Notas sobre a evolução recente da nossa economia

Ao contrário do que a direita e os seus ideólogos defendiam e defendem, era possível pôr a economia a crescer a um ritmo muito aceitável com a reposição de direitos e rendimentos, incentivando a procura interna.

CréditosMiguel A. Lopes / Agência Lusa

O afastamento da direita do poder, no seguimento das eleições de 4 de Outubro, e a construção de uma solução governativa em que o PS, em minoria, tem governado de forma estável ao longo dos últimos 20 meses, com base numa posição política conjunta com os partidos à sua esquerda, permitiu que a nossa economia, após um primeiro ano de 2016 em que foram já visíveis no segundo semestre do ano nítidas melhorias resultantes do início da reposição de direitos e rendimentos para muitos trabalhadores, registasse finalmente nos dois primeiros trimestres de 2017, um ritmo muito aceitável de crescimento de 2,8%, como não se verificava desde o início deste século.

Provou-se ao longo deste período que ao contrário do que a direita e os seus ideólogos defendiam e defendem, era possível pôr a economia a crescer a um ritmo muito aceitável com a reposição de direitos e rendimentos, incentivando a procura interna, sem por isso pôr em causa a aposta nas exportações e não agravando os nossos défices estruturais.

Provou-se finalmente que era possível fazer-se tudo isto reduzindo o desemprego (menos 145 400 desempregados entre o primeiro semestre de 2016 e o primeiro semestre de 2017) não através do recurso à emigração mas através da criação de novos empregos (mais 151 mil empregos neste período).

Foi possível ao longo destes últimos 20 meses travar um longo período de ataques a direitos e conquistas dos trabalhadores, ataques este que atingiram com o último governo PSD/CDS e com a intervenção da troika níveis nunca antes vistos.

Valorizando muito positivamente a evolução económica e social verificada com o afastamento da direita do poder é importante não esquecer as muitas limitações que o crescimento económico recente não esconde:

Em primeiro lugar e como os dados recentemente divulgados pelo INE referentes ao inquérito ao emprego do segundo trimestre mostram, se é verdade que desde o 1º semestre do ano passado foram criados 151 mil empregos (mais 3,3%), também é verdade que grande parte desta criação de emprego se concentra no sector dos serviços, em particular no turismo e imobiliário e no sector da construção, mantendo-se praticamente inalterável o emprego nos sectores produtivos (agricultura e industria), como é verdade que grande parte deste emprego criado é precário e com baixos salários (cerca de 30% dos trabalhadores por conta de outrem auferem hoje salários líquidos mensais inferiores a 600 euros).

«São cada vez mais claros os sinais de que a política económica tem que intervir activamente no reforço da capacidade do nosso aparelho produtivo (...)»

Estes mesmos dados divulgados pelo INE mostram que o desemprego que tem vindo a registar uma quebra considerável, atinge ainda em termos reais perto de um milhão de portugueses, considerando para além dos trabalhadores desempregados em sentido restrito, todos aqueles que estando disponíveis para trabalhar a tempo inteiro só conseguem empregos a tempo parcial ou desistiram de procurar emprego.

Em segundo lugar, os resultados económicos mais recentes mostram no primeiro semestre do corrente ano um ritmo de crescimento das importações superior ao das exportações como resultado da aceleração do consumo, do investimento e das exportações e da incapacidade do nosso aparelho produtivo de responder às suas necessidades de produção.

A destruição do nosso aparelho produtivo a que conduziram as políticas de direita, prosseguidas pelos sucessivos governos nas últimas décadas, faz com que uma aceleração do ritmo de crescimento da nossa economia provoque de imediato um agravamento do saldo da nossa balança de mercadorias, se não forem implementadas medidas de política económica que contrariem o livro funcionamento do mercado, como defende o pensamento neoliberal.

Dados divulgados na semana passada semana também pelo INE, referentes à balança de mercadorias no primeiro semestre do ano, mostram isso mesmo, um agravamento no saldo desta balança a preços correntes de 26,3%. Enquanto no primeiro semestre de 2016 o saldo a preços correntes da nossa balança de mercadorias era deficitário em 5 027 milhões de euros, no mesmo período do corrente ano esse défice subiu para 6 349 milhões de euros (um agravamento de 1 321 milhões de euros). Os bons resultados da nossa balança de serviços e em especial da balança de turismo têm permitido nos últimos anos cobrir parte deste défice crónico, mas há limites para tudo.

São cada vez mais claros os sinais de que a política económica tem que intervir activamente no reforço da capacidade do nosso aparelho produtivo, na implementação de medidas de incentivos à substituição de importações por produção nacional e na aposta na promoção de exportações com elevado valor acrescentado nacional.

Deixar nas mãos dos mercados a resolução destes cada vez maiores desequilíbrios externos da nossa economia, como defende a política de direita e como defende o pensamento neoliberal, teve os resultados recentes que conhecemos no nosso país: um longo período recessivo com destruição de centenas de milhares de empregos, mais de milhão e meio de desempregados, perto de 600 mil portugueses forçados a emigrar e cortes nos direitos, nos salários e nas pensões de milhões de portugueses. Esta não foi, nem será no futuro a solução que os trabalhadores e o povo português desejam para os problemas económicos do nosso país.

Agora que a nossa economia cresce a bom ritmo é a altura ideal de o governo intervir activamente na defesa da nossa produção nacional, das nossas empresas e dos nossos trabalhadores, tal como outros fazem por essa Europa fora e por esse Mundo.

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