À medida que o projecto da Lei da Saúde e dos Cuidados avança, depois de ter sido apresentado, em Julho, pelo governo conservador britânico, sobe de tom a oposição de vários sectores progressistas e de esquerda, que vêem na «lei do assalto corporativo» ao National Health Service (NHS; serviço nacional de saúde) uma forma de aprofundar a sua privatização e de colocar áreas-chave da saúde pública nas mãos dos privados.
Esta semana, um deputado do Partido Trabalhista exigiu a reversão da privatização do NHS, bem como a supressão do projecto de lei conservador, refere o Peoples Dispatch. Reclamou ainda o financiamento adequado do serviço nacional de saúde, incluindo um aumento salarial de 15% para os seus funcionários.
Organizações como We Own It e Unite the Union, iniciativas e campanhas como Save the NHS e Just Treatment também têm estado activas e a expressar as suas preocupações sobre o projecto de lei, acusando o governo de Johnson de usar a pandemia de Covid-19 para privatizar serviços importantes do NHS.
O governo britânico defende a necessidade de reorganizar o sistema, aproximando os hospitais do apoio social e atribuindo um papel mais formal às empresas privadas na «colaboração» com o serviço público – que já detêm.
Os oponentes afirmam que a referida reorganização – que irá dividir o NHS em 42 unidades integradas, «cada qual com o seu orçamento apertado» – significa um aprofundamento da privatização do sistema, quando, no contexto da pandemia, se exige um maior investimento público.
O projecto de lei, que já foi aprovado na Casa dos Comuns duas vezes em Julho, encontra-se na fase da Comissão, prevendo-se que seja submetido a uma terceira votação em Outubro. De acordo com a fonte, o governo de Boris Johnson quer lançar a «reforma» a todo o vapor em Abril do próximo ano.
«Esta não é a receita de que necessitamos»
Numa declaração proferida na terça-feira, Jacalyn Williams, responsável da área da Saúde do sindicato Unite the Union, sublinhou que o «NHS é a nossa maior conquista e, depois de uma década de subfinanciamento e de lidar com a pandemia de Covid-19, esta lei não é a receita de que necessitamos». Disse ainda que a lei é um cavalo de Tróia, que vai trazer maior privatização, clientelismo, austeridade, e dará carta branca para «atropelar e vender o NHS».
Por seu lado, a organização Just Treatment afirmou que o projecto de lei vai conduzir o serviço público para um estilo à americana, onde os lucros são postos à frente da saúde, e destacando que lucrar com a saúde das pessoas contraria os princípios do NHS. O organismo lembrou ainda que, entre os muitos poderes que as empresas privadas passarão a ter, está o de decidir aquilo que os trabalhadores ganham, o que significará cortes para enfermeiros e médicos sobrecarregados.
De acordo com as estimativas do Unite the Union, o nível de privatização do NHS em 2018-19 variou entre 7% e 22%, e mesmo o valor mais baixo representou a transferência de 9,2 mil milhões de libras (10,7 mil milhões de euros) do orçamento do NHS para os bolsos dos privados.
«Os utentes e os trabalhadores não querem mais poder corporativo no NHS»
Robert Griffiths, secretário-geral do Partido Comunista Britânico, também criticou a «proliferação de cuidados de saúde privados, a transferência de serviços do NHS para empresas guiadas pelo lucro, a drenagem de recursos do NHS para Inciativas de Financiamento Privado (PFI) e a duplicação dos pagamentos a entidades privadas desde 2010», informa o Peoples Dispatch.
Segundo um inquérito realizado pela campanha We Own It (é nosso) e pela Survation, 76% dos inquiridos disseram que desejavam ver o NHS «restabelecido como um serviço totalmente público», frente a apenas 15% que aceitaram a colaboração privada com a saúde pública.
«Os utentes e os trabalhadores não querem mais poder corporativo no nosso NHS – queremos mais financiamento, uma voz democrática sobre o modo como funciona, apoio adequado aos trabalhadores e o fim dos planos de privatização», afirmou a Just Treatment numa declaração da sua campanha contra o projecto de lei de Boris Johnson.
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