Nunca é demais falar da precariedade

A precariedade reforça a posição dos patrões, que vêem assim transferido para si todo ou quase todo o poder na relação trabalho. O trabalhador vê-se numa situação mais frágil de busca da sua sobrevivência e estabilidade e acaba por se submeter a este tipo de contratação, «porque o desemprego está ali à porta».

A luta contra a precariedade tem sido uma das principais bandeiras de luta da CGTP-IN
Créditos / O Castendo

Os últimos dias foram marcados pelos resultados apresentados pelo Governo no relatório sobre a contratação de natureza temporária no Estado. O dito relatório indica que mais de 100 mil trabalhadores estão a trabalhar com este tipo de vinculação. O Governo, nomeadamente na voz do ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Vieira da Silva, faz questão de alertar para o facto de estes resultados informarem apenas sobre os contratos de caráter temporário, e não apurarem se são justificados. Afirma ainda que o número é exagerado se estivermos a falar de vínculos precários. No entanto, a realidade que conhecemos à nossa volta faz-nos «pressentir» que o número de trabalhadores que têm estes vínculos enquanto concretizam trabalho permanente deverá ser uma grande percentagem deste total.

Estamos a falar de contratos a termo resolutivo (contratos a prazo), dos estágios remunerados, das bolsas de investigação, dos recibos verdes, dos Contratos Emprego-Inserção. Podemos ainda acrescentar a subcontratação a empresas de trabalho temporário.

A precariedade nos últimos anos generalizou-se de uma forma abismal. Este relatório mostra-nos que o Estado, que deveria dar o exemplo, é um dos problemas. O exemplo é seguido pelos privados, apesar de a lei ainda contrariar o vínculo precário em situações em que é realizado trabalho permanente.

Na verdade, e apesar da «lei dos contratos a prazo» do governo de Mário Soares e das insuficiências do Código do Trabalho, este ainda afirma que este tipo de contratos só podem ser usados em situações específicas (Art.º 140.º n.º 1 – «O contrato de trabalho a termo resolutivo só pode ser celebrado para satisfação de necessidade temporária da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade»). Os patrões espezinham o que consta no Código do Trabalho e ainda mais o que está no artigo 53.º da Constituição da República Portuguesa, que consagra o princípio da segurança no emprego e a proibição do despedimento sem justa causa, como um direito fundamental estruturante das relações de trabalho no nosso país.

A precariedade reforça a posição dos patrões que vêem assim transferido para si todo ou quase todo o poder na relação trabalho. O trabalhador vê-se numa situação mais frágil de busca da sua sobrevivência e estabilidade e acaba por se submeter a este tipo de contratação, «porque o desemprego está ali à porta». Acaba por assim viver numa situação instável e pouco autónoma. O vínculo precário traz a instabilidade da vida.

O Estado não dar o exemplo é ajudar a perpetuar esta situação. Da Educação à Saúde, passando pelas mais diversas áreas da administração central e local, verificamos esta situação. Há funcionários que trabalham há mais de 10 anos com contratos precários e exercem funções no mesmo local, com horário definido, com uma relação hierárquica.

Há que agir. E o Estado deve dar o primeiro passo. Espera-se que seja até fim de Outubro... vamos ver a firmeza da acção. Estamos também a conhecer posicionamentos e dúvidas interpostas: seja, por exemplo, do CDS-PP, que vem questionar a quebra das regras europeias ao estar a vincular mais trabalhadores, ou da UGT, que alerta muito aflita para os custos que pode ter esta vinculação.

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