De Francisco Assis já nada espanta! Mas atendamos, quase a arriscar o masoquismo, às apreciações ao discurso de Juncker esta quarta-feira sobre «O estado da União», dadas à estampa no Público de ontem.
Consideração geral, sem comentários, «O presidente da Comissão Europeia sabe do que fala, já que constata todos os dias as dilacerantes divisões que atravessam a União Europeia, a tormenta dos discursos nacionalistas a roçar a xenofobia e a pusilanimidade de grande parte dos governantes nacionais, exageradamente dispostos a capitular diante da verborreia que caracteriza os sectores antiliberais e antidemocráticos da esquerda e da direita.»
Mas ocorre-me que à «xenofobia» se pode contrapor a russofobia, à pusilanimidade a criminosa agressividade e à «verborreia» a diarreia mental. E que quererá Assis dizer com essa dos «obscenos ataques» a Juncker?
Assis gostou em particular do desejo de Juncker criar uma estrutura militar da União Europeia (UE) articulada com a NATO porque…há «uma nova realidade política que circunda o espaço europeu», porque os EUA já estão a reduzir os gastos no seu «espaço de influência europeu» e a UE precisa de «investir mais na defesa dos seus cidadãos». Mas a Europa tem que ter um «exército» para se confrontar com outros continentes ou países?
«É muito rasteiro chamar aos que defendem a paz no espaço europeu "arautos de um pessimismo primário e criminoso" e "as belas almas puras do costume".
Com o circundar do espaço europeu refere-se certamente ao cerco militar e nuclear à Rússia, à atracção desenvergonhada de países fronteiros desta para integrarem a UE e a NATO. Não referiu, porém, como é que Portugal e esses países de fronteira comum, ficariam livres da resposta adequada que a Rússia teria em caso de ataque dos EUA pelos interpostos países referidos… Assis é um atlantista aventureiro e mede pouco as responsabilidades de ser eurodeputado de Portugal, e não da Europa ou dos Estados Unidos.
É muito rasteiro chamar aos que defendem a paz no espaço europeu «arautos de um pessimismo primário e criminoso» e «as belas almas puras do costume».
Assis defendeu as negociações para o TTIP, para a UE não perder a «capacidade de influenciar» diversos aspectos «susceptíveis de assegurar uma correcta regulação da globalização em curso». Passando en vol d’oiseau pelas cedências que seriam feitas, que estrutura de controlo e fiscalização e que capacidade restaria à soberania portuguesa, incluindo a judicial, para intervir em zonas de conflitos de interesses?
Sobre o messianismo do presidente da Comissão Europeia lembrou que ele «é um velho militante da democracia-cristã europeia; um típico representante desse centro hoje em dia tão execrado pelos extremismos de toda a espécie», e expressão da «democracia liberal e a economia social de mercado», que – não disse – de vitória em vitória nos conduziram ao estado em que estamos. Mas então quem é responsável pela crise?
Para terminar, diria eu que, certamente não por acaso, palavras como povo, trabalhadores, Portugal, entre outras, estão ausentes das considerações de Assis.
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