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Bolsonaro continua a desqualificar indígenas mobilizados pelos seus direitos

O presidente brasileiro tem atacado os indígenas que se mantêm acampados na capital federal contra a agenda anti-povos originários, em particular contra a chamada tese do «marco temporal».

Povo Yanomami realiza manifestação na região do Ajarani, em Roraima
Povo Yanomami realiza manifestação na região do Ajarani, em Roraima (imagem de arquivo) Créditos / Blog da Funai

Na passa sexta-feira, Jair Bolsonaro recorreu à sua conta de Twitter para atacar a manifestação frente ao Palácio do Planalto: «Agora, na frente da Presidência da República. Este tipo de gente quer voltar ao poder com ajuda daqueles que censuram, prendem e atacam os defensores da liberdade e da CF [Constituição Federal].»

Em declarações anteriores, ao longo da semana, o presidente brasileiro desqualificou sistematicamente os indígenas mobilizados, referindo-se a eles como «massa de manobra» e «pessoas que vivem de esmolas e de mentiras da esquerda», refere a Carta Capital.

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Violência e doenças ameaçam indígenas yanomamis

Depois de alertas sucessivos para os perigos trazidos pelos invasores, o território indígena, no Norte do Brasil, foi alvo de um ataque a tiro por parte de garimpeiros, esta segunda-feira.

Mães com filhos ao colo e crianças estavam no local em que garimpeiros ilegais chegaram de barco e começaram a disparar, numa reserva em Roraima, na segunda-feira passada 
Créditos / Brasil de Fato

Com o recrudescimento do conflito armado na Terra Indígena Yanomami, no estado de Roraima, os residentes no território aguardam uma reacção do Estado brasileiro. O receio da violência generalizada aumenta numa região afectada pelas invasões e pela presença de garimpeiros fortemente armados, depois de, há dois dias, se ter registado um confronto que deixou mortos e feridos, indica o Brasil de Fato.

«Todas as autoridades têm conhecimento da situação, e agora teve esse tiroteio. Os garimpeiros estão usando armas pesadas, metralhadoras, ilegalmente», disse à DW Brasil Dário Kopenawa Yanomami, vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami (HAY).

De acordo com Dário, pelos menos quatro garimpeiros e um indígena foram baleados. À imprensa brasileira, outros líderes indígenas falam em três invasores mortos e cinco feridos, além de um indígena ferido com um tiro de raspão na cabeça.

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Com Bolsonaro, «aumentaram as invasões a terras indígenas»

Dados preliminares divulgados esta terça-feira pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) apontam para um aumento das invasões de terras indígenas nos nove primeiros meses do governo de Bolsonaro.

Povo Yanomami realiza manifestação na região do Ajarani, em Roraima
Créditos / Blog da Funai

O organismo, ligado à Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), refere que entre Janeiro e Setembro deste ano foram registadas 160 «invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao património» a 153 terras indígenas em 19 estados brasileiros.

O Cimi sublinha que estes dados apontam para mais casos, mais terras originárias e mais estados relativamente a todo o ano de 2018, quando foram contabilizados 111 casos em 76 terras indígenas de 13 estados da federação, segundo informa o portal brasil247.com.

O relatório do Cimi, intitulado «Violência contra os Povos Indígenas do Brasil – dados de 2018», refere ainda que, no ano passado se registou um aumento no número de assassinatos de indígenas (135) em relação a 2017 (110).

De acordo com o organismo, o tipo de invasões alterou-se nos últimos anos. Enquanto, antigamente, os invasores entravam na terra, roubavam madeira, exploravam minérios e depois, em algum momento, se iam embora, agora tem havido a invasão com intenção de permanecer nos terrenos.

«Chama a atenção o aumento da prática ilegal de loteamento das terras indígenas, especialmente na região Norte», diz o documento, em que o Cimi dá conta de um novo modelo de apropriação das terras dos povos originários, mais agressivo.

O relatório refere ainda que 305 povos habitam em 1290 terras indígenas no Brasil. Na maioria dos casos – 821 (63%) –, os territórios estão ainda em fase de reivindicação ou regulamentação; destes, 528 não tiveram qualquer providência tomada pelo Estado, noticia a mesma fonte.

O presidente Jair Bolsonaro já anunciou que não pretende demarcar ou finalizar a demarcação de quaisquer novas terras indígenas durante o seu governo.

Em declarações ao Brasil de Fato, Roberto Antônio Liebgott, do Cimi região Sul, disse que «o discurso de Bolsonaro na ONU é sinal [de] que não há perspectiva. A Funai [Fundação Nacional do Índio] foi completamente desmontada. Dados preliminares de 2019 já indicam que houve mais invasões do que no período anterior. Todo período de construção da democracia. Agora é um período de desconstrução.»

O levantamento do Cimi apurou outros problemas, como ameaças de morte (oito), conflitos por terra (11), casos de disseminação de álcool e outras drogas (11; apesar de a venda de bebidas alcoólicas a indígenas ser proibida em todo território brasileiro).

Ainda relativamente a 2018, o relatório regista 101 casos de suicídios de indígenas e, no âmbito da mortalidade infantil, 591 falecidos até aos cinco anos de idade.

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O tiroteio, refere o Brasil de Fato, teve lugar quando sete embarcações se aproximaram da comunidade de Palimiú. Aquilo que os indígenas fizeram foi tentar defender-se, afirmou o vice-presidente da HAY, tendo por base relatos de líderes locais.

Na sequência do confronto, foi enviado um pedido de socorro ao Exército, à Polícia Federal, à Fundação Nacional do Índio (Funai) e ao Ministério Público de Roraima. «Solicitámos aos órgãos que atuem com urgência para impedir a continuidade da espiral de violência no local e garantir a segurança para a comunidade ianomâmi de Palimiú», diz o ofício assinado pela associação.

«Não houve reação do governo federal ou do estadual até agora. O Estado brasileiro simplesmente não reagiu», criticou Dário. «Há muitos anos nós pedimos a retirada dos garimpeiros. Nem presidente [Jair] Bolsonaro nem o vice [Hamilton] Mourão resolveram nada», acrescentou.

Garimpo ilegal aumenta exponencialmente na TI Yanomami

Nas margens do rio Uraricoera, a comunidade de Palimiú é uma das mais afectadas pelo garimpo ilegal de ouro na Terra Indígena Yanomami, funcionando como «porta de entrada» dos invasores, que chegaram ao território numa primeira grande onda ainda na década de 1980.

Actualmente, estima-se que pelo menos 20 mil invasores estejam em actividade no território demarcado exclusivamente para uso dos indígenas. Só em 2020, o garimpo ilegal de ouro avançou 30%, provocando a degradação de 2400 hectares, segundo um estudo publicado em Março pelas organizações Hutukara e Seedume, com apoio do Instituto Socioambiental (ISA).

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Mineração ilegal aumenta devastação na Terra Indígena Yanomami

Em plena pandemia, a actividade do garimpo ilegal avançou 30% no território e, só em 2020, desmatou o equivalente a 500 campos de futebol. Indígenas enfrentam mais riscos de doenças, violência e álcool.

o garimpo ilegal avançou na Terra Indígena Yanomami
Créditos / isoambiental.org

Um relatório divulgado esta quinta-feira revela que a exploração ou extracção de substâncias minerais (garimpo) ilegal está a entrar de forma cada vez mais rápida nas terras indígenas e na floresta amazónica.

O levantamento aponta para a proliferação de novos núcleos de invasores, mais próximos dos povos originários, incluindo de grupos de índios isolados, bem como para a abertura de novas rotas para dentro do território.

Intitulado «Cicatrizes na floresta: evolução do garimpo ilegal na TI Yanomami em 2020», o estudo foi produzido pela Hutukara Associação Yanomami (HAY) e a Associação Wanasseduume Ye’kwana (Seduume), tendo revelado que, entre Janeiro e Dezembro do ano passado, foi devastada uma área equivalente a 500 campos de futebol na Terra Indígena Yanomami, localizada no extremo Norte do Brasil, entre os estados do Amazonas e de Roraima.

O total de área desflorestada é de 2400 hectares, sendo que em 2020 se registou um aumento de 30%. Ou seja, mesmo com a pandemia de Covid-19, a actividade ilegal nunca parou, antes pelo contrário.

O relatório agora publicado denuncia como a actividade criminosa prolifera na terra indígena, subindo os rios e aproximando-se cada vez mais das comunidades indígenas, com novas rotas de acesso ao interior da floresta.

O novo levantamento também alerta para o modo como o avanço dos garimpeiros em território indígena tem levado doenças às comunidades, sobretudo malária e Covid-19, e colocado em risco a sobrevivência de grupos de indígenas isolados, como os Moxihatëtëma, que são mais vulneráveis às enfermidades e correm sérios riscos de extinção com a exposição forçada pelos garimpeiros.

Outros problemas, como o álcool e o aumento da violência, também são consequência da maior presença de garimpeiros na Terra Indígena Yanomami e da maior proximidade dos invasores em relação aos povos originários.



«Homem garimpeiro é como um porco de criação da cidade»

De acordo com o estudo, a actividade garimpeira no Território Indígena Yanomami realiza-se sobretudo de duas maneiras: em dragas flutuantes, localizadas nos leitos de grandes rios (Uraricoera, Mucajaí, Catrimani e Parima), e em terra firme, de modo semi-mecanizado, com recurso a mangueiras e a motores de combustão para extrair o sedimento de cavas ou barrancos.

Com recurso à monitorização remota, foi possível examinar o conjunto das cicatrizes deixadas por esta segunda modalidade, que inclui desmatamentos recentes, solo exposto, áreas recém-abandonadas e pequenas lagoas de rejeito, revela o Brasil de Fato.

O rio Uraricoera concentra mais de metade (52%) de toda a área degradada pelo garimpo identificada pela monitorização remota. Também é possível verificar que os novos locais de garimpo, surgidos no ano passado, estão colados às comunidades Yanomami e Ye’kwana. As pistas clandestinas de aterragem, agora, ficam a poucos metros do lugares onde os indígenas vivem.

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Aumento da exploração mineira ilegal na Amazónia atinge em força as áreas indígenas

Um mapa recente com informações da actividade em terras demarcadas e protegidas mostra que a Amazónia brasileira abriga 453 explorações ilegais. O povo Yanomami prepara-se para a investida de Bolsonaro.

Área da Amazónia afectada pela extracção mineira
Créditos / RAISG

Não sendo ilegal no Brasil, a exploração ou extracção de substâncias minerais (garimpo) é proibida em áreas protegidas e reservas indígenas. No entanto, o mapa Amazónia Saqueada, realizado pela InfoAmazónia e pela Rede Amazónica de Informação Socioambiental Georreferenciada (RAISG) – organização que reúne técnicos de seis países da Amazónia –, mostra que existem pelo menos 2312 pontos e 245 áreas não autorizadas de extracção de ouro, diamantes e coltan no Brasil, na Bolívia, na Colômbia, no Equador, no Peru e na Venezuela.

A pesquisa inédita compilou dados sobre a situação de mineração ilegal nos sete milhões de metros quadrados do território amazónico, sublinha o Brasil de Fato numa peça hoje publicada. No que respeita ao Brasil, a RAISG aponta a existência de 453 «garimpos» em 132 áreas.

Sobre a pesquisa, os dados recolhidos e o seu significado, Alicia Rolla, geógrafa do Instituto Socioambiental (ISA), que coordena a RAISG, afirmou ao Brasil de Fato que «as informações obtidas sobre a exploração em áreas indígenas e de conservação são obtidas através das instituições que trabalham na Rede».

Em seu entender, o mapa é importante para a compreensão da dinâmica extractivista de minérios. «O garimpo está presente dos dois lados da fronteira, e os garimpeiros atravessam-nas inclusive para fugir de fiscalização. Outra coisa que conseguimos observar é que a prática ilegal possui uma proximidade com a legal», afirmou a geógrafa.

Outro aspecto sublinhado são as consequências ambientais da exploração mineira ilegal – bastante sentidas pelos pelos indígenas e comunidades ribeirinhas que dependem dos recursos naturais em áreas demarcadas e de preservação. «O uso do mercúrio para separar o ouro da areia contamina os rios e, consequentemente, os peixes. Além disso, a extracção de minérios provoca o desmatamento para chegar ao subsolo, e o assoreamento dos rios, causando distúrbios ambientais como o aumento de mosquitos transmissores de doenças», destaca o Brasil de Fato.

Terra Yanomami em Roraima

«A nossa terra está demarcada pelo governo federal desde 1992, mas não está a ser respeitada», denunciou Dário Vitório Kopenawa Yanomami, vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami, no estado de Roraima. «Várias doenças estão a surgir por conta da contaminação e de crimes ambientais feitos pelos garimpeiros», acrescentou.

Os abusos cometidos na área indígena do povo Yanomami, com cerca de 9 419 108 hectares, são encaminhados para «órgãos públicos como a Fundação Nacional do Índio (Funai), a Polícia Federal (PF), o Ministério Público Federal (MPF) e para o Exército Brasileiro, para que assumam as suas responsabilidades», afirma.

Em Julho último, dois índios isolados foram mortos por garimpeiros. «Fizemos a denúncia para a Procuradoria-Geral da República e o Ministério da Justiça, e pedimos investigação sobre o garimpo ilegal, além de [uma] investigação sobre as mortes para o MPF e Polícia Federal», revela Dário.

De acordo com a pesquisa da RAISG, a extracção de minérios começou a chegar à terra Yanomami em 2010, e tem vindo a aumentar: no final de 2016, já tinham sido identificadas 49 balsas na região.


Resistência ao governo de Bolsonaro

Tendo em conta as declarações do presidente eleito, no passado dia 12, relativas às «riquezas de Roraima» – o seu subsolo, a sua terra e os seus recursos hídricos – e a reafirmação, num encontro com deputados dos Democratas, também na quarta-feira, de que, se depender dele, não haverá «demarcações de terras para indígenas», o povo Yanomami «prepara-se para resistir».

É que 46% do estado de Roraima é território indígena e, face às ameças de Jair Bolsonaro, Dário Vitório Kopenawa Yanomami destaca: «Estamos a organizar-nos e vamos posicionar-nos para cobrar os nossos direitos que estão na Constituição. Ele precisa de respeitar as áreas demarcadas, não pode quebrar o protocolo e enfrentar as autoridades anteriores que fizeram as demarcações.»

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O líder Yanomami e xamã Davi Kopenawa, presidente da Hutukara Associação Yanomami, disse ao Instituto Socioambiental (ISA) estar preocupado e revoltado com a actual invasão garimpeira.

«Você vê a água suja, o rio amarelado, tudo esburacado. Homem garimpeiro é como um porco de criação da cidade, faz muito buraco procurando pedras preciosas como ouro e diamante», afirmou Kopenawa.

«Há vinte anos conseguimos mandar embora esses invasores e eles retornaram. Estão entrando como animais com fome, à procura da riqueza da nossa terra. Está avançando muito rápido. Está chegando no meio da terra Yanomami. O garimpo já está chegando na minha casa», alertou.

O xamã disse ainda temer um conflito com os invasores. «Estou muito preocupado, pois o garimpeiro não está sozinho, são grandes grupos, andam armados, apoiados por empresários, pelo governador de Roraima e pelo presidente Bolsonaro, assim como outros empresários do Brasil. Aqui em Roraima, os garimpeiros, empresários e políticos não respeitam os povos indígenas, só querem tirar as nossas riquezas», denunciou Kopenawa.

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Mesmo com a pandemia de Covid-19, a actividade ilegal nunca parou, antes pelo contrário, indica o relatório, que denuncia como a actividade criminosa prolifera na terra indígena, subindo os rios e aproximando-se cada vez mais das comunidades indígenas, com novas rotas de acesso ao interior da floresta.

O novo levantamento alertou igualmente para o modo como o avanço dos garimpeiros em território indígena tem levado doenças às comunidades, sobretudo malária e Covid-19, e colocado em risco a sobrevivência de grupos de indígenas isolados, como os Moxihatëtëma, que são mais vulneráveis às enfermidades e correm sérios riscos de extinção com a exposição forçada pelos garimpeiros.

Outros problemas, como o álcool e o aumento da violência, também são consequência da maior presença de garimpeiros na Terra Indígena Yanomami e da maior proximidade dos invasores em relação aos povos originários.

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Dois dias depois, na quinta-feira, referiu-se aos índios como «uns coitados» e associou-os ao «sapo barbudo», em alusão ao ex-presidente brasileiro Lula da Silva, segundo indica o portal oantagonista.com.

Desde o passado dia 22, a mobilização nacional «Luta pela Vida», em Brasília, reúne cerca de 6000 indígenas num acampamento organizado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em conjunto com todas as suas organizações de base.

Demarcações dos territórios indígenas em causa

O movimento indígena, que tem vindo a denunciar repetidamente o agravamento das violências contra os povos originários no país sul-americano, dentro e fora dos territórios tradicionais, está a acompanhar o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o futuro das demarcações de terras indígenas.

A continuação do processo no STF foi adiada para a próxima quinta-feira, dia 1 de Setembro. Em causa está o chamado «marco temporal», de acordo com o qual os índios só podem reivindicar a demarcação de terras nas quais se encontravam estabelecidos antes da promulgação da Constituição de 1988.

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Com Bolsonaro, existe «uma política anti-indígena sistemática e intencional»

A acusação é de Samara Pataxó, assessora jurídica da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), que no passado dia 9 denunciou o presidente brasileiro no Tribunal Penal Internacional (TPI).

Créditos / APIB

Pela primeira vez, os povos indígenas brasileiros uniram-se para denunciar um presidente no TPI. No Dia Internacional dos Povos Indígenas, 9 de Agosto, a APIB, em conjunto com a sua equipa de advogados, solicitou à procuradoria do Tribunal Penal Internacional, com sede em Haia (Países Baixos), que examine os crimes praticados contra os povos indígenas pelo presidente Jair Bolsonaro desde o início do seu mandato, em Janeiro de 2019.

A equipa jurídica entende que «estão em curso no Brasil actos que se configuram como crimes contra a humanidade, genocídio e ecocídio», e, «dada a incapacidade do actual sistema de justiça no Brasil de investigar, processar e julgar essas condutas», decidiu denunciar estes actos junto da comunidade internacional, através do TPI.

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Com Bolsonaro, «aumentaram as invasões a terras indígenas»

Dados preliminares divulgados esta terça-feira pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) apontam para um aumento das invasões de terras indígenas nos nove primeiros meses do governo de Bolsonaro.

Povo Yanomami realiza manifestação na região do Ajarani, em Roraima
Créditos / Blog da Funai

O organismo, ligado à Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), refere que entre Janeiro e Setembro deste ano foram registadas 160 «invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao património» a 153 terras indígenas em 19 estados brasileiros.

O Cimi sublinha que estes dados apontam para mais casos, mais terras originárias e mais estados relativamente a todo o ano de 2018, quando foram contabilizados 111 casos em 76 terras indígenas de 13 estados da federação, segundo informa o portal brasil247.com.

O relatório do Cimi, intitulado «Violência contra os Povos Indígenas do Brasil – dados de 2018», refere ainda que, no ano passado se registou um aumento no número de assassinatos de indígenas (135) em relação a 2017 (110).

De acordo com o organismo, o tipo de invasões alterou-se nos últimos anos. Enquanto, antigamente, os invasores entravam na terra, roubavam madeira, exploravam minérios e depois, em algum momento, se iam embora, agora tem havido a invasão com intenção de permanecer nos terrenos.

«Chama a atenção o aumento da prática ilegal de loteamento das terras indígenas, especialmente na região Norte», diz o documento, em que o Cimi dá conta de um novo modelo de apropriação das terras dos povos originários, mais agressivo.

O relatório refere ainda que 305 povos habitam em 1290 terras indígenas no Brasil. Na maioria dos casos – 821 (63%) –, os territórios estão ainda em fase de reivindicação ou regulamentação; destes, 528 não tiveram qualquer providência tomada pelo Estado, noticia a mesma fonte.

O presidente Jair Bolsonaro já anunciou que não pretende demarcar ou finalizar a demarcação de quaisquer novas terras indígenas durante o seu governo.

Em declarações ao Brasil de Fato, Roberto Antônio Liebgott, do Cimi região Sul, disse que «o discurso de Bolsonaro na ONU é sinal [de] que não há perspectiva. A Funai [Fundação Nacional do Índio] foi completamente desmontada. Dados preliminares de 2019 já indicam que houve mais invasões do que no período anterior. Todo período de construção da democracia. Agora é um período de desconstrução.»

O levantamento do Cimi apurou outros problemas, como ameaças de morte (oito), conflitos por terra (11), casos de disseminação de álcool e outras drogas (11; apesar de a venda de bebidas alcoólicas a indígenas ser proibida em todo território brasileiro).

Ainda relativamente a 2018, o relatório regista 101 casos de suicídios de indígenas e, no âmbito da mortalidade infantil, 591 falecidos até aos cinco anos de idade.

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O crime contra a humanidade e o genocídio estão previstos no Estatuto de Roma, o tratado que estabeleceu o TPI. O primeiro, refere o portal da APIB, consiste em «extermínio, perseguição e outros actos desumanos», enquanto o segundo – genocídio – é «causar severos danos físicos e mentais e deliberadamente infligir condições com vistas à destruição dos povos indígenas».

Na denúncia, a Articulação apresenta uma série cronológica de acções do presidente e do governo federal contra as populações indígenas desde que Jair Bolsonaro assumiu a Presidência da República.

Política anti-indígena no discurso e em actos administrativos

Para Samara Pataxó, assessora jurídica da APIB, «o que se tem assistido desde o primeiro dia de mandato é a construção de uma política anti-indígena sistemática e intencional».

Esta política pode ser observada não apenas no discurso, mas em actos administrativos, «que mostra evidentemente que as atitudes do presidente Jair Bolsonaro configuram crime de genocídio e crimes contra a humanidade», defende Pataxó.

Entre outros aspectos, o documento apresentado em Haia aponta o desmantelamento das infra-estruturas públicas de garantia dos direitos indígenas e socioambientais, estimulando a invasão e o desmatamento de terras indígenas, bem como o garimpo ilegal nesses territórios.

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Mineração ilegal aumenta devastação na Terra Indígena Yanomami

Em plena pandemia, a actividade do garimpo ilegal avançou 30% no território e, só em 2020, desmatou o equivalente a 500 campos de futebol. Indígenas enfrentam mais riscos de doenças, violência e álcool.

o garimpo ilegal avançou na Terra Indígena Yanomami
Créditos / isoambiental.org

Um relatório divulgado esta quinta-feira revela que a exploração ou extracção de substâncias minerais (garimpo) ilegal está a entrar de forma cada vez mais rápida nas terras indígenas e na floresta amazónica.

O levantamento aponta para a proliferação de novos núcleos de invasores, mais próximos dos povos originários, incluindo de grupos de índios isolados, bem como para a abertura de novas rotas para dentro do território.

Intitulado «Cicatrizes na floresta: evolução do garimpo ilegal na TI Yanomami em 2020», o estudo foi produzido pela Hutukara Associação Yanomami (HAY) e a Associação Wanasseduume Ye’kwana (Seduume), tendo revelado que, entre Janeiro e Dezembro do ano passado, foi devastada uma área equivalente a 500 campos de futebol na Terra Indígena Yanomami, localizada no extremo Norte do Brasil, entre os estados do Amazonas e de Roraima.

O total de área desflorestada é de 2400 hectares, sendo que em 2020 se registou um aumento de 30%. Ou seja, mesmo com a pandemia de Covid-19, a actividade ilegal nunca parou, antes pelo contrário.

O relatório agora publicado denuncia como a actividade criminosa prolifera na terra indígena, subindo os rios e aproximando-se cada vez mais das comunidades indígenas, com novas rotas de acesso ao interior da floresta.

O novo levantamento também alerta para o modo como o avanço dos garimpeiros em território indígena tem levado doenças às comunidades, sobretudo malária e Covid-19, e colocado em risco a sobrevivência de grupos de indígenas isolados, como os Moxihatëtëma, que são mais vulneráveis às enfermidades e correm sérios riscos de extinção com a exposição forçada pelos garimpeiros.

Outros problemas, como o álcool e o aumento da violência, também são consequência da maior presença de garimpeiros na Terra Indígena Yanomami e da maior proximidade dos invasores em relação aos povos originários.



«Homem garimpeiro é como um porco de criação da cidade»

De acordo com o estudo, a actividade garimpeira no Território Indígena Yanomami realiza-se sobretudo de duas maneiras: em dragas flutuantes, localizadas nos leitos de grandes rios (Uraricoera, Mucajaí, Catrimani e Parima), e em terra firme, de modo semi-mecanizado, com recurso a mangueiras e a motores de combustão para extrair o sedimento de cavas ou barrancos.

Com recurso à monitorização remota, foi possível examinar o conjunto das cicatrizes deixadas por esta segunda modalidade, que inclui desmatamentos recentes, solo exposto, áreas recém-abandonadas e pequenas lagoas de rejeito, revela o Brasil de Fato.

O rio Uraricoera concentra mais de metade (52%) de toda a área degradada pelo garimpo identificada pela monitorização remota. Também é possível verificar que os novos locais de garimpo, surgidos no ano passado, estão colados às comunidades Yanomami e Ye’kwana. As pistas clandestinas de aterragem, agora, ficam a poucos metros do lugares onde os indígenas vivem.

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Aumento da exploração mineira ilegal na Amazónia atinge em força as áreas indígenas

Um mapa recente com informações da actividade em terras demarcadas e protegidas mostra que a Amazónia brasileira abriga 453 explorações ilegais. O povo Yanomami prepara-se para a investida de Bolsonaro.

Área da Amazónia afectada pela extracção mineira
Créditos / RAISG

Não sendo ilegal no Brasil, a exploração ou extracção de substâncias minerais (garimpo) é proibida em áreas protegidas e reservas indígenas. No entanto, o mapa Amazónia Saqueada, realizado pela InfoAmazónia e pela Rede Amazónica de Informação Socioambiental Georreferenciada (RAISG) – organização que reúne técnicos de seis países da Amazónia –, mostra que existem pelo menos 2312 pontos e 245 áreas não autorizadas de extracção de ouro, diamantes e coltan no Brasil, na Bolívia, na Colômbia, no Equador, no Peru e na Venezuela.

A pesquisa inédita compilou dados sobre a situação de mineração ilegal nos sete milhões de metros quadrados do território amazónico, sublinha o Brasil de Fato numa peça hoje publicada. No que respeita ao Brasil, a RAISG aponta a existência de 453 «garimpos» em 132 áreas.

Sobre a pesquisa, os dados recolhidos e o seu significado, Alicia Rolla, geógrafa do Instituto Socioambiental (ISA), que coordena a RAISG, afirmou ao Brasil de Fato que «as informações obtidas sobre a exploração em áreas indígenas e de conservação são obtidas através das instituições que trabalham na Rede».

Em seu entender, o mapa é importante para a compreensão da dinâmica extractivista de minérios. «O garimpo está presente dos dois lados da fronteira, e os garimpeiros atravessam-nas inclusive para fugir de fiscalização. Outra coisa que conseguimos observar é que a prática ilegal possui uma proximidade com a legal», afirmou a geógrafa.

Outro aspecto sublinhado são as consequências ambientais da exploração mineira ilegal – bastante sentidas pelos pelos indígenas e comunidades ribeirinhas que dependem dos recursos naturais em áreas demarcadas e de preservação. «O uso do mercúrio para separar o ouro da areia contamina os rios e, consequentemente, os peixes. Além disso, a extracção de minérios provoca o desmatamento para chegar ao subsolo, e o assoreamento dos rios, causando distúrbios ambientais como o aumento de mosquitos transmissores de doenças», destaca o Brasil de Fato.

Terra Yanomami em Roraima

«A nossa terra está demarcada pelo governo federal desde 1992, mas não está a ser respeitada», denunciou Dário Vitório Kopenawa Yanomami, vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami, no estado de Roraima. «Várias doenças estão a surgir por conta da contaminação e de crimes ambientais feitos pelos garimpeiros», acrescentou.

Os abusos cometidos na área indígena do povo Yanomami, com cerca de 9 419 108 hectares, são encaminhados para «órgãos públicos como a Fundação Nacional do Índio (Funai), a Polícia Federal (PF), o Ministério Público Federal (MPF) e para o Exército Brasileiro, para que assumam as suas responsabilidades», afirma.

Em Julho último, dois índios isolados foram mortos por garimpeiros. «Fizemos a denúncia para a Procuradoria-Geral da República e o Ministério da Justiça, e pedimos investigação sobre o garimpo ilegal, além de [uma] investigação sobre as mortes para o MPF e Polícia Federal», revela Dário.

De acordo com a pesquisa da RAISG, a extracção de minérios começou a chegar à terra Yanomami em 2010, e tem vindo a aumentar: no final de 2016, já tinham sido identificadas 49 balsas na região.


Resistência ao governo de Bolsonaro

Tendo em conta as declarações do presidente eleito, no passado dia 12, relativas às «riquezas de Roraima» – o seu subsolo, a sua terra e os seus recursos hídricos – e a reafirmação, num encontro com deputados dos Democratas, também na quarta-feira, de que, se depender dele, não haverá «demarcações de terras para indígenas», o povo Yanomami «prepara-se para resistir».

É que 46% do estado de Roraima é território indígena e, face às ameças de Jair Bolsonaro, Dário Vitório Kopenawa Yanomami destaca: «Estamos a organizar-nos e vamos posicionar-nos para cobrar os nossos direitos que estão na Constituição. Ele precisa de respeitar as áreas demarcadas, não pode quebrar o protocolo e enfrentar as autoridades anteriores que fizeram as demarcações.»

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O líder Yanomami e xamã Davi Kopenawa, presidente da Hutukara Associação Yanomami, disse ao Instituto Socioambiental (ISA) estar preocupado e revoltado com a actual invasão garimpeira.

«Você vê a água suja, o rio amarelado, tudo esburacado. Homem garimpeiro é como um porco de criação da cidade, faz muito buraco procurando pedras preciosas como ouro e diamante», afirmou Kopenawa.

«Há vinte anos conseguimos mandar embora esses invasores e eles retornaram. Estão entrando como animais com fome, à procura da riqueza da nossa terra. Está avançando muito rápido. Está chegando no meio da terra Yanomami. O garimpo já está chegando na minha casa», alertou.

O xamã disse ainda temer um conflito com os invasores. «Estou muito preocupado, pois o garimpeiro não está sozinho, são grandes grupos, andam armados, apoiados por empresários, pelo governador de Roraima e pelo presidente Bolsonaro, assim como outros empresários do Brasil. Aqui em Roraima, os garimpeiros, empresários e políticos não respeitam os povos indígenas, só querem tirar as nossas riquezas», denunciou Kopenawa.

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A este cenário, afirma a organização, acresce a inacção do governo de Bolsonaro em relação à propagação da pandemia de Covid-19 no seio de comunidades indígenas. Como exemplo, Pataxó citou o incumprimento de uma medida liminar do Supremo Tribunal Federal, que obrigava o governo federal a prestar assistência aos povos indígenas no âmbito da pandemia.

 «É a primeira vez que os povos indígenas do Brasil vêem um presidente posicionar-se contrariamente à demarcação de terras, que incentiva a actuação ilegal de garimpeiros, grileiros, o desmatamento nas terras indígenas, associados a uma política anti-indígena, quando tem discurso discriminatório e violento contra os povos indígenas e que surte efeitos concretos», acusa Samara Pataxó, em declarações ao Brasil de Fato.

Agosto Indígena

As organizações que integram a APIB preparam mobilizações em Brasília contra a agenda anti-indígena no Congresso e no Supremo Tribunal Federal.

Entre as propostas, está o chamado «marco temporal», uma tese jurídica segundo a qual os territórios só podem ser demarcados se os povos indígenas conseguirem provar que estavam a ocupar uma determinada área antes da promulgação da Constituição Federal (5 de Outubro de 1988) ou se ficar comprovado que existia um conflito pela posse da terra.

Além de inviabilizar a demarcação, o «marco temporal» promove a abertura dos territórios ao agronegócio, à mineração e à construção de hidro-eléctricas e outras obras, denunciam os povos indígenas.

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Esta tese político-jurídica é defendida pelo presidente brasileiro, segundo o qual «não teremos mais agricultura no Brasil» se a decisão for favorável aos indígenas, bem como pelos ruralistas que lhe são próximos e sectores políticos e económicos que têm interesse na exploração das terras indígenas.

Os defensores dos povos originários apontam que a tese é injusta porque desconsidera as expulsões, remoções forçadas e todas as violências sofridas pelos indígenas até a promulgação da Constituição.

Além disso, refere o Brasil de Fato, ignora o facto de que, até 1988, eles eram tutelados pelo Estado e não podiam recorrer para a Justiça de forma independente para lutar pelos seus direitos.

Para a Apib, trata-se de uma tese «anti-indígena», «que pretende, na realidade, expulsar os ocupantes originários das terras para destruí-las e explorá-las à exaustão», informa opovo.com.br.

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