História, jornalismo e ficções.
Hoje começamos pelo livro do mês, uma investigação jornalística que esmiúça o arco que se estabelece entre o dia 25 de Abril de 1974 e o assassinato do industrial Joaquim Ferreira Torres em Agosto de 1979, num ajuste de contas relacionado com a rede bombista de extrema-direita que operou em Portugal.
Miguel Carvalho, que recebeu o prémio GAZETA em 2009 pela sua investigação sobre a morte de Ferreira Torres, atirou-se a arquivos e entrevistou dezenas de pessoas para explicar o nebuloso mosaico dos movimentos de extrema-direita como o ELP, o MDLP e a rede bombista, e as suas ligações a figuras dos meios político, empresarial e militar.
Naturalmente, não poderiam ficar de fora as responsabilidades da Igreja na criação de um clima de medo nem a atuação da CIA. Quando Portugal Ardeu – Histórias e Segredos da Violência Política no Pós-25 de Abril, confronta-se as ideias hegemónicas disseminadas no Portugal da «normalização» democrática, com os factos que substanciam que estivemos muito mais perto de um golpe de extrema-direita do que de uma «ditadura de esquerda», esse fantasminha desenhado, criado e nutrido ao longo dos últimos quarenta anos para avalizar um esvaziamento total ou parcial de muitas das chamadas conquistas de Abril. Editado pela Oficina do Livro, é investigação jornalística que faz História.
Solidariedade em cartaz
Até 23 de Setembro a Galeria Zé dos Bois apresenta, no âmbito da Capital Ibero-americana de Cultura, a exposição «Cartazes Cubanos da OSPAAAL 1960-1980», uma «colecção de materiais que vogam entre a denúncia da opressão e a exaltação dos feitos revolucionários e que, no seu conjunto, são um documento inestimável da época de ouro do design cubano e um exemplo claro do uso da comunicação visual em prol da igualdade e das transformações sociais».
A par da vocação internacionalista da Organização de Solidariedade para com os Povos de África, Ásia e América Latina (OSPAAAL), Cuba implementou diversos organismos políticos de vocação interna e local. Num deles, o COR – Comité de Orientação Revolucionário, sedeado em Cienfuegos, trabalhou o artista gráfico Pepe de la Paz, alvo de uma retrospectiva incluída nesta exposição.
A visitar de quarta a sábado, entre as 18h e as 22h, no número 59 da Rua da Barroca, em Lisboa.
Nota de rodapé (ou não há duas sem três).
Já foi aqui espectáculo do mês, já foi livro do mês e não há duas sem três: dez anos depois d’ O Avarento, espectáculo que marca precisamente o início da simbiose Praga-Vieira Mendes, o Teatro Praga regressa ao palco do Teatro Nacional São João para o Despertar da Primavera – uma tragédia de juventude. Alerta Porto e arredores: têm até 23 de Julho.
One struggle, one fight.
Uma estreia no Para toda a gente: termino hoje com uma sugestão televisiva. Ou netvisiva. Criada por Dustin Lance Black para a ABC e com produção executiva de Gus Van Sant, When We Rise perspectiva-nos os últimos quarenta anos de lutas cívicas nos Estados Unidos, tendo como espinha dorsal a luta LGBT e as memórias de Cleve Jones, Roma Guy, Ken Jones e Cecilia Chung, todos consultores da série.
Partindo do motim de Stonewall, em Nova Iorque, e da eleição e assassinato de Harvey Milk, em São Francisco, a série mantém o seu epicentro em nesta última para, do particular da cidade e dos direitos LGBT, nos pintar um fresco de todos os avanços e recuos nos direitos civis, não só na questão da orientação sexual, mas da identidade de género, da questão racial, das lutas feministas, da luta de classes. Porque sim, sempre, isto anda tudo ligado.
E When We Rise é sobre a luta LGBT, mas é acima de tudo sobre os indispensáveis. Os que lutam todos os dias, mesmo depois de dizerem a si mesmos que tudo está acabado: está acabado porque assassinaram Harvey Milk, está acabado porque o HIV mata e não há interesse político na investigação científica que pode salvar vidas, está acabado porque a DOMA, mais conhecida como Prop 8, determina que o casamento só pode ser celebrado entre um homem e uma mulher. Ou porque Donald Trump foi eleito.
Não está acabado. Ganho ou perdido, nunca está acabado. Nunca lutamos só por um de nós. E o nós é um conjunto em constante alargamento. One struggle. One fight.
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