Oito meses após a tomada de posse do novo governo e o afastamento da direita (PSD/CDS-PP) do poder, podemos afirmar que um ciclo de cortes salariais, aumento de impostos e perda de direitos dos trabalhadores e do povo foi interrompido, e iniciado um período de reposição de salários, pensões e direitos, mas muito há ainda para recuperar e conquistar.
Conhecida a execução orçamental do primeiro semestre do ano, provou-se que foi possível iniciar a reposição de salários na administração pública, travar os cortes nas prestações sociais (complemento solidário para idosos, rendimento social de inserção, abono de família e reformas e pensões), sem para tal agravar o défice orçamental e antes pelo contrário reduzi-lo em cerca de mil milhões de euros comparativamente com o mesmo período do ano anterior.
É certo que muito há ainda por fazer e que o investimento público tem obrigatoriamente que começar a crescer e a muito bom ritmo, ao mesmo tempo que a despesa com os juros da dívida pública não pode continuar a absorver o equivalente a 4,7% do nosso PIB (situação mais gravosa ao nível da União Europeia). O nosso país não pode adiar por muito mais tempo a renegociação da sua dívida pública por forma a libertar recursos financeiros para investir, para poder crescer e desenvolver-se.
É certo que após um primeiro trimestre em que a nossa economia cresceu a um ritmo de apenas 0,9% em termos homólogos, prolongando um tendência de desaceleração que se iniciou no início do segundo semestre de 2015, os vários indicadores disponíveis apontam para uma ligeira melhoria no segundo trimestre do ano, muito insuficiente ainda para as necessidades do país e como tal pouco gerador de novos empregos.
Os perigos que o País enfrenta são muitos e as incertezas imensas em termos políticos, económicos e sociais.
É necessária a implementação sem tibiezas de uma política de rendimentos que reponha, aos trabalhadores, pensionistas e reformados, o poder de compra perdido e que assegure aumentos reais de salários e pensões, não se contentando em interromper a sua quebra nominal.
É necessária uma política fiscal que combata a fraude e evasão fiscal, que proteja os rendimentos do trabalho, em particular do trabalho por conta de outrem, e os pensionistas, e que tribute mais os rendimentos do capital, o património mobiliário e as transacções financeiras.
« a despesa com os juros da dívida pública não pode continuar a absorver o equivalente a 4,7% do nosso PIB (situação mais gravosa ao nível da União Europeia)»
Ao contrário do que alguns afirmam, a carga fiscal no nosso país não é excessiva, ela está é muito mal distribuída. Pagam muito os que pouco podem e pagam pouco os que muito deviam.
É necessário uma política financeira que apoiada num sector bancário predominantemente público assegure uma política de crédito, captação de poupanças e financiamento da nossa economia capaz de promover uma política soberana de desenvolvimento económico e social do país.
Depois de três meses consumidos na discussão das diferentes versões impostas pela Comissão Europeia do Orçamento do Estado para 2016, de dois meses a discutir o Plano de Estabilidade para o período de 2015 a 2019, o país, que passou os últimos dois meses sujeito à ameaça de sanções por parte da União Europeia, por causa do défice orçamental atingido em 2015 pelo governo anterior PSD/CDS-PP, viu essa pressão e chantagem alargada para o período de elaboração do Orçamento do Estado para 2017.
É caso para dizer que a Comissão Europeia digeriu muito mal, se é que já digeriu, a derrota da direita nas eleições de 4 de Outubro no nosso país, tudo servindo de argumento para questionar a solução governativa encontrada e a política económica que tem vindo a ser prosseguida, nomeadamente o aumento do salário mínimo nacional, a reposição salarial na administração pública ao longo de 2016, a extinção gradual da sobretaxa de IRS, a redução do IVA na restauração e o descongelamento das pensões de reforma mais baixas.
A forma complacente como a Comissão Europeia se tem comportado com a França ou com a vizinha Espanha, que no mesmo período de oito meses foi a eleições legislativas duas vezes e em que a direita, não tendo conseguido em nenhum dos casos maioria absoluta, se mantém no governo, governa com o orçamento de 2015 e apresenta défices orçamentais bem superiores aos do nosso país, é bem elucidativa dos interesses políticos fundamentais que norteiam a União Europeia: o prosseguimento e aprofundamento das políticas neoliberais que os governos de direita, como o PP em Espanha, asseguram.
Para a União Europeia não importa que a França esteja acima do limite do défice (por mais arbitrário e inaceitável que ele seja) e que assuma não o cumprir a pretexto «do combate ao terrorismo», que a Espanha continue a ser governada por um governo de gestão, que o défice orçamental continue elevado, que o orçamento seja o do ano anterior, que a dívida pública não pare de subir, desde que as políticas neoliberais permanecem inalteradas e seja a direita a governar.
Já Portugal, que se tem atrevido nos últimos meses, mais ou menos timidamente, a pôr em causa essas políticas, vai continuar certamente a ter que enfrentar as hostilidades da Comissão Europeia. Preparemo-nos!
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