Pagamos a conta, fiquemos com o Banco

Hoje torna-se claro que a proposta do PCP, desde o início do processo, seria a que mais eficazmente poderia proteger os depositantes e os recursos do Estado.

O terceiro maior banco nacional é propriedade do Fundo de Resolução, uma entidade pública sob controlo do Banco de Portugal
Créditos

Estávamos em Maio de 2015 quando surge a primeira proposta legislativa de manutenção do Novo Banco na esfera pública. Lia-se assim: «A Assembleia da República resolve recomendar ao Governo que cancele a privatização do Grupo Novo Banco e dos seus activos, compensando o fundo de resolução com o resultado de potenciais encaixes pela imobilização de activos do antigo Grupo Espírito Santo e Grupo Banco Espírito Santo, reorientando a direcção do Novo Banco para o fortalecimento da instituição e para a manutenção do seu controlo público, subordinando esse controlo ao interesse nacional e a uma política de crédito ao serviço do crescimento económico, do povo e do país, assegurando que o Estado não assume qualquer encargo com o processo resultante da aplicação da medida de resolução.»1

Mais tarde, já na presente legislatura, em Fevereiro de 2016, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o Projecto de Resolução que «Determina a manutenção do Novo Banco na esfera pública, assegurando a sua propriedade e gestão públicas ao serviço dos interesses do povo e do país», onde se pode ler: «A Assembleia da República resolve recomendar ao Governo que adopte as medidas legislativas e regulamentares necessárias à concretização da nacionalização em definitivo do Novo Banco, adquirindo ao Fundo de Resolução a totalidade do capital do Novo Banco, com a respectiva remuneração dos empréstimos concedidos e manutenção das garantias pessoais do Estado atribuídas actualmente ao Novo Banco, ponderando para esse efeito as opções de aquisição e gestão do balanço do Novo Banco, dos seus activos, passivos e activos desvalorizados ou "tóxicos" que melhor correspondam à defesa do interesse público e sem abdicar de nenhum mecanismo legal ao alcance do Estado no âmbito do Regime Jurídico das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.»

O primeiro foi rejeitado com os votos contrários de PSD, CDS e PS e o segundo aguarda ainda a discussão e votação em sessão plenária da Assembleia da República.

A situação do Novo Banco, quer do ponto de vista dos serviços que presta e da sua importância no sistema financeiro português, quer do ponto de vista da sua importância enquanto grupo empregador, merece pois que sejam relembradas as diversas posições assumidas sobre o desfecho do caso BES e sobre a condução do caso Novo Banco, pelo anterior Governo e pelo actual.

Hoje torna-se claro que a proposta do PCP, desde o início do processo, seria a que mais eficazmente poderia proteger os depositantes e os recursos do Estado: utilizar o capital do Grupo Espírito Santo e todos os seus activos para colmatar as necessidades de capital do BES e utilizar mesmo a riqueza pessoal dos membros da famiglia que enriqueceram durante décadas às custas da descapitalização do banco. Mas o PCP foi mais longe desde o princípio: assegurar o controlo público da instituição resultante da resolução do BES, o Novo Banco.

«A manutenção do Novo Banco na esfera pública não pode, no entanto, significar a incorporação pública dos prejuízos sem qualquer critério.»

Hoje, enquanto comentadores e «senadores» saltam para as TV’s e jornais para cavalgar o assunto do dia, é importante reafirmar que a solução para o Novo Banco, como aliás, para uma grande parte da banca que actua em Portugal, é o seu controlo público e é igualmente fundamental relembrar que, tivesse a intervenção do Governo de má memória PSD/CDS sido orientada para defender o interesse público e o Grupo Espírito Santo teria sido chamado a pagar a factura do capital que consumiu.

O Governo preferiu intervir apenas no BES deixando de fora o GES, tal como já se tinha feito no passado com o BPN e a SLN, com a mesma oposição do Partido Comunista Português.

A situação entretanto criada com o processo de privatização do Novo Banco, com a despesa pública associada à resolução do BES a que se soma o meio milhão de euros que o Banco de Portugal pagará a Sérgio Monteiro – ex-Secretário de Estado do Governo PSD/CDS – e com a instabilidade que todo o processo provoca no sistema financeiro demonstra que, não só o PCP tinha razão sobre a forma como se deveria ter chamado o GES a pagar o BES, como na forma como desde a resolução que se deveria ter afastado a possibilidade e o projecto da privatização.

A manutenção do Novo Banco na esfera pública não pode, no entanto, significar a incorporação pública dos prejuízos sem qualquer critério. Tal como um grupo financeiro estrangeiro faz, como bem se viu no caso Banif, também o Estado tem o direito e o dever de escolher qual a parte do balanço e do negócio do Novo Banco que pretende integrar no sistema público bancário, mas o mais importante neste momento é travar o processo de degradação da instituição bancária que se vive pela situação de incerteza, de fugas de informação, de especulação e indefinição.

Cada dia que passa é um dia perdido para estancar o prejuízo que as aventuras dos Espírito Santo e outros senhores do dinheiro provocaram no BES, e que hoje pesam no balanço e na estabilidade do Novo Banco. Os portugueses já pagaram o Novo Banco e vendê-lo a uma instituição privada implicará perdas tremendas. Nacionalizar efectivamente o Novo Banco, de forma que deve ser estudada e ponderada, pode implicar necessidade de investimentos, mas já que pagámos o banco, ao menos que fiquemos com ele. Mais que não seja, porque essa é a única forma de impedir que tenhamos de passar por isto tudo outra vez.

  • 1. Projecto de Resolução n.º 1487/XII/4.ª que Determina a recomposição e imobilização dos activos detidos pelo Grupo Espírito Santo e Banco Espírito Santo e os membros do Conselho Superior do GES, apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, a 22 de Maio de 2015.

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