No dia 5 de Abril de 2011, em conferência de imprensa convocada para o efeito, o Secretário-Geral do PCP, Jerónimo de Sousa propunha que o Estado português iniciasse de imediato a renegociação da nossa dívida pública, com a reavaliação dos prazos, juros e dos montantes a pagar, no sentido de aliviar o Estado do peso e do esforço do serviço da dívida que então suportava, canalizando recursos para a promoção do investimento produtivo, a criação de emprego e outras necessidades do país.
Quase que caiu o Carmo e a Trindade com esta proposta do PCP, com o PS, PSD e CDS, a considerarem-na irresponsável e irrealista e a dizerem mesmo que ela conduziria ao afundamento da nossa economia e ao empobrecimento do país.
Nessa altura o valor da nossa dívida pública atingia os 160 mil milhões de euros (94% do PIB) e custava ao país cerca de 5 mil milhões de euros anuais, hoje, passados seis anos, entre os quais três anos de intervenção da Troika (CEE/BCE/FMI) coincidentes com os quatro anos e meio de governo de direita PSD/CDS, a dívida pública atinge os 243,5 mil milhões de euros (130,4% do PIB) e custa ao país anualmente cerca de 8 mil milhões de euros de juros.
Não é de mais reafirmarmos que este valor equivale ao Orçamento do Ministério da Saúde e representou quase o triplo do investimento público em 2016.
Àqueles que afirmavam que a renegociação da dívida afundaria a nossa economia e levaria o país ao empobrecimento podemos dizer que o pacto de agressão que nos impuseram, esse sim, fez o país entrar numa profunda recessão em que ainda se encontra – o PIB caiu 3,1% nos últimos seis anos, o investimento caiu 25,3%, foram destruídos 373 mil postos de trabalho, mais de meio milhão de portugueses foram forçados a emigrar e mais cerca de 200 mil portugueses caíram nas malhas da pobreza.
Esses que invocaram o caos se a renegociação da dívida avançasse desempenharam um papel inestimável na salvação dos grandes bancos europeus e mundiais, dos seus accionistas e credores, responsáveis pela crise financeira mundial de 2007/2008, sacrificando em contrapartida as condições de vida do povo português, através de um pacto de agressão que impôs um nível de destruição de direitos laborais e sociais, nunca antes visto desde o 25 de Abril de 1974.
Vale a pena lembrar, e citando Philippe Legrain, conselheiro económico do Presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, que no fim do primeiro trimestre de 2010, os bancos franceses tinham uma exposição de 780,4 mil milhões de euros relativamente à Grécia, Irlanda, Itália, Portugal e Espanha; os bancos alemães de 557,8 mil milhões, os bancos espanhóis de 134,5 mil milhões, primariamente a Portugal; os bancos italianos de 66,3 mil milhões e outros bancos da zona Euro de 396,2 mil milhões, os bancos fora da zona Euro tinham igualmente grandes exposições ao nível de 387,4 mil milhões no caso dos bancos britânicos, predominantemente na Irlanda, e de 493,8 mil milhões no caso dos bancos americanos.
«Percebe-se muito bem porque razão tão facilmente, altas figuras do Banco de Portugal e dos Governos PS, PSD e CDS transitam para instituições internacionais de relevo (...)»
A estratégia oficial seguida visou fundamentalmente salvar os bancos, recapitalizando-os e transferindo as suas exposições de risco em última análise, à custa das finanças públicas e dos trabalhadores e do povo. Assim, em Março de 2013, a exposição dos bancos alemães face a bancos espanhóis, irlandeses, portugueses e gregos estava reduzida a 48,3 mil milhões de euros a partir de 127,6 mil milhões três anos antes; a dos bancos franceses estava em 31,5 mil milhões a partir de 75,7 mil milhões, a de bancos britânicos de 32,2 mil milhões a partir de 58,4 mil milhões; a de bancos americanos de 23 mil milhões a partir de 43,3 mil milhões.
Percebe-se muito bem porque razão tão facilmente, altas figuras do Banco de Portugal e dos Governos PS, PSD e CDS transitam para instituições internacionais de relevo, quer falemos do BCE, FMI, OCDE, BM, CE, do fundo abutre Arrow Global ou da Goldman Sachs, o maior fundo de investimentos mundial.
A opção pelo recurso ao Programa de Assistência Económica e Financeira no valor de 78 mil milhões de euros, entre Junho de 2011 e Junho de 2014, em vez de se avançar para o processo de renegociação da dívida acompanhado pela diversificação das suas fontes de financiamento, serviu tão só para permitir que muita da nossa dívida pública nas mãos da Banca e de outros investidores internacionais pudesse ser substituída pela dívida agora nas mãos dos chamados investidores institucionais, como são o BCE, UE e FMI, e nas mãos da Banca Nacional.
Basta para tanto verificar que em 2010 o sector financeiro internacional detinha 63,2% da nossa dívida pública, cerca de 109 mil milhões de euros, enquanto em 2016 detém apenas 27,6% dessa mesma dívida, enquanto a Troika detém agora 29,4%.
Desta forma, a renegociação da dívida pública, que, passados seis anos, muitos que antes a criticavam agora acham-na indispensável, ter-se-á que fazer num quadro bem mais complexo, não apenas pela sua enorme dimensão, mas também porque cerca de um terço está nas mãos da Troika e 10% nas mãos de particulares.
Adiar a renegociação da nossa dívida pública nos seus prazos, juros e montantes é impedir o país de ter recursos financeiros indispensáveis ao seu crescimento económico sustentável e constitui um crime contra a nossa soberania de que as futuras gerações nos julgarão.
É nosso dever denunciar os seus responsáveis, os sucessivos governos de direita PSD/CDS e os Governos PS, que prosseguiram ao longo dos anos políticas de direita e que hoje não tem a coragem de enfrentar os grandes interesses financeiros europeus, que o BCE e o Eurogrupo bem corporizam.
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