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Manu Chao: «Que nunca morra a alegria»

O concerto não contemplou pausas para os artistas que quando paravam de tocar, lá estavam a saltar, a correr e a apelar ao público, uma verdadeira assembleia de gentes comuns, na qual podemos afirmar que, por unanimidade e aclamação, foi aprovado o mote feito do palco de uma «Palestina livre» e que «ninguém é ilegal». 

CréditosAndre Pain / Lusa

Ao apanharmos o metro na linha vermelha já começavam a aparecer os keffiyehs à volta do pescoço. Podia ser um dia de semana normal, de casa/trabalho/casa, não fosse o concerto que entrou de rompante pela nossa cidade adentro. Já em Chelas, ao passar o ISEL, lá iam as pessoas apressadas, esquecendo que amanhã era dia de trabalho, numa réstia de rebeldia que rimava com alegria partilhada e que fazia esquecer a esquizofrenia e a azáfama do dia-a-dia, ou a fila para a entrada do concerto. O ambiente já anunciava o momento que iríamos encontrar. 

Escusado será dizer que a sala estava cheia, até porque é do (aborrecido) conhecimento público que os bilhetes estavam esgotados. A diversidade presente na sala era o espelho do que é suposto ser a nossa sociedade, diversa, interclassista, com diferentes culturas, a conviverem com a beleza de todas as suas contradições e livre de restos.

Lá vieram os artistas, pelas 21h. Vieram de repente, para dar um abanão de esperança e empurrão para a frente. Vinham ansiosos de vida, de gente, de diversidade, de todos nós, dos que estavam lá e do mundo inteiro. Era um «concerto ultra acústico», sendo que ninguém sabia para o que ia realmente. Os artistas entraram a correr, sempre a saltar e sem pausas para respirar, dando a sensação que tinham de aproveitar cada segundo, mas com uma «gana» de quem tem de se mexer porque há muito a fazer, porque a esperança é algo que se sente, constrói-se e conquista-se e não há tempo a perder!

O Manu estava «passado» e com isso vieram os mais variados apelos: «sorrir e não dispersar»; «tudo chegará», «vamos para a puta da rua Lisboa!». Isto, sempre durante as músicas enquanto se ouvia o som das sirenes da polícia, umas vezes alto, outras vezes mais baixo. Parecia apelar à vigilância das nossas gentes, ou seja, uma à alegria consciente, e não pateta, que corre sabendo para onde vai, surgindo o aviso de «futuro incerto». 

O concerto não contemplou pausas para os artistas que quando paravam de tocar, lá estavam a saltar, a correr e a apelar ao público, uma verdadeira assembleia de gentes comuns, na qual podemos afirmar que, por unanimidade e aclamação, foi aprovado o mote feito do palco de uma «Palestina livre» e que «ninguém é ilegal». Lá estava o Manu e mais dois companheiros a tocar a saltar, a bufar de tanto correrem, a dizerem sucessivamente que era a última e não conseguiam sair do palco. 

Dão-se as 23h37, acaba o concerto, saímos e encontrámos companheiros de todas as lutas. Fumámos um cigarro cheios de força e confiança, pois sabemos que clandestinos somos todos e ninguém nos parará porque o futuro pertence-nos e um dia poderemos todos cantar e dançar de tanta alegria, liberdade e diversidade para todo o sempre. 

O Manu e os seus dois companheiros passaram o tempo todo a sorrir e a apelar a toda a gente para, a sorrir, se fazer boa cara ao mau tempo. É o lema reinante de gente resistente e se estiverem atentos, mesmo depois do concerto, fica a sensação que, como que por magia, nos diz ao ouvido «ainda estou aqui». 

Mesmo depois do fim do concerto, ou depois do fim de um filme, a vida continua… Cultura é também resistência, e por isso «eles» detestam-na. Trata-a com amor, como o Manu Chao trata o mundo todo.

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