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Os deputados são chamados a responder à questão

Ficar com o que está pago ou entregar a abutres

São discutidos e votados, esta sexta-feira, dois projectos de resolução exigindo o controlo público sobre o Novo Banco. «Fundos abutre» mantêm o seu voo sobre a instituição bancária.

CréditosJosé Sena Goulão / Agência Lusa

As iniciativas, de PCP e BE, pretendem que o Estado assuma o controlo do banco surgido da falência do Banco Espírito Santo (BES), actualmente propriedade do Fundo de Resolução, um entidade pública para a qual foram transferidos 3,9 mil milhões de euros aquando da medida de resolução que criou o Novo Banco.

No documento do PCP, é sublinhada a «necessidade urgente de assegurar a direção pública», nomedamente através da «nomeação dos órgãos sociais e a elaboração de um plano estratégico para a banca pública que estabeleça os objetivos materiais e temporais». Os bloquistas pedem «o apuramento consequente de todas as responsabilidades» no processo, assim como um «debate alargado e democrático sobre o desígnio estratégico» do banco.

Apesar de vários dirigentes e deputados do PS já se terem mostrado favoráveis à nacionalização da instituição bancária, não é conhecido o sentido de voto da bancada na Assembleia da República.

Também nomes improváveis, como os ex-ministros das Finanças, de governos do PSD e do CDS-PP, Manuela Ferreira Leite e Bagão Félix, assim como o último presidente do BES e primeiro presidente do Novo Banco, Vítor Bento, manifestaram abertura à hipótese de nacionalização, face às propostas em cima da mesa.

O que se conhece dos valores e condições apresentados pela Lone Star, fundo recomendado pela equipa do ex-secretário de Estado Sérgio Monteiro que o Banco de Portugal encarregou da venda do Novo Banco, parecem motivar muitas destas vozes. O fundo norte-americano oferece 750 milhões de euros pela compra, com a promessa de uma recapitalização de valor idêntico. No entanto, pede em troca uma garantia do Estado no valor de 2,5 mil milhões de euros, mais de metade dos dinheiros públicos injectados na instituição em 2014.

Na véspera da discussão e votação sobre o futuro do banco, relembramos o perfil da Lone Star que publicámos horas antes da recomendação do Banco de Portugal ter sido tornada pública.

Quem são os abutres que rondam o Novo Banco?

A Lone Star Funds foi criada entre 1995 e 1996, mas o seu fundador e presidente, John Grayken, já vinha acumulando fortuna através da compra de «activos tóxicos» à banca – no essencial, crédito à habitação de cobrança difícil –, vendendo posteriormente com lucros na ordem das centenas de milhões de euros.

Quando o sector imobiliário voltou a estar em alta nos EUA, a Lone Star virou-se para o Japão, em 1998, e depois para a Europa. O termo flipping é regularmente usado para descrever a estratégia destes fundos: comprar barato para, ao fim de poucos anos, vender com lucro. Mas como é possível comprar activos desvalorizados e transformá-los numa «galinha dos ovos de ouro» num espaço de dois ou três anos?

Quando se trata de crédito à habitação, a prática da Lone Star é simples: se o devedor não paga, executa a hipoteca e vende o imóvel o mais rápido possível. Os lucros são conseguidos à custa de despejos massivos, seja na baixa de Nova Iorque, no Japão, na Coreia do Sul ou no Leste da Alemanha.

Lone Star Funds: comprar barato, vender caro e depressa

Se a sua especialidade começou por ser o imobiliário, a crise asiática do final do século XX proporcionou novos negócios, entrando no sector financeiro. Em 2003 adquire uma participação maioritária num banco coreano, que tenta vender passados três anos com um lucro superior a 4,5 mil milhões de dólares, 250% do valor pago.

Suspeitas de manipulação bolsista abortaram o negócio, levaram à prisão do representante da Lone Star na Coreia do Sul e de um funcionário que desviou 11 milhões de dólares para o fundo norte-americano. Mas a venda acabou por se concretizar em 2012, com um lucro de 3,5 mil milhões de dólares.

Porém, a receita aplicada no banco Korea Exchange Bank (KEB) logo após a compra não deixou boas memórias aos seus trabalhadores, com uma reestruturação agressiva, fusão de unidades e despedimentos. Mas o ritmo não agradava ao «fundo abutre», levando mesmo à substituição do presidente do banco em 2005.

No Japão, o fundo aproveitou a falência de um banco para criar o Tokyo Star Bank, em 2001, depois de pagar 340 milhões de dólares ao governo nipónico. Depois de seis anos de mais uma «reestruturação agressiva», o banco é vendido. Quando, em 2011, no auge da crise financeira, os novos donos não conseguem sustentar os 2,2 mil milhões de dólares de dívida assumida para comprar o Tokyo Star Bank, a Lone Star recupera o controlo do banco.

Em 2014, o banco japonês é vendido pelo fundo norte-americano – pela segunda vez em menos de uma década – por 510 milhões de dólares a um banco sedeado na Ilha de Taiwan.

Se o cartão de visita da Lone Star na gestão bancária é negro, as práticas fiscais não são melhores. O fundador renunciou mesmo à cidadania norte-americana, passando a ser cidadão irlandês e beneficiando do regime fiscal que permite não pagar impostos, já que detém a participação no fundo norte-americano na Bermuda, um paraíso fiscal.

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