de materialização da proposta franco-alemã para fundação de um exército europeu – aberto ao Reino Unido – o conjunto multidisciplinar de projectos ditos de defesa e segurança marca uma nova etapa – que os mentores esperam decisiva – na institucionalização do federalismo na União Europeia. Um processo que significa o abandono das ilusões de estabelecer o federalismo por vias abertas e democráticas – ainda que meramente formais – substituídas por uma imposição clandestina protegida pela via autocrática da militarização.

Este método permite o recrutamento das correntes fascistas e populistas europeias para o movimento federalista, através da aceleração da integração militar.

A militarização da União surge, deste modo, como um seguro contra as dissidências, isto é, a repetição de brexits, garantindo simultaneamente ao sistema económico neoliberal aquilo de que mais necessita actualmente: a política exercida em moldes autocráticos. Para isso, nada mais aconselhável e seguro do que militarizar a política.

 

O preço a pagar por tudo isto é a transformação da União Europeia numa aliança militar integrada, por definição, no sistema agressivo da NATO. Dissolvem-se os efeitos do Brexit e, ao contrário das aparências, subordina-se operacionalmente a Europa – já pronta para a guerra – aos Estados Unidos.

Perante as circunstâncias expostas, estreitam-se os espaços para convencer a opinião pública global de que uma guerra de enormes proporções é evitável.

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