I Governo Constitucional (1976–1978)

O primeiro governo Soares visto a 40 anos de distância

No dia em que se assinalam os 40 anos da tomada de posse do I Governo Constitucional, lembramos alguns dos principais marcos de um governo que acabou aliado à direita.

O Presidente da República, Ramalho Eanes, dá posse ao I Governo Constitucional
Créditos / Agência LUSA

Foi há 40 anos que tomou posse o I Governo Constitucional, resultando das primeiras eleições legislativas após a aprovação da Constituição da República Portuguesa, em 1976. Um governo da responsabilidade do PS, que, procurando apoios variáveis no plano parlamentar, terminou com a aliança ao CDS, com o II Governo Constitucional a tomar posse em Janeiro de 1978.

Foi um governo marcado pelas contradições inerentes a uma orientação voltada para a ruptura com o processo revolucionário que acompanhou os dois anos anteriores. O ano e meio em que esteve em funções representou um corte com muitos dos caminhos seguidos depois do 25 de Abril e até então, cortes muitas vezes rápidos, mesmo repentinos, e contra o ciclo e o que se sentia por uma boa parte dos portugueses.

Uma das primeiras preocupações do executivo liderado por Mário Soares foi o início do processo de adesão à Comunidade Económica Europeia (CEE). O pedido é ratificado na Assembleia da República logo em Novembro de 1976 e conduzido pelo próprio Soares e pelo então ministro dos Negócios Estrangeiros, Medeiros Ferreira.

A iniciativa é apresentada junto da CEE formalmente em Março de 1977 e a adesão viria a ser concretizada em 1986. Quarenta anos depois do pedido e 30 anos depois da adesão, o País está confrontado com a possibilidade de lhe serem aplicadas sanções inéditas por incumprimento das regras relativas ao limite do défice orçamental.

A ofensiva laboral

Em Março de 1977, chegava ao governo Maldonado Gonelha para a tutela do Trabalho, substituindo Francisco Manuel Curto. Durante este I Governo Constitucional, algumas das medidas mais emblemáticas no plano laboral foram a criação dos contratos a prazo (em Outubro de 1976) ou a facilitação dos despedimentos colectivos (em Dezembro de 1976), ainda antes da troca de ministro.

Composição do I Governo Provisório

  • Primeiro-ministro: Mário Soares
  • Ministro de Estado: Henrique de Barros
  • Ministro sem pasta: Jorge Campinos
  • Defesa Nacional: Firmino Miguel
  • Plano e Coordenação Económica: António Sousa Gomes
  • Administração Interna: Costa Brás
  • Justiça: Almeida Santos
  • Finanças: Medina Carreira
  • Negócios Estrangeiros: Medeiros Ferreira
  • Agricultura e Pescas: António Barreto
  • Habitação, Urbanismo e Construção: Eduardo Pereira
  • Obras Públicas: Almeida Pina
  • Educação e Investigação Científica: Sottomayor Cardia
  • Comércio e Turismo: Carlos Mota Pinto
  • Indústria e Tecnologia: Nobre da Costa
  • Trabalho: Maldonado Gonelha
  • Assuntos Sociais: Armando Bacelar
  • Transportes e Comunicações: Rui Vilar

Mas Gonelha viria a ficar conhecido pelo projecto de lei a que deu nome, já na vigência do II Governo Constitucional, no qual se manteve ministro do Trabalho. O projecto restringia a forma de organização dos sindicatos, aprofundava a possibilidade de divisões no movimento sindical, e retirava ou limitava o exercício de muitos dos direitos sindicais.

Maldonado Gonelha, electricista de profissão, veio a assumir vários cargos de relevo. Foi ministro dos Assuntos Sociais do governo do Bloco Central, entre 1983 e 1985. Teve cargos de relevo na banca, liderando o Conselho de Administração do Montepio Geral e, mais recentemente, foi vice-presidente da Caixa Geral de Depósitos.

Reforma Agrária e Nacionalizações – dois alvos prioritários

A Reforma Agrária foi outro dos alvos do primeiro governo de Mário Soares. Para a pasta da Agricultura e Pescas foi nomeado António Lopes Cardoso, substituído, logo em Novembro de 1976, por António Barreto, por discordâncias com a orientação do PS. Barreto daria nome à lei que abriu caminho à restituição das terras intervencionadas pela Reforma Agrária aos antigos proprietários. Numa entrevista recente, o próprio ex-ministro assumiu o recurso à violência para impor a retirada dos trabalhadores agrícolas do Alentejo e Ribatejo. A «lei Barreto» foi aprovada em Julho de 1976 pelo PS, PSD e CDS.

Também em Julho de 1977, foi aprovada a «lei de Delimitação de Sectores». Assumindo o objectivo de reconhecer a «irreversibilidade das nacionalizações» efectuadas no período revolucionário, restringiu o seu alcance. As nacionalizações incidiram sobre determinado tipo de empresas e participações sociais, enquanto a lei restringia os sectores vedados à iniciativa privada. Empresas de armamento, petroquímicas, de refinação de petróleo ou de adubos passam a estar abertas à participação de privados, tal como parte do sector financeiro.

Em Outubro é aprovado um regime de indemnizações para os proprietários expropriados nos três anos anteriores. Apesar das limitações previstas, o diploma permitiu que se iniciasse um processo que envolveu litigâncias judiciais e outras alterações legislativas que, de acordo com algumas estimativas, terão permitido algum ganho para os empresários indemnizados.

FMI e a política de alianças de um governo minoritário

Na segunda metade de 1977, o governo de Mário Soares abre as portas, pela primeira de três vezes (as seguintes foram em 1983 e 2011), ao Fundo Monetário Internacional (FMI). A instituição é chamada para preparar a entrada de Portugal na CEE e consigo trouxe cortes salariais, aumentos de impostos, desvalorização cambial ou aumento do custo do crédito.

No final desse ano, Soares apresenta uma moção de confiança na Assembleia da República que só consegue os votos do PS. O I Governo Constitucional chega ao fim, mas logo de seguida toma posse um novo governo, em que o PS surge aliado ao CDS, que garantiu três ministros no novo executivo.

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