Chuck Berry: o bom rebelde!

Quem julga saber que a guitarra eléctrica se toca com as mãos, com os dedos correndo ligeiros sobre as cordas em melodias, gemidos e ritmos diversos, nunca ouviu Chuck Berry, não conhece o Rock 'n' Roll.

Chuck Berry
Créditos / UOL Música

A guitarra eléctrica, como Chuck mostrou ao mundo, toca-se com todo o corpo, enquanto os pés dançam e acentuam os golpes da guitarra nas nossas convenções e na construção do prédio onde moram as canções, com os seus heróis e os seus monstros.

Chuck Berry, mudou a face da música com uma guitarra eléctrica nas mãos , mas também com as suas esparregatas em palco e o seu famoso «Duck Walk». Com o seu jeito suave e voz delicada, Chuck subia ao palco sorridente e transformava a América num alvoroço, como quem diz, eu não estou aqui para vos entreter, eu vim trazer-vos o Rock 'n' Roll.

Com uma carreira iniciada aos 15 anos de idade numa América profundamente racista e marcada pela segregação, é ainda hoje comum, depois da sua morte aos 90 anos, ouvir surgir algumas vozes a criticar o seu estilo de vida impróprio, do modo como ele se envolveu com fãs adolescentes, naqueles anos em que a loucura da geração do rock assaltava a América branca.

Foi exactamente a sua integração no espírito de uma geração, unindo toda uma nação de jovens sobre o mesmo ritmo louco, a capacidade de cantar as suas estórias, escrever os seus hinos, de falar dos seus sonhos mais selvagens, que fez do jovem Charles Edward de Saint Louis no Missouri, o Rei coroado do Rock Chuck Berry, a única estrela do rock a viajar verdadeiramente no espaço.

E se a sua paixão por carros, blues e mulheres assustou a América branca e puritana da década de 50, não deixa de ser sintomático que nos dias de hoje, quando o racismo, a xenofobia e a morte de jovens negros voltam a ser notícia quando se fala dos Estados Unidos da América, a morte de Chuck Berry sirva ainda para novas investidas moralistas sobre o seu passado num escrutínio estritamente reservado a negros. Ironia suprema quando sabemos como o hip hop se tornou num estereótipo de misoginia, violência, narcisismo e materialismo vazio, controlado pelas grandes editoras multinacionais.

Celebremos então o outro lado da história, com a música rebelde do maior compositor do Rock 'n' Roll de sempre,  Chuck Berry.

Tudo começou no ano de 1955, quando Chuck Berry gravou nos míticos estúdios dos irmãos Chess uma versão de um conhecido tema country, Ida Red gravado no original por Bob Wills and His Texas Playboys. O resultado foi o sucesso estrondoso do single que num só golpe criava um estilo próprio da fusão do country com o rhythm n blues, colocava a guitarra eléctrica como o instrumento principal da vaga que varria as rádios e jukeboxes, lançava os pilares do Rock 'n' Roll e um nome que perdurará para sempre, Chuck Berry.

Antes de se tornar na lenda cuja música viaja no espaço como expressão da  humanidade para quem nos ouvir lá fora, Chuck Berry iniciou-se a cantar em bares de negros, interpretando blues e canções de outros autores, assim como os êxitos do momento. Desse tempo, ele ganhou o conhecimento da construção das canções e a experiência de palco. E se hoje podemos dizer que sem Chuck Berry não haveria grande parte da mais importante história do rock, também é verdade que ele incorporou muito do passado na sua música. Assim, não será por acaso que neste Havana Moon de 1956 possamos escutar ressonâncias latinas de um famoso calypso de Nat King Cole.


Berry teve de lutar toda a vida para recuperar os direitos sobre as suas músicas. Muitos dos seus clássicos, foram creditados a Alan Freed figura histórica da rádio que assim recebia o pagamento pela sua divulgação da nova música na rádio, que ele próprio passou a designar por Rock 'n' Roll. Num outro caso histórico na música popular, Berry conseguiu ver defendida em 1963 a sua autoria contra uma cópia directa e abusiva do seu original Sweet Little Sixteen, por uns tais de Beach Boys com um êxito desse ano intitulado Surfin USA.


O início da carreira de Berry foi explosivo e a cada música nova os jukeboxes derretiam moedas com o Rock 'n' Roll a escorrer das colunas, entre beijos prometidos depois da escola e batidos entre corridas de carros. A cada canção sucediam-se os êxitos, imediatamente transformados em clássicos que vieram a estabelecer a base de todo o prédio em que ainda hoje se sustenta o Rock 'n' Roll: Roll Over Beethoven, School Day, Carol, Back in the U.S.A., Little Queenie, Johnny B. Goode, são alguns desses momentos intemporais de comunhão juvenil, mas se há uma canção que define todo o espírito dessa época ela tem de ser Rock and Roll Music.

Como ícone do Rock 'n' Roll, Chuck Berry teve diversos problemas com a justiça. Mas os problemas a sério aconteceram quando Berry investindo na sua St. Louis, foi detido por transportar uma menor entre estados, que havia trabalhado como prostituta. Preso durante dois anos, Berry regressou um homem mais sombrio e desencantado. Mas a sua escrita manteve-se rápida e repleta de ironia, na sua capacidade única de captar o espírito do momento, como ilustra o clássico C´est La vie imortalizado no filme Pulp Fiction de Tarantino.

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