|interior

Nenhuma casa se constrói pelo telhado

Mais do que o atraso na implementação, o facto de o programa com vista a descongestionar as áreas metropolitanas ter ficado vazio deve explicar-se por não existirem condições atractivas no Interior.

Créditos / PME Magazine

Achar que era por apresentar uma solução de rendas acessíveis (programa «Chave na Mão») que as pessoas iam a correr para um dos 165 concelhos de «baixa densidade» revela bem a falta de visão de quem tem a responsabilidade de romper com o caminho seguido até aqui.

Sendo certo que muitas famílias não têm condições de pagar uma renda que evite várias horas de deslocações pendulares, também é verdade que, encontrando a casa ideal longe dos grandes centros urbanos, pouco ou nada mais alcançam.

Desde há várias décadas que os serviços públicos deixaram de pontuar muitos territórios do interior do País. Foram maternidades e outros serviços de saúde, serviços de finanças e do Ministério da Agricultura, agências da CGD, estações dos CTT, esquadras da PSP, escolas e tribunais (alguns repostos nos últimos anos), a que se juntou o forte desinvestimento na ferrovia.

|

«Democratização» das CCDR: novo truque para adiar a regionalização

O diploma que altera a orgânica das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), mantendo-as sob tutela da Administração Central, será alvo de apreciação parlamentar esta terça-feira.

Créditos / Instituto Superior Técnico

«Modernização», «eficiência», «democratização», «alargamento dos poderes locais» e «administração desconcentrada do Estado» são algumas das expressões adoptadas no decreto-lei que será discutido esta tarde na Assembleia da República.

Analisada a substância do diploma rapidamente se percebe que o Governo apostou tudo na semântica para criar a ilusão de «uma melhor administração ao nível regional» e afastar o preceito constitucional da regionalização, que, tal como confirma a realidade dos países com regiões administrativas instituídas, é a chave para a coesão territorial, bem como para um melhor aproveitamento das potencialidades regionais.

Resultados, esses, que a projectada integração nas CCDR «dos serviços desconcentrados de natureza territorial, designadamente nas áreas da educação, saúde, cultura, entre outras», está longe de alcançar.

O decreto-lei publicado em Diário da República a 17 de Junho prevê a abertura de um processo eleitoral para a constituição de cada CCDR, com a participação de eleitos locais, já no próximo mês de Setembro (um ano antes das eleições autárquicas). 

O presidente será eleito pelo conjunto de todos os eleitos municipais, incluindo os presidentes de junta, já não na sede de cada CCDR, mas antes nas instalações de cada Assembleia Municipal, de acordo com a Declaração de Rectificação, publicada em 26 de Junho.  

Um dos vice-presidentes será designado pelos presidentes das câmaras municipais e o outro pelo Governo. Mas se dúvidas houvesse quanto ao facto de as CCDR se manterem estruturas desconcentradas da Administração Central, o diploma satisfá-las. 

Embora votado por um colégio de eleitos autárquicos, o presidente da CCDR continua a responder perante o Governo e a poder ser (tal como os vice-presidentes) destituído por este. Entre os motivos enunciados para o afastamento surge «o incumprimento dos objectivos definidos no plano de actividades aprovado ou desvio substancial entre o orçamento e a sua execução».

PSD, BE e PCP foram os partidos a pedir a apreciação parlamentar do diploma. Na redacção da iniciativa, os social-democratas parecem desconcertados com o facto de a tutela destes órgãos continuar, «na prática, e contraditoriamente, nas mãos do Governo na sua essência, que mantém os poderes de direcção, supervisão e disciplinar sobre estes órgãos, entidade única que pode dimanar orientações e destituir os responsáveis destes órgãos descentralizados do Estado». 

Omitindo que, depois da revisão constitucional acordada em 1997 entre PSD e PS, com o apoio do CDS-PP, o acordo firmado entre Rui Rio e António Costa, em 2018, com vista à transferência de encargos para as autarquias locais, onde se insere este processo de «democratização» das CCDR, constituiu novo bloqueio à regionalização e a uma efectiva descentralização de competências.

Tipo de Artigo: 
Notícia
Imagem Principal: 
Mostrar / Esconder Lead: 
Mostrar
Mostrar / Esconder Imagem: 
Mostrar
Mostrar / Esconder Vídeo: 
Esconder
Mostrar / Esconder Estado do Artigo: 
Mostrar
Mostrar/ Esconder Autor: 
Esconder
Mostrar / Esconder Data de Publicação: 
Esconder
Mostrar / Esconder Data de Actualização: 
Esconder
Estilo de Artigo: 
Normal

Tópico

Contribui para uma boa ideia

Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.

O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.

Contribui aqui

Projectado através dos seus destinos turísticos, particularmente em 2020, ano em que quase todos foram obrigados a fazer férias «cá dentro», o interior do País é bom para descansar. Encontrar trabalho é difícil, ou não fosse o abandono do aparelho produtivo, designadamente da agricultura. Por outro lado, a desigualdade de rendimentos comparativamente com o Litoral também não é um aliciante. 

A tranquilidade que se vive no Interior faz eco no desinvestimento de décadas, que deixou as pessoas cada vez mais afastadas e isoladas, havendo hoje quem não consiga sequer fazer uma chamada sem recorrer ao roaming. Enquanto o País vibra com a proximidade do 5G, há concelhos como Vinhais, no distrito de Bragança, onde, segundo dados da Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom), mais de 50% dos cerca de 8 mil habitantes não têm acesso à internet e as comunicações por telemóvel nem sempre funcionam.

A vontade de povoar zonas mais desertificadas devia pressupor a assunção de políticas que verdadeiramente concorram para retirar Portugal da lista de países da Europa (são apenas oito) com menores índices de coesão, que é como quem diz, dos que não têm regiões administrativas ou outros níveis intermédios de organização do Estado. 

Querer resolver o problema das assimetrias regionais com o simples envio de pessoas para o Interior, deixando tudo como está, é começar a casa pelo telhado.  

Tópico

Contribui para uma boa ideia

Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.

O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.

Contribui aqui