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Líder do Donetsk assassinado em atentado bombista

O desaparecimento de Alexandre Zakharchenko pode pôr em causa o processo de paz na região. Os suspeitos, entretanto presos, «reconheceram a ligação a um não especificado grupo de sabotagem ucraniano».

Alexandre Zakarchenko, líder da autoproclamada República Popular do Donetsk, durante as cerimónias solenes do Dia da Libertação do Dombass dos invasores nazis, junto ao memorial na colina de Saur-Mogli, na região do Donetsk.
CréditosFonte: RT News / Valeryi Mel'nikov / RIA Novosti

Alexandre Zakharchenko, presidente da autoproclamada República Popular do Donetsk (Donétskaiá Narôdnaiá Respúblika, DNR), no leste da Ucrânia, foi assassinado num atentado ocorrido no centro da cidade de Donetsk.

Uma explosão abalou o café Separ – próximo à residência de Zakharchenko – cerca das 17h30 locais (15h30 em Lisboa), tendo provocado a morte de Alexandre Zakharchenko e causado mais 11 vítimas, segundo declarações de Dmitri Trapeznikov, líder provisório da DNR, à RIA Novosti. Trapeznikov não quis confirmar a morte de vários guarda-costas no incidente, como chegou a ser referido, mas confirmou que pelo menos um dos ministros «sofreu ferimentos graves».

Alexandre Kasakov, assessor do líder assassinado, declarou à RT News que Zakharchenko foi atingido na cabeça e teve morte no local – e não no hospital, como chegou a ser transmitido por alguns meios. «O dirigente da República Popular de Donetsk, Alexandre Zakharchenko, morreu em consequência de um ataque terrorista», declarou Kasakov, acrescentando que «um explosivo improvisado fora plantado no interior do café, próximo da porta de entrada» e que, aparentemente, os assassinos sabiam quando ele chegaria ao café e «estavam à sua espera».

Segundo a mesma fonte, o estado de sítio foi declarado e as fronteiras com a Ucrânia e a Rússia foram fechadas pelos serviços de segurança, com as autoridades a «procurarem activamente pelos potenciais perpetradores» do atentado.

Ém consequência das buscas soube-se, mais tarde, da detenção de um número ainda indeterminado de suspeitos, que se encontrariam nas proximidades do local. Dmitri Trapeznikov confirmou a detenção de vários suspeitos e referiu à RIA Novosti que os mesmos «reconheceram a ligação a um não especificado “grupo de sabotagem ucraniano”».

Reacções ao atentado

Moscovo condenou o assassinato como sendo adverso para o processo de paz na Ucrânia. Konstantin Kosachev, presidente do Comité do Senado Russo para os Assuntos Internacionais declarou à RT News que a morte do líder da DNR «poderia ter um impacto particularmente negativo na implementação dos acordos de Minsk».

«Kiev tem repetidamente recorrido a estes métodos para se libertar de dissidentes ou indesejáveis», pelo que existem «todas as razões» para ver a sua mão no assassinato, afirmou a porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo, Maria Zakharova, acrescentando que «em vez de se guiarem pelos acordos de Minsk e procurar resolver um conflito interno, os fautores da guerra de Kiev optaram por um cenário terrorista, exacerbando a já tensa situação na região».

Quanto aos serviços secretos ucranianos, optaram por negar qualquer envolvimento no assassinato, preferindo considerá-lo como o resultado da luta «entre bandos de criminosos» ou fruto da «mão de Moscovo» – afirmações produzidas por Igor Guskov e Yelena Gitlyanskaya, respectivamente director e porta-voz do SBU, o serviço secreto ucraniano acusado de estar por detrás do crime.

O presidente Vladimir Putin exprimiu «profundas condolências» aos familiares e amigos de Alexandre Zakharchenko, que definiu como «um verdadeiro líder popular» e um «homem de coragem». Afirmou, também, que «aqueles que prosseguem o caminho do terror, violência e intimidação não procuram uma solução pacífica e um diálogo real com o povo do sudeste da Ucrânia».

De mineiro a presidente da DNR

Alexandre Vladimirovich Zakharkenko, Presidente do Conselho de Ministros e Comandante Supremo das Forças Armadas da República Popular do Donetsk, nasceu na cidade de Donetsk em 26 de Junho de 1976, há 42 anos, filho de pai russo e de mãe ucraniana. Deixa a sua mulher, Natália, e quatro filhos.

Estudou na Escola Técnica de Automação Industrial, em Donetsk, especializando-se com distinção em Electromecânica de Minas. O seu primeiro trabalho foi como mineiro, como electromecânico do 5.º grau. Um ano e meio depois estabeleceu-se como empresário na indústria do carvão. Entretanto matriculara-se no Instituto de Direito do Ministério do Interior, em Donetsk.

Em 2010 dirige o ramo no Donetsk da ONG «Oplot» («Muralha», ou «Bastião»), fundada em Kharkov por Evgeny Vladimirovich Zhilin. Os principais objectivos da organização eram de «assistência às famílias de polícias mortos ou incapacitados em serviço, ou ainda daqueles que, por outras razões, estivessem impossibilitados de manter uma existência digna». Outra actividade da «Oplot» era a investigação histórico-militar, opondo-se às tentativas — já então crescentes — de glorificação dos colaboracionistas da OUN-UPA, de Stepan Bandera, financiando as buscas por restos mortais de soldados do Exército Vermelho mortos durante a Segunda Guerra Mundial e cuidando dos monumentos aos heróis da Grande Guerra Patriótica, glorificando e exaltando o «povo vitorioso».

«Acreditámos, acreditamos e continuaremos a considerar-nos parte da União Soviética»

Alexandre Zakharkenko, entrevista ao Republik (em russo)

Depois de, em 2014, os distúrbios na chamada praça «EuroMaidan» terem degenerado num golpe de Estado que depôs o presidente legitimamente eleito, Alexandre Zakharchenko assumiu uma firme posição anti-Maidan e juntou-se às milícias populares que reagiram contra o golpe na Ucrânia, exigindo para a população do Donbass o direito a determinar o seu futuro, fosse sobre a língua em que se queriam exprimir, fosse a forma de Estado e o país em que queriam viver. Quando o novo governo em Kiev desprezou a voz do Donbass, Alexander Zakharchenko dirigiu o grupo de milicianos armados que ocupou, sem sangue, o edifício da administração da cidade do Donetsk.

Após o referendo que declarou a independência, em 11 de Maio de 2014, tornou-se o primeiro comandante militar da DNR e, mais tarde, secretário de estado dos Assuntos Internos. Comandou directamente a unidade militar de voluntários da «Oplot», até Julho de 2014, e nessa qualidade participou directamente nos combates em torno do aeroporto internacional do Donetsk, em 27 e 28 de Maio de 2014, tendo sido ferido numa perna. Um mês depois, recebeu a patente de Major.

Em Agosto do mesmo ano, após a resignação do primeiro-ministro da DNR, Alexandre Borodai, o Conselho (Soviete) da República apontou Alexandre Zakharchenko para o lugar. Apresentou candidatura para as primieiras eleições presidenciais na DNR, tendo sido eleito, em 2 de Novembro de 2014, recolhendo 75% dos votos.

No início de 2015 deu início a primeira fase do trabalho de recuperação das localidade atingidas pela guerra, no território controlado pela DNR. Entre Janeiro e Maio de 2015 293 locais foram recuperados.

Em Fevereiro de 2015 participou nas primeiras negociações de paz em Minsk, com os líderes dos países do chamado «quarteto». Como resultado do processo negocial foi assinado um acordo providenciando «um imediato e compreensivo cessar-fogo em áreas das regiões do Donetsk e de Lugansk». O acordo entrou em vigor em 15 de Fevereiro de 2015 mas, até agora, não foi cumprido pelo governo de Kiev.

Dois dias depois Alexander Zakharchenko voltou a ser ferido, nos combates por Debaltsevo. Durante os combates foi promovido ao posto de Coronel e recebeu a sua primeira condecoração (Herói da DNR). Depois da conclusão vitoriosa das operações militares em Debaltsevo recebeu, simbolicamente a patente Major-General e a Ordem «Glória da LNR», atribuídas pela república-irmã de Lugansk.

Em Agosto do mesmo ano foi lançada por Zakharchenko a segunda fase da restauração das infraestruturas e habitações residenciais da DNR, incluindo a construção de 111 novas moradias unifamiliares, a recuperação de 2 mil casas e 1189 partamentos, entre outros trabalhos.

Graças a estes esforços foi possível prevenir uma catástrofe humanitária e o colapso económico causado pela guerra, primeiro, e pelo total bloqueio por parte da Ucrânia, depois.

Até hoje, sobrevivera a vários atentados contra a sua vida.

 

 

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