O centro, ou seja, a mulher

Sugestões de leituras, músicas, filmes, teatro e outras manifestações artísticas para o mês do Dia da Mulher, que é também o mês da Poesia.

Fadwa Tuqan
Créditos

Recordar Fadwa Tuqan e, em Almada, ver cinema da Palestina e discutir os problemas desta terra ocupada

É já na próxima quarta-feira o dia 8 de Março. E por isso não espere, caro leitor, cara leitora, que hoje comece por Los Angeles, Viena, Tóquio ou Évora. Não são esses os centros do mundo. Hoje, o centro é já a Mulher. E por isso principio com uma poeta a (re)descobrir: Fadwa Tuqan. Com o coração ferido pela tragédia do seu povo e da sua terra, a Palestina, sob o jugo de Israel, Fadwa escreveu estes versos: «– Só quero estar no seio da minha pátria/sendo terra/erva/ou flor».

Temos pois, aqui, alguém que é um símbolo das mulheres em luta pelos seus direitos – por vezes, também, o direito a uma pátria. Fadwa Tuqan nasceu em Nablus, em 1917, e aí morreu no final de 2003. Foi uma das poucas vozes femininas na poesia palestina. Começando por escrever em moldes tradicionais foi umas das pioneiras no uso do verso livre na poesia árabe.

Nos seus escritos iniciais e na autobiografia que viria a publicar, aborda a sua luta pessoal como mulher na sociedade árabe. A partir de 1967, a ocupação dos territórios da Palestina e a opressão crescente orientam a escrita de Fadwa Tuqan para uma poesia patriótica e nacionalista, tendo o seu trabalho sido reconhecido com diversos prémios internacionais.

Reencontrei Fadwa Tuqan num interessante blog de poesia valenciano que tenho por hábito frequentar e, portanto, a ideia de aqui a recordar não parte de mim. Mas já é minha a ideia de traduzir (recorrendo à versão castelhana) e partilhar este seu poema. De uma mulher, sobre agredidas mulheres:

Vinte anos depois

Aqui o rasto das pegadas se detém;
aqui a lua
encontra-se com os lobos, os cães e as pedras,
atrás das pedras e das tendas, atrás das árvores.
Aqui a lua
vende o seu rosto todas as noites,
por um punhal, uma vela, um entrelaçado de chuva.
Não atires uma pedra para o fogo;
não roubes os anéis de vidro
dos dedos das ciganas.
Elas dormiam, tal como os peixes e as pedras e as árvores.

Aqui o rasto das pegadas se detém;
aqui a lua estava a dar à luz.
Ciganas!
Devolve-lhes os anéis de vidro
e as pulseiras azuis.

Faz pois todo o sentido, neste quadro, lembrar a iniciativa da Câmara Municipal de Almada e do MPPM (Movimento pelos Direitos do Povo Palestino e pela Paz no Médio Oriente) que promovem uma Mostra de Cinema Palestino subordinada ao tema «Realidade e Memória», com filmes do realizador Michel Khleifi. Integra-se no programa dos «Dias da Palestina» que a autarquia está a organizar com a Missão Diplomática da Palestina.

Os «Dias da Palestina» começaram a 2 de Março e prolongam-se até 19, no Fórum Municipal Romeu Correia (Praça da Liberdade, Almada), com o seguinte programa (começarei por 4 de Março):

Sábado, 4 de Março, 16h, Auditório Fernando Lopes-Graça – Casamento na Galileia, de Michel Khleifi, ficção (1987), filme inédito em Portugal, vencedor da Concha de Ouro no Festival Internacional de Cinema de San Sebastian e do prémio FPRESCI em Cannes, entre outros. No final da sessão o realizador conversa com a assistência. Entrada livre.

Quarta, 8 de Março, 21h, Sala Pablo Neruda – Conferências: A Mulher na Sociedade Contemporânea (Shahd Wadi fala de «O Corpo das Mulheres Palestinianas entre duas Resistências»; «Direitos Abstractos e Conflitos Concretos» é o tema da intervenção de João Luís Lisboa).

E, continuando a falar na Mulher, vem a talhe de foice lembrar que o Movimento Democrático de Mulheres (MDM) tem convocada uma manifestação para o dia 11 de Março em Lisboa. Razões: «a melhoria das condições de vida» das mulheres, uma vez que «o direito ao trabalho, à igualdade salarial, à maternidade e paternidade, o direito das crianças às escolas, creches, tempos livres» bem como os direitos das mulheres à segurança social em situação de desemprego, maternidade, doença profissional, deficiência, pobreza e velhice são, em boa verdade, direitos por concretizar em plenitude.

Outra mulher: a «Mulher da erva» e o seu cantor (contra os «primos convexos»)

Corria o ano de 1971. José Afonso lançava uma das suas obras-primas: o álbum Cantigas do Maio, que haveria de ficar como um sólido pilar da resistência musical e poética ao fascismo. Lá estava «Grândola» que se transformaria no hino da Revolução de Abril. E lá estava essa pérola (para muitos, uma das duas ou três mais belas melodias do Zeca) que é «Mulher da erva» – admirável tributo a uma velha mulher do campo, vítima de uma exploração muito mais antiga do que ela própria.

Como não convidar todas e todos a regressar esta semana à escuta, atentíssima, desta obra magna que é Cantigas do Maio? Pela razão que nos comanda, hoje, e que é a Mulher, mas também porque 30 anos correram sobre a morte do cantor de Abril e porque o que passou nos media no passado dia 23 de Fevereiro foi, como era de esperar, sol de pouca dura. Continuam a ouvir as cantigas do Zeca na rádio ou nas televisões? Claro que não. Outras «músicas» se levantam. Pois bem, evoquemos a sua obra imensa.

Desde os seus primórdios coimbrões – marcados pelo benigno ascendente do chamado fado de Coimbra –, as canções de José Afonso sempre foram a simbiose perfeita de três dons: uma poesia singular, uma voz única (de timbre e coloração inconfundíveis) e um inato talento para a melodia.

E ao falarmos de melodia, e também de ritmos, não é possível esquecer a fidelidade desta música às raízes mais profundas da música popular portuguesa, mas também a sua dívida em relação aos ritmos da África e do Brasil, para não falar da irmã Galiza – que sempre soube homenagear este nosso cantor com espectáculos, com discos, com versões recriadas das suas canções e até com uma lápide no Auditório da Galiza, em Santiago de Compostela.

Mas, a par da qualidade musical intrínseca e da perenidade das cantigas (reinterpretadas por tantos artistas: Vitorino e Janita, Cristina Branco, Jacinta e tantos outros), também nos toca e nos marca, cada vez mais fundo, a indissipável aura de José Afonso como antifascista, democrata, lutador radical por um socialismo verdadeiro. Toca-nos e serve-nos de exemplo a sua dimensão humana de companheiro fraterno e solidário, disponível para todos os combates em prol dos deserdados e injustiçados deste mundo: os pobres, os sem-terra, os povos em luta pela sua dignidade e independência, os guerrilheiros da esperança.

José Afonso ridicularizou como ninguém o salazarismo, mais tarde a rede bombista e a recuperação capitalista após o 25 de Novembro, depois a vertigem da CEE. Mas cantou também o amor, a amizade, os direitos da mulher. E, além de ter posto em canção poemas de outros (Camões, Lope de Vega, Pessoa, Pignatelli, Mutimati Barnabé João – que era António Quadros –, Fernando Miguel Bernardes…), vazou tudo o que foi dito e mais em versos e melodias de alta temperatura musical e poética, mesmo naquelas composições em que não renegou a sua intimidade, a sua experiência pessoal e contradições, e se deixou imbuir (e bem) dos influxos do surrealismo, de um aparente nonsense ou do espírito das facécias populares.

Por muito que muitos o prefiram ignorar, a imagem, a voz e a obra de José Afonso converteram-se em símbolos do 25 de Abril (será necessário recordar ainda o «Venham mais cinco», «Os índios da Meia-Praia», a «Utopia»?), expressão da resistência de um povo em combate pela liberdade e por uma vida digna.

Trinta anos após a sua partida (nasceu em Aveiro, em 2 de Agosto de 1929 e morreu em Setúbal, em 23 de Fevereiro de 1987), a música de José Afonso está mais viva e actuante do que nunca. Venceu, como poucas, a lei da morte e o efémero. Muitos a guardam na memória e em cassetes, velhos discos de vinil e CD. E continuam a escutá-la. Isto porque a rádio, a nossa rádio, quase a silenciou na sua condescendência com a mediocridade, o fácil, o insidioso pensamento único.

José Afonso, esse, está vivo. E bem vivo. A prova é ter-nos deixado preciosos recados para o tempo em que vivemos. Um tempo de «primos convexos» que não parecem aperceber-se das «plantas carnívoras» e dos “corvos” que, cada vez mais, os/nos cercam e «trincam os calos»: bancos e alta finança, grandes grupos económicos, senhores gestores da riqueza deles e da miséria dos outros, agências de rating (espécie de rottweilers do capitalismo), directórios políticos da União Europeia – peritos em garrotear os povos – e os seus representantes em Portugal. Deixo, por isso, um poema de José Afonso adequado aos dias de hoje:

Tenho um primo convexo

Tenho um primo convexo
Fadado para amnistias

Em torno dele nadam
Plantas carnívoras
Agitando como plumas
As cordas violáceas
O meu primo dormita
Glu glu entre palmeiras
Suspenso numa rede
De suor e preguiça
Corvos bicam-lhe os pés
Trincam-lhe os calos
Enquanto a tarde jaz
E a mão suspende
O gesto de acordá-lo
E a terra treme
Mas de nada o meu primo se apercebe

Fica também a cantiga, para quem a queira escutar numa nova versão de Sofia Vitória e Júlio Pereira e, depois, na versão original de José Afonso, editada no Natal de 1974, no álbum O Coro dos Tribunais.

O 10.º aniversário de O Tempo das Cerejas

E, já que falamos de resistentes, como não sugerir aqui uma visita a O Tempo das Cerejas, de Vítor Dias, por ocasião do 10.º aniversário do blog? – esse imprescindível instrumento de análise do presente (às vezes do passado), lição de memória e de cultura (nomeadamente musical), prova viva de acordadíssima inteligência crítica. Palmas, e muitas, para O Tempo das Cerejas por estes dez anos, feitos a 27 de Fevereiro 2017, durante os quais nos tem ensinado a pensar e a conhecer. Ficamos todos à espera do próximo aniversário.

Porto, Casa da Música, e a memória de um imenso solo de sax alto

E, por falar em música – em que O Tempo das Cerejas é fértil (não por acaso vai buscar o nome a uma velha canção que todos os revolucionários conhecem de cor) – lembra-se a leitora ou o leitor amante de jazz do famoso solo de sax alto, longo de 8/9 m, que é possível escutar em «Human nature» (tema originalmente gravado por Michael Jackson), no álbum, de Miles Davis, Live around the world?

Recordará também que é esse o disco em que se guardam algumas das derradeiras actuações (1988-1990) do genial trompetista norte-americano. Pois bem, é o autor desse solo, Kenny Garrett, que será possível ouvir, com o seu quinteto, na Casa da Música, no Porto, no próximo 15 de Março, pelas 21h, na Sala Suggia. Se puder, não perca a oportunidade de escutar este senhor saxofonista e flautista (que alinhou também ao lado de Chick Corea, John McLaughlin, Freddie Hubbard, Woody Shaw ou Donald Byrd).

E teatro: em Espinho, Gafanha da Nazaré, Trancoso, Coimbra, Porto…

Conhece as Marionetas da Mandrágora, sediadas em Espinho, e as suas prodigiosas marionetas e maquinetas de palco? Pois vá ver esta activíssima e criativa companhia de mulheres (mas não só), que também gosta de trabalhar com escolas, ao Centro Multimeios de Espinho (espectáculo Conchas), no dia 11 de Março, de manhã. Já outro dos espectáculos do reportório da companhia, «Breve História de Portugal», estará em cena a 5 de Março, na Fábrica das Ideias da Gafanha da Nazaré e, a 12, em Trancoso.

Já agora, vá ver também na Gafanha (freguesia de Ílhavo) a Mostra de Robertos e Marionetas criada em 2013, tendo como ponto de partida o trabalho e espólio do artista popular Armando Soares Ferraz, nascido na vila em 1923, e um dos últimos fantocheiros. A mostra «pretende preservar esta memória e, simultaneamente, ser um estímulo à criação de novos projetos e textos para estas personagens do imaginário de todos».

Em 2017, a Fábrica das Ideias apresenta, neste quadro, «um conjunto de acções que vão desde os espectáculos à formação, passando por animações de rua, exposições, conversas e oficinas de criação» – lê-se na informação disponível no sítio da Câmara de Ílhavo.

Se estiver por Coimbra, fique atenta/o ao programa de Março da Escola da Noite. Cito: «Faz escuro nos olhos, uma criação do Teatro Griot dirigida por Rogério de Carvalho, é apresentada em Coimbra nos dias 16 e 17 de Março e é o principal destaque da programação mensal do Teatro da Cerca de São Bernardo». Trata-se de um espectáculo dirigido por Rogério de Carvalho, montagem de textos a partir de diversos autores, como Sigmund Freud, Virginia Woolf, Breyten Breytenbach ou Howard Barker. «Um espectáculo que procura a cadência por detrás dos alvos e dos efeitos da violência, na fronteira entre o ruído e o silêncio», lê-se na informação disponibilizada. 

Finalmente, no S. João, do Porto, estreia a 9 e fica em cena até 18 de Março Veraneantes, de Maximo Gorki, espectáculo do Ao Cabo Teatro, com encenação de Nuno Cardoso

Em Santo Tirso, escultura sempre

3 de Março é a data de início da exposição «Quinze Escultores» que ficará patente até 28 de Maio e pretende mostrar um pouco da obra realizada pelos 15 escultores portugueses representados no Museu Internacional de Escultura Contemporânea de Santo Tirso. Representados estão Alberto Carneiro, António Campos Rosado, Manuel Rosa, Zulmiro de Carvalho, Carlos Barreira, Rui Sanches, Ângelo de Sousa, Rui Chafes, José Pedro Croft, Fernanda Fragateiro, Pedro Cabrita Reis, José Barrias, Ângela Ferreira, Carlos Nogueira e José Aurélio.

Alguns filmes nas salas

Stefan Zweig: Adeus, Europa, de Maria Schrader; os magníficos Paris Texas e As Asas do Desejo, de Wim Wenders, em reposição; O Vendedor, do iraniano Asghar Farhadi; A Mulher Canhota, de Peter Handke. A registar ainda: São Jorge, de Marco Martins, estreia nos cinemas a 9 de Março.

Por último, livros e seus autores

Em Espinho, dia 4 de Março, sábado, José Viale Moutinho estará à conversa com os leitores na Sala Polivalente da Biblioteca José Marmelo e Silva. Assunto: as suas duas últimas novelas, a saber, A Batalha de Covões (Editora Teodolito) e Quatro Manhãs de Nevoeiro (Edições Afrontamento). O encontro está integrado na Semana da Leitura da Rede das Bibliotecas de Espinho.

Em Sintra, a programação da Casa do Chá dos Hipopómatos na Lua, dirigida a miúdos e graúdos, promete. No âmbito do ciclo Periferias, 8 de Março – workshop de marionetas «Pássaros migrantes» com Ana Sofia Gonçalves; 9 de Março – workshop «Pergunta! Exclamação! Ponto: Pedra! Papel? Tesoura» com o ilustrador André da Loba; 10 – conversa com o escritor David Machado e workshop «Acho que posso ajudar a desenhar o vento», orientado pela ilustradora Mafalda Milhões. Depois, a 14, haverá encontros na Biblioteca, que fica mesmo ao lado da Casa do Chá, em torno do livro Versos que Riem (Calendário de Letras) com oficina orientada pela ilustradora Ana Biscaia. E o programa continua, neste mês de Março, que é o mês da Poesia.

A 10 e 11 de Março, no auditório da Escola Superior de Educação do Porto (Rua Dr. Roberto Frias, n.º 602) decorrem os 22.ºs Encontros Luso-Galaico-Brasileiros do Livro Infantil. Quem queira poderá ainda inscrever-se: basta dirigir-se a [email protected], ao cuidado da Comissão Organizadora, e aparecer. Estão previstas as presenças de André Letria (ilustrador e editor da Pato Lógico), Raquel Patriarca (autora de livros cartonados e ilustrados para os mais pequenos, além de investigadora), Pepe Carreiro (ilustrador galego de Os Bolechas), além de diversos investigadores universitários portugueses, galegos e brasileiros, como Blanca-Ana Roig Rechou, Maria Jesús Agra Pardiñas, Isabel Mociño González, Ana Margarida Ramos, Sara Reis da Silva, Madalena Teixeira da Silva, Diana Navas, bibliotecários, como Inês Vila, e vários outros intervenientes.

O tema central dos Encontros é «Os primeiros livros», ou seja, os livros para pré-leitores e leitores iniciais. Uma boa ocasião para discutir as questões da promoção do livro e da educação literária orientadas para as primeiras idades.

Uma das investigadoras presentes, Sara Reis da Silva (Universidade do Minho) apresentará, por seu lado, no dia 18 de Março, à tarde, a sua última obra ensaística na livraria Gigões & Anantes, em Aveiro. Intitula-se Capítulos da História da Literatura Portuguesa para a Infância e tem a chancela da Tropelias & Companhia. Na mesma tarde, logo a seguir, é apresentado o livro infantil Versos que Riem (Calendário de Letras), com a presença da ilustradora Ana Biscaia.

Duas sugestões de leitura, a terminar. Jovem investigador doutorado na área da Sociologia, e já com considerável obra publicada, intelectual inquieto e interessado em questões dos domínios da Filosofia e das Artes, Bruno Monteiro acaba de prestar à cultura portuguesa um notável serviço com a (difícil) tradução a partir do original alemão de uma antologia dos aforismos do grande Karl Kraus (1874-1936) – uma das figuras de proa da intelectualidade vienense da viragem do século XIX para o século XX, autor de Os Últimos Dias da Humanidade, obra maior da literatura mundial, recém-traduzida para português por António Sousa Ribeiro que, já em 1987, vertera alguns dos aforismos de Kraus, em O Apocalipse Estável. Aforismos.


Com o título Pro Domo et Mundo. Aforismos, a nova edição tem a chancela da Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto, que prossegue a bom ritmo a sua actividade editorial. Muito informado, rigoroso e bem estruturado é o prefácio de Helena Topa; a edição inclui ainda um texto final de Jacques Bouveresse.

Mestre da escrita aforística, Kraus é um satírico impiedoso que elege como alvos o jornalismo (que actualidade crescente!), a sociedade vienense, as questões de moral, certa arte e certos artistas, bem como a psicanálise que então emergia, também em Viena, pela mão, ou antes, pela mente de Freud e dos seus discípulos. A 13 de Março, 2.ª feira, pelas 18h30, na Livraria Leituria, em Lisboa, Nuno Venturinha apresentará a obra, na presença do tradutor e da prefaciadora. Um pérola como exemplo: «Uma piada cultural atrevida gerou a "universidade jornalística". A honestidade social devia reclamar a escola de comércio jornalística.» (p. 39).

Igualmente de festejar é a reedição, pela Companhia das Letras, de A Rosa do Povo, de Carlos Drummond de Andrade (Itabira, 1902 – Rio de Janeiro, 1987), sem qualquer dúvida um dos livros maiores da poesia de língua portuguesa publicada no século XX, com poemas inesquecíveis como «Consideração do poema», «Procura da poesia», «Nosso tempo», «Caso do vestido» e tantos outros.

Uma linguagem poética absolutamente nova e surpreendente – ainda hoje –, lúcida e reveladora, de quem, em 1962 (e como lembra Arnaldo Saraiva num seu ensaio), apontava como linhas temáticas principais na sua escrita poética, entre outras, o indivíduo, a terra natal, a família, os amigos, o choque social, o conhecimento amoroso, a própria escrita poética, o ludismo.

Publicado em 1945, A Rosa do Povo é a obra de Drummond em que se reflectem, de forma mais viva, os efeitos da Segunda Guerra, a transformação vivida pelo mundo entre 39 e 45, a vida nas cidades, as tensões do amor e da morte, o coração sempre gauche do grande itabirano, que escreve, a abrir o poema «Nosso tempo», «Este é tempo de partido, / tempo de homens partidos», e que o remata com estes outros versos memoráveis: «O poeta / declina de toda a responsabilidade / na marcha do mundo capitalista / e com suas palavras, intuições, símbolos e outras armas / promete ajudar / a destruí-lo / como uma pedreira, uma floresta, / um verme.»

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