Pouco mais de uma semana passada sobre o incêndio do Museu Nacional, que ocorreu dia 2 de Setembro, no Rio de Janeiro, o presidente golpista anunciou a criação da Agência Brasileira de Museus (Abram), que passará a administrar os 27 museus até agora sob a alçada do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), criado em 2003 pelo governo de Lula da Silva, no âmbito de uma política pública de museus, e que será extinto.
A outra medida provisória anunciada – ambas entram já em vigor mas terão ainda de ser aprovadas no Congresso dos Deputados – permite criar fundos patrimoniais «com o objectivo de arrecadar, gerir e destinar doações de pessoas físicas e jurídicas privadas para programas, projectos e demais finalidades de interesse público», refere a Agência Pública.
Ambas as medidas assinadas pelo presidente brasileiro estão a ser alvo de fortes críticas por parte de vários sectores da sociedade brasileira, que o acusam de se ter aproveitado do incêndio do Museu Nacional para realizar uma mudança no modelo de gestão dos museus, guiada pelo princípio de «menos público, mais privado», e dando, na prática, «carta branca à classe empresarial para interferir na gestão da cultura», sublinha o Brasil de Fato.
Em declarações a este periódico digital, o arqueólogo e investigador Luiz Oostebeek destacou a «importância decisiva» dos museus «na construção da formação cultural e cidadã de um país», pelo que, defendeu, deve ser «o poder público a assumir a responsabilidade desse processo».
Em entrevista à Agência Pública, José Nascimento, que presidiu ao Ibram entre 2009 a 2013, questionou a legalidade da acção do presidente golpista, por ter sido tomada durante a campanha eleitoral, e classificou as medidas provisórias como desastrosas, antes de mais porque «desmontam toda a política pública dos museus», bem como «o órgão que [dela] cuida».
José Nascimento lembrou o «acto falhado» do ministro brasileiro da Cultura, ao afirmar que o incêndio do Museu Nacional «foi uma janela de oportunidades», e sublinhou que para o governo de Temer se trata mesmo de uma «janela de oportunidades», para «privatizar os museus».
Repúdio de trabalhadores e instituições
O Comité de Patrimónios e Museus da Associação Brasileira de Antropologia divulgou uma nota em que afirma encarar «com grande temor o perigo de uma Medida Provisória que esvazia as universidades públicas de seus museus, ferindo o princípio da autonomia universitária».
Por seu lado, a Rede Brasileira de Colecções e Museus Universitários considera que as medidas provisórias representam um «atentado à democracia brasileira e às instituições públicas», agredindo «frontalmente a continuidade das políticas públicas voltadas ao sector dos museus», indica a Agência Pública.
Newton Soares, representante dos trabalhadores do Ibram, disse à Agência Brasil que as medidas adoptadas vão servir para desbaratar «cada vez mais uma política nacional de museus», uma vez que retiram 27 museus da gestão do governo e os transferem para organizações de âmbito público-privado.
«Tirar essa gestão de dentro do governo e passar para outras organizações é transformar os 27 museus do Ibram num grande balcão de negócios. Fica-se refém da vontade do mercado. Não se tem autonomia para dizer quais as necessidades e para pautar as políticas públicas», frisou.
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