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Energia: Medina rejeita taxar grupos económicos

O ministro das Finanças opta por manter a salvo os lucros dos grandes grupos económicos ao defender que a escalada dos preços da energia «não se resolve com taxas». 

CréditosAntónio Cotrim / Agência Lusa

«A questão dos preços da energia não é resolvida com taxas», disse Fernando Medina, este sábado, em declarações à chegada ao segundo dia de uma reunião informal dos ministros das Finanças da União Europeia (UE), no âmbito da presidência checa do Conselho, em Praga.

Um dia depois de os ministros da Energia da UE terem discutido em Bruxelas medidas de emergência a aplicar a nível comunitário para mitigar os efeitos da escalada de preços no sector energético, o ministro português das Finanças defendeu que «as taxas são uma forma de utilizar receitas excepcionais para um determinado fim de política pública, [mas] a questão central é como é que se colocam os preços» da energia.

As declarações de Medina surgem no final da semana em que o Governo apresentou um pacote de paliativos para alegadamente apoiar as famílias, sem medidas eficazes para travar o aumento do custo de vida, como a intervenção nos preços ou o aumento de salários e pensões

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Até quando vão continuar a vender a ideia de que isto é tudo normal? 

São perto de dois mil milhões de euros os lucros arrecadados no primeiro semestre, apenas pelas energéticas e pelos principais bancos a operar em Portugal.

Resultados de um estudo de 2014 sustentam o retrato dos EUA como sistema «dominado pelas elites económicas, uma oligarquia»
Créditos / politicsofpoverty.oxfamamerica.org

Já foi praticamente tudo dito aqui em matéria de acumulação de riqueza, desigualdades e injustiças sociais, mas os números revelados ao longo da última semana, sendo a confirmação deste estado de coisas, voltaram a surpreender pela obscenidade.

Não vale a pena argumentar com «situações excepcionais», porque não é de excepções que o sistema capitalista se alimenta. A guerra na Ucrânia não seria uma «situação extraordinária», como ontem referia Marcelo, nem poderia servir para justificar a riqueza obtida com o sacrifício dos portugueses, se quem nos governa tivesse tomado medidas de forma a não desequilibrar ainda mais os pratos da balança.

Tão surpreendente quanto a riqueza criada numa altura em que, por mais que se estique, as contas de muitas famílias já não dão para pôr comida na mesa até ao final do mês, é a naturalidade com que se divulgam notícias sobre os resultados semestrais das empresas. Mas também a facilidade com que os beneficiários tentam pô-las em perspectiva. Os lucros «não são excessivos», argumentaram os presidentes da CGD (486 milhões de euros de lucro) e do BPI (201 milhões), onde as «reestruturações» alicerçadas em fechos de balcões e despedimentos têm impulsionado o aumento da riqueza.

O facto de nos tentarem fazer acreditar que a obtenção destes resultados não tem nada de extravagante, numa altura em que a subida dos preços come cada vez mais os salários de quem gera a riqueza, só pode ser uma manobra de distração, por um lado, e de escape, por outro. Enquanto mantiverem o povo aprisionado à ideia de que este é o estado natural das coisas e não há alternativa, que os trabalhadores são descartáveis ou podem ser colocados a trabalhar com vínculos precários, que os salários não podem subir muito mais se não lá se vai a estabilidade e a produtividade das empresas, e que estas só são realmente viáveis se derem milhões a ganhar aos seus accionistas, nada muda.

Por outro lado, a retórica de que os resultados não são exagerados só pode servir para não sedimentar ideias, algumas pífias, como a que teve Marcelo, de pedir às empresas com lucros «extraordinários» iniciativas de «maior responsabilidade social».  

A justiça social não se constrói com paliativos, caridade ou apelos à boa vontade das empresas, mas com a aplicação de políticas que defendam quem trabalha e trabalhou, e permitam distribuir melhor a riqueza criada no nosso país.

Espanha aprovou recentemente um imposto extraordinário sobre os lucros dos sectores bancário e energético. Por cá, o Governo foi instado a fazer o mesmo, mas Luís Montenegro logo veio em auxílio dos grandes grupos económicos, argumentando que «não há justificação para criar mais impostos», e que esse seria um «sinal incorrecto aos que investem no sector da energia em Portugal».

Além de desmentirem o novo líder do PSD, os lucros da Galp (420 milhões) e da EDP (306 milhões, mais 265 milhões da EDP Renováveis), permitem ter uma ideia do que podia mudar se ainda fosse o País a beneficiar deles. 

Tipo de Artigo: 
Editorial
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O aumento da pobreza no nosso país contrasta com o crescente aumento dos lucros dos grandes económicos, que o Governo evita beliscar. Lucros que crescem em virtude dos preços especulativos que vêm sendo praticados a pretexto da guerra na Ucrânia, e onde o Governo se recusa a intervir, designadamente no que se refere ao controlo e fixação de tectos máximos.

Apesar disso, Fernando Medina parece reconhecer que essa seria a receita adequada. «Quando esses preços [gás e electricidade] forem controlados e se conseguirem diminuir também as receitas extraordinárias, diminuem as receitas extraordinárias dessas empresas», disse.

Itália foi o primeiro país da Europa a anunciar, em Março, uma taxa adicional de imposto de 10% sobre os ganhos das energéticas, que depois aumentou para 25%. No mês de Julho, aqui ao lado, o governo de Sánchez decidiu aplicar taxas extraordinárias à banca (4,8%) e às empresas energéticas (1,2%). Meses antes, o Reino Unido tinha anunciado um imposto de 25% sobre os lucros «inesperados» das petrolíferas e das empresas de gás. 

Entretanto, Bruxelas volta a fazer pressão sobre os países e a pedir «rigor orçamental». Numa conferência de imprensa após a reunião dos ministros das Finanças da UE, Valdis Dombrovski, vice-presidente executivo da Comissão Europeia, defendeu que, «no próximo ano, a política orçamental tem de ser prudente», «dar prioridade à sustentabilidade orçamental e ser coerente com a tarefa do Banco Central Europeu» com o argumento de «reduzir a inflação», que agravará a situação de Portugal, país periférico e altamente endividado, interferindo negativamente no financiamento das pequenas e médias empresas e nas contas de quem tem crédito à habitação indexado à Euribor. 


Com agência Lusa

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