A Samkyukta Kisan Morcha – coligação de dezenas de sindicatos de agricultores – tinha convocado um «Dia Negro» para 26 de Maio, a ser observado nos locais de protesto onde os agricultores se mantêm há seis meses, nas entradas da capital, Nova Déli, e também em aldeias e cidades pelo país fora, cumprindo as medidas sanitárias.
De acordo com o portal newsclick.in, a resposta não foi pequena. Aos agricultores, juntaram-se trabalhadores de outros sectores, organizações de jovens, estudantes e de mulheres, camadas populares, perfazendo dezenas de milhares em todo o país – excepto nas zonas afectadas pelo ciclone Yaas – e deixando clara a determinação de ver revogada a legislação que ataca os camponeses e os deixa à mercê do agronegócio.
Nalguns locais, foram queimadas efígies do primeiro-ministro, Narendra Modi, bem como cópias da legislação aprovada, enquanto noutros manifestantes e residentes exibiram bandeiras negras em suas casas, nos seus carros, tractores, nos campos agrícolas e nas ruas, em fábricas e estabelecimentos comerciais.
Quando passam 6 meses sobre o início das mobilizações dos agricultores indianos em defesa do sector, contra o agronegócio, os sindicatos querem mostrar que o movimento está vivo, em circunstâncias adversas. Representantes da Samyukta Kisan Morcha (SKM) – que integra cerca de 40 organizações de agricultores – anunciaram há dez dias que não deixariam passar o 26 de Maio, dia em que se completam seis meses de luta contra a legislação aprovada em Setembro do ano passado, que os deixa à mercê dos grandes grupos económicos e que, denunciam os sindicatos, põe fim ao preço mínimo garantido, ameaça a segurança alimentar do país e conduz à destruição da pequena agricultura pelo agronegócio. No mesmo dia, faz sete anos que o primeiro-ministro, Narendra Modi, assumiu o poder e, por tudo isso, a SKM decidiu designar esta jornada como «Dia Negro». De acordo com o projectado pelos organizadores, tanto agricultores como outros cidadãos irão exibir bandeiras negras nas suas casas e veículos, além de queimarem efígies de Modi nas aldeias. A direcção da Samyukt Kisan Morcha, que reúne os sindicatos agrícolas, vai organizar uma terceira fase de mobilizações, num contexto em que muitos agricultores precisam de regressar aos campos. O rumo dos protestos que os agricultores indianos mantêm há quase três meses contra a legislação neoliberal aprovada por Modi será decidido após uma reunião no próximo domingo, dia 28. O objectivo dos dirigentes sindicais é pôr em marcha uma estratégia capaz de manter vivas as mobilizações nos arredores de Nova Déli, noticia o Newsclick. Se se olhar para o programa das quatro iniciativas anunciadas para domingo, refere o portal, nota-se que a direcção do movimento agrícola já se está a confrontar com o desafio, pois duas delas visam atrair a participação da juventude e dos trabalhadores. Quando, no final de Novembro último, centenas de milhares de agricultores constituíram um poderoso movimento de luta contra as leis que põem em causa a sua sobrevivência, tinha terminado a temporada da colheita do arroz e o trigo tinha sido semeado. Muitos dos agricultores que então deram início ao «cerco» à capital eram sobretudo dos estados do Punjabe e de Haryana, e o calendário agrícola permitia-lhes estar afastados das suas terras e dava-lhes disponibilidade para lutar. No entanto, com o fim de Fevereiro a aproximar-se, um grande número vê-se obrigado a sair dos arredores de Nova Déli para regressar às suas aldeias, mesmo que por um período curto de tempo, uma vez que a época da colheita de trigo está aí à porta. Gurnam Singh Chaduni, dirigente do Sindicato Bharatiya Kisan e da Samyukt Kisan Morcha, declarou ao newsclick.in que «o foco, agora, é atrair diferentes sectores da sociedade para as manifestações, tranformando-as num movimento de massas». «Estamos a fazer isto sublinhando que as reformas agrícolas não afectam apenas os agricultores, mas também outras pessoas», disse Chaduni, acrescentando que muito foi alcançado nesta direcção com as mahapanchayats – grandes reuniões dos conselhos das aldeias – recentemente organizadas no estado de Haryana, que tiveram uma participação considerável de mulheres, trabalhadores agrícolas sem terra e assalariados. Numa «demonstração de força», o Bharatiya Kisan Union (Ekta Ugrahan) e o Punjab Khet Mazdoor Union – a facção do sindicato que representa os trabalhadores sem terra – organizaram uma mobilização que reuniu mais de 100 mil pessoas, este domingo, na localidade de Barnala, no estado do Punjabe. «A grande multidão foi a resposta a todos aqueles que afirmaram erradamente que andolan pheeka pad gaya hai [o movimento desapareceu]», disse ao newsclick.in o secretário estadual do BKU (EU), Shingara Mann Singh. Em seu entender, a mobilização foi também um sucesso por sublinhar que o movimento de luta em curso não diz respeito apenas aos agricultores e ao seu sustento. «Este protesto contra as kaale kanoon [leis negras] não é só para os agricultores, mas também para os trabalhadores do campo», disse Singh, acrescentando que, «para honrar o papel das mulheres na agricultura», foi feito um apelo para celebrar o Dia Internacional da Mulher (8 de Março) nos acampamentos de camponeses localizados em redor de Nova Déli. Por seu lado, o presidente do Punjab Khet Mazdoor Union, Jora Singh Nasrali, destacou que as leis agrárias vão afectar o rendimento dos agricultores e o emprego dos trabalhadores agrícolas, e que «é fundamental que ambos estejam unidos para lutar contra a privatização e corporatização» que o governo indiano pôs à solta. Além disso, denunciou, «o Sistema de Distribuição Pública [PDS, na sigla em inglês] será gravemente diluído pelas reformas, pondo em risco a segurança alimentar». Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Quando da apresentação da iniciativa, Balbir Singh Rajewal, membro do secretariado da SKM, afirmou que o governo «pensa que a apatia ou simples ignorância enfraqueceriam o movimento, na ausência de negociações». Mas sublinhou que o executivo é «tolo» se crê que os agricultores abandonariam os protestos sem ver cumpridas as suas reivindicações, refere o portal newsclick.in. Frisou ainda que, embora o movimento agrícola tivesse a noção de que seria apresentado como «vilão», jamais pensou que o governo «descesse tão baixo», ao responsabilizar os agricultores pela falta de oxigénio nos hospitais e pelo aumento dos casos de Covid-19. Isto, lembrou, enquanto o governo se envolvia a fundo nas campanhas para as eleições nos estados. Na semana passada, a Polícia espancou brutalmente os agricultores que protestaram na presença do ministro-chefe do estado de Haryana, M. L. Khattar (do BJP, partido de Modi), durante a inauguração de um hospital no distrito de Hisar, cujas autoridades ainda fizeram questão de processar 350 agricultores. Estes estavam particularmente revoltados com Khattar, depois de ter dito que os agricultores andavam a espalhar o vírus nas zonas rurais ao regressarem das mobilizações em Déli. No entanto, ontem, com milhares de agricultores concentrados em Hisar, as autoridades não só retiraram as queixas contra os agricultores, como aceitaram indemnizar os visados, que nalguns casos ficaram com os tractores e carros espatifados. Gurnam Singh Chadhuni, da SKM, anunciou isto aos manifestantes, sublinhando a grande vitória alcançada e tendo considerado que o mais importante foi o pedido de desculpas por parte da Polícia. Ashok Dhawale, presidente do All India Kisan Sabha (AIKS), disse ao Newsclick que se tratou de facto de uma grande vitória. «Encontrei-me com vários agricultores que me mostraram feridas e cicatrizes, e era claro que resultavam de uma acção para aleijar as pessoas, não para as dispersar», frisou. Sobre os protestos programados para amanhã, Dhawale disse que têm dimensão nacional, mas «que se teve o cuidado de não convocar grandes concentrações, tendo em conta a pandemia». Por seu lado, Balbir Singh Rajewal, da SMK, destacou que todo o mundo está a ver o movimento agrícola indiano e aquilo que vai conseguir com a sua luta. «Nos tempos mais recentes, o mundo não assistiu a um movimento como este, em que as pessoas enfrentam directamente as empresas por um período tão longo», disse, acrescentando que o que está em causa vai muito para além da legislação relacionada com o sector. «Tem a ver com bater o pé e não deixar que os interesses dos grupos económicos mandem nas nossas vidas.» Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Internacional|
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Amarjeet Kaur, secretária-geral do Congresso dos Sindicatos de Toda a Índia (AITUC), disse que o povo não consegue esquecer a agonia de não ter camas, medicamentos e oxigénio, e de perder os seus próximos e queridos para a morte. Apesar disso, da «indignidade», do «falhanço» e «grande angústia», «com excepção das regiões costeiras de Odisha e Bengala Ocidental, atingidas pelo ciclone Yaas, houve adesão ao Dia Negro em todos os cantos da Índia», disse, citada pelo Newsclick.
Mesmo em Uttar Pradesh, o estado da Índia com mais população (cerca de 200 milhões de habitantes), onde vários dirigentes agrícolas foram colocados em prisão domiciliária na véspera de 26 de Maio, para vergar os protestos, registaram-se múltiplas mobilizações. Nalguns pontos houve confrontos, nomeadamente nas portagens, depois de a Polícia ali ter atacado os manifestantes.
Na Região da Capital da Índia, vários sindicatos filiados no Centro de Sindicatos Indianos (CITU) promoveram mobilizações em mais de 50 locais. Para Anurag Saxena, secretário-geral do CITU, a «enormidade do protesto mostra como as pessoas estão zangadas com este governo, já que permitiu um ataque sem precedentes aos empregos para tornar o patronato mais rico».
Destacou ainda a necessidade de tornar «a vacinação gratuita e universal para salvar o povo trabalhador da pandemia», exigiu apoio imediato para os trabalhadores do sector informal e para os desempregados, bem como alterações aos actuais códigos laborais, que prejudicam os trabalhadores.
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