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O negócio das vacinas

A UE financiou a produção de vacinas, comprou-as antecipadamente, mas abdicou de quaisquer direitos de propriedade, deixando nas mãos das multinacionais farmacêuticas a gestão integral do processo.

Um trabalhador da saúde prepara uma seringa com uma dose da vacina da Pfizer-BioNTech contra a Covid-19, no Hospital do Santo Espírito, em Roma, Itália, a 2 de Janeiro de 2021
CréditosFabio Frustaci / EPA

No âmbito do combate à pandemia de Covid-19, a vacinação é essencial para salvar vidas e também um elemento estruturante da retoma da actividade económica e social, num quadro em que se exige que as vacinas cheguem a todos os países, sem exclusões.

Portugal é uma das vítimas da falta de vacinas na União Europeia (UE), resultante dos constrangimentos na produção anunciados pelas farmacêuticas.

Recorde-se, a UE não só financiou a investigação e a produção de vacinas, como também as comprou antecipadamente, embora abdicando de quaisquer direitos de propriedade e deixando nas mãos das multinacionais farmacêuticas a gestão integral do processo de produção e comercialização, ao sabor dos seus interesses comerciais. Aliás, não será por acaso que a Comissão Europeia se tem recusado a divulgar todos os elementos dos contratos que assinou com as multinacionais farmacêuticas.

Os países, nomeadamente Portugal, não podem ficar prisioneiros dos interesses das multinacionais farmacêuticas, que, em contraponto com a lentidão no fornecimento de vacinas, continuam a aumentar os seus lucros milionários.

A realidade com que nos confrontamos é que a grande dificuldade na vacinação está na falta de vacinas devido à falha de compromisso das farmacêuticas relativamente às entregas com que se tinham comprometido contratualmente.

Nesse sentido, são necessárias medidas de defesa do interesse público que permitam, nomeadamente, que a saúde pública prevaleça sobre os direitos de propriedade intelectual para que se possam produzir vacinas nos laboratórios preparados e nos vários países. Para isso, é urgente libertar as patentes a preços razoáveis, seja através de uma negociação ou usando mecanismos legais existentes para o efeito.

Não se pode também esquecer que, para além das vacinas desenvolvidas pelos laboratórios farmacêuticos financiados e contratualizados pela UE, já existem outras, e cerca de duas centenas estão em desenvolvimento em vários países. Algumas destas vacinas têm fabrico autorizado em países diferentes daqueles em que foram desenvolvidas, mediante acordos e sem custos astronómicos de patentes.

Considerando que vários países da UE anunciaram a intenção de diversificar opções de compra de vacinas, para além das disponibilizadas pela UE, Portugal deve também, rapidamente, procurar adquirir vacinas noutros países, num processo que crie ainda condições para garantir a produção nacional neste domínio.

A produção de vacinas contra a Covid-19, em menos de um ano, constituiu um enorme feito da ciência, assente no financiamento público de investigação e desenvolvimento, e na contribuição de milhares de cientistas, médicos e enfermeiros.

Eis a razão pela qual as vacinas devem ser consideradas um bem público mundial, acessível a todos.

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