Dois apontamentos devem ser feitos à notícia desta semana, segundo a qual o salário médio subiu 4,5% desde a saída da troika do País.
Em primeiro lugar, este «aumento» (já explicamos o porquê das aspas) não pode ser desligado da solução governativa encontrada no seguimento das eleições do passado dia 4 de Outubro. Foi de resto um dos pontos discutidos entre os partidos de esquerda com o PS e que foi explanado nas posições conjuntas.
Por outro lado, convém relembrar que «aumento» é este: trata-se, na verdade, da reposição do valor dos salários tirado aos trabalhadores desde 2010, ainda com o governo de José Sócrates. O governo que se lhe seguiu, do PSD e do CDS-PP, desde logo se disponibilizou para não só cumprir as exigências da troika como ir mais além, mostrando que o «memorando de entendimento» foi um bom pretexto para pôr em prática o seu próprio programa de Governo.
O salário médio líquido aumentou, entre 2007 e 2011, 11,1%, enquanto entre 2011 e 2016 o crescimento foi de apenas 3%. O crescimento médio do salário líquido, por ano, segundo o INE, foi de 2,6% no primeiro período – e de 0,6% no segundo.
Entre 2010 e 2014 reduziu-se o número de trabalhadores remunerados em 307,9 mil. No mesmo período, a remuneração média anual, por trabalhador, diminuiu 546,9 euros. O que levou a isto é bem conhecido de todos nós: despedimentos colectivos, contratos precários (a prazo, mensais, etc.) com renovação automática, estágios não remunerados, crescimento das empresas de trabalho temporário (em que nalguns casos mais de metade do parco salário não passa sequer pelos trabalhadores), para dar apenas alguns exemplos.
Outro dado a ter em conta é a parcela de Produto Interno Líquido (riqueza líquida criada) que vai anualmente para os trabalhadores (aqueles que contribuem verdadeiramente para essa riqueza). Em 2009 a percentagem era de 45,1% – em 2015 foi de apenas 40,4%, um valor abaixo dos 44,4% registados em… 1995. Note-se que 82,3% da população empregada são trabalhadores por conta de outrem.
É uma evidência dizer que mesmo estes valores tão expressivos não mostram com exactidão a dimensão do problema, e que para a compreendermos precisamos de ter em conta os aumentos de preços, de impostos e de um conjunto de outros factores que fizeram com que a pobreza alastrasse na sociedade portuguesa.
Outra evidência é a crescente desigualdade que se verifica entre países da União Europeia: se entre 2010 e 2015 o ganho médio mensal de um português adulto diminuiu 3,7%, o de um grego diminuiu 17,2% e o de um alemão aumentou 11,9%.
Porém nunca é demais referir estas evidências, principalmente quando vemos os partidos então no governo a contorcerem-se em manobras para demonstrar que a realidade por eles deixada não era esta. Era esta e era sobre ela que era preciso actuar. É neste contexto que começam a surgir as devoluções dos salários dos trabalhadores, ainda que por ora bem insuficientes.
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