A publicação de rankings das escolas tem sido uma prática controversa em diversos países, incluindo Portugal. Estes rankings são frequentemente utilizados como uma ferramenta para avaliar a qualidade das instituições de ensino, comparando-as de forma quantitativa com base nos resultados dos alunos em exames nacionais. No entanto, há uma série de razões pelas quais a publicação de rankings é prejudicial e por que a sua utilização para justificar a privatização do ensino é problemática.
A Federação Nacional dos Professores (FENPROF) tem vindo a afirmar que os rankings de escolas tendem a oferecer uma visão simplista e distorcida da realidade educativa. Geralmente, baseiam-se em resultados de exames, ignorando outros fatores importantes que contribuem para a qualidade da educação, como o ambiente escolar, o apoio psicológico, as atividades extracurriculares e a inclusão de alunos com necessidades educativas especiais. Esta abordagem quantitativa negligencia a complexidade do processo educativo, reduzindo-o a meros números que não refletem a totalidade da experiência escolar.
«Esta abordagem quantitativa negligencia a complexidade do processo educativo, reduzindo-o a meros números que não refletem a totalidade da experiência escolar.»
Motivos mais do que suficientes, por isso, para que outros países tenham abandonado os rankings por os considerarem redutores e perversos. No caso da República da Irlanda foi o próprio governo a recorrer para o Supremo Tribunal para não ser obrigado a divulgá-los, por considerar que seria o que melhor protegeria o sistema educativo. O Supremo deu-lhe razão.
Além disso, os rankings podem criar uma pressão excessiva sobre alunos e professores. As escolas podem sentir-se incentivadas a focar-se exclusivamente na preparação para exames, em detrimento de uma educação holística e integral. Esta pressão pode levar a práticas educativas prejudiciais, como «treinar para o teste», reduzindo o currículo apenas ao conteúdo que será avaliado nos exames, negligenciando o desenvolvimento da formação integral, crítica e criativa dos alunos.
Considero que, no que é confirmado por relatórios de outras organizações e entidades, como a própria FENPROF e o Conselho Nacional de Educação, escolas com o mesmo currículo e idênticos projetos educativos em áreas ou abrangendo uma população escolar economicamente mais favorecidas tendem a obter melhores resultados devido a uma série de vantagens estruturais, como maior financiamento, acesso a recursos educativos de qualidade e apoio adicional fora do ambiente escolar. Tal verifica-se mesmo entre escolas privadas sem ou com contrato de associação. Desta forma, cria-se um ciclo vicioso onde escolas em áreas menos favorecidas são constantemente classificadas de forma negativa, resultando em menor financiamento e menos oportunidades de melhoria de resultados.
«Desta forma, cria-se um ciclo vicioso onde escolas em áreas menos favorecidas são constantemente classificadas de forma negativa, resultando em menor financiamento e menos oportunidades de melhoria de resultados.»
A publicação de rankings reforça estas desigualdades ao promover a ideia de que algumas escolas são inerentemente «melhores» do que outras, sem considerar os contextos socioeconómicos diversos em que operam, nem sequer os processos educativos e formativos adotados, os quais, obviamente, não podem ser mensuráveis. É, por isso, falso que os melhores resultados se devem aos projetos educativos das escolas privadas. Admiti-lo é não só contornar o problema, como aproveitar estes resultados para defender uma posição contrária à valorização da escola pública.
Não é, por isso, surpreendente que membros do atual governo e MECI [Ministério da Educação, Ciência e Inovação], bem como os patrões do setor privado, venham defender (em sintonia e com base nesta premissa falsa) o financiamento dos colégios por parte do Estado. Porém, a educação não é um produto que deve ser submetido às leis de mercado. A privatização ou o apoio a privados tende a beneficiar apenas uma minoria, muitas vezes exacerbando a segregação e as desigualdades existentes. Escolas privadas têm a possibilidade de selecionar os seus alunos, excluindo aqueles que podem apresentar maiores desafios educativos ou socioeconómicos, o que não é uma opção para as escolas públicas. Ou será que há quem, seriamente, acredite que os colégios querem lá todos os alunos e conseguiriam manter as elevadas classificações obtidas nos rankings? A prática prova o contrário.
«Porém, a educação não é um produto que deve ser submetido às leis de mercado. A privatização ou o apoio a privados tende a beneficiar apenas uma minoria, muitas vezes exacerbando a segregação e as desigualdades existentes.»
Por outro lado, não será aceitável seguir-se um caminho que pode resultar na diminuição do controle público sobre a educação, um bem público essencial. Quando processos de gestão do setor privado, como por exemplo lógicas de gestão de recursos humanos, são transferidos para o setor público, o foco pode deslocar-se do bem-estar dos alunos para a gestão de recursos, comprometendo a missão educativa de formar cidadãos críticos e participativos. A «privatização» pode levar a uma fragmentação do sistema educativo, onde a coesão social e os valores de igualdade e inclusão são ameaçados.
É necessário, isso sim, investir na educação pública de forma equitativa, garantindo que todas as escolas, independentemente da sua localização e das populações que servem, tenham os recursos necessários para oferecer uma educação de qualidade. As políticas públicas devem ser desenhadas para apoiar as escolas que se confrontam com maiores desafios, promovendo a igualdade de oportunidades para todos os alunos.
«As políticas públicas devem ser desenhadas para apoiar as escolas que se confrontam com maiores desafios, promovendo a igualdade de oportunidades para todos os alunos.»
Além disso, é crucial desenvolver sistemas de avaliação que vão além dos resultados de exames. Avaliações qualitativas, feedback da comunidade educativa e o acompanhamento do desenvolvimento integral dos alunos devem ser considerados para fornecer uma visão mais abrangente e precisa da qualidade educativa.
Em suma, a publicação de rankings das escolas é uma prática que simplifica e distorce a realidade da educação, criando pressões indevidas e exacerbando desigualdades. Utilizar esses rankings para justificar lógicas privatizadoras do ensino é uma abordagem inadequada que pode comprometer a igualdade de oportunidades e o bem-estar dos alunos. Em vez disso, devemos focar-nos em fortalecer a escola pública, promovendo políticas que garantam uma educação de qualidade para todos, independentemente do seu contexto socioeconómico.
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