O número de mortos provocado pelo furacão Matthew, o mais poderoso desde 2007, varia de estimativa para estimativa. Certo é que o número de vítimas mortais ascende a mais de um milhar. Nenhuma delas é cubana.
A região caribenha, bem como a costa leste dos Estados Unidos da América, está sujeita a um regime climatérico que torna relativamente comum a formação de tempestades tropicais e furacões e as suas populações são recorrentemente fustigadas pelos ventos ciclónicos e pelas chuvas torrenciais que destroem tudo à sua passagem.
De Tiburon, Haiti, a Guantánamo, Cuba, o poder destrutivo do furacão foi suficiente para arrancar do solo as árvores, as casas, e remover de muitas estruturas as coberturas. As comunicações e a electricidade foram interrompidas na maior parte das zonas afectadas. Quando o furacão atingiu os Estados Unidos da América, onde provocou quatro mortes, a sua intensidade era já bastante mais baixa.
O Haiti está a lidar com focos de cólera e um potencial surto desde a passagem do Matthew na primeira semana de Outubro. Mais de um milhão de pessoas ficou sem nada e a situação é de verdadeira calamidade em todas as dimensões, particularmente no que toca à saúde pública e à situação social e humanitária. O país mais pobre de todas as Américas foi devastado e não tem capacidade de lidar com os problemas criados pelo furacão.
A ajuda internacional – se chegar e for suficiente – será, uma vez mais, a única salvação para um povo que em 2010 sofreu com o tremendo abalo sísmico que destruiu praticamente toda a capital. Os milagres do capitalismo estão à vista: 80% da população vive abaixo do limiar de pobreza e 54% vive em situação de pobreza extrema e um Estado incapaz de dar resposta a recorrentes problemas que resultam de catástrofes naturais.
Curiosamente, por cá nunca ouvimos falar da situação desse povo que tão perto de Cuba e que tão fortemente contrasta com a forma como Cuba se organiza. Numa região em que o clima e a geologia são semelhantes, a contagem de vítimas tem diferenças abismais.
É comum que a comunicação social dominante compare a República de Cuba com a Europa Ocidental, mas nunca ouvimos ou lemos a comparação ajustada ao contexto. Não será de estranhar, dada a capacidade que o povo cubano tem demonstrado de afirmar o humanismo inerente ao processo revolucionário e à construção do socialismo. Graças a um eficaz sistema de protecção e evacuação, os cubanos, apesar de muitas cidades terem sido inteiramente devastadas, não perderem um único, homem, mulher ou criança nas águas torrenciais ou nas rajadas do Matthew.
«Há um outro significado no comportamento da comunicação social face às catástrofes naturais que assolam o globo, significado que reside na forma como é tratada a realidade cubana e a resiliência com que o povo e as instituições de cuba lidam sistematicamente com a devastação das infra-estruturas e com a protecção civil do seu povo ante as catástrofes»
Sobre um furacão que já provocou mais de um milhar de mortos, talvez por apenas quatro terem sido vitimados em território norte-americano, julgo que se pode dizer que a atenção mediática, não tendo sido inexistente, não foi sequer comparável à que foi dada a outros furacões de intensidades e consequências semelhantes.
Talvez o povo do Haiti não mereça a mesma solidariedade e preocupação que o povo da Carolina do Sul na bitola da nossa comunicação social. Essa discrepância, bem patente na cobertura televisiva, mas não só, tem um significado político em si mesma. Mas há um outro significado no comportamento da comunicação social face às catástrofes naturais que assolam o globo, significado que reside na forma como é tratada a realidade cubana e a resiliência com que o povo e as instituições de cuba lidam sistematicamente com a devastação das infra-estruturas e com a protecção civil do seu povo ante as catástrofes.
O tsunami do Índico de 2004, causador de uma onda de destruição que atingiu vários países, mereceu uma atenção mediática concentrada nas estâncias turísticas. O Katrina, 2005, que levou a miséria a milhares de norte-americanos abandonados pelo seu próprio Governo, mereceu uma tremenda cobertura mediática, quase ao estilo da promoção de uma produção de Hollywood sobre desastres naturais. Hoje, o Haiti é notícia bastante mais tímida, como que por embaraço em não falar disso. E Cuba nem merece menção, apesar da exemplar forma de se organizar perante a adversidade da natureza.
«A mais bela construção de uma Revolução são os homens e mulheres que ela produz.» E, no caso de Cuba, a organização da sociedade de homens e mulheres que centra no seu próprio bem-estar o funcionamento. A organização, o Estado e a política em função do Ser Humano salva-vidas.
Um Estado – como o Haiti – ao serviço dos grandes grupos económicos, da corrupção, do crime organizado, nas mãos do capitalismo transnacional é bem tratado na comunicação social, ou nem mencionado, mas o seu povo sucumbe à cólera do capitalismo.
Um Estado – como Cuba – ao serviço das pessoas, dos trabalhadores, constantemente criticado pela comunicação social dominante, salva o seu povo da miséria e da morte com a construção do socialismo. Distam cem quilómetros um do outro.
Não afirmarei, para que não venha a fácil acusação de «teórico da conspiração», que toda a desigualdade com que são tratados os mortos por esse mundo fora é pensada nos gabinetes dos grandes capitalistas e transmitida para as redacções da comunicação social – que lhes pertence – como orientação jornalística. Ficará ao critério de cada um julgar por que não é notícia igual um milhar de mortos, onde quer que tombem, tal como ficará ao critério de cada um julgar por que motivo o facto de Cuba resistir de forma tão humana às forças da natureza, quanto firme resiste às forças do império norte-americano, nunca é notícia.
Os povos da República Dominicana, Haiti e Cuba têm nas suas mãos a reconstrução das suas vidas, das suas casas, das suas cidades, aldeias e vilas. A grande diferença é que os cubanos não perderam vidas para esse recomeço e tiveram, antes e depois do furacão, um Estado ao seu serviço, das pessoas.
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