Num quadro de grande teatralização, o PS, pela voz de Pedro Nuno Santos, mas não só, foi dando nota da lealdade para com o Governo de Montenegro desde que este tomou posse, que tem como exemplo recente a abstenção na última moção de censura, enquanto as bancadas do PSD e do CDS-PP tentaram arranjar bodes expiatórios para justificar o injustificável, consubstanciado na promiscuidade do primeiro-ministro com grandes grupos económicos.
O desespero do Governo no Parlamento passou por vários actos, designadamente o de suspender o debate e obter novo acordo, para que caíssem a moção de confiança do Executivo de Montenegro e a comissão parlamentar de inquérito em que o PS se escudou, com medo de ser acusado de ter derrubado o Governo, mas não passou.
Antes, já o secretário-geral do PCP tinha chamado a todo este processo uma «autêntica novela», «jogo de sombras, passa-responsabilidades e passa-culpas», salientando que «é preciso resolver a vida das pessoas». Segundo Paulo Raimundo, a rejeição da moção de confiança do Governo pelo PCP é um «sinal claro de combate» à política de «retrocesso» do Executivo de Luís Montenegro. No documento, só chumbado perto das 20h desta terça-feira por todas as bancadas parlamentares, à excepção das que suportam o Governo (PSD, CDS-PP) e da IL, o Executivo insistiu na retórica de que «conquistou a estabilidade política, promoveu a estabilidade social e consolidou a estabilidade económica e financeira», afirmações que trabalhadores e reformados contrariam, e a vida se encarrega de negar.
É assim para os trabalhadores da Administração Pública, que continuam a lutar para que os salários aumentem e assim pare o ciclo de empobrecimento. É assim para as crianças, que, num ano de lucros recorde dos grandes grupos económicos, são em número crescente numa situação de privação material, com a agravante da política que fomenta a proliferação das «inovadoras» creches, abertas quase 24 horas por dia e todos os dias do ano, negando o direito dos filhos a passarem tempo com os seus pais.
É assim para todos os que não encontram a «estabilidade financeira» quando pretendem efectivar o direito na habitação, ou para os que pagam mais pelos empréstimos enquanto a banca suga os seus rendimentos. Mas se dúvidas houvesse quanto às prioridades do Governo do PSD e do CDS-PP, basta recordar os 1,8 mil milhões que destinou no Orçamento do Estado deste ano para apoios e benefícios fiscais para empresas, os 1,5 mil milhões para parcerias público-privadas (PPP), ou os cerca de 400 milhões de euros de redução do IRC das empresas, isto num país em que mais de metade dos trabalhadores (61%) têm um salário bruto mensal inferior a 1000 euros.
É ainda a opção pelos grupos económicos que determina a criação de PPP em cinco hospitais. Uma decisão que o ministro Leitão Amaro apelidou de «histórica», mas que não responde aos utentes que são confrontados com uma política de urgências encerradas, tempos elevados de espera nas urgências, mesmo para doentes urgentes, e longos tempos de espera para serem atendidos pela linha SNS 24, conforme obrigou o Executivo de Montenegro. O dinheiro, que sobra para garantir lucros nas PPP, falta para a valorização dos profissionais de saúde, que continuam a reivindicar condições laborais e salariais, denunciando que a falta delas degrada a qualidade do serviço e afasta muitos médicos e enfermeiros do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Realidades a contrastar com a «vida melhor para todos», que o Governo alega ter criado, como defendeu, no final do debate, o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, que admitiu que os mercados têm toda a confiança neste Governo.
Mas não ficam por aqui os ataques do Executivo, designadamente aos direitos de quem trabalha e trabalhou. Também os grupos de trabalho criados para estudar alterações à legislação laboral e avaliar a sustentabilidade da Segurança Social, e que se deverão manter nos próximos meses, levantam preocupações.
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