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Hélia Correia vence prémio maior da ficção portuguesa

A escritora Hélia Correia, voz notável da literatura portuguesa contemporânea, venceu o Grande Prémio do Romance e Novela com a sua mais recente obra, «Um bailarino na batalha». A decisão do júri foi unânime.

Hélia Correia intervém na abertura da 14.ª edição das Correntes d'Escritas, na Póvoa de Varzim (2013). Foto de arquivo.
CréditosEstela Silva / LUSA

A escritora Hélia Correia é a vencedora por unanimidade do Grande Prémio de Romance e Novela APE/DGLAB1 da Associação Portuguesa de Escritores (APE), pela obra Um bailarino na batalha, refere a Agência Lusa citando comunicado da APE.

O prémio, um dos mais prestigiados do panorama literário nacional, foi atribuído por decisão unânime do júri coordenado por José Manuel de Vasconcelos e constituído por Clara Rocha, Cristina Robalo Cordeiro, Fernando Pinto do Amaral, Maria de Lurdes Sampaio e Salvato Teles de Menezes.

Os finalistas do prémio, além de Hélia Correia, foram Djaimilia Pereira de Almeida, Joana Bértholo, Julieta Monginho e Rui Laje.

O Grande Prémio de Romance e Novela APE/DGLAB, no valor de 15 mil euros, é um prémio literário atribuído pela APE desde 1982 com o objectivo de consagrar uma obra de ficção de autor português publicada no ano anterior à atribuição do prémio.

O prémio já foi atribuído a 31 autores, tendo-o obtido por duas vezes os escritores Vergílio Ferreira, António Lobo Antunes, Mário Cláudio, Agustina Bessa-Luís, Maria Gabriela Llansol e Ana Margarida de Carvalho.

Hélia Correia

Hélia Correia nasceu em Lisboa em Fevereiro de 1949. Frequentou a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde se licenciou em Filologia Românica e, mais tarde, fez uma pós-graduação em Teatro da Antiguidade Clássica. Foi professora de Língua Portuguesa do ensino secundário.

O seu fascínio pela civilização grega, na sua dimensão humana e equilíbrio, é um traço contínuo do percurso literário de Hélia Correia. «Tudo era feito à medida do homem e pelo homem, e o homem tinha consciência disso. Depois perdemos essa noção», afirmou um dia, por ocasião da recepção de um prémio literário. Na mesma ocasião exprimiu a vontade de que a sua obra pudesse ser «um convite ao pensamento, um convite à filosofia, um convite a que nos desafiemos a tomarmos outra vez as palavras no seu sentido original, na sua pureza».

A casa eterna (1991), que marca uma primeira incursão da autora na biografia ficcionada – uma forma que viria a utilizar nos romances Lillias Fraser e Adoecer – é, para alguma crítica, um momento de cisão na sua escrita.

«Escrever é uma servidão que eu agradeço»

Hélia Correia

Em 1981 estreou-se com O Separar das Águas – ponto de partida para uma obra que se veio a espraiar por vários géneros literários e pela tradução. A novela Montedemo (1983), encenada pelo grupo O Bando, deu-lhe uma primeira notoriedade e correspondeu ao interesse da autora pelo teatro, em particular pelo teatro clássico grego, que a conduziu a uma «breve participação na peça Édipo Rei, onde profere algumas falas em grego» e se traduziu em diversas obras dramáticas, entre as quais Perdição, Exercício sobre Antígona (1991), levado à cena pela Comuna (1993); Florbela (1991), que viria a ser encenada pela companhia Maizum; A ilha encantada (2008), uma adaptação para jovens da peça A tempestade, de William Shakespeare; e com a revisitação de As troianas (2018) renova uma parceria criativa com o seu companheiro, o poeta e dramaturgo Jaime Rocha, com quem publicara anteriormente A Pequena Morte/Esse Eterno Canto (poesia, 1986).

Em 1991, com o romance A casa eterna, recebeu o Prémio Máxima de Literatura, primeiro de outros galardões literários que se lhe sucederiam: com Lillias Fraser recebe o Prémio Dom Dinis da Fundação Casa de Mateus (2001) e o Prémio PEN Clube Português de Novelística (2002); de novo o Prémio Máxima de Literatura (2006), com Bastardia; o romance Adoecer proporcionou-lhe o Prémio Inês de Castro (2010); em 2013, com A terceira miséria (poesia), recebe o Prémio Literário Casino da Póvoa, atribuído pelo festival Correntes d’Escritas, e o Prémio PEN Clube Português de Poesia; e com Vinte Degraus e Outros Contos vence o Grande Prémio do Conto Camilo Castelo Branco (2014).

O conjunto da sua obra literária é reconhecido pela primeira vez em 2013, ano em que lhe foi atribuído o Prémio Vergílio Ferreira pela Universidade de Évora, seguindo-se-lhe, em 2015, o mais importante galardão da literatura lusófona, o Prémio Camões. A Associação de Escritoras e Escritores em Língua Galega (AELG) atribuiu-lhe, em 2017, o Prémio Escritora Galega Universal.

Para José Manuel Mendes, presidente da APE, Hélia Correia é «uma narradora de excepção, uma personalidade fulgurante que consegue, com uma peculiar imaginação e um poder encantatório de construção de histórias, atmosferas e personagens, escrever num português perfeito, exímio, de grande qualidade, feito de rigor, num trabalho criativo invulgar».

Um deserto habitado

O romance Um bailarino na batalha – título que, conforme explica a autora em entrevista ao JL-Jornal de Letras, se destinava inicialmente a um romance que estava a escrever e que foi substituído, num momento iluminado, por este «poema em prosa sobre o que anda a acontecer» – foi publicado em fins de 2018.

Sobre ele escreveu Mário Santos tratar-se de «um (magnífico) poema narrativo épico em prosa», que «prolonga a eloquência nobre de A Terceira Miséria» e cuja «dicção alta e meditada, o seu andamento largo, herbertiano, bíblico e homérico, a sua assombrosa capacidade de mitificar o real quotidiano, transfigurando-o, poética e politicamente» está nos antípodas da «indústria da ficção jornalístico-realista» que nos sitia.

Com Um bailarino na batalha Hélia Correia aborda, no dizer do seu editor, «um dos grandes problemas da actualidade, que, de certo modo, o foi de todos os tempos, as migrações dos deserdados». Os seus personagens «movem-se no deserto […] fora de um espaço e tempo reconhecíveis», com um ritmo construído «na cadência dos caminhantes e da sucessão dos dias e das noites, em busca de uma Europa cada vez mais próxima e inacessível».

  • 1. DGLAB: Direcção-geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas.

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