Em entrevista à Renascença esta sexta-feira, o primeiro-ministro António Costa afirmou que a «grande lição» a retirar desta crise provocada pela pandemia de covid-19 é que Portugal tem que voltar a produzir «o que se habitou a importar da China».
Décadas de políticas que nos trouxeram aqui transformam-se, num passo de mágica, num «hábito» que os portugueses adquiriram, de comprar ao estrangeiro e deixar de produzir.
Portugal tem a maior zona económica exclusiva da União Europeia, mas o saldo na balança comercial de pescado é negativo em mais de mil milhões de euros. A nossa dieta tem nos cereais um elemento fundamental, mas o trigo que produzimos dá apenas para os primeiros 15 dias do ano e o milho para quatro meses. A batata nacional não se vende mas comemos mais de 300 mil toneladas de batata francesa ou espanhola.
Mesmo com o encerramento de mais de 90% das explorações leiteiras, somos ainda auto-suficientes em leite cru, mas compramos mais de 50 mil toneladas de queijo e de 75 mil toneladas de leite no estrangeiro.
Portugal é um dos países no mundo cuja economia menos cresceu nas últimas décadas. Nem podia ser de outra forma, quando o País mantém os mais elevados custos do crédito, da energia, ou das comunicações, em consequência da entrega a privados – quase todos estrangeiros – destes sectores, e quando as pequenas e médias empresas estão sujeitas ao domínio da grande distribuição que esmaga os preços e lhes impõe condições desiguais.
Esta realidade é fruto de opções políticas e não de «hábitos de consumo». Foram décadas de políticas dirigidas por sucessivos governos seguindo as imposições da União Europeia e de quotas que favoreciam as grandes economias europeias.
O sector têxtil e do calçado foi considerado dispensável, a metalurgia pesada um fardo que era necessário afastar, cultivar couves e batatas estava ultrapassado, pescar era coisa obsoleta. Encerraram milhares de empresas e privatizaram os sectores produtivos.
Mas a ideia de que, comprando ao estrangeiro, poderíamos sobreviver apenas de sol e serviços revela-se agora um erro tremendo.
Perante esta situação de grande incerteza, cabe aos trabalhadores insistir na adopção de medidas que coloquem no horizonte a recuperação da produção nacional. E, pelo caminho, exigir a garantia de condições dignas de trabalho aos que produzem aquilo de que necessitamos para viver.
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