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Governo insiste na tese de que aumentos salariais só reduzindo impostos às empresas

Em entrevista à Antena 1 e ao Jornal de Negócios, o ministro da Economia, António Costa e Silva, defende que é preciso libertar as empresas de «constrangimentos fiscais» para se poder aumentar salários. 

CréditosAntónio Cotrim / Agência Lusa

«Não podemos exigir às empresas aquilo que elas não podem pagar», é desta forma que o ministro da Economia e do Mar sustenta a tese avançada por António Costa, no início de Junho, sobre a necessidade de reduzir os impostos que as empresas pagam de modo a aumentar o salário médio em 20% nos próximos quatro anos. 

Ao programa Conversa Capital, António Costa e Silva admite a existência, na concertação social, de «uma grande consonância de todos os parceiros na questão da valorização salarial», embora não haja eco disso. No caso do salário mínimo, os patrões têm travado aumentos que poderiam repor alguma dignidade nas condições de vida de quem o recebe. De resto, e apesar de ser uma questão fundamental para o desenvolvimento do País, a valorização dos salários está longe de ser uma prioridade para este Governo (como se viu na recente actualização de 0,9% na função pública), bem como para os do PSD e do CDS-PP, sob a batuta de Bruxelas.

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«Primeiro criar riqueza e só depois distribuí-la». Então, por que esperam?

É uma afirmação bastas vezes proferida pelas associações patronais sempre que o assunto é o aumento dos salários. «Primeiro é preciso criar riqueza», argumentam. Mas esse passo já foi dado. 

Créditos / Towards Data Science, a partir de Oxfam

BPI: 307 milhões de euros. Brisa: 183,2 milhões de euros. EDP: 657 milhões de euros (com distribuição de 750 milhões de euros aos seus accionistas). Galp: 457 milhões de euros. Repsol: 2,5 mil milhões de euros. Santander Totta: 298,2 milhões de euros. Semapa (Navigator, Secil): 198 milhões de euros. Jerónimo Martins: 324 milhões de euros (até Setembro). 

Estes são alguns dos lucros divulgados por grandes empresas relativamente a 2021. Mas se este foi um ano feliz para os seus accionistas, o mesmo não podem dizer os que contribuem e contribuíram para que se alcançassem estes resultados.

Houve despedimentos e encerramento de agências (banca), houve actualizações salariais insuficientes para a recuperação do poder de compra, mantiveram-se os horários desregulados e a precariedade. E é quando os trabalhadores exigem a melhoria da sua qualidade de vida, a qual só se consegue por via do aumento dos salários, que os patrões dizem: não pode ser, primeiro é preciso criar condições, só depois de obter riqueza é possível redistribuí-la. 

Enquanto vão tecendo o argumentário para deixar tudo na mesma (quem não se lembra do presidente da CIP classificar de «excessivo» o valor de 705 euros para o salário mínimo?), os accionistas vão amealhando e as desigualdades agravam-se, como denunciou o Movimento Erradicar a Pobreza, este domingo, em que se assinalou o Dia Internacional da Justiça Social.

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Sem uma evolução geral, Portugal transforma-se num «país de salários mínimos»

O facto de os salários médios não terem acompanhado a evolução do salário mínimo nacional nos últimos seis anos leva a que este atinja cerca de 70% da remuneração média. 

CréditosRodrigo Antunes / Agência Lusa

A remuneração média nacional aumentará 10,1% entre 2015 e 2022, ao mesmo tempo que o salário mínimo subirá 39,6%, fazendo com que Portugal se transforme «num país de salários mínimos», conclui o economista Eugénio Rosa num estudo hoje divulgado.

Entre 2015 e 2022, segundo dados do Ministério do Trabalho citados no documento, o salário médio aumentará 96 euros, para 1048 euros, enquanto o salário mínimo nacional subirá 200 euros, para 705 euros, de acordo com aquilo que foi a intenção manifestada pelo Governo do PS.

A «distorção salarial», como lhe chama o economista, está a determinar que o salário mínimo nacional (actualmente de 665 euros) represente uma proporção cada vez maior do salário médio, tendo já atingido 67,3% da remuneração média.

«Este facto está a transformar Portugal num país de salários mínimos, pois um número cada vez maior de trabalhadores recebe apenas aquele salário», afirma o economista consultor da CGTP-IN.

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Patrões contra «aumento irracional» do salário mínimo

Sem surpresas, o presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) afirma que o aumento para 705 euros proposto pelo Governo, aquém do que os trabalhadores reivindicam, deve ser revisto. 

CréditosTiago Petinga / Agência Lusa

Em entrevista à Antena 1 e ao Jornal de Negócios, António Saraiva afirmou que não faz sentido manter a meta do Governo para o salário mínimo nacional (SMN), de chegar aos 750 euros apenas em 2023. 

«Sou contra qualquer aumento irracional», declarou o representante dos patrões, insistindo no gasto argumento de que um aumento do SMN «tem que atender à inflação, ao crescimento económico e aos ganhos de produtividade, factores perfeitamente mensuráveis».

A história tem demonstrado que não existe uma correspondência directa entre os ganhos das empresas e os salários de quem cria a riqueza. Veja-se o exemplo da Jerónimo Martins, que em 2015 registou lucros de 333 milhões de euros, mas os quase 90 mil trabalhadores recebiam então um salário médio pouco acima dos 680 euros.

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Aumento do salário mínimo volta ao Parlamento esta quinta-feira

O projecto de resolução do PCP propõe aumentar o salário mínimo nacional (SMN) de 665 para 850 euros. Em Abril de 2019, mais de 1 milhão e 200 mil trabalhadores auferia o SMN.  

CréditosTiago Petinga / Agência Lusa

Desde 2015 que o salário mínimo vem conhecendo aumentos sucessivos, fruto da luta dos trabalhadores, como observa o PCP no preâmbulo do diploma que será discutido esta tarde na Assembleia da República, mas ainda assim aquém do que seria necessário para baixar a taxa de risco da pobreza e do que objectivamente seria possível, não fosse a injustiça na distribuição da riqueza. 

Cerca de 56% da riqueza total do nosso país é detida por 1% da população, sendo que a fortuna que é acumulada pelos 50 mais ricos em Portugal equivale a 12% do Produto Interno Bruto (PIB).

Apesar de ser remuneração de referência para centenas de milhares de trabalhadores, foi ao longo dos anos objecto de uma profunda desvalorização por parte de sucessivos governos. Veja-se o exemplo dos últimos quatro anos de governação do PSD e do CDS-PP, em que o SMN esteve estagnado nos 485 euros. Desde então, foram-se realizados aumentos (ver caixa), embora insuficientes e aquém do necessário para acabar com a pobreza dos trabalhadores, com os patrões a reclamar contrapartidas.

O argumento do peso das remunerações na estrutura de custos das empresas é facilmente desmentida, quando se percebe que apenas representa um peso de 18%, muito inferior a um conjunto de outros custos, designadamente com a energia, combustíveis, crédito ou seguros. «Convém, aliás, referir que este conjunto de custos estão sujeitos à estratégia de lucro máximo de um conjunto de empresas e sectores que, depois de privatizadas, passaram a penalizar fortemente a economia nacional», refere-se no diploma.

De acordo com o último Inquérito à Situação Financeira das Famílias, em 2017, cerca de 70% da riqueza total é detida pelas famílias pertencentes ao grupo das 20% com maior riqueza, enquanto as famílias do grupo dos 20% com menor riqueza dispõem tão só de 0,1%. Também o último Inquérito Anual às Condições de Vida, realizado pelo Instituto Nacional de Estatística em 2019, dava conta de que cerca de 10% da população empregada era pobre e que 40,7% dos desempregados eram pobres, apontando esse mesmo documento para que cerca de dois milhões de pessoas se encontrassem em risco de pobreza (19,8%).

Significa isto que o seu rendimento mensal não chega para satisfazer as despesas básicas familiares, com o valor do SMN a ser uma das principais causas de pobreza no nosso país.

Actualmente, o salário mínimo em Portugal, conquista da Revolução de Abril, é de 665 euros e, tal como no ano passado, em que o valor do SMN era de 635, os comunistas recomendam ao Governo um aumento para os 850 euros, medida que integra também a política reivindicativa da CGTP-IN para 2022. Em Outubro de 2020, PS, PSD, CDS-PP e IL chumbaram um projecto de resolução pelo aumento do salário mínimo nacional para 850 euros. 

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O presidente da CIP advoga que «não há condições» para aumentar o salário mínimo para os 705 euros no próximo ano, conforme proposta do Governo, apoiado na «significativa perda de receitas e de empregos» do último ano e meio. Mas nem mesmo em períodos de maior fulgor económico os patrões se mostram disponíveis para proceder ao aumento dos salários. Para tal podemos recuar a 2019, com os patrões a recusarem uma subida do salário mínimo acima dos 600 euros

Com o aumento do SMN seria possível tirar muitos trabalhadores da pobreza e dinamizar a economia, uma vez que os seus salários vão estimular o consumo, a procura e o mercado interno, servindo também para alavancar o aumento dos salários médios. Por outro lado, é também condição de reforço da Segurança Social, assegurando melhor protecção social e pensões de reforma mais altas. 

Esta sexta-feira, o Parlamento chumbou o aumento do salário mínimo para 850 euros, com o voto contra de PS, PSD, CDS-PP, CH e IL. O valor está em sintonia com a proposta reivindicativa da CGTP-IN para 2022. A UGT reivindica um aumento do SMN para 715 euros.

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Apesar da trajectória de aumentos do salário mínimo nacional, ainda assim aquém do que seria necessário para retirar os trabalhadores da pobreza, o problema para o qual alerta Eugénio Rosa recai na estagnação dos salários médios, também na Administração Pública, cujas remunerações estão praticamente congeladas desde 2009. O economista defende que esta é uma situação «dramática», sendo quase impossível a contratação de trabalhadores altamente qualificados. 

No estudo, Eugénio Rosa regista que na página do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) estão 156 ofertas de emprego para engenheiros civis, electrotécnicos, mecânicos, agrónomos, entre outros, «cujos salários oferecidos, na sua esmagadora maioria, variam entre 760 euros e 1000 euros brutos», ou seja, antes dos descontos para o IRS e para a Segurança Social.

«Como é que o País assim pode reter quadros qualificados?», questiona o economista, sublinhando que sem trabalhadores altamente qualificados o crescimento económico e o desenvolvimento nacional serão impossíveis.

Por outro lado, denuncia, «o País despende uma parte importante dos seus recursos em formar nas universidades jovens altamente qualificados que depois o abandonam e vão contribuir para o desenvolvimento de outros países, porque não encontram no seu país remunerações e condições de trabalho dignas».


Com agência Lusa

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As estatísticas confirmam uma realidade marcada pelos baixos salários. Se em 2019 a população que se encontrava em risco de pobreza era de 16,2%, em 2020 atingiu os 18,4%, isto depois da transferência de apoios sociais.

Por trás dos números estão muitas famílias com menores a cargo (quase 11% das crianças até aos 16 anos pertenciam, no ano passado, a agregados em privação material e social, segundo revelou hoje o INE), muita gente sem conseguir pagar uma casa digna para lá viver, muitos milhares de trabalhadores para quem o mês é muito maior do que o vencimento. 

Este flagelo não deve deixar ninguém indiferente e precisa de respostas firmes para que Portugal deixe de ocupar os desonrosos últimos lugares do ranking dos países europeus com os salários mais baixos.

Os dividendos distribuídos pelos accionistas das grandes empresas, nalguns casos acima dos lucros obtidos, como acontece na EDP, mostram que é possível alterar este cenário e que todos os argumentos demagógicos em torno da necessidade de aumentar a produtividade para fazer subir os rendimentos dos trabalhadores não passam disso mesmo.

Só com uma justa redistribuição da riqueza é possível criar mais e melhor emprego, e dar esperança às gerações futuras. Para que tal aconteça basta tomar essa opção e uma política que defenda quem trabalha.  

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Por outro lado, também a forma de chegar aos aumentos salariais conhece diferentes entendimentos. Se, num acto de quem tem a faca e o queijo na mão, as empresas continuam a apelar à redução dos impostos, deixando assim o País mais depauperado, do lado das centrais sindicais, particularmente da CGTP-IN, a exigência é que haja uma melhor distribuição da riqueza. Os reflexos de menos impostos e do aumento da produtividade, que é uma realidade em Portugal, só se observam no aumento dos lucros dos grandes grupos económicos, que, ao contrário das pequenas e médias empresas, são quem mais beneficia das ajudas estatais

Diz António Costa e Silva que é preciso libertar as empresas de «alguns constrangimentos fiscais» para que possam dedicar-se à valorização do trabalho. Afirmação com que os trabalhadores da EDP, que este ano distribuiu dividendos superiores a 750 milhões de euros, da Galp (457 milhões de euros de lucro) ou da Jerónimo Martins certamente não estarão de acordo. 

Em 2021, 19 grandes grupos económicos acumularam lucros líquidos de mais de 5,1 mil milhões de euros, qualquer coisa como 14 milhões de euros por dia. Um ano antes foram transferidos para paraísos fiscais perto de 7 mil milhões de euros.

Os números evidenciam a elevada concentração de riqueza e o que os trabalhadores e o País estão a perder com o beneplácito do Governo, que alimenta a viciada campanha de o aumento dos salários ameaçar a competitividade das empresas ao oferecer-lhes mais benefícios fiscais, negligenciando que os salários regressam sob a forma de consumo. «Reduções selectivas do IRC e tudo o que [se possa] fazer do ponto de vista fiscal» é a receita do ministro da Economia, para, alegadamente, alcançar «salários mais competitivos» e um «equilíbrio entre trabalho e capital».

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