A Suécia rejeitou formalmente a participação numa investigação conjunta de vários países europeus às fugas nos gasodutos Nord Stream, que se verificaram no dia 26 de Setembro, nas zonas económicas exclusivas da Suécia e da Dinarmarca, «isto porque há informações na nossa investigação que estão sujeitas a confidencialidade directamente ligadas à nossa segurança nacional», afirmou Mats Ljungqvist, procurador sueco.
As explosões nos gasodutos Nord Stream 1 e 2 configuram o escalar no clima de confrontação e confirmam a incerteza dos povos face ao futuro. O enquadramento histórico, económico, mas essencialmente político, é necessário para a apreciação dos factos. A 1 de Julho de 2021, o Centro de Pesquisas do Parlamento Europeu escreveu um relatório sobre o Nord Stream 2. O documento que tem como nome «The Nord Stream 2 pipeline - Economic, environmental and geopolitical issues» (O gasoduto Nord Stream 2 - Questões económicas, ambientais e geopolíticas) vem no seguimento de duas resoluções aprovadas no Parlamento Europeu, em 2019 e em 2021, que propunham o fim do novo gasoduto em questão. Eram meramente alíneas, e como tal em ambas as resoluções a argumentação não ia muito longe. O documento elaborado procurava fazer uma contextualização, algo enviesada é certo, mas conseguiu fazer um breve resumo da história do fornecimento do gás natural russo até ao Nord Stream 2 e quase que como por magia, antecipava algumas das discussões hoje tidas. Desde a questão do conflito do leste europeu até à moderna análise maniqueísta, está tudo presente. A verdade é que o documento pode ser lido de forma a compreender melhor os quatro ataques à bomba nos gasodutos Nord stream 1 e Nord stream 2, mas também para compreender os interesses políticos instalados. Percebendo-se a dimensão histórica, política e económica, pode-se entender mais a fundo o que está em causa e como o futuro energético da europa constitui uma vertente de uma guerra que vai além das armas e da confrontação bélica. O The World Factbook, um livro produzido pela CIA que reúne um conjunto de dados sobre diversos países, faz um apanhado da produção de gás a nível mundial. Dados de 2017 indicam que há 97 países no mundo que produzem gás natural. Destes, há dois aspectos que saltam à vista: o primeiro é que os dois países que mais gás produzem de forma destacada são os EUA (772 800 mil milhões m³) e a Rússia (665 600 mil milhões m³); já o segundo aspecto é que nos 97 países figuram 22 países Europeus que, no entanto, tudo somado, produzem apenas 274 mil milhões m³, ou seja, nem metade do que a Rússia produz. Perante este cenário consegue-se entender bem as dificuldades do continente europeu na auto-suficiência da produção de gás. Foi sempre necessário procurar soluções para contrariar algo que parece difícil de contrariar, mesmo atendendo à narrativa da transição energética que muitos tentam vender como quase imediata mas levaria bastantes anos a realizar-se. No que toca a reservas, de acordo com uma Revisão Estatística da Energia Global de 2020 produzida pela BP, a Rússia apresenta-se como o país com a maior reserva de gás natural no mundo, tendo a década de 70 significado um aumento da produção e do fornecimento, colocando a então União Soviética na liderança deste último, após o desenvolvimento da produção na Sibéria e o ínicio da exportação. Em 1984 foi construído o primeiro gasoduto de grandes dimensões que faz a ligação até à Europa. O gasoduto Urengoy–Uzhhorod, começa no campo de gás de Urengoy, localizado na Sibéria, indo até Uzhhorod, no Oeste da Ucrânia, junto à fronteira com a Eslováquia, para depois o gás ser transportado para o centro da Europa. Passados 8 anos, em 1992, começou-se a preparar um novo gasoduto, mas desta vez via Bielorrússia com destino à Polónia e Alemanha. O gasoduto Yamal ainda demorou a funcionar na sua plenitude e somente em 1997 é que chegou o primeiro gás ao país germânico. O custo total de construção do gasoduto foi estimado em 36 mil milhões de dólares. A 2003 foi colocado em marcha o gasoduto Blue Stream que faz a ligação da Rússia à Turquia por via do Mar Negro. A Blue Stream Pipeline B.V., empresa comum da russa Gazprom e da italiana Eni com sede na Holanda, é a proprietária da parte submarina do gasoduto. A Gazprom detém a parte terrestre do lado russo e a empresa energética turca BOTAŞ detém a parte terrestre do lado da Turquia. De forma a reforçar a ligação à Turquia foi construído o TurkStream, também ele via Mar Negro. Acordado em 2016, com construção iniciada em 2017 e com começo a 1 de Janeiro de 2020, o TurkStream vem substituir o South Stream, que fora abortado em 2014, e uma primeira intenção em 2009 de construir um Blue Stream II. Este gasoduto permitiu fornecer gás à Bulgária e por essa via serviria para fornecer a zona dos Balcãs. No meio de tantos gasodutos que partem da Rússia surge por fim o Nord Stream 1 que, acompanhado pelo Nord Stream 2, têm assumido o centro das atenções e da batalha geopolítica. O Nord Stream 1, começado a construir em 2010 e terminado em 2011, faz a ligação directa entre Vyborg na Rússia e Greifswald na Alemanha. Foi inaugurado a 8 de Novembro de 2011 pela chanceler alemã Angela Merkel e o Presidente russo Dmitri Medvedev. O Nord Stream 1 é constituído por dois gasodutos e passa pelo Mar Báltico, passando perto da costa da Finlândia. Cada um dos tubos tem 1200 quilómetros de comprimento e diâmetros aproximados de 1220 milímetros, Nas palavras de Angela Merkel à data da inauguração o projecto era um «marco na cooperação energética» e a «base de uma parceria fiável» entre a Rússia e a Europa. Estavam lançados os dados, uma vez que o Nord Stream 1 passava a ser o gasoduto que mais gás fornecia à Europa e contrariava assim uma dificuldade objectiva para os povos. No total o investimento foi de 14,8 mil milhões de euros, dos quais o financiamento veio 30% de capitais próprios e 70% através de financiamento via banca um pouco por todo o centro da Europa. Para se ter uma ideia, estima-se que em 2021, 40% do gás fornecido pela Rússia para a Europa foi realizado por este gasoduto. Um outro dado importante prende-se com com o facto da União Europeia depender em 43% do gás russo, ficando a Rússia à frente da Noruega (23%) e da Argélia (6%). Apesar disto configurar o que muitos chamam de «dependência energética face à Rússia», o contrário também acontece. No documento referido acima, realizado pelo Centro de Estudos do Parlamento Europeu, é dito que 73% do gás exportado pela Rússia é para a União Europeia, o que indica que a própria Rússia, a determinado ponto, colocou-se dependente da própria dependência. Como tal, após alguns anos de estudo, a Rússia em 2014 assinou com a China um acordo de 30 anos para o fornecimento de gás e o gasoduto chamado Yakutia–Khabarovsk–Vladivostok foi começado a construir nesse mesmo ano, tendo o processo acabado em 2019. Em 2020 a China importou 4,1 mil milhões de m3 e as previsões apontam para que haja um aumento considerável nos próximos anos. Apesar da Rússia ter avançado para a exploração de novos mercados, o europeu manteve-se como o central. Neste seguimento e dado o sucesso económico e político do Nord Stream 1, surge em 2011 a ideia para um novo gasoduto. Depois de muitos avanços e recuos e estudos de diversas possibilidades, em 2015, a Gazprom, a Royal Dutch Shell, a E.ON, a OMV e a Engie chegaram a entendimento para financiar o então Nord Stream 2 apesar das dificuldades impostas pela Polónia, passando toda a construção apenas para a Gazprom. A Alemanha, olhando para os seus interesses, viu com com bons olhos a construção de mais um gasoduto e a construção ficou concluída em Setembro de 2021. Não deixa de ser interessante que, tendo em conta toda a narrativa que hoje é imposta acerca dos Direitos Humanos e os incumprimentos da Rússia, o então porta-voz do também então governo alemão tenha dito, sobre o falso activista russo vendido como oposição quando nunca o foi, que «não há ligação directa entre o caso Navalny e o Nord Stream 2». Já Armin Laschet, que à data era o recém-eleito líder da União Democrata-Cristã (CDU) disse também que não iria reconsiderar o seu apoio ao projecto e, quando pressionado sobre o fornecimento doméstico de energia, disse que «a Alemanha decide»,em resposta a pressões tanto do Parlamento Europeu como dos EUA. Num quadro de competição não é favorável favorecer um inimigo. O povo diz sabiamente para não guardar os ovos todos no mesmo galinheiro e para os aliados Europeus, os ovos não só estavam a ser todos guardados como estavam a ser oferecidos a um rival directo do Ocidente. Esta era e é a leitura dos EUA no que toca ao fornecimento de gás pela Rússia. Aos olhos dos EUA e dos seus aliados, era alegado que o que estava em causa para além da soberania era também a segurança energética da Europa. As tentativas de condicionamento ao Nord Stream 2 estavam sempre presentes, mas apesar disso a construção avançou e foi concluída. Hoje seria apenas necessário um aval técnico, que na realidade é um aval político, para o fornecimento poder começar, não fossem as recentes explosões. Antes de aí chegarmos há a necessidade de traçar a cronologia que explica os desenvolvimentos dos acontecimentos. As sanções em relação a gasodutos enquanto arma de arremesso não são algo novo. Em 1981 a Administração Reagan aplicou sanções à União Soviética aquando da construção de um gasoduto. As sanções passavam essencialmente pela proibição de empresas americanas venderem o material tecnológico necessário para a conclusão do projecto. O modelo de sanções americanas continua semelhante, mas no caso do Nord Stream 2 há o desenvolvimento de instrumentos legais com diversos pressupostos ideológicos que visaram dificultar o processo. Em 2016, oito chefes de Estado de países da União Europeia (República Checa, Estónia, Hungria, Letónia, Polónia, Eslováquia, Roménia e a Lituânia) assinaram uma carta contra o novo gasoduto que já estava em marcha, endereçando-a ao então presidente da Comissão Europeia Jean-Claude Juncker, opondo os seus interesses aos interesses da Alemanha. A razão pela qual houve esta movimentação prende-se pela avaliação de que o Nord Stream 2 iria diminuir ou prejudicar bastante o gasoduto Urengoy–Uzhhorod e como tal colocaria todo o gás necessário nas mãos dos germânicos. A Polónia, por via da UOKiK, que é a sua autoridade da concorrência, afirmou que o novo gasoduto iria aumentar o monopólio da Gazprom sobre o mercado do seu país. Desta forma, e com medo de multas, a Royal Dutch Shell, a E.ON, a OMV e a Engie recuaram com a sua participação directa no negócio deixando de serem accionistas da empresa comum Nord Stream 2 AG, e passaram somente a financiar todo o projecto. Algo estranho uma vez que as intenção polacas seria contrariar o monopólio russo. A Polónia avançou em 2020 para a via legal e pediu uma multa de 6,5 mil milhões de euros à Gazprom e multas entre 6 e 20 milhões de euros aos parceiros no negócio. Tambem pela via legal, a União Europeia procurou travar o projecto numa directiva de gás que desenhou em 2009 e que não permitia que os produtores de gás controlassem em simultâneo a distribuição e a venda. O debate pretendeu-se sobre a origem dos gasodutos como o Nord Stream 2 que começam fora da União Europeia e como tal não estão abrangidos por essa norma. Chegando à conclusão que tal directiva não tinha validade jurídica face aos gasodutos já existentes pois já havia acordos comerciais assinados, procurou-se emendá-la. A Comissão Europeia, o Parlamento Europeu e os 28 Estados Membros chegaram então a um acordo que abrangia o novo Nord Stream 2 e futuros gasodutos, mas não os que já existiam. A aplicação da directiva neste caso ficava ao encargo do regulador de energia nacional alemão. Naturalmente, e uma vez que as obras já tinham começado, a Gazprom via assim os seus interesses condicionados pela actualização da directiva. A União Europeia que defende o neoliberalismo dentro de portas, olhando para os interesses ocidentais, procurou condicionar a economia e a criação natural de monopólios. A Gazprom deixaria de dominar o Nord Stream 2 na totalidade e desta feita, alegando que o projecto tinha começado antes da directiva sofrer emendas, alegou que a directiva do gás não se aplicava neste caso e pediu a isenção da regulamentação. A resposta alemã não acompanhou as pretensões da companhia russa uma vez que, à data da aprovação da directiva, o gasoduto ainda não estava terminado. Isto colocava a Gazprom numa situação delicada, pois ou vendia parte da participação no Nord Stream 2 ou teria que arranjar uma subsidiária independente. Com toda esta teia de dificuldades, acrescem ainda as sanções americanas. Seguindo a posição da Administração Bush relativamente ao Nord Stream 1 e a posição da Administração Obama sobre o Nord Stream 2, a Administração Trump não hesitou em acompanhar os seus antecessores. Na tradição do já referido Reagan, em 2017 foi aprovada uma lei nos EUA chamada Countering America's Adversaries Through Sanctions Act (Lei para Contrariar os Adversários da América Através de Sanções) que, na secção 232, define que o Presidente dos EUA pode impor cinco ou mais sanções a quem conscientemente faça um investimento, venda, arrende ou forneça bens, serviços, tecnologia ou informação para a construção de condutas de exportação de energia russa. Não tendo sido logo aplicadas sanções, a lei poderia ser considerada dissuasora. Na ausência de sanções directas, a construção do Nord Stream 2 avançou rapidamente e em 2018 a Noruega permitiu a construção debaixo das suas águas territoriais. Com este desbloqueio tudo indicava que o gasoduto poderia estar terminado em 2020. A reacção americana era obrigatória e em 2019, com o apoio dos Democratas e Republicanos no Congresso, a Administração Trump conseguiu aprovar o Protecting Europe's Energy Security Act (Lei para Protecção da Segurança Energética da Europa), incluído no National Defense Authorization Act (Lei de Autorização da Defesa Nacional), algo digno de uma ingerência directa de seu nome. Os EUA comprovaram assim que no seu Congresso condicionam as decisões de outros países. Esta lei previa sanções directas a todas as empresas que possuíam navios na construção dos gasodutos Nord Stream 2 e TurkStream, acabando no entanto por não afectar este último uma vez que a construção subaquática já tinha terminado. As sanções americanas tiveram efeitos imediatos no Nord Stream 2, obrigando à paragem uma vez que a empresa suíça holandesa Allseas retirou-se do projecto. Os EUA afinaram ainda mais as suas leis e introduziram mais critérios para impedir também relações comerciais. Mais uma vez, olhando para o passado, parece uma realidade alternativa face ao presente. O ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, Heiko Maas, acusou Washington de se imiscuir na política energética europeia e a Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, também criticou as ameaças às empresas europeias uma vez que, segundo ela, realizavam negócios legítimos. Com todos os impasses, o impensável a determinado momento era a conclusão da construção do Nord Stream 2, mas tal aconteceu em 2021. A conclusão do gasoduto permitiria duplicar o fornecimento de gás para a Europa em 110 mil milhões de m3. A conclusão do projecto deu-se a Setembro mas já em Junho, estando já 95% concluído, os EUA por via do Antony Blinken, Secretário de Estado da Administração Biden, admitiriam que os seus esforços de boicote não tinham sido frutíferos: «Como questão prática, a conclusão física do gasoduto foi, penso eu, um facto consumado» completando com «independentemente de sancionar essa entidade (a Nord Stream 2 AG) e o CEO, isso, a nosso ver, não teria mudado nada em termos da conclusão física». A conclusão de Blinken era a lógica indo ao encontro do momento dadas as evidências e um restabelecimento de boas relações diplomáticas com a Alemanha, apesar de continuar a vigorar a narrativa da segurança energética uma vez que a torneira do gás encontra-se sempre no lado russo. Com o desenvolvimento do Nord Stream 2, os EUA ficavam numa má posição. Começava pela tarefa da Administração Biden de tentar contrariar um declínio relativo cada vez mais claro e passava por ver um rival directo como a Rússia a assumir a dianteira da venda de gás uma vez que o gás natural liquefeito custava mais 40% que o gás natural russo e, como tal, era menos atractivo. Para o Nord Stream 2 passar a funcionar, bastava o tal aval técnico que não seria mais que um aval político de fundo porque constituiria um passo enorme na política energética europeia. Mesmo com o Green New Deal e as metas traçadas de transição energética, o futuro iria passar pelo gás natural. Antevendo dificuldades, os EUA, na busca pela salvaguarda dos seus interesses e com recurso a velhas tácticas de desestabilização e provocação, bem como pela aproximação ao novo governo alemão, procuraram ganhar os seus aliados no quadro da NATO e União Europeia para a única forma de boicotar o Nord Stream 2. A linha passava por unir todos em torno de uma ameaça comum que alegadamente colocaria em causa o modelo de vida ocidental e, através disso, montar uma operação mediática para ter a legitimidade dos povos para determinadas acções e imposição de sacrifícios. Há pelo menos duas declarações que revelam bem um grau de premeditação nas aplicações de sanções mas também a mensagem de que o Nord Stream 2 nunca avançará. Ambas acompanhadas pelos desenvolvimentos na Ucrânia, pois a guerra no país existia desde 2014, já tinha havido um verdadeiro golpe de Estado nesse mesmo ano, que alinhou a Ucrânia ao Ocidente, e os avanços da NATO à volta da fronteira com a Rússia faziam esperar uma resposta russa. Com estes elementos, Biden diz em Fevereiro de 2022, numa conferência conjunta com o Chanceler alemão, que «se a Rússia invadir, isto é, tanques ou tropas que atravessem novamente a fronteira da Ucrânia, então deixará de haver um Nord Stream 2. Acabaremos com isto» e quando um jornalista lhe pergunta como é que o fará, simplesmente reiterou com um «prometo-lhe que seremos capazes de o fazer». Já na declaração oficial do encontro (que é possível ler no site da Casa Branca), Biden revela a táctica. Face às mobilizações da Rússia, começa por dizer que «os Estados Unidos têm trabalhado em estreita colaboração com os nossos Aliados e parceiros para dar uma resposta forte e unificada» e que «a Alemanha tem sido um líder nesse esforço, e temos coordenado de perto os nossos esforços para deter o gasoduto Nord Stream 2 se a Rússia invadisse ainda mais a Ucrânia». Como se tal já não fosse evidente, admite ainda o grau de ingerência afirmando que «após mais consultas estreitas entre os nossos dois governos, a Alemanha anunciou que iria suspender a certificação do gasoduto» e anunciou sanções à Nord Stream 2 AG, complementando com a ameaça «não hesitaremos em tomar outras medidas se a Rússia continuar a escalar». No final da declaração pode-se ler «o Presidente Putin deu ao mundo um incentivo esmagador para se afastar do gás russo e para outras formas de energia» dando já a entender que os EUA esfregavam já as mãos. Os acontecimentos desenvolveram-se e a Rússia inicia o que chama «operação militar especial» em Fevereiro de 2022, mobilizando tropas para as zonas em guerra desde 2014. A partir desse momento há cinco elementos que dominam a situação: a aplicação de sanções à Rússia por parte do ocidente sob a batuta dos EUA; a redução do fornecimento de gás com cortes esporádicos por parte da Rússia; a crise energética evidente acompanhada por uma crise económica, comprovando a teses das crises cíclicas cada vez mais curtas; a degradação de vida dos povos por via de uma inflação especulativa; o envio de milhões de euros para a manutenção da guerra que poderiam resolver problemas urgentes dos povos, revelando os interesses. A guerra que inicialmente foi alvo de uma forte campanha mediática e promoção de uma visão maniqueísta, prolongou-se no tempo. Isto resultou na erosão progressiva, mas lenta, da base social de apoio contra o inimigo comum por via da tal degradação do nível de vida. O próprio Vladimir Putin chegou a dizer que bastava a União Europeia levantar as sanções e o gás iria voltar a circular com normalidade. Algo que a título de exemplo, Judit Varga, ministra húngara da justiça, numa recente entrevista ao Diário de Notícias, até determinado ponto acompanha, dizendo que «(...) não se trata de quem é solidário com a Ucrânia, porque isso é o óbvio. Neste momento, nós precisamos do gás russo. Não tem nada que ver com Putin, nem com a guerra». A União Europeia não tem em cima da mesa grandes soluções. As energias renováveis, a energia nuclear francesa e a transição energética apresentam-se como soluções insuficientes e pouco viáveis. A solução tem passado pela poupança de energia, e definição de tectos de gasto energético, respostas tímidas que vão ficando cada vez mais irrisórias à medida que o Inverno se aproxima. A situação assume grandes traços de complexidade e o mais fácil seria ceder à Rússia levantando algumas das sanções. Eis que então chegamos à actual situação no fornecimento de gás russo. A situação que se configurava delicada mas não irreversível escalou para patamares de incerteza onde a cautela nas acusações deve ser tomada, mas a leitura também tida em conta. As recentes explosões nos quatro canais que perfazem o Nord Stream 1 e 2 são, para além do evidente, acções que configuram o terrorismo em águas altamente vigiadas e ao alcance de poucos. Alguns não hesitaram em dirigir acusações à Rússia. Constate-se que, numa altura em que quase todas as acusações [à Rússia] são quase unânimes, poucos quiseram chegar-se à frente nesta, dada a delicadeza do ataque, a ausência de provas, a desinformação que é usada como uma arma de guerra e tudo o que está em jogo. Consegue-se fazer questões mas pouco mais. Questões como por exemplo: se a torneira está do lado da Rússia, qual é a vantagem em destruir o seu trunfo? Podemos até colocar elementos em cima da mesa como: o dia em que se dá a primeira explosão é o mesmo dia da estreia do novo Gasoduto Báltico que faz a ligação entre a Noruega e a Polónia. Podemos também considerar algo estranha a reação de Radek Sikorski, actual deputado no parlamento europeu e antigo ministro da Defesa e Relações Externas polaco, que agradeceu aos EUA na rede social twitter fazendo acompanhar o agradecimento com uma imagem das águas do Báltico após a explosão. Podemos ainda considerar estranho o facto de, após as explosões, Ursula von der Leyen vir propor «investimento adicional» europeu para acelerar projetos na área da energia. O que sabemos com toda a certeza é que há uma clara sabotagem, o mais provável é ter sido terrorismo de Estado e existe o perigo dos gasodutos não voltarem a funcionar. O que se sabe é que as explosões ocorridas perto da Dinamarca e Suécia, após um relatório entregue às Nações Unidas e elaborado por esses dois países, foram realizadas com recurso a centenas de quilos de explosivos, causando danos que podem ser irreparáveis. De acordo com os especialistas, à medida que não se tapam as fugas, a água salgada vai correndo os tubos, danificando os gasodutos. Sabemos ainda que o que está também em causa é um crime ambiental com proporções enormes uma vez que nunca tinha sido expelido para a atmosfera tanto metano como o registado, algo que não está a ser muito difundido. A leitura do ocorrido não é simples e o jogo clássico de culpas está a acontecer da forma que se desenvolve. Os EUA acusam a Rússia e a Rússia acusa os EUA. Há no meio a União Europeia que tenta reagir, sem agir com vista à solução do conflito e os povos que não sabem o dia de amanhã, num conflito que vai além da Ucrânia e poderá continuar por muitos anos. O elemento de gravidade é o escalar das agressões e provocações que pode traduzir-se em casos ainda mais graves que os das explosões dos gasodutos e ganhar formas catastróficas. Vivemos actualmente a receita para tempos difíceis e perigosos. Um sistema capitalista preso nas suas contradições, que desde 2008 não consegue ultrapassar a crise e vê períodos de estabilidade cada vez mais curtos, graves retrocessos na vida dos povos, uma União Europeia que não abdica do dogma neoliberal e da lógica de confrontação, uma NATO que continua a ser fiel à sua essência e caminha no sentido do alargamento e um bafo fascizante que vem ascendendo alimentado por tudo isto de forma a salvar tudo menos os povos. A segurança dos povos dependerá do grau da sua luta. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Internacional|
Republicação
Nord Stream 1 e 2, as explosões e o futuro energético
Fornecimento de gás para a Europa
Nord Stream 2, as sanções e as ameaças
A actualidade, sanções, explosões e a incerteza
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Esta investigação seria desenvolvida ao abrigo da agência de cooperação judiciária Eurojust, que inclui acordos jurídicos ao abrigo dos quais a Suécia teria de partilhar informações sobre os resultados sua própria investigação, mesmo que os considerasse confidenciais.
Segundo a emissora pública alemã, a ARD, a Dinamarca também terá recusado a criação de uma equipa de investigação conjunta.
Embora a Alemanha tenha demonstrado interesse em participar numa investigação conjunta às causas, frequentemente associadas a uma acção de sabotagem, também o estado alemão alinha no secretismo europeu sobre as informações que detém sobre a situação.
Em resposta a pedidos de informação da deputada Sahra Wagenknecht, eleita pelo Die Linke (A Esquerda), sobre as fugas no Nord Stream, o governo alemão recusou-se a prestar qualquer esclarecimento: «após cuidadosa consideração, o governo federal chegou à conclusão de que não podem ser fornecidas informações - nem mesmo de forma confidencial - por razões de bem-estar do Estado».
«A informação solicitada afecta interesses de confidencialidade que, neste caso, requerem protecção extraordinária, de tal forma que, excepcionalmente, o bem-estar do Estado supera o direito dos membros do parlamento à informação», considerou o Ministério dos Negócios-Estrangeiros alemão.
A deputada tinha requerido informação sobre todos os navios e tropas da NATO que estavam estacionadas na zona do Nord Stream, nos dias que antecederam as fugas. Foi também solicitada a divulgação de informação sobre qualquer navio da Rússia que tivesse sido avistado na zona. A Alemanha escolheu o silêncio, cúmplice.
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