Esta segunda-feira assinala-se o terceiro ano da invasão da Ucrânia pela Federação Russa, um salto qualitativo na guerra que se tinha iniciado em 2014, depois do golpe de Estado de Maidan, em que os bandos armados nazi-fascistas e o exército ucraniano procuravam liquidar as populações russófonas. Na realidade, a guerra era entre a NATO e a Rússia por interposta Ucrânia, com o objectivo de implodir a Federação Russa, dividindo-a em vários estados, devastar a sua economia submetendo-a à voracidade com que os EUA queriam apropriar-se dos seus recursos naturais. Projecto antigo dos neocons, sobretudo democratas mas também republicanos, neocons que têm a curiosidade de terem nas suas fileiras uma quantidade não negligenciável de ex-trotskistas à semelhança da esmagadora maioria dos soixante huitards franceses que agora militam nas direitas e extremas direitas.
A manipulação da opinião pública pela comunicação social, actualmente controlada universalmente de forma esmagadora pelas oligarquias, e as redes sociais dos magnatas direitinhas tem construído uma sólida narrativa que atira qualquer evidência para as urtigas. Assinala o dia 24 como o início de uma guerra em que a Rússia começaria pela Ucrânia a invadir toda a Europa até às Berlengas, não se percebendo qual o interesse da Rússia em invadir a Europa, a não ser que tivesse decidido alinhar com Mark Rutte para acabar com os gastos dos países do Sul com os fundos europeus em vinho e mulheres, para os trazer para as virtudes dos frugais europeus que por seu turno seriam invadidos para os eslavos se rebolarem nos jardins do Borrell.
«Na realidade, a guerra era entre a NATO e a Rússia por interposta Ucrânia, com o objectivo de implodir a Federação Russa, dividindo-a em vários estados, devastar a sua economia submetendo-a à voracidade com que os EUA queriam apropriar-se dos seus recursos naturais.»
Aturdidos com as marteladas que Trump está a dar no atlantismo, sem perceberem que ele é o grande vencedor desta guerra a que quer colocar um rápido ponto final para lucrar o mais possível com os seus destroços, a União Europeia (UE) manca e rota envia Dupond e Dupont a Kiev para visitar, aplaudir e acarinhar Zelensky, que, na sua barraca de tiro, dispara sobre tudo o que pode colocar em causa a sua imediata sobrevivência. Nem tudo são passos de dança como o que tentou engraxar os sapatos de Trump comprando os direitos de tradução para ucraniano das Memórias de Melanie Trump, como relatou o New York Times. Os outros lances são bem reveladores dos seus instintos ditatoriais no exercício de poder. Uma das mais recentes vítimas foi o general Serhii Naiev, comandante das forças conjuntas do exército desde 2020, afastado por ter criticado e considerar inaceitável um processo contra três comandantes acusados de não terem sabido defender a região de Kharkiv em maio de 2024. Nada de inesperado se for relembrado que outro general, Valerii Zaluzhnyi, comandante em chefe das Forças Armadas foi despachado para Londres como embaixador quando notoriamente a sua popularidade é muito superior à de Zelensky.
O último tiro foi em Petro Poroshenko, presidente depois do golpe de Maidan de 2014 a 2019, possível candidato em futuras eleições, e mais quatro oligarcas com o pretexto de negócios realizados antes de 2020, sancionados como traidores, proibidos pelo Conselho de Defesa e Segurança Nacional, um órgão do Estado directamente dependente de Zelensky, de saírem, de se movimentarem no país, de terem acesso aos seus bens. A situação é tão escandalosa que a advogada Oleksandra Matviichuk, laureada com o prémio Nobel da Paz em 2022, deplora nas redes sociais «A pior coisa a fazer na situação que atravessamos é desencadear uma guerra política interna numa altura em que é importante agir como uma só equipa nacional na cena internacional». Nada ou praticamente nada disto é relatado nos media e não comove a pandilha dos burocratas de Bruxelas que envia Ursula e Costa para as louvaminhas de dia 24. Fingem não perceber que o que interessa a Zelensky e à sua camarilha é safarem-se entre os pingos da forte chuva que está a desabar, protegendo as suas negociatas entre as curvas e contracurvas de uma possível paz que está a ser agenciada entre os EUA e a Federação Russa, os verdadeiros sujeitos no terreno. Toda essa gentalha, políticos, comentadores, jornalistas ainda conseguem encher a boca com a democracia na Ucrânia, a legitimidade democrática de Zelensky, depois de ter proibido todos os partidos da oposição, ter prendido, até mesmo assassinado dirigentes e militantes desses partidos o que toleraram como os três macacos que cobrem os olhos, tapam os ouvidos, fecham a boca mesmo agora quando ataca sem fás nem nefas potenciais rivais que têm estado ao seu lado. Continuam descaradamente a afirmar que se está a defender militar e politicamente uma democracia!
«Aturdidos com as marteladas que Trump está a dar no atlantismo, sem perceberem que ele é o grande vencedor desta guerra a que quer colocar um rápido ponto final para lucrar o mais possível com os seus destroços, a União Europeia (UE) manca e rota envia Dupond e Dupont a Kiev para visitar, aplaudir e acarinhar Zelensky, que, na sua barraca de tiro, dispara sobre tudo o que pode colocar em causa a sua imediata sobrevivência.»
A UE, dispensada de qualquer participação imediata e significativa, procura ficar na fotografia assistindo a essas facécias zelenskianas. Lá vão Ursula e Costa visitar a barraca de tiro de Zelensky começando por assistir ao documentário Timisoara12 filmado em Butcha, para depois entre variados números de beijos e abraços reafirmarem o seu inabalável apoio até à Rússia ser derrotada, ainda que aturdidos com a realidade da frente de batalha. Antes de partirem, a alucinada Alta Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e Política de Segurança, Kaja Kallas, tinha-os confortado com as suas certezas: «Vladimir Putin não conseguiu atingir nenhum dos seus objectivos estratégicos (…) A Rússia quer que o mundo acredite que pode manter esta guerra indefinidamente, mas a realidade é diferente. Os limitados ganhos territoriais da Rússia são acompanhados de baixas militares insustentáveis e de uma economia em colapso e o tempo não está do lado da Rússia». Os limitados ganhos territoriais são quase 25% do território ucraniano e, de facto, a Rússia enfrenta um grave problema com a inflação. Todos os outros dados económicos contrariam Kallas e as suas certezas de pacotilha. Enquanto, em 2024, a UE cresceu 1,1% e a zona euro 0,9%, a Rússia cresceu 4,1%. Se atentarmos na dívida pública e externa, a da Rússia é de 21% e 14,8%, respectivamente, enquanto a das principais economias da UE são: Alemanha 72,8% e 157,70%; França 122,51% e 266,67%; Itália 158,93% e 128,67%; Espanha 123,61% e 171,51%, fora da UE, o Reino Unido 112,5% e 301%. Isto deve-se, sobretudo, à política de sanções, especialmente as dirigidas à energia, entre quatro a cinco vezes superiores ao que custava quando o principal fornecedor era a Federação Russa, o que para alegria de Trump, já agora dos seus antecessores, coloca a Europa na sua dependência com as indústrias a deslocalizarem-se para a China e também para os EUA.
Kaja Kallas, se tivesse uma migalha de senso comum, devia olhar para o seu país, a Estónia, e para os outros estados bálticos, Letónia e Lituânia, que recentemente se desligaram da rede eléctrica controlada pela Rússia, pondo fim a essa dependência energética, para se integrar no sistema eléctrico da União Europeia, através da ligação à rede da Europa Ocidental. O que foi festejado e aplaudido em festanças com as donas constanças, Ursula e Kallas. O resultado, menos de quinze dias depois, é o avolumar de uma crise económica, porque muitas empresas não podem suportar o aumento de 350% (!!!) dos custos de electricidade. São estas as vitórias do bando de burocratas não eleitos que comandam a UE! São os mesmos que ainda não perceberam porque Trump tanto os despreza e está a acelerar a paz na Ucrânia. É o grande vencedor desta guerra, não quer perder tempo em sacar mais lucros, além dos já obtidos com a venda de armas, são perto de 150 mil milhões de dólares gastos, de que o complexo militar industrial norte-americano é de longe o maior fornecedor. O que está agora a exigir à Ucrânia, a exploração dos seus recursos minerais, a que Zelensky vai ceder com a espada do Starlink sobre a sua cabeça, se o Starlink for desligado, como Trump já ameaçou, terá consequências imediatas fatais na frente de batalha. Adicionam-se as mais de 70% de terras aráveis adquiridas pelas multinacionais Cargill, DuPont e Monsanto/Bayer, que uma alteração do actual governo ucraniano à Constituição permitiu serem transacionáveis com estrangeiros, ao controle das finanças que está a ser exercido pelos fundos BlackRock e Vanguard. A pressa de Trump é a exploração o mais rápido possível dessa sua colónia europeia, que tanto lhe faz seja integrada ou não na UE, o que apesar das promessas de Bruxelas não é assim tão líquido, lembrem-se os boicotes dos agricultores polacos, romenos e húngaros à circulação dos produtos agrícolas ucranianos, isso antes de se conhecer como a França, a grande beneficiária da Política Agrícola Comum, irá reagir.
«O que está agora a exigir à Ucrânia, a exploração dos seus recursos minerais, a que Zelensky vai ceder com a espada do Starlink sobre a sua cabeça, [...] terá consequências imediatas fatais na frente de batalha, adiciona-se as mais de 70% de terras aráveis adquiridas pelas multinacionais Cargill, DuPont e Monsanto/Bayer, que uma alteração do actual governo ucraniano à Constituição permitiu serem transacionáveis com estrangeiros, ao controle das finanças que está a ser exercido pelos fundos BlackRock e Vanguard.»
Bem podem Macron e Starmer ir a Washington bajular Trump, procurando convencê-lo que é do seu interesse continuar a guerra, bem podem Ursula e Costa garantir o que não podem garantir sem o apoio dos EUA que é continuar a guerra, os interesses dos EUA são outros, pelo que o mundo está a mudar e eles aí não têm lugar, como é bem visível nas duas propostas na ONU a pretexto da guerra na Ucrânia, uma dos norte-americanos, outra dos europeístas, em que os norte-americanos ao contrário dos europeístas não classificam os russos de agressores nem referem a reversão dos territórios conquistados pelos russos, apelam ao fim rápido da guerra. Lamentável são muitas esquerdas, que aceitando a abstracção da leis e da ordem neoliberal por terem abandonado o marxismo e negado as lutas de classe, estrebuchem imbecilmente alienando-se das perspectivas de paz independentemente do que se pense e julgue sobre os beligerantes, fazendo análises lúcidas sobre esta guerra.
- 1. Timisoara, Roménia, no final de 1989, é a grande falsificação de um massacre que não existiu, encenado, pago e filmado pela BBC, um exemplo paradigmático da manipulação da opinião pública pela comunicação social. Agamben, filósofo que faz parte das elites dominantes, apesar de ser seu crítico, escreveu: «Pela primeira vez na história da humanidade, cadáveres acabados de enterrar ou alinhados nas mesas das morgues foram desenterrados à pressa e torturados para, em frente das câmaras, simular o genocídio que devia legitimar o novo regime. O que o mundo inteiro teve debaixo dos olhos em directo nos ecrãs da televisão como sendo verdade era a não verdade absoluta; e, embora a falsificação por vezes fosse evidente, era de qualquer modo autenticada como uma verdade pelo sistema mundial dos meios de comunicação, para que se tornasse claro que a verdade passara a ser apenas um momento do movimento necessário da falsidade.»
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