|Legislativas 2024

Bloco de Esquerda propõe salário mínimo 100 euros inferior ao exigido pela CGTP

Num espírito de conciliação, o Bloco de Esquerda apresentou uma proposta de aumento do salário mínimo (900 euros em 2024) muito inferior ao que é exigido pela CGTP-IN. Trabalhadores querem mil euros já em 2024, BE empurra para 2026.

Créditos / Lusa

É o segundo ano consecutivo em que o Bloco de Esquerda (BE) apresenta uma proposta de aumento do Salário Mínimo Nacional (SMN) inferior ao que já tinha sido anunciado pela CGTP-IN, a maior estrutura representativa dos trabalhadores em Portugal. Seguindo a linha política definida no início de 2023, o BE insiste na aplicação dos 900 euros em 2024: se já era um valor inferior ao exigido pela central sindical em 2023 (910 euros), a diferença tornou-se agora ainda mais significativa, com o Bloco a reivindicar menos 100 euros mensais para os quase 1 milhão de trabalhadores que auferem o SMN.

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Salário Mínimo: Nova direcção do PS quer travar ritmo de aumentos

Pedro Nuno Santos prometeu, com pompa e circunstância, que o Salário Mínimo Nacional chegará aos 1000 euros em 2028. Feitas as contas, a proposta representa um travão no ritmo de aumento do salário mínimo e não passa de um truque de retórica.

O primeiro-ministro, António Costa, e o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, durante o 24.º Congresso Nacional do Partido Socialista, na FIL. 5 de Janeiro de 2024
CréditosAntónio Cotrim / Agência Lusa

«Dar com uma mão para tirar com a outra». No encerramento do 24.º Congresso do PS, o novo secretário-geral, Pedro Nuno Santos, ignorando premeditadamente o contexto e as condições em que o seu partido governou, exaltou um conjunto de juras e promessas, entre as quais o aumento do Salário Mínimo Nacional (SMN).

A proposta merece análise, até porque o que é prometido é sonante: 1000 euros até 2028. Olhando para o número de uma forma isolada pode parecer que o que está a ser propalado é um avanço extraordinário, porém, quando analisado, é um retrocesso objectivo na trajetória de evolução do SMN e uma forma de contrariar as reivindicações dos trabalhadores já em 2024. Importa relembrar que se o ritmo de aumento do SMN já era baixo para fazer face ao aumento do custo de vida, a nova direcção do PS pretende um ritmo ainda menor.

Pedro Nuno Santos vestiu as vestes de um progressista e iniciou o seu discurso com a hipérbole do «PS ser o construtor de Abril», falou do «Estado Social», do interesse colectivo e afastou o individualismo. Numa segunda fase largou o discurso polido e redondo do «socialismo democrático» e procurou dar corpo ao discurso, omitindo no entanto, a legislação laboral e as normas gravosas nela contida. Vincando a falsa dicotomia de «nós (PS) ou eles (direita)», quis apagar todo o rasto de políticas de direita praticadas pelo seu partido.

Acontece que o PS que agora se quer apresentar de cara lavada é o mesmo PS que com uma maioria absoluta negou as respostas aos problemas dos trabalhadores e ante um aumento brutal do custo de vida, os dados indicam que continuará a negar essas respostas, mas com alguma cosmética eleitoralista para ludibriar quem vota. É que 1000 euros até 2028 não é um avanço, mas sim um retrocesso.  

Como se pode ver no gráfico acima, para efeitos comparativos, de 2021 a 2024, o SMN subiu 23,3%, a um ritmo médio de 6,6%. Em 2021 a subida foi de 4,72%; em 2022 a subida foi de 6,01%; em 2023 a subida foi de 7,80% e em 2024 a subida foi de 7,89%. Este apanhado não pode ser isolado até porque nestes anos houve uma perda real dos salários apesar da subida nominal. Se procurarmos enquadrar, podemos ver que em 2023 o SMN fixava-se nos 760 euros e o cabaz alimentar, a 4 de Janeiro do mesmo ano, fixava-se nos 219,40 euros. Assim, podemos concluir que o cabaz alimentar representava 28,89% do SMN. Já este ano, em 2024, apesar da subida do SMN para os 820 euros, o cabaz alimentar, custando 265,04 euros a 3 de Janeiro, representava 28,8%.

Não garante que o cabaz alimentar não continuará a subir. O que para já está a fazer a inflação descer tem sido a redução do custos energéticos, no entanto, a inflação deveria ser uma oportunidade para aumentar o poder de compra dos trabalhadores com aumentos salariais reais. Por essa razão é que, por exemplo, a CGTP-IN coloca a exigência de 1000 euros de SMN já em 2024, mas parece que para Pedro Nuno Santos e a nova direcção do PS, a receita passa por agradar o patronato.

Analisando a promessa feita em Congresso, um SMN de 1000 euros em 2028 representaria uma subida de 45 euros ao ano. Isto significa um aumento médio de 5,08% entre os anos de 2025 e 2028 e uma subida de 15,6%. Na prática, o que é prometido representa um decréscimo anual no ritmo de aumento do SMN. Por outras palavras, há uma desvalorização que a retórica do PS vende como um enorme aumento, quando não é. 

Há ainda mais elementos a ter em conta. Num quadro em que Portugal, no contexto da União Europeia, tem um SMN que não lhe permite ser competitivo com outros países, a promessa do PS não visa alterar esse paradigma. 

Se compararmos Portugal com a Espanha, que é a principal parceira económica, a meta fixada pelo PS para o SMN em 2028 representa menos do que é já hoje praticado pelo país vizinho. Espanha tem hoje um SMN de 1080 euros e a tendência será aumentar. No quadro acima, fez-se duas comparações, mas tendo em conta o histórico registado nos últimos 4 anos; as previsões para Espanha, segundo o Eurostat, para aumento do SMN desse país; e a promessa do PS para 2028.

Conseguimos ver assim que mesmo com uma variação anual do SMN em Espanha de 2,5%, com base na previsão da Eurostat, e com uma variação anual do SMN em Portugal de 5%, o desfasamento entre ambos os países irá praticamente manter-se. Fazendo as contas, a tal previsão do Eurostat coloca que Espanha terá um SMN 1238,57 euros em 2028. A comparação não é propriamente fiável, até porque bastaria a Comissão Europeia dizer ao PS, caso este seja Governo, que não admite um aumento do SMN no ritmo prometido para não acontecer, até porque o hábito desse partido é concordar com a submissão de Portugal ao euro.

A questão do SMN não começa e acaba em si. O SMN tem fortes implicações no salário médio e esta não é uma questão menor na medida em que se prende com a legislação laboral e a caducidade da contratação colectiva. A proposta do PS e a falta de vontade para rever a legislação laboral é a receita para a estagnação salarial.

Simplificando a questão, a contratação colectiva permitiria indexar o salário médio ao SMN e, por sua vez, a cada subida deste último, o salário médio aumentaria também. Com a caducidade da contratação colectiva, o número de trabalhadores abrangidos por este factor diminui e, por sua vez, dá-se, não só uma estagnação, como também se assiste ao SMN a apanhar o salário médio. 

Olhando para os dados do Eurostat e fazendo as contas, podemos ver que, em 2023, o salário médio bruto anual da média da União Europeia representava 37413 euros. Já o salário médio bruto anual de Portugal nesse mesmo ano representava 58,6% face à média da Zona Euro, sendo 21917 euros.

Segundo as previsões do Eurostat relativamente ao crescimento do salário médio bruto anual da média da União Europeia, para Portugal conseguir alcançar esse indicador, precisaria de crescer 14,6% ao ano já a partir de 2024 até 2028. Ou seja, assumindo que a contratação colectiva indexa os salários ao salário mínimo nacional, chegamos à conclusão que em 2024 Portugal apenas subiu 7%, menos de metade do que é necessário e o PS coloca no horizonte, até 2028, uma subida de apenas de perto de 5% ao ano. 

A visão estratégica que Pedro Nuno Santos e o PS assumem é apenas uma venda de gato por lebre. As intenções propagandeadas ao vento do eleitoralismo, quando confrontadas com a realidade e os indicadores confirmam que a vontade do PS é, pura e simplesmente, manter Portugal e os trabalhadores na posição frágil em que se encontram.

Se os discursos aparentam um pulsar progressista, isso é apenas aparência. Na realidade, a nova direcção do PS está pronta para continuar com o caminho da política de direita, revelando no final do dia que as caras pouco importam quando o compromisso feito é com o grande capital.   

Tipo de Artigo: 
Análise
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«A proposta do Bloco é simples», explicou Mariana Mortágua, coordenadora do BE, durante uma acção de campanha com a deputado do Bloco ao Parlamento Europeu, Marisa Matias, e actual candidata pelo distrito do Porto. «Uma subida intercalar do salário mínimo, já este ano, para os 900 euros e um aumento real de 50 euros nos anos seguintes», a acrescer à inflação anual.

«Isto é fazer o que nunca foi feito», anunciou a deputada, durante um almoço de apoiantes em Santo Tirso. Infelizmente, os trabalhadores ainda não podem comer inovações legalistas. Terão, até 2026, de esperar para conseguir alcançar um salário mais digno com o qual possa fazer frente ao aumento do custo de vida.

A posição do Bloco de Esquerda consiste no fundo, num meio termo entre a reivindicação da CGTP-IN, acompanhada pelo PCP (que já anunciou a inclusão do SMN de mil euros no seu programa eleitoral), e a proposta de Pedro Nuno Santos, secretário-geral do PS, que defende os mil euros para 2028.

Na ânsia de se destacar, Mariana Mortágua acaba por boicotar pública e activamente a posição assumida por dezenas de milhares de trabalhadores que participaram em centenas de plenários em centenas de diferentes locais de trabalho em todo o país.

Poucos dias depois do anúncio de Pedro Nuno Santos, Ana Pires, da Comissão Executiva da CGTP-IN, reafirmou a posição de unidade dos sindicatos e dos trabalhadores portugueses: «A nossa proposta é que o salário mínimo atinja os mil euros em 2024. Não é com mil euros em 2028 que se vai dar resposta aos baixos salários». Essa resposta não pode esperar pelos mil euros propostos pelo BE para 2026.

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