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As cinzas da inquisição

A Biblioteca Nacional de Portugal expõe os livros que nos foram sonegados por mais de 300 anos de Inquisição Católica.

Páginas censuradas do livro «Examen de ingenios para las sciencias», Huesca, 1581, de Juan Huarte de San Juan, autor dos primeiros trabalhos sobre psicologia. 
Créditos / Biblioteca Nacional de Portugal

«Bibliotecas Limpas: Censura dos livros impressos nos séculos XV a XIX», é o nome que leva a exposição patente na Biblioteca Nacional de Portugal (BNP) e pretende mostrar como o sinistro Tribunal da Inquisição mortificava não só os corpos, mas também as mentes. Controlando e engaiolando o pensamento, ao longo de três séculos de pesada repressão de livros, entre 1536 e 1821.

Hervé Baudy, responsável pelo texto de apresentação da mostra e investigador da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (FCSH-UNL) refere «uma história de debates e tragédias, com práticas às vezes negociadas, na maior parte do tempo impostas, e também com incidência no destino individual».

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António Borges Coelho distinguido com Medalha de Mérito Cultural

O historiador António Borges Coelho vai receber a Medalha de Mérito Cultural, em reconhecimento de um percurso de vida caracterizado por uma intensa actividade política e académica.

António Borges Coelho na sua casa, na Parede, em 4 de Outubro de 2018. O historiador, poeta e resistente antifascista foi entrevistado pela Lusa no mês em que cumpria 90 anos de vida.
CréditosMiguel A. Lopes / LUSA

O historiador António Borges Coelho vai ser distinguido na sexta-feira com a Medalha de Mérito Cultural, anunciou hoje o Governo, que justificou a atribuição pelo percurso de vida «caracterizado pela intensa actividade política e académica».

O anúncio foi feito pelo Ministério da Cultura que, em comunicado, destaca o percurso profissional e pessoal deste historiador, poeta e ensaísta, e enaltece também o seu «constante compromisso com a cultura e língua portuguesas, nas quais e para as quais ajudou a preservar e a compreender, com a sua obra, uma parcela fundamental da memória nacional».

«Para além da relevância do seu percurso científico no âmbito da historiografia portuguesa, foi sublinhada a grande erudição e acessibilidade da sua obra, e o seu comprometimento com a cultura e a língua, evidenciado no modo como integra na narrativa dos acontecimentos a caracterização detalhada de instituições, informações demográficas e estruturas económicas, sociais e culturais», acrescenta a nota.

Nascido em Murça, Trás-os-Montes, a 7 de Outubro de 1928, António Borges Coelho frequentou o Seminário de Montariol (Braga), que abandonou por falta de vocação para o sacerdócio, segundo a nota biográfica disponibilizada pelo Ministério da Cultura.

Borges Coelho mudou-se para Lisboa para estudar Direito, mas acabou por frequentar o curso de História. Em 1962 retomou a sua licenciatura em Ciências Histórico-Filosóficas na Faculdade de Letras de Lisboa, que concluiu, em 1969, com uma tese sobre Leibniz.

Ex-militante do Partido Comunista, António Borges Coelho actuou na clandestinidade antes do 25 de Abril, tendo feito parte da oposição ao regime político, o que lhe valeu perseguições e a prisão durante vários anos, para além do impedimento de dar aulas no ensino oficial.

Em 1974, após a revolução, iniciou a sua actividade de docente no Departamento de História da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde leccionou largos anos e participou em numerosas provas de mestrado, de doutoramento e de agregação.

Passou a professor catedrático dessa faculdade, em 1993, com uma tese sobre a Inquisição de Évora.

A sua vasta bibliografia inclui, também, poesia, teatro e ficção. Foi também repórter do jornal A Capital, então dirigido por Norberto Lopes e Mário Neves, entre Fevereiro de 1968 e Dezembro e 1969.

António Borges Coelho desenvolveu também investigação de diversos temas da História de Portugal, de que resultaram obras como Raízes da Expansão Portuguesa (1964), A Revolução de 1383 (1965), Comunas ou Concelhos (1973), da série Questionar a História (seis volumes, 1983-2007),  Quadros para Uma Viagem a Portugal no Século XVI (1986), A Inquisição de Évora (dois volumes, 1987),  O Vice-Rei Dom João de Castro (2003), Ruas e gentes da Lisboa Quinhentista (2006).

Desde 2010 que, com Donde Viemos, iniciou a publicação de uma História de Portugal que conta, até agora, seis volumes publicados – o mais recente dos quais dedicado ao período que vai da Restauração ao Ouro do Brasil.

Nos anos 1970, organizou a obra Portugal na Espanha Árabe (1972-1975), em quatro volumes, considerada uma obra de referência nas investigações sobre o período árabe em Portugal.


Como ensaísta, é autor de títulos como Alexandre Herculano (1965), Leibniz. O Homem. A Teoria da Ciência (1969) e O 25 de Abril e o Problema da Independência Nacional (1975).

Como poeta publicou Roseira Verde (1962), Ponte Submersa (1969), Fortaleza (1974), No Mar Oceano (1981) e Ao Rés da Terra (2002), entre outros.

Escreveu ainda peças para teatro, como Príncipe Perfeito (1988) e Sobre os rios de Babilónia (2001). Na área da ficção é autor de Tempo de Lacraus (1999) e de Youkali é o País dos Nossos Desejos (2005), entre outros títulos.

Fundou e dirigiu a revista História e Sociedade, participou em diversos congressos e reuniões científicas, e durante 24 anos leccionou na Faculdade de Letras, onde deu a Última Lição no dia 11 de Dezembro de 1998.

Actualmente com 90 anos, António Borges Coelho continua a dedicar-se aos estudos de história e à investigação de novas temáticas para a sua História de Portugal e está a preparar uma antologia dos seus poemas.

No ano passado foi distinguido com o Prémio da Universidade de Lisboa, tributo de consagração pelo trabalho que desenvolveu naquela instituição, e com a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade, entregue pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

António Borges Coelho já havia sido agraciado anteriormente com a Grã-Cruz da Ordem Militar de Sant’lago da Espada e com o Prémio da Fundação Internacional Racionalista.


com Agência Lusa

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Se os autores dos livros proibidos eram cruelmente torturados e executados, como o filósofo Giurdano Bruno, queimado em Roma, em 1601, ou o famoso dramaturgo português António José da Silva (conhecido enquanto «O Judeu»), também condenado à fogueira em Lisboa, em 1739, já os livros impressos eram reduzidos a cinzas.

«Há mil maneiras de prevenir o mal, e outras mil de o reprimir, quer na era dos papiros, quer na da internet. Quando se fala em censura de livros, pensa-se de imediato no desaparecimento físico ou no impedimento de circulação das obras», escreve. Baudry recorda, no entanto, que, comparada com a eliminação do autor, «a expurgação» dos livros, pode parecer um mal menor. 

«Aqui, a correção não é das almas e dos corpos, mas sim das palavras. Reveste três modalidades: além da pura e simples supressão, corrigir, em casos menos frequentes, significa substituir ou acrescentar, como o mostram os exemplares expostos». Na exposição poderemos ver «palavras, frases ou passagens, de maior ou menor extensão, que tinham de ser suprimidas para que a obra continuasse a poder ser lida». 

É desta situação, designada como «intervencionismo microcensório», que a exposição da BNP trata. «As obras alvo desta censura textual não eram escolhidas ao acaso. Usavam-se listas. A burocracia bibliográfica inquisitorial portuguesa inspirava-se no trabalho feito em outros países, quer neles vigorasse a Inquisição, como Espanha ou Itália, quer não, como França, Alemanha ou Boémia», escreve Hervé Baudry.

A partir de 1544, começam a ser construídas listas (Index, índices) de livros proibidos, às quais se iam sempre acrescentado novas, ou velhas, obras. Em Portugal, a lista manuscrita intitulada «Prohibição dos Livros Defesos» (1547) inaugura uma série que, nesta exposição, culmina com o «Index Auctorum Damnatae Memoriae», de 1624, que contém as mais de 26 mil instruções com força de lei para banir mais de um milhar de títulos.

É todo este processo de purga de livros, as suas razões e processos inquisitoriais que pode ser analisado na exposição, aberta ao público até ao dia 23 de Abril, com direito a visitas guiadas a 5 e 23 de Março.

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