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Vale condenada a pagar 162 mil euros por cada trabalhador morto em Brumadinho

Mais de dois anos após a chamada tragédia de Brumadinho, em Minas Gerais, a Vale foi condenada em primeira instância a indemnizar as famílias de cada trabalhador morto – 137 no total.

No dia 25 de Janeiro de 2019, a Barragem I da Mina Córrego do Feijão cedeu, libertando 12 milhões de metros cúbicos de resíduos da exploração mineira 
Créditos / Brasil de Fato

A decisão é da juíza titular da 5.ª Vara do Tribunal Regional do Trabalho em Betim, Vivianne Celia Ferreira Ramos Correa, e beneficia os herdeiros dos 137 trabalhadores directamente ligados à empresa de mineração vitimados pela ruptura, em 25 de Janeiro de 2019, da Barragem I da Mina Córrego do Feijão, localizada em Brumadinho (estado brasileiro de Minas Gerais) e administrada pela empresa Vale desde 2003, que provocou a morte a 270 pessoas.

A decisão judicial foi tomada na sequência de uma acção colectiva avançada pelo Sindicato Metabase Brumadinho, que requeria o valor três milhões por danos morais por trabalhador morto, informa a Rede Brasil Atual.

Como a sentença foi tomada em primeira instância, é passível de recurso. Além disso, revela a fonte, em nota divulgada à imprensa, a empresa ignora a decisão judicial, afirmando ser «sensível» à situação dos atingidos e que, por esse motivo, estaria a realizar acordos para «garantir uma reparação rápida e integral».

Quatro minutos de lucro por trabalhador

O escritório Garcez, que representou o sindicato, afirmou, também numa nota, lamentar o teor da resposta da empresa de mineração. «A Vale, ao contrário da nota divulgada após a sentença, continua agindo de modo cruel e insensível quanto ao terrível sofrimento que causou aos trabalhadores mortos. Faz acordos multibilionários com o Estado de MG [Minas Gerais], tratando de questões sem relação com o sofrimento dos mortos, e destina zero centavo até o momento para tal dano», critica o escritório de advogados.

«Se a empresa for mesmo sensível como afirma na nota, seguramente cumprirá a sentença espontaneamente», destaca a defesa dos familiares, de acordo com a qual a indemnização de 137 milhões de reais significa 9,7 horas do lucro da empresa, ou seja, 4 minutos e 15 segundos por trabalhador.

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Seis meses depois, vítimas de Brumadinho continuam sem reparação

Há seis meses, a ruptura da barragem do Brumadinho libertou 12 milhões de metros cúbicos de resíduos da exploração mineira. Quase 950 mil pessoas foram atingidas e a reparação teima em não chegar.

A ruptura da barragem da Vale em Brumadinho, na Grande Belo Horizonte, libertou 12 milhões de metros cúbicos de resíduos da exploração mineira; 248 pessoas morreram e 22 continuam soterradas
Créditos / Revista Piauí

No dia 25 de Janeiro deste ano, a Barragem I da Mina Córrego do Feijão, localizada em Brumadinho (estado brasileiro de Minas Gerais) e administrada pela empresa Vale desde 2003, cedeu, libertando 12 milhões de metros cúbicos de resíduos da exploração mineira. Os corpos de 248 pessoas já foram identificados. Outros 22 continuam soterrados pela lama tóxica.

A propósito destes seis meses passados sobre a ruptura da barragem da Vale em Brumadinho, o Brasil de Fato publicou uma peça – a primeira de uma série especial de reportagens – sobre o modo como alguns dos 944 mil atingidos foram afectados e tentam retomar as suas vidas, sobre a luta com a empresa mineira por uma «reparação adeaquada» e os acordos alcançados (alguns dos quais estão em risco), assim como sobre a questão da exploração da Vale no estado de Minas Gerais e o potencial de dano das suas barragens de resíduos.

944 mil atingidos em 18 municípios

As 944 mil pessoas afectadas pela ruptura da Barragem de Brumadinho vivem nos 18 municípios atravessados pelo rio Paraopeba e por onde a lama correu, ao longo de 305 quilómetros.

Em Córrego do Feijão, Sara de Souza Silva é dona da única papelaria da terra, mas a loja não abre desde a ruptura da barragem. Lamenta que a empresa de exploração mineira não tenha agido de forma correcta nem para evitar a avalanche de lama, nem para reparar os danos que causou na localidade, que tem cerca de 400 habitantes e onde 27 morreram na tragédia da barragem.

O Parque da Cachoeira, um bairro que antes era conhecido pela produção de legumes, seis hortas foram engolidas pela lama. Em cada uma delas, com uma dimensão média de 15 hectares, trabalhavam cerca de dez famílias.

A de Adriana Leal, com 18 hectares, produzia hortaliças que abasteciam a capital do estado, Belo Horizonte (a 60 quilómetros), envolvendo 11 famílias. Todos ficaram sem rendimentos, sem terra para plantar e sem água para irrigar. Ao invés, ficaram com as dívidas dos financiamentos e dos fornecedores, revela o Brasil de Fato.

Críticas à Vale

Eloá Magalhães, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) na região de Brumadinho, fala do esforço feito para que o levantamento dos prejuízos fosse realizado por instituições públicas, sem ligação à Vale, considerando que assim haveria maiores hipóteses de garantir os direitos das vítimas do ruptura da Barragem I da Mina Córrego do Feijão.


«Construímos comissões de atingidos dentro das comunidades para poder participar nas negociações do acordo preliminar com a Vale junto ao Ministério Público e à Defensoria Pública. Esse esforço resultou na conquista do auxílio de emergência para uma parte dos atingidos», disse Magalhães ao Brasil de Fato.

De acordo com a Defensoria Pública Estadual de Minas Gerais (DPE), que tem prestado atendimento individual às famílias atingidas desde o dia 28 de Janeiro e constatado a ocorrência de vários danos como consequência da ruptura, 98 146 pessoas recebem da Vale um salário mínimo mensal.

O pagamento está previsto no Termo de Acordo Preliminar firmado entre a empresa mineira e a DPE em 20 de Fevereiro último. No entanto, de acordo com o levantamento feito pelo MAB, o número de beneficiados não abrange sequer 10% do total de atingidos.

Além disso, existem «várias dificuldades com a Vale», como explicou a defensora Carolina Morishita: «Há relatos de funcionários muito educados, mas que não cumprem prazos. Não há respostas, as informações são confusas. Há relatos de violência nas comunidades por parte de funcionários da Vale. Também constatamos a dificuldade de acesso aos direitos já conquistados, como o pagamento de emergência. As pessoas chegam aos pontos de apoio na Vale e recebem a resposta que ela não têm direitos, quando elas têm.»

Acordo em risco

No passado dia 15 de Julho, a Vale aceitou assinar com o Ministério Público do Trabalho (MPT) um acordo de indemnização por danos morais às famílias de 242 vítimas mortais. Pais, filhos e cônjuges dos mortos irão receber 700 mil reais cada (mais de 166 mil euros), enquanto os irmãos terão direito a 150 mil reais (cerca de 35 500 euros).

No entanto, o acordo poderá não entrar em vigor, uma vez que entra em conflito com a reforma trabalhista aprovada durante o governo de Michel Temer, que limita este tipo de pagamento a 50 salários mínimos. O Supremo Tribunal Federal deverá deliberar sobre o tema no dia 3 de Outubro.

Problemas de segurança

Estima-se que existam no Brasil cerca de 24 mil barragens – de resíduos, de geração de energia e para abastecimento de água. Destas, apenas 4500 estão submetidas à Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB) e apenas 3% foram vistoriadas. O Brasil de Fato revela ainda que o sector da fiscalização da Agência Nacional de Águas sofre de défice de funcionários.

A Vale extrai minério de ferro em três estados brasileiros: Minas Gerais, Pará e Mato Grosso do Sul, sendo que Minas Gerais corresponde a 53% da sua produção.

De acordo com os dados da PNSB, existem 114 barragens de resíduos de minério em todo o Quadrilátero Ferrífero, no Centro-Sul de Minas, a que acrescem outra 104 estruturas não cadastradas no plano, entre diques, gabiões e barragens. Deste total, 70 têm alto dano potencial no caso de ocorrência de uma ruptura.

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Para chegar a esta conta, os advogados lembram que o lucro da Vale, apenas no primeiro trimestre de 2021, foi de 30,5 mil milhões de reais. «Tal valor, dividido por 90 dias, significa um lucro diário de mais de 338 milhões de reais. E, dividido por 24 horas, representa mais de 14 milhões de reais de lucro por hora. E por consequência representa mais de 235 mil reais de lucro por minuto, e 3922 reais de lucro por segundo».

«Ou seja, a Vale leva 4 minutos e 15 segundos para lucrar um milhão de reais, valor previsto na sentença para cada trabalhador morto. Ínfimas 9,7 horas de lucro da Vale seriam suficientes para indemnizar os 137 milhões de reais pelo valor previsto na sentença, a ser destinado a cada um dos 137 trabalhadores directos da Vale mortos em Brumadinho, fruto da ganância desenfreada da empresa», refere a defesa dos familiares dos trabalhadores.

Por seu lado, Joceli Andreoli, da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), disse em declarações ao Brasil de Fato que se trata de um passo em direcção à Justiça, mas lembrando que a Vale não pagou integralmente pela catástrofe, que, além das perdas humanas, provocou danos ambientais irreparáveis à bacia do Rio Doce.

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