Iniciou-se recentemente o período de revisão do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES). O RJIES entrou em vigor em 2007. Mereceu a firme oposição da Fenprof que denunciou na altura a matriz neoliberal do diploma, todo ele orientado para a mercantilização do ensino e da investigação. Mais de duas décadas passadas sobre a sua vigência, os resultados estão à vista. De Norte a Sul do país, passando pelas duas regiões autónomas e abrangendo os dois subsistemas (politécnico e universitário), a precariedade foi crescendo para níveis pandémicos, afetando a vida de milhares de docentes sujeitos a todo o tipo de exploração.
Politécnicos(1) | Universidades(2) | Total(1)+(2) | |
---|---|---|---|
Total | 15835 | 19914 | 35749 |
Convidados | 10585 | 10737 | 21322 |
% | 66,85% | 53,92% | 59,64% |
Os números da Tabela 1 são da Direção-Geral de Estatísticas de Educação e Ciência (DGEEC). Referem-se ao ano de 2022 e podem ser confirmados no respetivo sítio na internet. Dizem respeito apenas aos docentes. No caso dos investigadores, a situação é mais grave ainda. Temos assim em Portugal mais de 21 mil docentes convidados, entre monitores, leitores, assistentes e professores das diversas categorias. Nas muitas reuniões que temos tido com as direções das instituições, dizem-nos que existem situações onde é legítimo recorrer à figura do convidado. Sabemos que, nas escolas de saúde, muitos profissionais de saúde lecionam nos vários cursos, trazendo a sua experiência para a sala de aula. Contudo, esta realidade não consegue disfarçar sequer os níveis colossais da precariedade que ultrapassam os limites do admissível.
O docente convidado foi o recurso encontrado para comprimir a massa salarial num quadro onde as instituições de Ensino Superior são subfinanciadas e forçadas a adotar, por via do RJIES, estratégias empresariais com vista à captação de novas fontes de financiamento que, para além da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e dos fundos comunitários, nunca se concretizaram.
Hoje, em função da precariedade do seu vínculo, o docente convidado trabalha mais, recebe menos e sujeita-se a todo o tipo de abusos. Num semestre pode trabalhar a 60%, passando depois a 20 ou a 30% conforme as necessidades. Muitos têm contratos de setembro a julho. De acordo com o regulamento de prestação de serviços da Universidade de Coimbra, o professor convidado a 60% pode dar 12 horas letivas por semana enquanto o docente de carreira dá no máximo 9. Um maná para as instituições!
«O docente convidado foi o recurso encontrado para comprimir a massa salarial num quadro onde as instituições de Ensino Superior são subfinanciadas e forçadas a adotar, por via do RJIES, estratégias empresariais com vista à captação de novas fontes de financiamento (...).»
Os estatutos das carreiras do politécnico e universitários, na sua versão de 2009 estabelece que a carreira de docência começa com o doutoramento, remetendo a figura do assistente para o pessoal especialmente contrato em condição de excecionalidade e devidamente fundamentada. Como explicar então que existam nos dois subsistemas 13079 assistentes convidados a dar aulas? Será pelo facto do seu salário ser quase metade de um professor adjunto ou se um professor auxiliar? Esta situação assume foros de escândalo quando sabemos que muitos doutorados são contratados como assistentes. E fazem-no basicamente para garantir o seu sustento recusando muitas vezes o apoio do sindicato como medo de não verem o seu contrato renovado no semestre seguinte. A precariedade no seu melhor!
A educação está hoje na ordem do dia. O resultado de décadas de políticas de direita, enfeudadas aos interesses dos grandes grupos económicos e aos ditames da União Europeia revelam-se em cada história contada na primeira pessoa pelos professores do básico e secundário em luta. A luta por um Ensino Superior público, de qualidade e ao serviço do desenvolvimento converge, hoje como nunca, com a defesa da escola pública e a valorização dos seus docentes.
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