Com o espírito de Natal a sobrevoar o calendário e o quase ensurdecedor badalar dos sinos que anunciam um pequeno e frágil interregno num universo em que guerras directas e indirectas asseguram a continuidade de um sistema da exploração dos homens e dos recursos materiais e imateriais para manter a sobrevivência de um sistema desumanizado em que essas riquezas se vão progressivamente acumulando num grupo cada vez mais restrito, que sugestões culturais fazer que interferiram mínima mas positivamente no ruído desse frenético vai e vem natalício que em muitas partes do mundo é frágil ou inaudível?
Por cá, haverá sempre espaço para sair das ruas de iluminações acrescentadas que assinalam a época, ir ouvir música que naturalmente também tem essa marca. Haverá por todo o país, em todas as cidades, vilas e aldeias um momento musical relacionado com o Natal. Enumerá-los é uma quase impossibilidade. Registem-se alguns, centrados em Lisboa e Porto, para contornar essa inexequibilidade.
O Messias de Haendel, uma narrativa dramática em torno do nascimento, vida, morte e ressurreição de Cristo é uma obra prima e um dos temas recorrentes da época natalícia e pascal.
É um dos mais populares oratórios escritos por Haendel, ainda que ultrapasse as fronteiras típicas de uma definição estrita de «oratório». Tem uma forte componente teatral que provocou grande controvérsia na sua primeira apresentação em Dublin e nas sequentes em Londres. A «Aleluia» de Messias é um dos trechos musicais com maior reconhecimento universal.
Pode ouvir o Messias de Haendel no dia 16 no Fórum Luísa Todi em Setúbal e no dia 17 no Grande Auditório do CCB e a 18 no Coliseu do Porto, pela orquestra Metropolitana de Lisboa dirigida por Leonardo Garcia Alárcon, o Coro Sinfónico Lisboa Cantat, maestro do coro Jorge Carvalho Alves, e os solistas Joana Seara-soprano, Carolina Figueiredo-meio soprano, Marco Alves dos Santos-tenor, André Henriques-barítono.
Em Lisboa, no dia 15 de Dezembro às 21h30 na Igreja da Graça, Lisboa, o Ensemble Bomtempo (alunos da Escola Artística de Música do Conservatório Nacional) e a Orquestra de Câmara do Conservatório, músicos jovens, muito prometedores e com anunciado futuro que, dirigidos por Nathanael Júnior, interpretam a Oratória de Natal de Saint-Saëns.
Obra da juventude do compositor, que foi um menino prodígio, dividida em dez andamentos para cinco solistas, coro, orquestra de cordas, órgão e harpa. O concerto encerra com o Tantum Ergo também de Saint-Saëns. Um aviso, a entrada é livre, está sujeita à lotação disponível.
Na Fundação Gulbenkian, também a 15 de Dezembro, a Oratória de Natal de Johann Sebastian Bach com o Coro e a Orquestra Gulbenkian dirigidos por Michel Corboz e os solistas Maria Cristina Kiehr - soprano, Marianne Beate Kielland - meio soprano, Tilman Lichdi - tenor, Peter Harvey - barítono.
A Oratória de Natal de J. S. Bach tem na sua base muita música escrita pelo compositor em anteriores cantatas que recupera, adapta e transforma, uma prática habitual em Bach que a faz com a sua enorme genialidade.
Ainda na Fundação Gulbenkian, nos dias 20, 21 e 22, «Músicas de Natais de Todo o Mundo», na voz de Sophia Escobar, acompanhada pelo Coro e Orquestra da Fundação Gulbenkian, dirigido por Jorge Matta. Canções escritas por Leonard Bernstein, Andrew Lloyd Webber, Frederick Loewe, Alan Silvestri, John Rutter, Howard Blake, Robert Shaw e Robert Russell Bennett.
A orquestra e o coro da Fundação Gulbenkian com a direcção de Jorge Matta estarão também na Igreja de São Roque, no dia 31 de Dezembro com o Te Deum Laudemus de Bráz Francisco de Lima, numa primeira audição moderna desse compositor que foi enviado por D. José para estudar em Itália. Tem obra pouco conhecida e com arquivo escasso, só se conhecem dez partituras. Solistas Carla Caramujo - soprano, Carolina Figueiredo - meio soprano e Manuel Rebelo - barítono.
No Porto, na Casa da Música, o Natal começa a dia 14 com «Christmas Song Book», uma selecção das músicas tradicionais mais ouvidas nesta quadra. Do «Silent Night» a «Santa Claus Is Coming to Town», de «White Christmas» a «Blue Christmas», de «Let It Snow» a «Jingle Bells», não falta (quase) nada do que foi consagrado pela tradição anglo-saxónica, muitas recuperadas pelo jazz.
A 16, a Banda Sinfónica Portuguesa, dirigida por Francisco Ferreira e o Coro Infantil da Academia de Música Costa Cabral, classe de Patrícia Silva, mergulham no reportório do espírito natalício com temas inspirados na música latino-americana, no folk inglês, no ballet clássico. Um concerto com composições de James Barnes, Jorge Salgueiro, Philip Sparkes, Leroy Anderson, Alfred Reed e Bert Appermon.
A 23, a Orquestra Barroca da Casa da Música e o Coro Casa da Música com a direcção Laurence Cummings dão um concerto a que não falta a 1.º parte do Messias de Haendel e se farão ouvir Heinrich Biber Duas Fanfarras, Michael Praetorius, Wie schön leuchtet der Morgenster, Uns ist ein Kindlein heut gebo e In Dulci jubilo, Andrea Gabrielli, O Magnum Mysterium e o The King Shall Rejoice de Haendel.
Em Figueiró dos Vinhos, a Orquestra Clássica do Centro, em parceria com a Associação das Vítimas de Pedrógão Grande, assinala o Dia de Natal com um concerto com entrada livre a realizar-se na Igreja Matriz de Figueiró dos Vinhos, no dia 25 pelas 17h. A Orquestra Clássica do Centro será regida pelo Maestro Cesário Costa com a participação da soprano Marina Pacheco e do tenor Sérgio Martins.
Das obras que serão interpretadas destaque-se Op. 6 nº 8 de Corelli; Mit Würd und Hoheit, da A Criação, de J. Haydn; Laudate Dominum, de W. A. Mozart; Panis Angelicus, de Cesar Franck; Avé Maria, de Caccini.
Muitos outros e bons concertos, com o Natal por tema, irão certamente acontecer ao pé da sua porta. Faça um intervalo nos seus preparativos natalícios para os ouvir.
Com estas, muito parcelares sugestões culturais, até para o ano com um desejo que é uma proposta bem enquadrada no espírito da época e que seria uma verdadeira e de bom quilate prenda de Natal para todos os portugueses e para Portugal.
Quando os empreendedores lusos andam todos excitados e sobressaltados com a proposta dos 600 euros para salário mínimo, acabou fixado em 580 euros, porque não discutir o salário máximo?
Uma ideia de Roosevelt que, em 1933, propôs que quem recebesse de rendimento mais de 25 mil dólares/ano, uns 400 mil dólares/339 600 euros actualmente, seria taxado a 100%. Acabou por ser fixada uma taxa de 97%, o que reduziu desigualdades e deu ao Estado capacidade para investir directamente e apoiar os investimentos privados produtivos, para acabar com a parasitagem que voltou em força com as políticas económicas neoliberais, postas sobretudo em prática pelos famigerados Reagan-Thatcher.
Uma proposta que bem se enquadra no espírito natalício, embora se calcule que os 0,002% (provavelmente ainda menos) de portugueses com rendimento superior aos € 30 000/mês (número redondo, pouco mais que 50 vezes o salário mínimo estabelecido para 2018), de voz grossa e recorrendo aos seus vassalos e mercenários, tocariam freneticamente os sinos a rebate anunciando que o propalado ecumenismo do Natal iria ser queimado em praça pública.
O Natal é o veículo para essa gente expurgar a alma com a caridadezinha!
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