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«Cemitério» rodoviário

Apesar de tantos estudos e planos, bem como metas sucessivamente não cumpridas, as estradas portuguesas continuam a ser um verdadeiro «cemitério» para cerca de meio milhar de portugueses/ano.

Acidente em estrada portuguesa. Foto de arquivo, c. 2015.
CréditosFonte: Bom dia EU

O país continua a figurar em lugar de destaque, no indesejável ranking europeu da sinistralidade rodoviária. Segundo dados da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR) referente ao ano de 2022, registaram-se em termos nacionais, incluindo Continente e Regiões Autónomas, 34 275 acidentes de viação com vítimas, 473 vítimas mortais, 2436 feridos graves e 40 123 feridos leves.

Relativamente ao ano em curso e apesar de estarmos já em pleno agosto, a ANSR não disponibilizou qualquer relatório sobre a sinistralidade rodoviária verificada, havendo, no entanto, diversos indicadores que apontam para um previsível agravamento da situação.

Num estudo divulgado em 2021 da autoria do Centro de Estudos de Gestão do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) de Lisboa, intitulado «Impacto Económico e Social da Sinistralidade Rodoviária em Portugal», pode ler-se: 

«Os custos económicos e sociais dos acidentes rodoviários podem decompor-se em danos de natureza patrimonial e em danos morais, imateriais ou não patrimoniais. Os danos de natureza patrimonial compreendem os prejuízos causados nos bens dos lesados acidentados e de terceiros, incluindo quer os denominados danos emergentes quer os denominados lucros cessantes. Os custos morais, imateriais ou não patrimoniais compreendem, entre outros, o valor das vidas humanas encurtadas ou permanentemente afetadas pelos acidentes de viação, a dor física e o abalo psíquico e emocional causado nos sinistrados e nas suas famílias decorrente dos ferimentos e dos tratamentos médicos necessários à recuperação, a perda de qualidade de vida, os danos causados na aparência física, ou as consequências temporárias ou permanentes na capacidade de afirmação pessoal e social das vítimas».

«Ao longo dos anos têm sido aprovadas sucessivas Estratégias e Planos, da responsabilidade de sucessivos governos, apontando para medidas diversificadas e avulsas, incapazes de enfrentar o problema numa perspetiva integrada, relativamente ao triângulo virtuoso de mitigação da situação, alicerçado em três eixos: veículo, infraestrutura e indivíduo.»

De acordo com o mesmo documento, «os acidentes de viação registados em Portugal no ano de 2019 tiveram um custo económico e social para o país estimado em 6422,9 milhões de euros, um valor que representa 3,03% da riqueza criada no país nesse ano. Desse custo total, a maior fatia (83,5% do total) é referente a acidentes com vítimas, totalizando 5 362,7 milhões de euros (2,53% do PIB), respeitando os restantes 1060,1 milhões de euros (0,5% do PIB) a acidentes sem vítimas que geraram apenas danos patrimoniais».

Perante tudo o que fica dito anteriormente, conclui-se com facilidade que a sinistralidade rodoviária constitui um problema muito grave, tanto no ponto de vista da saúde pública como da segurança interna. Antes de tudo o mais, pelo impacto na perda de vidas humanas e nos danos físicos e psicológicos provocados nas vítimas dos acidentes. Segundo pelos impactos económicos decorrentes da elevada sinistralidade rodoviária verificada.

Ao longo dos anos têm sido aprovadas sucessivas Estratégias e Planos, da responsabilidade de sucessivos governos, apontando para medidas diversificadas e avulsas, incapazes de enfrentar o problema numa perspetiva integrada, relativamente ao triângulo virtuoso de mitigação da situação, alicerçado em três eixos: veículo, infraestrutura e indivíduo.

A mais recente estratégia aprovada pelo Governo, designada Visão Zero 2030, define um quadro de referência para a política de segurança rodoviária, baseado na abordagem do Sistema de Transporte Seguro (STS) ou Sistema Seguro, «que visa eliminar as consequências graves dos acidentes rodoviários, tornando o sistema rodoviário mais autoexplicativo e tolerante».

Entretanto e apesar de tantos estudos e planos, bem como metas sucessivamente não cumpridas, as estradas portuguesas continuam a ser um verdadeiro «cemitério» para cerca de meio milhar de portugueses/ano.

Este morticínio silencioso ao qual o cidadão comum já se habituou, constitui um desafio político e moral a todos os que exercem mandatos democráticos de representação, no Governo, no Parlamento e nas autarquias, sem esquecer o contributo da academia e dos serviços da administração central e local. Em resumo: todos, todos, todos!


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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