O «Benefício» é a pedra-angular desta região demarcada do Douro

Da parte das grandes empresas comerciais/exportadoras, trata-se de atingirem, completamente, aquele objectivo de controlar todo o processo do Vinho do Porto «da cepa ao cálice»… e, acrescentamos nós, até dentro da «goela» dos consumidores concretos…

O vinho do Porto é produzido nas margens do rio Douro
CréditosFeliciano Guimarães

Quando o leitor estiver a preparar-se para saborear um cálice de Vinho do Porto ou mesmo de um Vinho de Mesa do Douro – «DOC» (Denominação de Origem Controlada) –, comece a pensar nas estórias mais reais que estão condensadas, por assim dizer, dentro de cada garrafa que tem à sua frente… Sim, tente imaginar a imensa trabalheira que esses Vinhos deram por lá, por aqueles socalcos tão (de)cantados, até chegarem, ali, à sua frente, disponíveis para a sua «sede» de coisas boas.

É uma imensa trabalheira, afinal descendente de outras e ainda mais imensas – e seculares – trabalheiras. Para quem conhece essas estórias, o Douro é uma região vitivinícola em que o Vinho «sabe» – muito – a sangue, a suor e a lágrimas de gerações de seres humanos! Aliás, acreditem que, hoje, esse trabalho e essas vidas – que fazem o Douro todos os dias – continuam a sobreviver à base do sacrifício e, acreditem também, isso não tem que ser assim! Na verdade, para os Durienses, e para os Vitivinicultores em especial, a Região Demarcada do Douro (RDD) – escultural; bela; forte; saborosa – afinal, não é (só) aquilo que parece… aos olhos de quem a visita ou de quem lhe saboreia os Vinhos, assim, estilo turista…

Neste complexo sistema que é esta RDD, sistema forjado em conjunto pela natureza e por homens e mulheres, consideramos o chamado «Benefício», a pedra-angular da estrutura sócio-económica de toda esta prodigiosa Região e suas heróicas Gentes.

O «Benefício» é um direito/autorização para produzir Vinho Generoso/Porto com controlo. É uma espécie de «quota» geral (anual) de transformação de Mostos de Uvas do Douro em Vinho «Generoso» (ou Vinho Fino), basicamente através da adição (benefício) de Aguardente Vínica aos mostos normais ainda em fermentação. Enfim, a bitola é a adição de entre 100 a 120 litros de Aguardente em cada Pipa, que vai dar os tais 550 litros de Vinho Generoso.

Desse quantitativo anual de Vinho com «Benefício» se estabelecem, a seguir, as «quotas» de Produção (autorizada) de cada Lavrador e de cada Empresa Durienses. É um laborioso e complicado processo com definição e controlo, hoje a cargo do chamado «Interprofissional do IVDP – Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto» e deste Instituto (público) como tal.

Processo que tem várias componentes interligadas e interactivas, como a das expectativas que haja para cada «Campanha» (colheita anual das Uvas) e para o escoamento do Vinho Generoso/Porto mais ou menos nesse mesmo período de tempo.

Saliente-se que a RDD tem uma área total na ordem dos 45 mil hectares de Vinha e, dessa área, apenas uns 25 mil hectares têm Vinhas, com direito a «Benefício», agrupadas por seis categorias, por «letras» sequenciais – A, B, C, D, E, F («medidas» de baixo para cima do terreno, a partir do nível das águas do Douro) –, sendo a Vinha classificada em letra «A» (mais ao nível das águas do Douro), a Vinha melhor para o «Generoso», logo a «letra» que tem mais quota, específica, de «Benefício».

Lá está um aspecto (e apenas um dos aspectos…) da complexidade deste «engenhoso» e interdependente processo que é esta RDD…

«O eventual fim do "Benefício" também seria o fim, incontornável, da grande maioria dos mais de 25 mil pequenos e médios Viticultores Durienses!»

Ainda assim, repete-se, consideramos o «Benefício» como a pedra-angular desta RDD. Atente-se que uma Pipa de Vinho «Generoso» (consideremo-lo Vinho quase Porto) pode ser comprada à Produção a cerca de 1000 euros cada (no Douro, uma Pipa são 550 litros) e uma Pipa de Vinho de Mesa anda a ser comprada entre 100 a 150 Euros cada uma, o que são Preços baixos (nesta Campanha de 2015/2016, há a expectativa de as Uvas e de os Vinhos atingirem melhores Preços à Produção).

É certo que o Vinho Generoso tem que levar muita Aguardente (a grosso modo, ¼ de Litro de Vinho do Porto é Aguardente adicionada) e esta anda cara para o Produtor de Generoso… mas, ainda assim, a diferença de preços compensa: de 800 a 1000 Euros a Pipa de Generoso para de 100 a 150 Euros a Pipa de Vinho de Mesa…

O eventual fim do «Benefício» também seria o fim, incontornável, da grande maioria dos mais de 25 mil pequenos e médios Viticultores Durienses!

Nota: quem quiser aprofundar conhecimentos sobre este processo da fixação do «Benefício» no Douro, poderá fazê-lo na Net e, a seguir, «pedir explicações» complementares porque o assunto é mesmo complexo…

Não é certamente por acaso que os maiores produtores de «Generoso» – que hoje são quase todos eles grandes comerciantes/exportadores de Porto e de Vinhos «DOC», Douro – já assumem, publicamente, que deve acabar o direito a produzir o Vinho com «Benefício» ou seja, acabar com as «quotas» anuais...

Para eles, as respectivas «marcas» das suas (grandes) empresas e o dito «mercado» (que eles determinam…) é que devem passar a reinar ainda mais do que já reinam…

Da parte dessas grandes empresas comerciais/exportadoras – que eram e ainda são conhecidas como as «Casas Exportadoras de Gaia», embora algumas delas já estejam a «migrar» para dentro da RDD – trata-se de atingirem, completamente, aquele objectivo de controlar todo o processo do Vinho do Porto «da cepa ao cálice»… e, acrescentamos nós, até dentro da «goela» dos consumidores concretos… Acontece que, como já se disse, quase todas elas também já são grandes, grandes produtoras…

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