|Forças Armadas

Caso Mondego. Quiseram matar o mensageiro

E agora, senhora ministra? Para além dos 13 militares que se recusaram a embarcar, o que fazer com o almirante Chefe do Estado-Maior da Armada, com o comandante naval e com o comandante do NPR Mondego?

O chefe do Estado-Maior da Armada, Henrique Gouveia e Melo, visita o navio Mondego, no porto do Funchal, Madeira, 16 de Março de 2023. O NRP Mondego não cumpriu uma missão de acompanhamento de um navio russo a norte da ilha de Porto Santo, após 13 militares terem recusado, dia 10 de Março, embarcar por motivos de segurança. 
CréditosHomem de Gouveia / Agência Lusa

A nova avaria do navio Mondego, quando se dirigia em missão para as Ilhas Selvagens, precisando de ser rebocado de volta à Madeira, mostra bem que a atitude dos militares que se recusaram a embarcar não foi mais que um grito de alerta. Para quem não tinha percebido a quem serviam, ficou agora claro que serviram a Armada e, consequentemente, o seu País. Aliás, este acontecimento veio facilitar muito a tarefa dos juízes deste processo.

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Os 13 militares do Mondego «foram os arautos de um grito de alerta»

A afirmação é da Associação Nacional de Sargentos (ANS), que sublinha que os referidos militares «sabiam, e sabem, melhor que ninguém, o que se passava, e passa, no seu navio».

O chefe do Estado-Maior da Armada, Henrique Gouveia e Melo, visita o navio Mondego, no porto do Funchal, Madeira, 16 de Março de 2023. O NRP Mondego não cumpriu uma missão de acompanhamento de um navio russo a norte da ilha de Porto Santo, após 13 militares terem recusado, dia 10 de Março, embarcar por motivos de segurança. 
CréditosHomem de Gouveia / Agência Lusa

Num comunicado, a ANS fala de «homens experimentados, técnicos altamente especializados», condecorados por missões cumpridas «em vários teatros e tipos de missão, em mares nacionais e internacionais, e ao serviço de Agências europeias e/ou em missões da NATO». A ANS refere ainda que, oito desses elementos da guarnição do Mondego, foram louvados recentemente pelo Comandante Naval, por «ao longo dos últimos 20 meses de actividade operacional», o Mondego ter «servido a Marinha e Portugal, em diversos cenários e geografias, em particular no dispositivo da Zona Marítima da Madeira e na operação INDALO, no âmbito do controlo das fronteiras externas da União Europeia, através da agência FRONTEX».

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O CEMA que antes de ser já o era

Finalmente, o Almirante Gouveia e Melo tomou posse esta segunda-feira como Chefe de Estado Maior da Armada (CEMA), após um sinuoso processo de nomeação que foi tudo menos um hino à transparência.

Créditos / saudemais.tv

Chegou ao fim o arrastado processo de substituição do Almirante Mendes Calado, enquanto CEMA, cargo que, segundo o próprio, não deixou «por vontade própria».

Aliás, depois de, em finais de Setembro, se ter ficado a saber da combinação prévia, entre o Presidente da República, o Governo e o então CEMA, para a saída deste antes do prazo estipulado, ficou-se agora também a saber que era Gouveia e Melo o escolhido para tomar posse no início do ano e que só a sua ida para a task force originou a recondução, precária, de Mendes Calado.

Em entrevista ao Expresso, o recém-empossado CEMA sublinha que o processo da sua nomeação «já tinha sido iniciado muito antes. Foi interrompido pela necessidade de me passarem para a task force».

O Presidente da República e o primeiro-ministro apresentaram como pretexto para o momento desta alteração no topo da hierarquia da Marinha a promulgação próxima das novas leis orgânicas dos três ramos das Forças Armadas e do Estado Maior General (EMGFA). Uma justificação considerada pouco compreensível, nomeadamente porque há cerca de dois meses o Chefe de Estado Maior do Exército foi reconduzido no cargo.

Entretanto, fica a expectativa quanto ao recato do novo CEMA, considerando alguma incompatibilidade entre as estrelas inerentes ao posto/cargo e as do espaço mediático que, em vagas sucessivas e repetitivas, estranhamente o têm vindo a projectar.

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Durante esse período, segundo a ANS, a guarnição do Mondego demonstrou «grande dedicação e forte espírito de missão», o que levou o Comando Naval a conceder-lhes «três dias de mérito pelo excelente desempenho, foco, disponibilidade e competência demonstrados, assentes no profissionalismo, exemplo e vontade de bem fazer, constituindo-se como o exemplo para as restantes unidades navais e para toda a Marinha».

A ANS denuncia as condições técnicas a que a «tutela militar e política» deixou chegar o material e «as condições dos homens e mulheres militares, exigindo sempre, e a qualquer preço, o cumprimento da missão», e acusa essa tutela de ser a principal responsável «pelo estado a que isto chegou e a quem se deve exigir responsabilidades».

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Entretanto, a ministra da Defesa Nacional afirmou esta terça-feira que aguardava os resultados da avaliação técnica para se pronunciar. Então, não foi realizada uma inspecção e o navio dado como operacional? Não foi assumido que estava em condições de cumprir a missão? E onde estão as tais «redundâncias» que permitiam que o Mondego fizesse tudo e em todas as circunstâncias? E o sentido de responsabilidade dos militares que deveriam responder por estas e outras afirmações e por esta situação?

A imagem do País não ficou agora afectada junto da NATO e dos nossos aliados, perante a evidência que o NRP Mondego, que deveria acompanhar a passagem do navio russo, não tinha condições para o fazer. Caricaturando s situação, a ter sido cumprida a missão o Mondego ainda corria o risco de ser rebocado pelo navio russo.

O problema é que, para além das avarias nos navios, o estaleiro do Arsenal do Alfeite tem cada vez menos condições para as reparar, considerando as dificuldades com que se confronta, nomeadamente a falta de pessoal e os equipamentos obsoletos.

A verdade, é que não se podem cumprir as mesmas missões do passado, com menos meios materiais e humanos. E, se os ministros, por ignorância, incompetência ou apenas para mostrar serviço, não querem compreender a situação, os chefes militares têm a obrigação de não andarem a propagandear que podem cumprir todas as missões, com menos meios humanos e materiais, porque não é verdade, como se constata. E, quando o fazem é à custa do esgotamento do pessoal, cujos resultados se reflectem nas dificuldades de recrutamento e de retenção nas fileiras. 

Enfim, desta vez, mesmo sem tiro no porta-aviões, o navio-almirante foi ao fundo!

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