|Reino Unido

Se o Labour não apoia os trabalhadores, os sindicatos não apoiam o Labour

O Unite, o maior sindicato no Reino Unido, anunciou que vai deixar de apoiar financeiramente o Labour. Já a juventude do Labour prometeu não voltar a fazer campanha por candidatos que furem um piquete de greve.

50 mil funcionários de 58 universidades no Reino Unido cumpriram três dias de greve na semana passada, apoiados por centenas de professores que não deram aulas, em solidariedade, durante esse período, Universidade de Glasgow, Escócia, 1 de Dezembro 2021
Créditos / socialistworker.uk.co

A reformulação do gabinete-sombra do Labour (Partido Trabalhista Britânico), comandada, esta semana, pelo seu actual líder, Keir Stammer, marcou mais um passo na progressiva aproximação à direita do partido. A extinção do cargo de ministro-sombra para os direitos trabalhistas não deixa muitas dúvidas sobre as novas prioridades da direcção do partido: a economia, não os trabalhadores.

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Ken Loach expulso do Partido Trabalhista Britânico

O cineasta Inglês, que em 2016 venceu a segunda Palma de Ouro no Festival de Cannes por Eu, Daniel Blake, foi notificado da sua expulsão do Labour por se recusar a legitimar a purga «de bons amigos e camaradas».

Ken Loach em frente ao cartaz do filme <em>Eu, Daniel Blake</em>, 2016 
Créditos / ctb.org

Conhecido pela sua intervenção social, empenhado na denúncia do capitalismo, da exploração laboral e da pobreza, Ken Loach é um dos mais importantes cineastas Ingleses. A sua penúltima longa-metragem, Eu, Daniel Blake (2016), expõe, nas suas palavras, «a constante humilhação de sobreviver. Se tu não vives furioso com isso, que raio de pessoa és?».

Em Eu, Daniel Blake, Loach retrata a experiência desumanizante de um homem a quem é recusada uma pensão de invalidez, muito embora tenha sido declarado inapto para trabalhar. Através da sua perspectiva vamos conhecendo a míriade de gente abandonada pelo sistema, que vive nas suas frinjas, sobrevivendo de restos. «É grotesto que aceitemos e achemos normal que alguém possa morrer de fome se não aceitar caridade», afirmou Ken Loach, por alturas do lançamento do filme.

O cineasta anuncioua na sua página de Twitter que «o quartel-general do Partido Trabalhista decidiu finalmente que não sou digno de continuar a ser membro do seu partido, já que me recusei a renegar aqueles que têm vindo a ser expulsos. Tenho orgulho em encontrar-me ao lado de bons amigos e camaradas, vítimas desta purga. É, sem dúvida, uma caça às bruxas... O Starmer e a sua clique nunca dirigirão um partido do povo. Somos muitos, eles são poucos. Solidariedade!».

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Eleições no Reino Unido: duas lições e uma especulação infame

Sair da União Europeia não tem de ser necessariamente um processo de recrudescimento nacionalista com negação de direitos fundamentais.

CréditosFonte: Europarlamento

As eleições no Reino Unido passaram e o resultado foi o que se conhece: os Conservadores de Boris Johnson ganharam e o afamado e estafado Brexit poderá (?), por fim, ver a luz do dia.

Primeira lição que é preciso tirar: por mais esotéricos que nos pareçam os candidatos de alguns partidos, não é por a comunicação social mainstream os diabolizar ou ridicularizar, que eles deixam de vencer. De resto, é bastante provável que uma das causas das suas vitórias seja, justamente, aparecerem nos antípodas do mainstream – afinal de contas, convém lembrar que, na maioria dos casos, foi esse mesmo mainstream que roubou direitos e esvaziou os bolsos da maioria dos eleitores, enquanto enchia os bolsos dos grandes grupos económicos. Não obstante, é útil registar que, ao contrário do que se passava no exterior, uma parte da comunicação social do Reino Unido nunca teve pejo de procurar caluniar o Partido Trabalhista (Labour) e, em particular, o seu mais alto dirigente, Jeremy Corbyn.

Prossigamos.

Os indefectíveis acólitos do projecto da integração capitalista europeia, vulgo, União Europeia (UE), chorarão agora pelos cantos, travestidos de cândidos democratas, alguns deles até «de esquerda», estupidificando o povo do Reino Unido e cantando a miséria e a desgraça para as terras de Sua Majestade, enquanto fazem mais umas profissões de fé sobre o «inabalável» futuro da União.

Segunda lição: o povo nem sempre acerta, é verdade, mas a estratégia de acenar com os espantalhos do cavaleiro do Apocalipse, nem sempre leva a bom porto. Resultou na Irlanda, aquando da repetição do referendo do Tratado de Lisboa, que lá martelou o «Sim», mas como está bom de ver aqui, a hostilidade da cúpula da UE durante este processo só entrincheirou mais o povo britânico na posição que já tinha. Lá diz o nosso povo que «com vinagre não se apanham moscas».

Mas vamos para a frente que, seguindo os ditos populares, atrás vem gente.

Com efeito, a ironia suprema destas eleições que – contra os avisos do próprio Corbyn – muitos venderam como um novo assalto no combate pró e contra o Brexit, o programa do Labour (consultável na íntegra aqui)1 está, possivelmente, mais nos antípodas das orientações da UE, que o dos próprios Conservadores.

Na realidade, ao propor a renacionalização de um conjunto de serviços públicos, aumentos significativos nos salários, redução do horário de trabalho, aposta no transporte público, investimento público em larga escala para resolver na esfera pública problemas da habitação e da saúde, entre outras medidas verdadeiramente progressistas, a mensagem subliminar que, de algum modo, o Labour estava a enviar à cúpula ao leme da UE era: «nós não queremos sair, queremos mesmo é que nos expulsem».

É verdade que nem o Reino Unido é a Grécia (geopoliticamente falando), nem o estar ou não amarrado aos compromissos do Euro é indiferente. É igualmente verdade que a História da social-democracia já nos mostrou que espinha dorsal é coisa que não abunda para aqueles lados (veja-se como agora a oposição interna a Corbyn dentro do próprio Partido Trabalhista o vai tentar destruir). Por isso, é avisado não entrar em grandes especulações ou euforias.

Pese embora tudo isto, é realmente lamentável que o Labour tenha perdido estas eleições, muito menos pelo que venha a ser o desenvolvimento do Brexit, e muito mais pelo que teria de desafiante implementar uma política que – a cumprirem-se as promessas feitas – iria largamente contra os pergaminhos do ideário neo-liberal, algo que teria impacto muito para lá das fronteiras do Reino Unido.

Nessa medida temos que nos ficar pela especulação e não chegar ainda à terceira lição: sair da UE não tem de ser necessariamente um processo de recrudescimento nacionalista com negação de direitos fundamentais, a saída pode corresponder precisamente à constatação da incompatibilidade entre o desenvolvimento económico e social soberanos e o projecto de integração capitalista, militarista e anti-democrático, que é a UE.

Como nota final, convém registar que, em nenhum momento, o Labour disse que iria ignorar o resultado do referendo que levou ao Brexit, mas antes reformular todo o plano para conduzir a uma saída suave e, antes de a concretizar, referendá-la novamente. Dirão alguns que, se os trabalhistas tivessem ganho, provavelmente um novo referendo teria como resultado que, afinal, não havia Brexit nenhum.

Mas esta nem é a linha especulativa mais interessante, porque o que ficaremos todos sem saber é se, estando a ser implementado este programa, a UE não preferiria, afinal, apressar a saída que sempre tentou inviabilizar, até que se tornasse um exercício de humilhação. No fim de contas, se há coisa de que Bruxelas não gosta é de vozes realmente dissonantes.

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Brexit ou os enxovalhos da democracia
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O cineasta era membro do Partido Trabalhista desde os anos 60, com alguns interregnos, tendo retomado recentemente a participação activa no partido por causa da liderança de Jeremy Corbyn.

A dedicação de Corbyn, Loach e de muitos outros membros do Labour à causa Palestiniana, contra as agressões do estado Israelita, motivaram uma campanha de difamação das alas mais conservadoras do Partido, com relações próxims com Israel, acusando-os de antisemitismo. Largas dezenas de militantes do Partido Trabalhista foram suspensas ou expulsas, ao mesmo tempo que dezenas de milhar rescindiram a sua militância, em resposta à perseguição, liderada por Keir Starmer, actual líder dos Trabalhistas, a figuras ligadas ao movimento sindical e de boicote a Israel.

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Embora o sindicato vá continuar a pagar as quotas da sua afiliação ao Labour, Sharon Graham, recém-eleita secretária-geral do sindicato Unite, com mais de 1,4 milhões de afiliados, não tem dúvidas de que o resto do «dinheiro do fundo político [usado pelo sindicato para financiar campanhas eleitorais], devia estar a ser melhor utilizado».

«Westminster não é o centro de tudo, há outras formas de fazer com que as coisas aconteçam, marcar o passo» de políticas laborais e sociais, que a direcção do Labour, se quiser, deve acompanhar. O fundo político será agora realocado para grandes campanhas, nacionais, regionais e locais, que beneficiem, directamente, os trabalhadores.

Graham abdicou de participar na convenção do Partido Trabalhista Britânico em Setembro, tendo escolhido dedicar-se, a tempo inteiro, a disputas laborais. «Não sei em que mundo é que eles vivem, mas não é certamente no meu, no que eu vivo as pessoas estão assustadas. Não sabem o que lhes vai acontecer, estão zangadas, em sofrimento, e a ideia de que os políticos não conseguem começar a falar sobre o que fazer é ultrajante».

O Young Labour, juventude do partido em que participam todos os militantes entre os 14 e os 26 anos, publicou um comunicado na sexta-feira a anunciar que não voltará a fazer «campanha, organizar ou angariar votos para candidatos ou deputados que não defendam os trabalhadores, que não respeitem os piquetes de greve ou não defendam o direito à luta laboral».

«Os sindicatos são o alicerce do movimento laboral e estão na linha da frente na defesa dos direitos dos trabalhadores contra patrões corruptos e governos conservadores, que causaram sofrimento a milhões de pessoas». Toda a energia do Young Labour vai ser agora dispendida na luta pela eleição de «candidatos do Labour que, explicitamente, defendam os sindicatos, respeitem os piquetes e representem, inflexivelmente, os direitos dos trabalhadores nos respectivos cargos».

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