|Um outro Mundial

Tempo para festejar um último golo

Em pleno Mundial de futebol, morreu o bibota Fernando Gomes. Nunca estaremos bem no momento em que sabemos que uma estrela que nos encantou na infância acaba de falecer. Um momento para relembrar um senhor dos relvados.

Há coisas que nunca esqueceremos. Em fevereiro de 1984, conheci pessoalmente Fernando Gomes. O FC Porto jogava em Torres Vedras e o avançado não havia sido convocado para o jogo da Taça de Portugal. Quis o destino que fosse almoçar à Serra da Vila, a aldeia onde viviam os meus avós paternos e onde eu frequentava o jardim escola. Foi um autêntico alvoroço, quando começou a correr a notícia de que um carro desportivo vermelho estava estacionado no largo, defronte do café do José Inácio, que também por ali tinha um restaurante. Imagino que o meu próprio almoço tenha decorrido na ânsia de ver o Gomes. E foi isso que aconteceu. Depois de comer o Fernando Gomes foi até ao café, distribuiu alguns calendários autografados e até pegou o meu irmão mais novo ao colo - coisa que o fez ser do FC Porto até que o próprio Gomes tenha mudado de clube. 

Há mesmo coisas que nunca esqueceremos. A quantidade de golos que Gomes marcava, a forma como festejava, como parecia tornar fácil esse gigantesco segredo que separa os vencedores dos aspirantes. Fernando Gomes deitado numa cama do hospital, depois de uma operação, a explicar como viveria a final da Taça dos Campeões Europeus de 1987 distante do relvado onde pertencia. Gomes a mudar-se para Lisboa, continuando a passear classe com a camisola do Sporting. Gomes a passar os anos mas a ter sempre aquela deferência e atenção que os grandes craques, aqueles craques que não têm mesmo comparação, sempre têm para quem os admira. Tal como nunca esquecerei que foi entre jogos deste Mundial que caiu essa triste notícia. A notícia de que Gomes iria agora marcar golos noutra dimensão. Nunca te esqueceremos, Bibota. 


Luis Enrique e a comunicação direta

Esqueçam as horas marcadas e as perguntas limitadas das conferências de imprensa, esqueçam as ilusões das fontes seguras sobre este ou aquele assunto, a comunicação direta chegou ao Mundial 2022 pelas mãos de um treinador que continua a inovar a toda a linha. Luis Enrique, o selecionador espanhol, criou uma conta no Twitch, plataforma de vídeos, onde de forma regular tem passado a conversar com os seus seguidores sobre tudo aquilo que acontece com a sua seleção, os seus jogadores, este Mundial e a sua estadia no Qatar. À hora em que estou a escrever este artigo, mais de 670 mil pessoas seguem a sua conta, com número de visualizações que excedem a quantidade de seguidores. Não é a comunicação do futuro, é o presente a apresentar-se de forma inequívoca.

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O tornozelo de Neymar, Messi e o feiticeiro

As lesões continuam a atormentar o Mundial, com Neymar a transformar-se em mais uma dúvida. Depois de uma entrada em falso, a Argentina tem um sinal a dar, num grupo onde a Arábia Saudita recebe a ajuda de um autêntico feiticeiro.

Neymar é reconfortado por colegas da seleção brasileira após ter saído lesionado do primeiro jogo dos canarinhos contra a Sérvia, no Mundial de 2022. Lusail, Catar, 24 de Novembro de 2022 
Créditos / SkySports

Sentado no chão, a face de Neymar Júnior parecia antever um reencontro com uma dor já conhecida. Havia um estranho conforto de quem sabe exatamente aquilo que está a viver. O jogador de futebol, de 30 anos, conhece demasiado bem o seu corpo. As dores não lhe surgem por surpresa, são uma situação constante, com a qual se aprende a viver e a lidar. Mas as lesões são algo de diferente. Um jogador pode aguentar a dor. A lesão é quem o faz parar.

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O futebol praticado por homens num campeonato de vários campeonatos

Entre a pressão que toca aos catarianos que querem brilhar em casa, os senegaleses sem a sua estrela e a afirmação daqueles que lutam pela liberdade onde ela insiste em ser limitada. Há homens para lá das polémicas.

Pedro Miguel, jogador do Catar, reage à derrota frente ao Equador no primeiro jogo do Mundial de Futebol 2022 
CréditosFriedemann Vogel / EPA

O nervosismo parece ter atacado os jogadores do Catar na partida de estreia deste Mundial. Erro nosso que, no foco que colocamos nas grandes questões que rodeiam o país organizador, pouca atenção acabámos por dar aos homens envolvidos na sua representação. A seleção catariana leva anos a preparar-se para esta competição. Um enorme investimento que coloca o talento de um conjunto de jogadores, que nunca atuou ao mais alto nível, perante uma situação insustentável. Com os olhos do mundo sobre a sua atuação, terá eventualmente sentido mais a exigência que os seus compatriotas lhes colocaram no dia de estreia.

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Portugal diante do espelho no Mundial 2022

Entre o que se joga em campo e no que fora dele acontece, Portugal olha-se ao espelho nos vários temas que este Mundial sugere. Há uma competição para ganhar, mas também questões que exigem resposta. Como em tudo na vida.

CréditosJosé Sena Goulão / Agência Lusa

Portugal entra hoje em campo para fazer a sua estreia no Mundial 2022, numa partida frente ao Gana. O sorteio ofereceu à seleção portuguesa um conjunto de jogos, nesta fase de grupos, onde será sempre considerada grande favorita. Essa é uma realidade que se mantém firmada deste a conquista do Euro 2016 com Fernando Santos.

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Não é a braçadeira, é o conhecimento

Uma investigação levou ao afastamento de vários focos de corrupção no seio da FIFA e das confederações continentais. Mas a bola rola no Catar... a sua riqueza permitiu-lhe ultrapassar todas as dificuldades.

Numa conferência de imprensa em Zurique, Suíça, a 20 de Julho de 2015, o antigo presidente da FIFA, Sepp Blatter, foi recebido por uma chuva de notas de dólares, atirados por um comediante inglês. Blatter esteve envolvido no processo corrupto que levou à escolha do Catar para a realização do Mundial de Futebol de 2022.
Créditos / Yahoo!

A tendência para medir os resultados das manifestações através das medidas concretas que são tomadas pelas instituições desvia-nos daquele que deve ser o caminho da transformação da sociedade. O que aqui está em causa não são as braçadeiras. O que está em causa é a informação que chega às pessoas. 

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O coração de Eriksen e o apelo dinamarquês

A 12 de Junho de 2021, o coração de Christian Eriksen parou. Um ano depois, Eriksen já encanta nos terrenos da Premier League e vai voltar a liderar a seleção da Dinamarca no Mundial do Catar.

Christian Eriksen usou uma braçadeira arco-irís em 2017, durante a qualificação para o Mundial de 2018, em apoio às pessoas LGBTI+ 
Créditos / @Squawka

A 12 de Junho de 2021, em Copenhaga, o coração de Christian Eriksen parou. Estava no centro do relvado, numa partida entre a sua seleção e a da Finlândia, a contar para o Euro 2020. O mundo inteiro assistiu à queda da estrela dinamarquesa, à união e ao desespero dos seus colegas e familiares, temendo uma tragédia televisionada. O jogo, no entanto, continuou. A Dinamarca, com Christian Eriksen já consciente e a recuperar numa cama de hospital, seguiu heroicamente até às meias-finais, acabando como uma das surpresas da prova.

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O grupo de todos os conflitos

Quis o sorteio que o Grupo B nos lançasse uma série de encontros que deixam água na boca a quem estuda e acompanha as grandes questões do mundo. Um grupo onde se joga muito mais do que apenas um resultado.

Mehdi Taremi, ponta-de-lança do FC Porto, vai representar a seleção do Irão no Mundial de 2022, no Catar 
CréditosJosé Sena Goulão / Agência Lusa

Quis o sorteio que o Grupo B nos lançasse uma série de encontros que deixam água na boca para quem estuda e acompanha as grandes questões do mundo. Inglaterra, Estados Unidos, Irão e País de Gales disputam duas posições no apuramento.

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O mundo no Mundial

O Mundial 2022, de uma forma cruelmente evidente, é muito mais do que uma competição de futebol. Outros valores se levantam no momento em que a bola começa a rolar. E parece ter pouco ou nada que ver com o futebol.

Luís Cristóvão, <em>Um Outro Mundial </em>
Créditos

Cada edição do Mundial de futebol é um momento de olhar o mundo e perceber como ele evolui. Para os cidadãos de 2022, o fato deste Mundial se realizar no Qatar trará mais reflexões sobre os problemas do que saudações sobre os avanços provocados pelo mesmo.

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O futebol, o Mundial e o nosso dever de intervenção

Contra aqueles que acreditam que os problemas do Mundo se resolvem com o cancelamento dos mesmos nas agendas pessoais, o envolvimento e a intervenção nos acontecimentos como uma resposta aos problemas que estes podem estar a gerar. Uma oportunidade para pensar no que é o futebol e onde somos colocados pela realização deste Mundial no Qatar.

CréditosWalter Bieri / EPA

O que é o futebol

Desde sempre que, em quase tudo no mundo, se pretendeu ter a capacidade de dividir as coisas em dois, polarizando as escolhas como adesões inquestionáveis a um dos lados da contenda. Ao longo da sua história, o futebol foi apenas mais uma dessas coisas do mundo que se ama ou se odeia. Muitos e muitas dos apaixonados pelo desporto encaram o futebol como o irmão velho e rico que parece encostar-se ao seu privilégio para se impor sem qualquer preocupação com os restantes. O futebol enquanto ópio do povo também é uma ideia muito partilhada por uma determinada elite, tendente apenas a entender as dinâmicas negativas criadas por um acontecimento que convoca paixões e multidões onde quer que ocorra. Por outro lado, muitos daqueles que se embrenham no acontecimento futebolístico também o tendem a fazer de forma absoluta, incapazes de o questionar ou de analisar as diferentes escalas em que as coisas do futebol, como as de todas as outras coisas da vida, se podem dividir.

Gostar de futebol não é um contrato exclusivo com uma construção ilusória a partir de um desporto que tende a embrenhar-se numa dinâmica de dinheiro e poder. É, na verdade, muito do seu contrário. Porque apesar de todos os movimentos que se podem gerar em volta do terreno de jogo, o futebol continua a ser muito semelhante àquilo que sempre foi. Um período de tempo predeterminado, onde duas equipas de número igual de elementos tentam vencer a outra, dentro de um quadro de regras simples aceites pelas duas partes. Neste intervalo de noventa minutos, podemos assistir a todas as grandes dinâmicas da vida. A importância da preparação e do planeamento. A força da organização coletiva. A inebriante esperança de podermos ser melhores do que qualquer rival que nos desafie. A capacidade de transformar fraquezas em forças. A emoção de um objetivo alcançado. O drama de uma derrota inesperada. Tudo dentro desse quadro controlado de quem sabe que, amanhã, o nosso pensamento já estará a focar-se no desafio seguinte.

Mas o futebol é também um meio de transformação social. Dos jogadores, que chegam quase todos de classes menos privilegiadas e, através do seu talento e do seu trabalho, conquistam uma ascensão social inimaginável em qualquer outra área profissional. Das comunidades, que se organizam em redor de um clube e crescem e se desenvolvem como exemplos de cooperação e sucesso. Dos adeptos, que aí encontram maneiras de expressar as suas raivas e as suas esperanças, concentradas numa prática de afirmação que lhes é impedida em muitas outras áreas da sua vida. E de tantos, tantos outros, que acabam por encontrar no futebol uma maneira de explicar o seu mundo através de uma língua franca que lhes abre portas em qualquer labirinto. Tudo isto é o futebol, o futebol que apaixona, o que futebol que se reinventa, o futebol ao qual continuamos a aspirar.


Onde nos coloca este Mundial

A realização do Mundial no Qatar coloca-nos uma série de questões que são muito relevantes no quadro do mundo em que vivemos no ano de 2022. A ausência de transparência na atribuição deste evento, a quebra da tradição no período do ano em que ocorre, o posicionamento do país que o recebe na defesa dos direitos humanos, largamente deficitário em relação aos padrões mínimos exigíveis, os condicionamentos impostos a todos aqueles que visitem o país, as opções na defesa do planeta perante as ameaças das alterações climáticas e outras tantas notícias que chegam do Qatar são pontos que merecem preocupação e análise. Os Mundiais de futebol têm um historial de debate em relação aos países que os organizam. Assim foi em Itália em 1934, na Argentina em 1978 ou na Rússia em 2018, apenas para citar os casos mais paradigmáticos e comparáveis com o que vai acontecer no Qatar. Importante que em todos esses casos seja a memória do que estava mal em cada um desses países aquela que perdura na mente da maioria das pessoas.

Parafraseando Jorge Valdano, o Mundial do Qatar pode ser uma oportunidade. Aliás, a mesma oportunidade que o futebol sempre nos ofereceu. Para reconhecer o mundo para além do limite do nosso alcance e entendimento, para nos colocar perante o desconhecido, mas também para debater, discutir e denunciar tudo aquilo que nos vários países que disputam esta prova é digno de ser transformado. O futebol sempre foi e sempre será isso mesmo. A chamada de atenção para algo que merece ser observado. Aliás, o Qatar está já a passar por isso mesmo. A forma como várias notícias e campanhas têm sido desenvolvidas – acompanho de mais perto aquelas realizadas pela Amnistia Internacional e a Human Rights Watch, mas existem mais organizações com trabalhos bastante meritórios, tal como vários jornalistas – já obrigou o país a modificar comportamentos que impedem que a situação dos trabalhadores seja tão má como já foi. Será preciso ir mais longe – o foco nunca deve ser apenas e só aquilo que é afetado pelo Mundial, mas em todos os cidadãos e habitantes, nas suas diferentes profissões e posicionamentos, merecem receber a nossa atenção e palavra. De maneira a que o Mundial seja uma janela onde a voz de quem tem algo a dizer encontre o palco que procura.

Os tempos que vivemos são particularmente tensos. Mas o esforço que fazemos terá de ser o de manter a capacidade para identificar as melhores maneiras de intervir em cada espaço. Compreendo perfeitamente quem prefere “cancelar”, nas suas agendas pessoais, a existência deste Mundial. No entanto, não alinho na opção de tapar os olhos e os ouvidos perante as injustiças do mundo. Bem pelo contrário. O Mundial será uma oportunidade para continuarmos atentos ao que acontece no mundo. Enquanto, no terreno de jogo, os melhores jogadores do mundo tentarão uma vez mais, através da expressão do seu talento, da sua inteligência e do seu trabalho, transformar o mundo a cada toque na bola. Poderão considerar isso uma utopia. Mas acredito ser um pouco mais do que isso. Acredito ser a minha obrigação de me envolver nas coisas para que delas se aproveite algo mais, através da observação e da análise. Daí que se entre, a partir de agora, em modo-Mundial, aqui por casa. Com a mesma dedicação de sempre.

Artigo publicado numa primeira versão no site luiscristovao.com 

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É inegável que o processo de escolha do país organizador esteve envolto em problemas de corrupção, tal como é inegável a fatura em vidas humanas do apressado desenvolvimento de um país que procura, num espaço de trinta anos, transformar a sua face. Por outro lado, joga-se pela primeira vez um Mundial num país árabe muçulmano, no que isso acaba por significar para as possibilidades de diálogo entre dois mundos que, na sua aparência, vivem de costas voltadas.

O Mundial 2022, de uma forma cruelmente evidente, é muito mais do que uma competição de futebol. Com a invasão militar russa na Ucrânia e as consequentes crises económicas e energéticas que afetam toda a Europa, as matérias-primas do Qatar conquistaram um peso ainda maior no equilíbrio do mundo em que vivemos. Não é por isso de espantar que tantos queiram virar a cara ao desrespeito pelos direitos humanos, direitos climáticos, direitos de trabalho, direitos das mulheres ou liberdade sexual neste país. Outros valores se levantam no momento em que a bola começa a rolar. E parece ter pouco ou nada que ver com o futebol.

O Qatar da bola

Apesar de ser apenas o segundo país a organizar um Mundial sem nunca antes ter participado num (sendo a Itália de Mussolini, em 1934, o outro exemplo), é difícil negar que o Qatar tem uma tradição futebolística.

«Apesar de ser apenas o segundo país a organizar um Mundial sem nunca antes ter participado num, é difícil negar que o Qatar tem uma tradição futebolística.»

Atuais campeões asiáticos, o Qatar participou, desde a sua independência, em onze, das trezes, edições da Taça Asiática. Conquistou a Taça do Golfo por três vezes. Participou nos Jogos Olímpicos de 1984. Foi finalista, vencido, no Mundial de Sub-20 em 1981, prova que organizou em 1985.

A caminho do atual Mundial, a seleção qatari aproveitou talento naturalizado para formar o seu grupo, com jogadores nascidos no Sudão, no Gana, no Egito, em França, em Portugal, no Iraque. Mas também encontra espaço para uma nova geração de qataris filhos de imigrantes. Apresentar-se ao nível dos rivais é um objetivo mínimo para a equipa orientada pelo espanhol Félix Sánchez.

Ainda há futebol de rua

Aos 23 anos, Moisés Caicedo é uma das figuras da seleção do Equador, que em 2014 atingiu os oitavos-de-final do Mundial. Nesse mesmo ano, Moisés deixou as ruas de Santo Domingo de los Tsáchilas, onde jogava com os seus dez irmãos, para entrar na academia do Independiente del Valle. Nesta equipa venceu a Taça dos Libertadores em Sub-20 e foi contratado pelo Brighton, da Premier League inglesa.

É um longo caminho para um jovem jogador que enche o meio-campo com uma personalidade e uma capacidade apenas ao alcance dos predestinados. Num momento em que, na Europa, se chora a ausência do futebol de rua, o Mundial marca a sua estreia com bons exemplos do que serve para fazer crianças pelo mundo inteiro sonhar. Talvez em alguma rua jogue agora alguém que, daqui a uns anos, cumprirá o seu sonho.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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Para os ingleses, uma passagem para esquecer nas Ligas das Nações parece ter refreado o entusiasmo. Os Estados Unidos, depois da ausência em 2018, lançam uma jovem geração em quem muito acreditam. Para os iranianos, envoltos em problemas sociais, cada Mundial é sempre uma ocasião para evidenciar a sua capacidade de luta e resistência. Para os galeses, apoiados no talento de Gareth Bale, trata-se do regresso a um Mundial sessenta e seis anos depois de muitas desilusões e de muitos craques que não tiveram a oportunidade de chegar a pisar este palco.

Um grupo onde se joga muito mais do que apenas um resultado.

Um Irão de face destapada

A forma como vários jogadores da seleção iraniana criticaram as autoridades do seu país e manifestaram o apoio às mulheres que exigem progresso e liberdade no Irão foi mais um rasgão na tradição de uma equipa fechada sobre si mesma. O elevar da voz em apoio à população demarcou uma geração de jogadores que têm realizado grande parte das suas carreiras na Europa, vivenciando outros enquadramentos e percebendo o lugar que ocupam como exemplos para os seus concidadãos.

Carlos Queiroz, chamado a atenuar o clima de conflito numa equipa onde já experienciou bastantes sucessos, parece ter optado por um caminho diferente no comentário pedido por um jornalista à situação no país. «Quanto é que me paga para responder a essa pergunta?», questionou o treinador português. Difícil de entender como se terão sentido Azmoun e Taremi ao ouvir o seu técnico expressar-se assim.

O Mundial das ausências

Dos muitos ausentes nesta competição, o senegalês Sadio Mané será aquele que mais custará não ver no Qatar. Depois de ter vencido tudo o que havia para vencer ao serviço do Liverpool e de ter conquistado a Taça das Nações Africanas com o seu país, o Mundial 2022 seria o momento de maior impacto da sua carreira, podendo conduzir o Senegal às eliminatórias, depois de uma saída frustrante na fase de grupos em 2018.

No entanto, uma lesão, sofrida a 8 de Novembro com a camisola do Bayern de Munique, acaba por impedi-lo de jogar a competição. A vida tornou-se, de repente, bem mais complicada para os senegaleses, que passam de candidatos a revelação a uma das equipas que pode acabar por ficar pelo caminho no Grupo A, que partilham com os Países Baixos, Equador e Qatar.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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Passou mais de um ano e Christian Eriksen já voltou a encantar nos terrenos da Premier League, primeiro ao serviço do Brentford, agora com o Manchester United. Vai voltar a ser ele a liderar a seleção da Dinamarca no Mundial do Catar. Uma seleção que tentou, pela via diplomática, abrir espaço para várias manifestações na defesa dos direitos humanos neste país.

Nas últimas conferências de imprensa, jogadores, treinador e dirigentes não deixaram de transmitir a sua mensagem. O patrocinador do equipamento quase apagou os símbolos do mesmo, tentando expressar a sua indignação perante os acontecimentos que rodeiam esta competição. Ao entrar em campo, a Dinamarca não estará calada perante as injustiças que outros tentam defender.

Karim Benzema, o ausente

O Mundial que iria ser o de Karim Benzema, o melhor jogador do mundo, já não será. Uma lesão roubou ao avançado do Real Madrid uma oportunidade que esperava desde o início da sua carreira. O seu único Mundial foi jogado no Brasil, em 2014. Uma longa ausência da seleção, devido a uma participação num esquema de chantagem sobre um colega, retirou expressão internacional a um jogador que sempre brilhou ao serviço do seu clube.

«A diversidade apresentada pela seleção campeã do mundo em 1998 nunca foi vivenciada com tranquilidade social num país (...) que também foi vendo crescer a expressão da extrema-direita na sua realidade política.»

A história de Benzema é um pouco a história da França nas últimas décadas. A diversidade apresentada pela seleção campeã do mundo em 1998 nunca foi vivenciada com tranquilidade social no país. Acusações de diferença de tratamento dado a descendentes de africanos nos escalões de formação, problemas de integração de jovens de ascendência magrebina nas seleções, são situações que se sentem num país que, neste período, também foi vendo crescer a expressão da extrema-direita na sua realidade política.

Não ter Karim Benzema neste Mundial é, para além disso, só mais um problema para Didier Deschamps. As lesões já haviam deixado de fora Presnel Kimpembe, Christophe Nkunku e N’Golo Kanté, todos com boas perspetivas de serem titulares. Paul Pogba, outra das estrelas, também fica de fora devido a problemas físicos, num ano em que os seus conflitos familiares extrapolaram para o público e demonstraram um entorno problemático para um jogador que ainda não encontrou tranquilidade na sua carreira. A caminhada da França até este Mundial é uma aventura feita de imensos labirintos.

A casa saudita

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Ataques aéreos sauditas provocam dezenas de mortos no Iémen

Aviões de guerra sauditas bombardearam diversas províncias iemenitas esta madrugada, incluindo zonas residenciais na cidade de Hudaydah e um centro de detenção em Saada.

A coligação liderada pelos sauditas comteue um novo massacre no Iémen, afirmam as autoridades iemenitas 
Créditos / Al Mayadeen

Os sauditas levaram a cabo mais de 70 ataques aéreos nas últimas horas. Ontem à noite, voltaram a violar o cessar-fogo na cidade costeira de Hudaydah, atingindo uma torre de telecomunicações e bairros residenciais, onde faleceram pelo menos seis pessoas, três delas crianças, e outras 18 ficaram feridas.

Ali al-Ahdal, director provincial da Saúde, disse ao canal iemenita al-Masirah que um edifício de três andares foi arrasado no ataque. As autoridades da estratégica cidade portuária, localizada cerca de 140 km a sudoeste da capital, Saná, continuam à procura de sobreviventes nos escombros.

Em Saada, no Noroeste do país, a aviação saudita atacou um centro de detenção temporário, provocando elevado número de vítimas. «Os hospitais estão cheios de mortos e feridos, e precisamos desesperadamente de medicamentos e de equipamento médico», disse o governador de Saada, Mohammed Jaber Awad, à al-Masirah.

O canal iemenita aponta para 180 vítimas mortais, enquanto o correspondentes da Al Mayadeen confirmou a existência, até ao momento, de 62 mortos e 120 feridos, referindo que o número de mortos aumenta à medida que as equipas de socorro efectuam buscas nos escombros.

A coligação liderada pelos sauditas intensificou os bombardeamentos no Iémen desde terça-feira, depois de as forças iemenitas terem lançado um ataque com mísseis e drones contra «infra-estruturas estratégicas» nos Emirados Árabes Unidos.

«Desespero da coligação saudita»

Mohammed Ali al-Houthi, membro do Conselho Político Supremo do Iémen, afirmou que os ataques a zonas residenciais de Hudaydah são um «crime de guerra».

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Intensos bombardeamentos da coligação saudita sobre Saná

O ataque de retaliação levado a cabo pela Arábia Saudita esta madrugada parece ser o mais mortífero desde 2019 na capital do Iémen, tendo provocado cerca de duas dezenas de mortos.

Casa destruída pelos bombardeamentos sauditas desta madrugada 
Créditos / Al Jazeera

Uma das zonas atingidas pela aviação saudita foi o bairro residencial de Al-Libi, em Saná, onde esta manhã o número de vítimas mortais ascendia a 23, segundo o correspondente no local da Al Mayadeen.

Por seu lado, a cadeia de TV iemenita al-Masirah refere que várias casas foram destruídas ou ficaram danificadas e que prossegue a busca por sobreviventes no meio dos destroços. Até ao momento, há registo de uma dezena de feridos.

Nas últimas 24 horas, a aviação da coligação militar liderada pelos sauditas levou a cabo mais de meia centena de raides em várias zonas da capital e províncias iemenitas, segundo a mesma fonte.

Em comunicado, citado pelo canal libanês Al Mayadeen, a coligação referiu que os ataques aéreos sobre Saná, levados a cabo ontem à noite e hoje de madrugada, surgem como «resposta à ameaça e são dedicados à necessidade militar», acrescentando que «a situação no terreno requer ataques contínuos em resposta à ameaça».

De acordo com as autoridades iemenitas, prosseguem as buscas por sobreviventes nos escombros das casas destruídas e danificadas em Saná / @sadam_alqudami / Al Mayadeen

Retaliação pelo ataque iemenita contra «infra-estruturas estratégicas» em Abu Dhabi

Tudo parece indicar que os intensos bombardeamentos desta noite são um acto de retaliação pelo ataque que o Exército iemenita lançou, ontem, contra «infra-estruturas estratégicas» nos Emirados Árabes Unidos (EAU), em virtude do seu papel na guerra de agressão contra o Iémen.

De acordo com as autoridades emiradenses, os ataques levados a cabo com mísseis e drones atingiram as instalações da empresa petrolífera nacional na zona industrial de al-Musaffah e uma zona de construção perto do Aeroporto Internacional de Abu Dhabi, provocando três mortos – um cidadão paquistanês e dois de nacionalidade indiana – e seis feridos.

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Venda de armas aos sauditas é sinal «preocupante» do arrastar da guerra no Iémen

O Departamento de Estado dos EUA aprovou o primeiro grande negócio de venda de armas aos sauditas na administração de Biden, algo que pode revelar a intenção de Riade de prolongar a agressão ao Iémen.

Edifícios destruídos e danificados após um bombardeamento saudita no Iémen; a agressão da coligação liderada pelos sauditas começou em Março de 2015 
Créditos / PressTV

Num comunicado emitido quinta-feira passada, o Pentágono deu conta da aprovação, pelo Departamento de Estado norte-americano, da venda de 280 mísseis ar-ar à Arábia Saudita, no valor de 650 milhões de dólares, para que Riade pudesse fazer frente a ameaças actuais e futuras.

Para o académico norte-americano Richard Falk, especialista em direito internacional e relações internacionais, o primeiro grande negócio de vendas de armas da era Biden aos sauditas, «os chamados mísseis defensivos ar-ar», constitui «um sinal preocupante das intenções sauditas de prosseguimento das suas políticas cruéis de devastação do Iémen».

Numa entrevista à PressTV, Falk, que foi professor na Universidade de Princeton durante mais de três décadas, afirmou que «a posse de uma defesa anti-mísseis mais segura permite aos sauditas continuarem a sua intervenção armada no Iémen, e possivelmente noutros locais, com menor temor de ataques de retaliação».

Richard Falk destacou as «relações especiais» entre Washington e Riade, afirmando que os EUA procuram defender os interesses sauditas e desviar as críticas que são dirigidas a Riade nas Nações Unidas.

EUA usam a sua influência para proteger a Arábia Saudita

«Os Estados Unidos estão a usar a sua influência geopolítica para proteger a Arábia Saudita da crítica na ONU e noutros lugares, gozando novamente com os compromissos colectivos de segurança e com a proibição incondicional da Carta das Nações Unidas do uso de força não defensiva. Estas relações especiais deixam claro que as relações internacionais continuam a ser moldadas pela primazia da geopolítica e não pelas normas internacionais», disse o académico.

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EUA são o maior exportador de armas e a Arábia Saudita o maior importador

Um relatório recente revelou que os EUA foram responsáveis por mais de um terço da venda de armamento a nível mundial nos últimos cinco anos, enquanto os sauditas foram os que mais importaram.

Donald Trump, president dos EUA, num encontro na Casa Branca com Mohammed bin Salman, príncipe herdeiro da Arábia Saudita, em Washington, Março de 2018
Créditos / CGTN

As exportações de armas que tiveram como origem os EUA, entre 2016 e 2020, representaram 37% de todos os negócios registados pelo Instituto Internacional de Estudos para a Paz de Estocolmo (SIPRI, na sigla em inglês).

Metade das exportações norte-americanas de armamento teve como destino o Médio Oriente, e a Arábia Saudita foi de longe o principal parceiro de negócio no período referido, representando quase um quarto de todas as vendas dos EUA (24%).

O instituto sediado em Estocolmo afirma que, entre 2016 e 2020, as exportações de armas dos EUA aumentaram 15% em comparação com o período 2011-2015.

A Rússia foi o segundo maior exportador de armas a nível global, representando um quinto do total de exportações registadas (com menos 22% de vendas que no período 2011-2015).

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Empresas francesas continuam a treinar tropas sauditas para matar no Iémen

Várias empresas francesas especializadas em treino militar participam na formação de oficiais sauditas e nunca deixaram de o fazer desde o início da guerra de agressão ao Iémen, revela uma reportagem.

Quartel da Polícia destruído após o bombardeamento da aviação saudita
A guerra de agressão ao Iémen tem dado lucros de milhares de milhões às empresas de armamento Créditos / mintpressnews.com

A notícia foi divulgada esta segunda-feira no portal da cadeia iemenita al-Masirah, que cita uma reportagem realizada conjuntamente pelos órgãos Lighthouse Reports, Arte e Mediapart, em parceria com o EUobserver.

De acordo com a investigação, o DCI Groupe, detido maioritariamente pelo Estado francês, está a dar treino de artilharia a membros da Guarda Nacional da Arábia Saudita numa escola militar em Draguignan, no Sudeste de França.

As mesmas fontes revelam que a multinacional francesa Thales Group e a filial francesa da RUAG, com sede na Suíça, estão envolvidas no treino de tropas sauditas, facultando-lhes o equipamento de simulação necessário à operação do sistema de artilharia Caesar, desenvolvido pela França, e que pode atingir quase meio milhão de iemenitas.

A al-Masirah refere ainda uma reportagem do meio de comunicação Disclose, de acordo com a qual um cargueiro deverá carregar munições para o sistema Caesar. O mesmo órgão revelou que a França irá entregar mais de cem caesars à Arábia Saudita até 2023.

Este sistema de artilharia é produzido pela Nexter Systems, uma empresa estatal francesa de fabrico de armamento. No final de 2018, 48 destes sistemas móveis estavam posicionados na fronteira da Arábia Saudita com o Iémen.

A reportagem refere que um documento interno filtrado pela agência militar francesa de inteligência – DRM – já então alertava para os riscos que os Caesars representavam para a população civil no Iémen. «A população abrangida por potencial fogo de artilharia: 436 370 pessoas», referiu o documento, datado de 25 de Setembro de 2018.

O mesmo documento dizia que os Caesars também desempenham um papel no apoio às «tropas lealistas e Forças Armadas sauditas no seu avanço em território iemenita».

Se não fosse o negócio das armas...

No ano seguinte, o fogo da artilharia das forças da coligação liderada pelos sauditas atingiu um mercado iemenita perto da fronteira, provocando a morte a 89 civis. Em Setembro, o Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas, debruçando-se sobre o Iémen, sublinhou que a venda de armamento apenas serve para perpetuar o conflito.


«Se não fosse o negócio das armas, a guerra não se prolongaria como está a acontecer, a guerra não continuaria a destruir o povo do Iémen como o tem feito», disse Ardi Imseis, um dos autores da reportagem.

A comunicação social britânica já tinha revelado informações semelhantes sobre a ampla participação de empresas do Reino Unido na monitorização dos ataques aéreos e na preparação de aviões, armas e munições da coligação invasora, refere a al-Masirah, notando que o mesmo é válido para os EUA, cujo envolvimento se tornou público e documentado.

Para a cadeia iemenita, esta reportagem vem confirmar que a «coligação» liderada pelos sauditas foi desde o início uma fachada para as potências ocidentais, que dirigem as operações que atingem o Iémen.

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A França, com 8% das vendas, é o terceiro maior exportador. Seguem-se a Alemanha (5,5%) e a China (5,2%), para fechar a lista dos cinco países que mais armas venderam entre 2016 e 2020. Na parte inferior do «top dez» situam-se Reino Unido, Espanha, Israel, Coreia do Sul e Itália.

O SIPRI nota que, por comparação com 2011-2015, os últimos cinco anos registaram um pequeno decréscimo no volume de vendas de armamento (menos 0,5%), pondo fim a mais de uma década de aumentos sucessivos.

Foi a primeira vez desde o período 2001-2005 que o volume de trocas de armas entre países – um indicador da procura – não registou um aumento por comparação com o período anterior de cinco anos.

Arábia Saudita, o maior importador

Os países do Médio Oriente registaram o maior aumento de importações de armas a nível mundial entre 2016 e 2020, importando mais 25% que nos cinco anos anteriores. Arábia Saudita (61%), Egipto (136%) e Catar (361%) registam os maiores aumentos.

Quatro dos dez maiores importadores de armas são desta região, que representa 33% das importações a nível global: aos três países referidos juntam-se os Emirados Árabes Unidos. Só a Arábia Saudita representa 11% de todo o volume de armas importadas mundialmente nestes cinco anos.

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Sauditas usaram mais de 3000 bombas de fragmentação no Iémen

A coligação liderada pelos sauditas recorreu a bombas de fragmentação de fabrico diverso ao longo da guerra de agressão contra o Iémen, desde 2015, provocando centenas de vítimas civis.

Crianças numa zona bombardeada no Iémen
Créditos / Sputnik News

«As informações e os dados que temos mostram que foram utilizados oito tipos de bombas de fragmentação, de fabrico norte-americano, britânico e brasileiro, durante a guerra no Iémen», revelou Ali Sofra, director-geral do Centro Executivo de Desminagem do Iémen, informaram este domingo os canais de notícias al-Maloumeh e al-Masirah.

O responsável precisou que a Arábia Saudita e os seus aliados lançaram 3179 bombas de fragmentação no Iémen desde o início da campanha de agressão, em Março de 2015, e que as vítimas civis, na sua maioria mulheres e crianças, são mais de mil. Muitas delas perderam a vida quando se encontravam em campos agrícolas e áreas de pasto.

«A monarquia árabe utilizou esse armamento, cujos efeitos são intrinsecamente indiscriminados, nos ataques aéreos que levou a cabo nas províncias de Saada, Saná, Hajjah, Hudayda, Jawf, Amran, Taizz, Dhamar e Mahwit», disse ainda Sofra, citado pela HispanTV.

Em Junho do ano passado, o Ministério iemenita dos Direitos Humanos alertou para os riscos que este tipo de armamento colocava à população civil, uma vez que é pouco preciso, abrange extensas áreas e constitui um perigo mortal para os civis mesmo depois de terminado o conflito. O Ministério acusou então a coligação liderada pela Arábia saudita de ter usado milhares de bombas de fragmentação em áreas residenciais, provocando inúmeras vítimas mortais.


A Organização das Nações Unidas (ONU) condenou a utilização destas munições no Iémen, considerando que se trata de «um crime de guerra». Em 2010 entrou em vigor a Convenção contra as Bombas de Fragmentação, que havia sido assinada dois anos antes por mais de uma centena de países.

Num tweet publicado esta segunda-feira, Ali Sofra criticou as organizações internacionais e de direitos humanos por evitarem falar sobre a existência de ataques aéreos e a utilização de bombas de fragmentação no Iémen. «Quaisquer vítimas de bombas de fragmentação no Iémen não são referidas nos seus relatórios anuais humanitários e de direitos humanos», escreveu, citado pela PressTV.

EUA «congelam» venda e Itália deixa de vender armamento aos sauditas

Joe Biden, o presidente recentemente empossado dos EUA, um dos grandes fornecedores de armamento à coligação liderada pelos sauditas e um dos principais envolvidos no Ocidente, juntamente com o Reino Unido, na guerra de agressão ao Iémen, anunciou na quarta-feira da semana passada o congelamento da venda de armas à Arábia Saudita e aos Emirados Árabes Unidos, cujo volume de negócio tinha incrementado fortemente sob os auspícios de Donald Trump.

Na sexta-feira, a Itália – um de vários países ocidentais envolvidos na venda de armas à Arábia Saudita e que muito lucram com a guerra de agressão ao Iémen – anunciou o fim da exportação de armamento à Arábia Saudita e e aos Emirados Árabes Unidos.

Luigi Di Maio afirmou que se tratava de um «acto necessário», de uma «clara mensagem de paz do nosso país» e que, para a Itália, o «respeito pelos direitos humanos é um compromisso inquebrável». Se for para valer, mais vale tarde que nunca. A guerra e o martírio do povo iemenita começaram há seis anos.

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Os EUA foram responsáveis por mais de metade das armas exportadas para a região (52%), seguindo-se a Rússia (13%) e a França (12%).

A região do mundo que mais armas importou foi a Ásia e Oceânia (42%). Índia, Austrália, China, Coreia do Sul e Paquistão foram os países que mais armas importaram na região.

O SIPRI afirma que é cedo para dizer se uma recessão associada à pandemia de Covid-19 pode fazer abrandar os negócios de armas. «O impacto económico da Covid-19 podia levar alguns países a diminuir as importações de armas nos próximos anos. No entanto, ao mesmo tempo, mesmo no auge da pandemia, em 2020, vários países assinaram grandes contratos de armamento», releva o SIPRI.

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Questionado sobre se este negócio «é consistente com a promessa do governo dos EUA de liderar a diplomacia com vista a pôr fim ao conflito no Iémen», Falk respondeu que não, rejeitando a declaração como uma alegação «falsa».

«Esta é uma afirmação claramente falsa», acusou, acrescentando que os mísseis ar-ar protegem o espaço político nacional saudita, dando ao reino a liberdade de fazer a guerra fora de seu território com expectativas substancialmente reduzidas de ver o seu país atacado. «Por outras palavras, o objectivo do armamento defensivo é muitas vezes isolar a guerra ofensiva da retaliação e, dado o historial saudita, esse parece ser o caso», frisou Richard Falk.

Não há «incentivo para a via diplomática»

«Tal militarismo parece fazer aumentar a capacidade de combate da Arábia Saudita e não apresenta nenhum incentivo para acabar com o conflito no Iémen pela via diplomática. Se a intenção fosse uma mudança no sentido da diplomacia, poderia ter sido sinalizada oferecendo às forças opositoras iemenitas capacidades militares equivalentes ou condicionando a venda dos mísseis a um esforço de boa-fé para resolver o conflito através de negociações. Não houve nenhum esforço tangível ou credível nessa direcção», acrescentou.

O académico norte-americano criticou a incapacidade da ONU para pôr fim ao conflito no Iémen, afirmando que «estamos a assistir a mais um caso em que a ONU e a segurança internacional são incapazes face aos alinhamentos geopolíticos que se dedicam a encontrar soluções militares para conflitos políticos».

«Nesta perspectiva, não há um ponto final à vista para o conflito e o sofrimento humano no Iémen, e é provável que não surja nenhum, a não ser que a Arábia Saudita se sinta ameaçada por outras fontes ou enfrente pressões internas significativas. A morte dos iemenitas, infelizmente, não faz parte dos cálculos políticos realizados pelos cínicos criadores dos objectivos da política externa de Riade», sublinhou.

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Numa declaração realizada ontem à noite, Yahya Saree, porta-voz das Forças Armadas do Iémen, afirmou que se tratou de uma «operação qualitativa […] em resposta à escalada de agressão contra o país».

O militar iemenita pediu às empresas e aos cidadãos estrangeiros, bem como aos residentes no «Estado inimigo dos Emirados» que «permaneçam longe de instalações vitais», tendo em conta que «os EAU são um Estado inseguro enquanto prosseguir a escalada de agressão contra o Iémen».

Navio dos Emirados apreendido em Hudaydah

No passado dia 3, Yahya Saree informou que as tropas iemenitas e combatentes dos comités populares tinham conseguido apreender um navio de bandeira iemenita ao largo do porto de Hudaydah, transportando diverso material militar.

Hussein al-Azi, vice-ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo de Salvação Nacional do Iémen, destacou que o navio não trazia «tâmaras ou brinquedos», mas «armas destinadas a grupos extremistas que põem em risco a vida de cidadãos comuns».

Numa declaração efectuada ontem à tarde, Jake Sullivan, Conselheiro de Segurança Nacional dos EUA – um dos países ocidentais mais envolvidos na guerra de agressão ao Iémen desde Março de 2015 – classificou os ataques a Abu Dhabi como «terroristas».

Sublinhando que o compromisso dos EUA com a segurança dos EAU é «inabalável», prometeu trabalhar no sentido de «responsabilizar» os Hutis, que assumiram a autoria do ataque.

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Por seu lado, o governador da província de Hudaydah, Muhammad Ayyash Qahim, destacou que estes ataques evidenciam o nível de «desespero e frustração» da coligação saudita.

«Os Emirados Árabes Unidos, a Arábia Saudita e os seus mercenários serão responsabilizados pelos crimes que perpetraram contra cidadãos comuns», disse, citado pela PressTV.

Esta quinta-feira, o secretário-geral das Nações Unidas reiterou «o apelo às partes para que exerçam a máxima contenção e evitem qualquer escalada, por entre o aumento das tensões na região, bem como para que respeitem as suas obrigações ao abrigo do direito humanitário internacional».

Guerra de agressão há quase sete anos

A Arábia Saudita, com o apoio dos EUA, do Reino Unido e de outras potências ocidentais e regionais, lançou, em Março de 2015, uma grande campanha militar de agressão contra o Iémen, tendo como objectivo declarado suprimir a resistência do movimento Huti Ansarullah e recolocar no poder o antigo presidente Abd Rabbuh Mansur Hadi, aliado de Riade, sem sucesso.

A agressão militar provocou milhares de mortos, feridos e deslocados, destruiu as infra-estruturas do mais pobre dos países árabes e esteve na origem da mais grave crise humanitária dos tempos modernos, segundo as Nações Unidas.

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O primeiro Mundial num país árabe e muçulmano não se realizará no gigante regional, a Arábia Saudita, mas no pequeno e disruptor Catar. O crescimento, no quadro mundial, das influências das forças cataris tem utilizado o desporto como meio para expressar a sua existência perante um vizinho que tem adotado diferentes estratégias para o controlar. Entre 2017 e 2021, o embargo imposto pelos sauditas colocou tudo em causa, não só a realização deste Mundial mas a própria subsistência do país. O Catar, ainda assim, resistiu.

Nessa prova de força dos cataris nasceu uma nova atitude dos sauditas, cada vez mais envolvidos em negócios e ações diplomáticas com os seus vizinhos. Não será, por isso, de espantar que os jogos da Arábia Saudita passem a imagem de ser jogados em casa. Num grupo de enorme exigência, e com uma estreia frente à Argentina de Messi, o sucesso desportivo da equipa saudita parece um objetivo difícil de concretizar. Mas a transformação deste Mundial, um ano depois do Estado da Arábia Saudita ter adquirido o Newcastle United, da Premier League, numa oportunidade de demonstração de força saudita em território catariano não será desperdiçada.

O futebol é, aqui, apenas um meio para alcançar outros fins.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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Nesta medida, o Mundial 2022 é um fenómeno de sucesso no que toca a alertar mentalidades, um pouco por todo o mundo, para questões que importa ter em conta no futuro do planeta. O excessivo peso colocado pela extração de combustíveis fósseis e a forma como este coloca em causa o nosso planeta. Os desequilíbrios daí resultantes em alargados territórios do planeta e a forma como a riqueza de um determinado país não é distribuída por todos aqueles que aí vivem e trabalham.

Também não se tem deixado de focar, de maneira regular, a importância da igualdade de direitos e a falta de senso que tem discriminar alguém pelo seu género, origem ou opção sexual. Não se mede nada disto por uma bola que rola ou por uma braçadeira que se usa. Mede-se pela capacidade que temos para dar eco às nossas mensagens. 

Daí que o futebol seja revolucionário. Porque mesmo no momento em que todo o seu aparato financeiro e simbólico se foca na organização de um evento que pretende limpo de mensagens políticas, são essas mesmas palavras e gestos que não deixam de ecoar a cada instante. Na forma como os jogadores ingleses se ajoelham antes do início de uma partida. Na liberdade concedida às mulheres iranianas para assistirem aos jogos num estádio. Pela maneira como jogadores, adeptos e jornalistas têm enfrentado as restrições impostas pelo Catar por não deixarem de expor as suas ideias, aproveitando o palco e o microfone para as fazer ecoar. Aos que se sentem fracos por ceder à beleza de um golo, insisto que essa beleza não nos faz esquecer aquilo por que importa lutar nestes meses de Novembro e Dezembro de 2022. 

Doze anos e muitos mais

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Proibida a entrada a animais, russos e à solidariedade com a Palestina

A disparidade na abrangência e alcance de sanções desportivas face a outros dramas humanitários revelam, mais do que um suposto humanismo e solidariedade, a hegemonia cultural, racismo e xenofobia do «Ocidente».

Equipa russa nos Jogos Paralímpicos de 2018 em Sochi
CréditosKirill Kudryavstev / AFP

Na sequência de mais um cenário de guerra no nosso planeta, diversas agências desportivas têm tomado medidas de afastamento de federações, clubes e atletas russos das competições. A disparidade na abrangência e alcance destas sanções desportivas face a outros dramas humanitários, particularmente sobre a Palestina, revelam mais do que um suposto humanismo e solidariedade: sobressai a hegemonia cultural, racismo e xenofobia do «Ocidente».

Desporto: uma frente de combate

Com a invasão do exército russo no território ucraniano, entrou-se numa nova e mais dramática fase do conflito que desde 2014 tem lavrado naquela zona, opondo a Rússia e, mais do que a própria Ucrânia, os EUA e a União Europeia. Para além das operações militares, esta guerra estende-se a todas as facetas da vida. É uma guerra travada no campo económico, informativo e também cultural.

Na frente desportiva, as chamadas potências ocidentais levam clara vantagem, com a sua hegemonia a verter-se na direcção dos organismos e federações desportivas. O objectivo é claro: expulsar tudo o que cheire a russo da dita «comunidade internacional». Entre as inúmeras sanções, salienta-se as seguintes:

- Nos recentes Jogos Paralímpicos de Inverno de Pequim, símbolo maior da inclusividade no desporto, os atletas russos e bielorussos foram impedidos de participar na competição.

- A Rússia e Bielorrússia também foram afastadas do Mundial de Futebol do Qatar e de diversas outras competições internacionais.

- Clubes como o Spartak Moskva, CSKA Moskva, Tyumen ou Zenit foram retiradas das competições europeias. Voltada para provas no estrangeiro, a equipa de ciclismo Rusvelo não tem um único dia de competição este ano, por impedimento da federação mundial.

- O Grande Prémio da Rússia da Fórmula 1 ou a final da Liga dos Campeões em São Petersburgo foram cancelados, assim como diversos outros eventos no ténis, ski, curling, etc.

- O tenista número um do mundo, Daniil Medveded, poderá estar impedido de competir em Wimbledon. O piloto Nikita Mazepin foi despedido da equipa Haas. A própria recém-estrela da patinagem no gelo Kamila Valieva poderá estar impedida de competir. Tem-se exigido aos atletas que se demarquem de Putin e do Governo, mesmo que nunca tenham tido ligações, recriando em pleno século XXI os autos de fé da Inquisição.

Chega-se ao absurdo de sites desportivos removerem as bandeiras dos países dos atletas, sites de apostas terem retirados eventos desportivos russos ou jogos electrónicos removerem as equipas russas.

Atletas, clubes, treinadores e demais staff são tratados como párias e vêem o seu esforço e ambições atirados ao lixo por terem o atrevimento de terem nascido na Rússia ou de trabalharem no país. Relembra-se que a última vez que sanções tão abrangentes foram tomadas contra um país foi contra o regime de Apartheid da África do Sul, como resposta ao próprio segregamento da população negra.

A Rússia tem oligarcas, o Ocidente empreendedores

Da mesma forma que a guerra não se iniciou em 2022, também esta tentativa de isolar a Rússia não começou agora. O tratamento que é feito à Rússia, pela sua ameaça à hegemonia estado-unidense, sempre foi distinta, colocando o seu papel no desporto sob um escrutínio que raramente existe para outros países.

Apesar de durante anos o dinheiro da Gazprom ter sido bem recebido pelos dirigentes desportivos de diversas modalidades, sempre houve uma percepção que esse dinheiro seria mais «sujo» do que outras empresas que movem milhares de milhões à custa de práticas monopolistas, de infracções de direitos humanos e/ou de exploração de vícios, como a Coca-Cola, Heineken ou a Bridgestone.

Também a figura do oligarca Roman Abramovich é vista como sinónimo da entrada dos grandes magnatas no futebol e da redução deste a uma brincadeira de ricos. No entanto, o epíteto de oligarca e magnata a brincar aos clubes nunca é aplicado a Ken Bates, homem que vendeu o Chelsea a Abramovich, e que antes disso já tinha sido dirigente de três outros clubes e da federação inglesa de futebol, e que ainda compraria o Leeds United. Não de somenos, Bates recebeu autorização da coroa britânica para explorar por 199 anos uma ilha nas Caraíbas contra a vontade do povo autóctone, e era próximo de Ian Smith, dirigente da Rodésia do Sul, estado supremacista branco, a par da África do Sul. Para a sua sorte na imprensa, calhou não saber escrever em cirílico.

Doping: o colectivismo russo vs. o pecado individual ocidental

Também na relação com o doping vemos tratamentos diferenciados. A cruzada iniciada em 2014 com um documentário alemão (por «coincidência») levou a que a WADA, agência mundial de antidopagem, tivesse impedido a Rússia de competir usando os seus símbolos nacionais, em competições por selecções. Não estando em causa a veracidade da acusação, parece que a WADA tem dificuldades em encontrar mais casos de programas de doping patrocinados pelo poder central, argumento central para esta medida. No entanto, casos não faltam, e fica aqui uma pequena amostra de um problema no desporto que só por conveniência não é mais falado.

Cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2018, em Pyeongchang

Quando os contornos começar a ficar cada vez mais sinistros e públicos, a justiça dos EUA viu-se obrigada a desvendar a rede de doping capitaneada por Lance Armstrong. Sustentada a partir de dinheiro público através do patrocínio da US Postal, agência federal do Governo dos EUA que dava nome à equipa, a rede conseguiu tornar Armstrong num embaixador dos valores estado-unidenses e um ídolo mundial, obtendo os seus resultados com recurso ao maior e mais sofisticado sistema de dopagem à data e fazendo questão de destruir carreiras e vidas de outros ciclistas. Mas aparentemente o maior esquema de dopagem e gangsterismo da história do ciclismo sob égide de entidades públicas não parece ter provocado sinais de alerta na WADA.

Também no atletismo, a lista alargada de atletas medalhados dos 100 metros apanhados por doping, como os estado-unidenses Carl Lewis, Tim Montgomery, Tison Gay, Justin Gatlin e Marion Jones, o canadiano Ben Johnson (que treinava com o mesmo homem que treinou Montgomery ou Jones) e os jamaicanos Yohan Blake, Asafa Powell, Shelly-Ann Fraser-Pryce e Sherone Simpson, treinados pela equipa MVP, criam um quadro que para a WADA apenas indica prevaricação pessoal, nunca as federações tendo sido responsabilizadas pelas transgressões.

Em 2017, um tribunal espanhol anulou a possibilidade de se identificarem 211 sacos de sangue que estavam na posse do médico Eufemiano Fuentes aquando uma busca da Guardia Civil em 2006, personagem central de uma rede de dopagem de que ainda hoje se desconhece a sua extensão. A justiça espanhola nunca se mostrou disponível para divulgar a identidade de todos os clientes de Fuentes que, segundo o próprio, remonta pelo menos aos Jogos Olímpicos de 1992 em Barcelona, e que para além de ciclistas (os únicos cujos nomes vieram à luz do dia) estendia-se, pelo menos, também ao futebol e ao ténis. Ocupada com a Rússia, a WADA pouco ou nada fez para desvendar este mistério, com as dúvidas sobre a performance de diversas gerações de ouro do desporto espanhol nos últimos 30 anos votadas a mera especulação.

A frieza oriental

Também o suposto tratamento dado aos atletas, sobretudo mulheres, mostra uma dualidade de critérios. Neste aspecto, geralmente, o alvo preferencial da comunicação social é a China e as suas atletas. Mas à boleia do aumento da tensão no Donbass, a mira temporariamente mudou. O alvo foi Kamila Valieva.

Pelo pecado de ter executado performances brilhantes nos recentes Jogos Olímpicos de Inverno em Pequim, logo surgiram as alegações de doping. A trama adensa-se quando, após uma performance menor, o acompanhamento dos treinadores e da comitiva russa foi imediatamente posto em causa por pressão psicológica sobre a agora pobre vítima, com direito a conferência de imprensa do Presidente do Comité Olímpico Internacional (COI). A Rússia, de novo, é vilificada.

Já quando em 2015 rebentou o maior escândalo de abusos sexuais na história do desporto, praticado pelo treinador da equipa de ginástica dos EUA e encoberto pela federação, o COI não teve nenhuma acção. Quando Simone Biles desistiu de provas de ginástica nos Jogos Olímpicos de Tóquio por questões de saúde mental, o mesmo Presidente do COI apenas afirmou que ela era uma lutadora. Não se encontrou espaço para considerações de problemas estruturais num organismo que encobriu cerca de meio milhar de abusos sexuais.

Ainda no campo da patinagem artística, o drama de Valieva leva a grande escrutínio e reflexões sobre como os russos treinam os seus atletas. Já o resultado do drama de Tonya Harding, patinadora estado-unidense que procurou fisicamente incapacitar uma atleta rival, são diversos prémios de cinema com uma das piores condutas desportivas transformada em entretenimento e personalizado na figura da ex-patinadora.

Quando a Palestina se deparou com um desporto apolítico

Se a dureza com que o desporto russo (e bielorrusso) tem sido tratado é justificada aos olhos de alguns como resposta às injustiças cometidas pelos Governos, não deixa de ser gritante como estas sanções desportivas são díspares com o tratamento dado a outros países noutros contextos.

Poderíamos falar dos regimes fascistas e das brutais ditaduras da América Latina no passado ou das monarquias absolutas do estados do Golfo e das aventuras imperialistas dos países da NATO. Ainda assim, o exemplo mais gritante na actualidade é a agressão e genocídio do povo palestino às mãos de Israel, que o submete a um regime de apartheid. Mas em vez de nos focarmos sobre a ausência de sanções sobre Israel e como este país está plenamente integrado no circuito desportivo internacional, atente-se antes às penalizações que os organismos que regulam o desporto têm tido contra aquelas que aproveitam o palco desportivo para mostrar solidariedade com a Palestina.

Caroon de Latuff

O clube escocês Celtic tem nos últimos anos recebido multas na ordem das dezenas de milhares de euros por os seus adeptos mostrarem a bandeira da Palestina durante jogos das competições internacionais. A bandeira da Palestina é considerada um adereço ilícito pela UEFA. Também a federação espanhola de futebol multou o jogador Kanouté por ter mostrado uma camisola de apoio à Palestina. O jogador Aboutrika recebeu um cartão amarelo durante um jogo para a Taça das Nações Africanas por ter violado as regras da FIFA sobre slogans políticos, sendo que o slogan de Aboutrika pedia simpatia para com Gaza. Também o clube chileno Palestino, criado por imigrantes, foi penalizado e obrigado a mudar o design da sua camisola, em que o número 1 tinha o desenho das fronteiras da Palestina de 1947.

O judoca Fathi Noureen foi suspenso durante 10 anos por se recusar a lutar contra um judoca israelita nos Jogos Olímpicos de Pequim por solidariedade com a causa palestiniana. Sorte semelhante teve Saeid Mollaei em 2019, tendo apenas voltado a competir após se mudar para a Alemanha e participar na equipa de refugiados. No xadrez, as federações mundiais têm repetidamente ameaçado países de suspensão caso não permitam a participação de atletas israelitas.

O número dois do squash, Ali Farag, assim como dezenas de outros jogadores e personalidades do desporto, têm vindo a público denunciar os dois pesos e duas medidas quando o assunto foi expressar solidariedade com a causa palestiniana e agora com a Ucrânia. Sempre se tentou impedir que os atletas pudessem abertamente demonstrar as suas opiniões acerca do genocídio alegando as organizações e federações que a política se devia manter fora do desporto e que não tem lugar dentro dos recintos. Subitamente, com a avalanche de expressões solidárias com o povo ucraniano, o que se realça é que o drama da Palestina não cabe na empatia de quem gere o desporto.

Por baixo da pele de cordeiro

Mais do que uma pretensa solidariedade com as dificuldades que o povo ucraniano passa, as recentes sanções sobre a Rússia e a Bielorrússia demonstram duas coisas: a hegemonia cultural do imperialismo dos EUA e da UE e a xenofobia e racismo presente na ideologia dos dirigentes «ocidentais».

Destruído o sonho, após a queda do bloco socialista, de um mundo submisso sob a batuta dos EUA, as principais potências imperialistas vêem-se incapazes de contrariar a emergência de um mundo multipolar, perdendo na esfera política e económica a capacidade de impor a sua política de rapina, opondo-se-lhes a resistência dos povos e dos interesses das potências regionais. A solução militar directa também não é viável em confronto com potências nucleares, como é o caso da Rússia. A mais eficaz arma que lhes resta é a hegemonia cultural criada ao longo de décadas. O controlo dos principais meios de comunicação, tanto de informação como de entretenimento, assim como dos supostos organismos independentes, não-governamentais, neutros e apolíticos permite este ataque concertado e rápido à Rússia na esfera desportiva, apagando esta nação (mais do que o país e o seu governo) do planeta.

O sofrimento que se vive na Ucrânia em 2022 não é maior nem menor que o sofrido nos últimos oito anos, quando os russófonos foram reprimidos pelo estado ucraniano, mas, enquanto as equipas russas são afastadas das competições, fez-se questão que o Shaktar Donetsk tivesse um lugar seguro onde jogar. Uma bomba detonada em Kiev não causa mais nem menos luto que uma que caia em Damasco ou Mossul, mas enquanto a bandeira e hino russo são banidos, nunca o COI pensou em retirar a Estrela de David ou a Star-Spangled Banner do pódio olímpico. O que marca as sanções em 2022 não é a solidariedade, é a agenda política.

À semelhança das sanções económicas, o ataque à cultura russa, como visto nas sanções desportivas, atingem mais o povo russo do que Putin ou a burguesia dirigente. A imagem criada sobre o desporto russo e os seus protagonistas ao longo dos anos não se desvia do guião criado para ostracizar outros povos. O atleta batoteiro, o dirigente manipulador, o dinheiro sujo, a máquina fria e sem escrúpulos, todos coniventes com o regime autocrático, criam uma percepção emotiva primária de rejeição, da criação de um «outro» que não pode estar «connosco». Mais uma machadada nos princípios do olimpismo. Só falta retirar um dos anéis…

A falha técnica dos Jogos de Sochi soou a premonitória em 2022

Neste processo a vítima não é o Governo russo, somos todos nós.

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Desde 2010, a realização do Mundial no Catar levantou suspeição e criou polémica. Mas doze anos não são suficientes para criar condições de ter, num mundo mediático, o espaço suficiente para alterar o curso da história. Na verdade, muito se realizou neste período. Uma profunda investigação levou ao afastamento de vários focos de corrupção no seio da FIFA e das confederações continentais. Anos e anos de trabalho e investigação no território catariano permitiram o conhecimento da realidade no local e a instauração de novas leis. Um extenso trabalho de consciencialização permitiu que dirigentes, treinadores e jogadores sejam, hoje, agentes de mensagens de liberdade e de defesa dos direitos humanos, numa escala nunca antes vista no futebol profissional. 

Mas a bola rola no Catar. Rola porque, na prática, os novos dirigentes da FIFA nunca encontraram base jurídica para reverter a entrega da competição a este país. Rola porque a sua riqueza lhe permitiu continuar a ultrapassar as dificuldades que teve pela frente. Rola, também, porque o Catar não é o outro lado do nosso mundo. 42º classificado no Índice de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas, apesar dos largos reparos registados no relatório da Amnistia Internacional quanto aos direitos dos trabalhadores migrantes, o direito ao sindicalismo, as liberdades de expressão e reunião, os direitos das mulheres e das pessoas LGBTI+ e às pena de morte, o Catar demarca-se de vários outros países do Médio Oriente.

Na prática, os valores do Catar estarão mais próximos da média dos valores dos países que integram a FIFA do que a ideia europeia de direitos. É esse confronto que o Mundial nos obriga a ter. O de ver o mundo como ele é, para melhor sabermos como nele fazer as nossas lutas. 

Os favoritos também se abatem

A derrota da Argentina perante a Arábia Saudita é a primeira grande surpresa deste Mundial e, em consequência, o primeiro grande aviso, sobretudo para as equipas que vão entrar hoje em campo.

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Presidente da FIFA ignora os estatutos e dá respaldo a Israel e Arábia Saudita

Gianni Infantino tinha reuniões preparadas com a Associação de Futebol da Palestina (AFP) mas, apesar de reiterados avisos, insistiu em participar em acções do governo Israelita em territórios ocupados.

26 crianças palestinianas, da Faixa de Gaza, que pertencem à Associação de Futebol de Palestinianos Amputados, preparam-se para participar no torneio de sub-16 para pessoas amputadas em bombardeamentos, por míssil, israelitas. Cerca de 80 homens amputados participam no torneio para adultos. <br />
 
CréditosSuhaib / Reuters

À margem de uma conferência organizada pelo Jerusalem Post, um diário israelita, no Museu da Tolerância, em Jerusalém, o Presidente da FIFA, Federação Internacional de Futebol, admitiu a possibilidade de organizar um Campeonato do Mundo de Futebol conjunto entre Israel e Arábia Saudita, «porque não Israel?».

A tentativa ingénua, por parte de Infantino, de incluir a Palestina numa futura iniciativa, em colaboração com Israel, foi muito mal recebida pela comunidade palestiniana, em contraste com os aplausos da audiência, composta por vários antigos membros do gabinete de Donald Trump, como Ivanka Trump e Mike Pompeo e por Benjamin Netanyahu, responsáveis pelo escalar das agressões e ocupações contra a Palestina nos últimos anos.

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Não abrandam os protestos contra a ocupação e os colonatos

As tropas israelitas reprimiram os protestos desta sexta-feira contra os colonatos. Um rapaz não resistiu aos ferimentos em Gaza. A Unicef informou que Israel matou 9 crianças palestinianas em 2 meses.

Manifestantes palestinianos repelem latas de gás lacrimogéneo disparadas por forças israelitas durante os confrontos que se seguiram à manifestação contra o colonato de Eviatar, na localidade de Beita, no Norte da Cisjordânia ocupada, a 27 de Agosto de 2021 
Créditos / PressTV

Pelo menos dois manifestantes foram atingidos com balas de borracha disparadas pelas tropas israelitas na localidade de Beita, a sul de Nablus. O serviço de ambulâncias do Crescente Vermelho Palestiniano revelou que outros 26 palestinianos sofreram problemas respiratórios devido à inalação de gás lacrimogéneo.

Desde Maio, Beita tem sido palco de fortes confrontos entre as forças de ocupação e a população palestiniana, que protesta contra a construção do colonato judaico de Eviatar no cimo do Monte Sabih, bem como contra o confisco de terras dos aldeãos da região.

Também na sexta-feira, as forças israelitas dispararam numerosos cartuchos de gás lacrimogéneo, balas de borracha e granadas de atordoamento contra manifestantes palestinianos em Kafr Qaddum, no distrito de Qalqiliya (Margem Ocidental ocupada), ferindo dezenas deles.

Pelo menos oito foram atingidos por balas de borracha e dezenas sofreram de asfixia devido à inalação de gás lacrimogéneo lançado pelas forças israelitas, refere a PressTV.

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Dezenas de palestinianos feridos por forças israelitas em protestos contra colonatos

As forças israelitas reprimiram com violência, esta sexta-feira, os protestos dos palestinianos contra os colonatos na localidade de Beita, perto da cidade de Nablus, na Margem Ocidental ocupada.

Palestinianos durante os protestos em Beita contra a ocupação israelita, 25 de Junho de 2021 
CréditosAyman Nubani / WAFA

Pelo menos 18 palestinianos foram atingidos com balas de aço revestidas de borracha, incluindo dois paramédicos, durante um protesto realizado esta sexta-feira para denunciar a construção do novo colonato judaico de Eviatar no cimo do Monte Sabih, perto da localidade palestiniana de Beita, revelaram fontes locais e médicas.

Várias dezenas de manifestantes sofreram ainda sintomas de asfixia devido às granadas de gás lacrimogéneo lançadas pelas forças de ocupação, que, nas últimas semanas, têm reprimido com violência os protestos crescentes dos residentes contra a criação do colonato referido.

A população de Beita e das aldeias circundantes, informa a WAFA, tem levado a cabo marchas semanais, todas as sextas-feiras, denunciando igualmente o confisco de terras dos aldeãos de Beita, Huwarra e Za'tara para que as autoridades israelitas possam ali inaugurar uma estrada apenas para colonos judeus.

De acordo com a WAFA, em quase um mês de protestos, as forças de ocupação israelitas usaram fogo real para dispersar as marchas, tendo morto cinco palestinianos de Beita e ferido 618.

Além do colonato no Monte Sabih, as forças israelitas criaram, há alguns meses, um posto avançado no cimo do Monte al-Arma, a norte de Beita, na medida em que ambas as elevações gozam de uma localização estratégica, com vista para o distrito de Nablus e o Vale do Jordão, uma faixa de terra fértil a oeste do Rio Jordão que representa aproximadamente 30% da Cisjordânia ocupada.

O controlo dos montes a sul e a norte de Beita, e a construção de uma estrada só para colonos são medidas com as quais, nota a agência, as forças israelitas pretendem tornar as aldeias e vilas palestinianas em «enclaves e guetos apinhados, cercados por muros, colonatos e instalações militares», cortando a contiguidade geográfica com outras partes da Margem Ocidental ocupada.

Um manifestante palestiniano é evacuado do local dos protestos durante os confrontos com as forças israelitas no contexto de uma mobilização contra o colonato de Eviatar, recentemente construído, perto da localidade de Beita, a sul de Nablus, a 25 de Junho de 2021 / PressTV

Outros protestos anti-colonatos e mais repressão

Também esta sexta-feira, as forças israelitas atacaram os manifestantes no protesto semanal contra os colonatos na aldeia de Kafr Qaddum (distrito de Qalqiliya). Durante os confrontos, as forças de ocupação israelitas atingiram dois palestinianos com fogo real e prenderam um deles, refere a PressTV.

Dezenas de manifestantes sofreram dificuldades respiratórias devido à inalação de gás lacrimogéneo, enquanto outros quatro, incluindo dois jornalistas, foram atingidos com balas de borracha, indica a mesma fonte.

Houve ainda protestos contra os colonatos na região de al-Ras, perto da cidade de Salfit, onde dezenas de palestinianos sofreram dificuldades respiratórias devido à inalação de gás lacrimogéneo.

A sul de Hebron (al-Khalil), as tropas israelitas atacaram uma mobilização contra a expansão dos colonatos israelitas, a ocupação e a limpeza étnica em Masafer Yatta.

Mais de 600 mil israelitas vivem colonatos só para judeus em Jerusalém Oriental e na Margem Ocidental ocupada. Todos os colonatos israelitas são considerados ilegais à luz do direito internacional.

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As tropas israelitas também atacaram um protesto na aldeia de Umm al-Shaqhan, a sul de al-Khalil (Hebron), contra a expansão de um colonato e os ataques frequentes de colonos israelitas tanto a palestinianos como às suas propriedades.

No protesto, revela a fonte, os manifestantes vincaram a sua determinação em proteger a terra e minar os planos israelitas de expandir os colonatos, que são ilegais à luz do direito internacional. Vários palestinianos, activistas solidários estrangeiros e oito jornalistas foram presos.

Rapaz de Gaza, atingido a tiro por forças israelitas, sucumbe aos ferimentos

Omar Hasan Abu an-Neel, de 12 anos, faleceu este sábado, depois de ter ficado gravemente ferido na semana passada, em protestos junto à vedação com que Israel cerca a Faixa de Gaza.

Fontes médicas disseram à WAFA que o rapaz, residente no bairro de Tuffah, na cidade de Gaza, não resistiu aos ferimentos, depois de ter sido atingido a tiro pelas forças israelitas, uma semana antes, num protesto no Nordeste do enclave cercado, junto à vedação.

O jovem, ferido na cabeça, foi levado de imediato para um hospital, onde foi operado e se manteve em estado crítico.

Abu an-Neel é o segundo palestiniano a morrer dos ferimentos sofridos naquele protesto, em defesa de Jerusalém, contra os ataques frequentes dos israelitas à mesquita de al-Aqsa e para assinalar o incêndio desta mesquita, há 52 anos.

Osama Khaled Deij, de 32 anos, do campo de refugiados de Jabaliya, perto da cidade Gaza, faleceu no Hospital al-Shifa poucos dias de ter sido atingido a tiro pelas tropas israelitas, não resistindo aos ferimentos.

Pelo menos 41 palestinianos ficaram feridos no protesto de 21 de Agosto, a maior parte dos quais com disparos nos membros, nas costas e no abdómen, informou o Ministério da Saúde em Gaza.

Mais de quatro dezenas de palestinianos ficaram feridos e dois faleceram na sequência dos disparos efectuados pelas forças israelitas contra o protesto junto à vedação do enclave no passado dia 21 / Al Jazeera

Unicef: Israel matou nove crianças e feriu 556 na Margem Ocidental em dois meses

Num relatório divulgado esta semana, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) revelou que nove crianças palestinianas tinham sido mortas na Margem Ocidental ocupada e Jerusalém Oriental pelas forças israelitas entre 7 de Maio e 31 de Julho.

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ONU refere «graves» violações cometidas por Israel contra menores palestinianos

O relatório do secretário-geral da ONU sobre crianças e conflitos regista mais de mil «violações» contra crianças palestinianas. Mas Israel, como a Arábia Saudita, volta a ficar de fora da «lista negra».

De acordo com o Ministério palestiniano da Informação, 12 mil crianças foram detidas pelos israelitas nos últimos 17 anos
Jovem palestiniano é detido pelas forças israelitas (imagem de arquivo) Créditos / addameer.org

Em Junho de 2020, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, anunciou que a a Arábia Saudita seria retirada da «lista negra» onde foi incluída em 2017 por matar e ferir crianças no decurso das suas operações militares de agressão ao Iémen. E este ano voltou a não ser incluída na «lista das partes que violam os direitos dos menores durante os conflitos». Esse facto, bem como a não inclusão de Israel «na lista de regimes que matam crianças», mereceu a condenação do Irão.

Por seu lado, o Estado da Palestina lamentou que «o relatório anual mais uma vez falhe ao não incluir, de forma justa, as forças de ocupação de Israel na lista das partes que cometem violações graves contra as crianças» – uma realidade que o relatório refere nos seus próprios termos.

«Esta falha persiste – nota a agência WAFA –, apesar da documentação exaustiva e provas dos crimes de Israel contra os menores palestinianos», e do facto de que esses «crimes não só continuam, como estão aumentar», tendo-se registado a morte de 69 crianças palestinianas nos últimos dois meses (66 das quais no «massacre a Gaza», em Maio último»).

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A «viagem ao inferno» dos jovens palestinianos detidos por Israel

Uma comissão da ONU reafirmou denúncias expostas em vários relatórios sobre detenções de menores palestinianos por Israel – quase sempre presos de noite, algemados e vendados. É o início da «viagem ao inferno».

Um jovem palestiniano é preso na Cisjordânia, na sequência dos protestos contra a decisão norte-americana sobre Jerusalém
Créditos / palestinalibre.org

A instância, composta por especialistas independentes das Nações Unidas, expressou particular preocupação pela expansão dos colonatos e o aumento da violência dos colonos israelitas, em que se incluem ataques a crianças e às suas escolas.

Segundo se pode ler no portal oficial de notícias da ONU, na semana passada diversas organizações informaram a comissão sobre as operações nocturnas levadas a efeito pelas forças israelitas com o propósito de deter crianças e adolescentes na Cisjordânia ocupada, com «graves consequências para o seu bem-estar e gozo dos seus direitos».

«Mais de 300 crianças estão detidas no sistema militar israelita. A maioria por delitos menores, como atirar pedras e publicações nas redes sociais», assinala a comissão, que denuncia o facto de os menores serem «levados para locais desconhecidos, presos em viaturas militares e sujeitos a ameaças e abusos verbais», bem como o facto de, por vezes, serem «obrigados a assinar confissões em hebraico, uma língua que não costumam entender».

Estas preocupações reafirmam as que têm sido veiculadas, ao longo do tempo, por várias entidades, nomeadamente a Comissão dos Prisioneiros Palestinianos, órgão dependente da Autoridade Palestiniana que, em diversas ocasiões (também este ano), alertou para o facto de os menores serem torturados e sofrerem abusos nos cárceres israelitas, bem como para o facto de serem espancados, insultados e pressionados no momento da detenção.

No final de Março, um relatório publicado pelo Ministério palestiniano da Informação denunciava também esta realidade, afirmando que «95% das crianças palestinianas presas pelas autoridades israelitas foram torturadas durante a detenção».

De acordo com o relatório, até 2015 foram documentadas anualmente 700 detenções de menores palestinianos. Já em 2017, Israel prendeu 1467 crianças e adolescentes; 1063 no ano seguinte e, nos dois primeiros dois meses deste ano, 118. Entre 2000 e 2018, foram presos mais de 16 mil menores.

Uma «viagem sem fim ao inferno»

Numa peça intitulada «“Endless Trip to Hell”: Israel Jails Hundreds of Palestinian Boys a Year. These Are Their Testimonies», publicada em Março e plenamente actual, o periódico israelita Haaretz aborda esta realidade, em que as crianças, algumas com idades inferiores a 13 anos, «são detidas pela calada da noite, vendadas e algemadas, alvo de abusos e constrangidas» a confessar «crimes» que não cometeram.

A peça, que reúne testemunhos de sete jovens da Margem Ocidental ocupada com idades compreendidas entre os dez e os 15 anos, revela as diversas fases do processo de detenção, que começa nas operações nocturnas e passa pelo interrogatório, a prisão, o julgamento e a proposta de um acordo.

Na sua maioria, os jovens são presos por, alegadamente, terem atirado pedras ou queimado pneus, mas, como sublinha a advogada Farah Bayadsi o objectivo das detenções «é mais para mostrar controlo do que para aplicar a lei».

A experiência traumática é fundamentada por tudo aquilo por que as crianças passam durante uma detenção. Arrancadas de casa quando dormem, são algemadas e vendadas, levadas em veículos militares para colonatos e bases israelitas, passando por todo um processo que envolve intimidação, ameaças, agressões físicas, afastamento da família e pressão para «confessar».


O nível de brutalidade varia. Khaled Mahmoud Selvi, preso quando tinha 15 anos, foi levado para a prisão e despido (o que, de acordo com o jornal, ocorre em 55% dos casos), tendo sido obrigado a permanecer dez minutos nu, em pé, durante o Inverno.

De acordo com os dados recolhidos pela organização não governamental (ONG) British-Palestinian Military Court Watch, 97% dos jovens palestinianos detidos pelas forças militares israelitas (IDF) vivem em pequenas localidades a menos de dois quilómetros de um colonato.

O advogado Gerard Horton, da ONG referida, afirma que a ideia é «assustar toda a aldeia» e que se trata de um «instrumento eficaz» para controlar uma comunidade. Acrescenta que, do ponto de vista dos ocupantes e opressores, a pressão «tem de ser constante»: «Cada geração tem de sentir a mão pesada das IDF.»

A experiência é traumática. O pai de Khaled Shtaiwi, preso com 13 anos em Novembro do ano passado, contou ao periódico que criou na sua aldeia o «dia da psicologia», porque o seu filho não é capaz de falar sobre o que se passou e porque quer ajudar todas as crianças que foram presas pelos israelitas.

Em Beit Ummar, Omar Ayyash foi preso com dez anos de idade, em Dezembro último. Agora, as crianças que brincam nas ruas da aldeia afastam-se assim que se apercebem da aproximação de soldados israelitas. Tornou-se um hábito desde que as tropas levaram Omar.

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No seu relatório, relativo a 2020, o secretário-geral das Nações Unidas reporta 1031 casos confirmados de violência das forças israelitas contra 340 crianças palestinianas. Dá ainda conta de 11 mortos e 324 feridos, bem como de 361 detenções (87 crianças reportaram maus-tratos e violações ao processo legal devido, sob custódia, por parte das forças israelitas, e 83% referiram violência física). Foram ainda registados 30 ataques a escolas e hospitais, perpetrados pelas forças israelitas de ocupação e colonos judeus, de acordo com o relatório.

O Estado da Palestina, refere a WAFA, lamenta que o secretário-geral da ONU, reunindo estes dados, «ignore» as «provas das graves violações e crimes cometidos por Israel», sublinhando que «esta omissão voluntária» de Israel da lista só reforça a sua «impunidade».

Constitui, além disso, um «desvio grave das responsabilidades confiadas ao secretário-geral», que o Estado da Palestina insta «a corrigir sem demora», porque as «crianças palestinianas têm direito à protecção, segurança, dignidade e liberdade».

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«As tensões continuam na Margem ocidental, incluindo Jerusalém Oriental. Nove crianças palestinianas foram mortas entre 7 de Maio e 31 de Julho, e 556 crianças foram registadas como feridas, também por fogo real, balas de aço revestidas de borracha, granadas de atordoamento e gás lacrimogéneo», aponta o informe da Unicef.

No mesmo período, pelo menos 170 crianças foram presas em Jerusalém Oriental ocupada, segundo o documento.

De acordo com a agência das Nações Unidas, 2,5 milhões de pessoas, incluindo 1,2 milhões de crianças, a viver na Faixa de Gaza cercada e na Margem Ocidental ocupada, incluindo Jerusalém Oriental, necessitam actualmente de ajuda humanitária.

O organismo sublinhou que a situação humanitária se deteriorou recentemente com a escalada da tensão em Jerusalém Oriental, a agressão israelita a Gaza em Maio e a pandemia de Covid-19.

«Tendo em conta a escalada recente, o apelo humanitário para as necessidades das crianças em 2021 aumentou para 46,2 milhões de dólares no total, sendo que 31,5 milhões (68%) estão por financiar», referiu.

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A AFP tinha ficado agradavelmente surpreendida com a intenção, manifestada pelo presidente da FIFA, de reunir com as autoridades desportivas da Palestina, deixando o alerta de que, embora compreendendo que ele também se encontrasse e participasse com insituições israelitas, não iriam tolerar a visita a territórios ocupados militarmente por Israel.

O Museu da Tolerância, em contrassenso com o seu nome, foi construído nos «terrenos confiscados do histórico cemitério Ma’manullah, declarado um local históricos para os muçulmanos. Neles estão enterrados os restos mortais de milhares de palestinianos, árabes e muçulmanos, cujos sepúlcros foram profanados pela construção do edifício no local».

O Futebol palestiniano não abdica da sua dignidade

Esperávamos que a visita do Presidente da FIFA trouxesse esperança aos futebolistas palestinianos, começando a resolver alguns dos muitos problemas que impedem o desenvolvimento deste desporto na Palestina, um país que sofre, ainda, sob ocupação israelita. Não esperávamos uma visita de apoio a grupos evangélicos sionistas que defendem a negação de direitos aos palestinianos», afirmou, em comunicado, a AFP.

«A decisão [de Infantino] de ignorar as nossas preocupações, e tendo em conta que não temos o direito de interferir na agenda do Presidente da FIFA, só nos deixa como alternativa anunciar que, com muito pena nossa, não estaremos disponíveis para receber uma delegação da FIFA, nestas circunstâncias».

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Israel prendeu cerca de mil menores palestinianos em 2021

Cerca de mil jovens e crianças, 73 deles menores de 14 anos, foram presos este ano pelas forças israelitas, revelou o Centro de Estudos dos Prisioneiros Palestinianos.

Um jovem palestiniano é preso na Cisjordânia, na sequência dos protestos contra a decisão norte-americana sobre Jerusalém
Créditos / palestinalibre.org

Sob instrucções directas dos seus superiores, as forças de ocupação visam sistematicamente os menores, para os dissuadir de resistir à ocupação, negando-lhes assim o seu direito à educação, informa o relatório apresentado na semana passada.

O texto, assinado pelo director do Centro de Estudos dos Prisioneiros Palestinianos, Riyad al-Ashqar, regista a escalada no número de detenções de menores palestinianos por parte das forças israelitas e destaca que todos os menores foram submetidos a diversas formas de tortura e maus-tratos a partir do momento da detenção, informam as agências Safa e Prensa Latina.

O texto denuncia igualmente que as tropas de Telavive prenderam diversos menores depois de os atingir a tiro, por vezes de forma grave, tendo interrogado alguns deles no hospital – procurando obter «confissões» em troca do acesso a medicamentos.

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Israel prendeu 5426 palestinianos na primeira metade do ano

Grupos de defesa dos presos apresentaram um relatório sobre o primeiro semestre de 2021. Nas cadeias israelitas, há actualmente 4850 palestinianos, 540 dos quais ao abrigo da «detenção administrativa».

Os palestinianos estão a ser detidos em aldeias e cidades dos territórios ocupados em 1948 por terem apoiado Gaza 
As forças israelitas prenderam mais palestinianos no primeiro semestre deste ano do que em todo o ano de 2020 Créditos / Middle East Monitor

Entre os palestinianos que se encontram nos cárceres de Israel, contam-se 43 mulheres e 225 menores, segundo o documento conjunto divulgado este fim-de-semana pela Comissão dos Assuntos dos Presos e ex-Presos Palestinianos, a Sociedade dos Presos Palestinianos, a Addameer e o Centro de Informação Wadi Hilweh.

Os organismos referidos precisaram que 12 presos são membros do Conselho Legislativo Palestiniano (Parlamento), 70 são provenientes dos territórios ocupados em 1948, 350 são originários de Jerusalém ocupada e 240 da Faixa de Gaza cercada.

O informe destaca a existência de 540 prisioneiros palestinianos em detenção administrativa, sem acusação formada ou julgamento, por períodos de seis meses indefinidamente renováveis.

Quase 5500 detidos em seis meses

No que respeita a detenções, os organismos de defesa dos presos revelaram que Israel prendeu 5426 palestinianos entre 1 de Janeiro e 30 de Junho deste ano – um número superior a todas as detenções efectuadas pelas forças israelitas em 2020 e registadas por estas organizações: 4636.

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Forças israelitas prenderam 230 menores palestinianos desde Janeiro

Por ocasião do Dia da Criança Palestiniana, que se assinala a 5 de Abril, a Comissão dos Assuntos dos Presos e ex-Presos Palestinianos revelou também que 140 menores permanecem em cadeias israelitas.

Um soldado israelita detém um rapaz palestiniano, juntamente com outros quatro, perto do posto avançado de Havot Maon, na Margem Ocidental ocupada, a 11 de Março de 2021 
Créditos / Anadolu

Os menores palestinianos, alguns dos quais crianças, continuam a ser alvo das forças militares israelitas, que os prendem, muitas vezes de forma violenta, nos territórios ocupados.

De acordo com um relatório publicado este domingo pela Sociedade dos Prisioneiros Palestinianos, pelo menos 230 foram detidos desde o início do ano, a maioria dos quais em Jerusalém Oriental ocupada.

O grupo de defesa dos direitos dos presos sublinhou que «as crianças encarceradas são submetidas a vários tipos de abusos, incluindo «a recusa de comida e de bebida por longas horas, abuso verbal e a detenção em condições duras».

O informe veio a lume na véspera do Dia da Criança Palestiniana, que se assinala a 5 de Abril, com actividades culturais, educativas e mediáticas que, refere a PressTV, visam reforçar a consciência sobre o sofrimento dos menores palestinianos.

Detenção administrativa e maus-tratos

Também no âmbito do Dia da Criança Palestiniana, a Comissão dos Assuntos dos Presos e ex-Presos Palestinianos revelou que 140 menores permanecem em cadeias israelitas, incluindo dois que se encontram presos ao abrigo do regime de detenção administrativa.

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A «viagem ao inferno» dos jovens palestinianos detidos por Israel

Uma comissão da ONU reafirmou denúncias expostas em vários relatórios sobre detenções de menores palestinianos por Israel – quase sempre presos de noite, algemados e vendados. É o início da «viagem ao inferno».

Um jovem palestiniano é preso na Cisjordânia, na sequência dos protestos contra a decisão norte-americana sobre Jerusalém
Créditos / palestinalibre.org

A instância, composta por especialistas independentes das Nações Unidas, expressou particular preocupação pela expansão dos colonatos e o aumento da violência dos colonos israelitas, em que se incluem ataques a crianças e às suas escolas.

Segundo se pode ler no portal oficial de notícias da ONU, na semana passada diversas organizações informaram a comissão sobre as operações nocturnas levadas a efeito pelas forças israelitas com o propósito de deter crianças e adolescentes na Cisjordânia ocupada, com «graves consequências para o seu bem-estar e gozo dos seus direitos».

«Mais de 300 crianças estão detidas no sistema militar israelita. A maioria por delitos menores, como atirar pedras e publicações nas redes sociais», assinala a comissão, que denuncia o facto de os menores serem «levados para locais desconhecidos, presos em viaturas militares e sujeitos a ameaças e abusos verbais», bem como o facto de, por vezes, serem «obrigados a assinar confissões em hebraico, uma língua que não costumam entender».

Estas preocupações reafirmam as que têm sido veiculadas, ao longo do tempo, por várias entidades, nomeadamente a Comissão dos Prisioneiros Palestinianos, órgão dependente da Autoridade Palestiniana que, em diversas ocasiões (também este ano), alertou para o facto de os menores serem torturados e sofrerem abusos nos cárceres israelitas, bem como para o facto de serem espancados, insultados e pressionados no momento da detenção.

No final de Março, um relatório publicado pelo Ministério palestiniano da Informação denunciava também esta realidade, afirmando que «95% das crianças palestinianas presas pelas autoridades israelitas foram torturadas durante a detenção».

De acordo com o relatório, até 2015 foram documentadas anualmente 700 detenções de menores palestinianos. Já em 2017, Israel prendeu 1467 crianças e adolescentes; 1063 no ano seguinte e, nos dois primeiros dois meses deste ano, 118. Entre 2000 e 2018, foram presos mais de 16 mil menores.

Uma «viagem sem fim ao inferno»

Numa peça intitulada «“Endless Trip to Hell”: Israel Jails Hundreds of Palestinian Boys a Year. These Are Their Testimonies», publicada em Março e plenamente actual, o periódico israelita Haaretz aborda esta realidade, em que as crianças, algumas com idades inferiores a 13 anos, «são detidas pela calada da noite, vendadas e algemadas, alvo de abusos e constrangidas» a confessar «crimes» que não cometeram.

A peça, que reúne testemunhos de sete jovens da Margem Ocidental ocupada com idades compreendidas entre os dez e os 15 anos, revela as diversas fases do processo de detenção, que começa nas operações nocturnas e passa pelo interrogatório, a prisão, o julgamento e a proposta de um acordo.

Na sua maioria, os jovens são presos por, alegadamente, terem atirado pedras ou queimado pneus, mas, como sublinha a advogada Farah Bayadsi o objectivo das detenções «é mais para mostrar controlo do que para aplicar a lei».

A experiência traumática é fundamentada por tudo aquilo por que as crianças passam durante uma detenção. Arrancadas de casa quando dormem, são algemadas e vendadas, levadas em veículos militares para colonatos e bases israelitas, passando por todo um processo que envolve intimidação, ameaças, agressões físicas, afastamento da família e pressão para «confessar».


O nível de brutalidade varia. Khaled Mahmoud Selvi, preso quando tinha 15 anos, foi levado para a prisão e despido (o que, de acordo com o jornal, ocorre em 55% dos casos), tendo sido obrigado a permanecer dez minutos nu, em pé, durante o Inverno.

De acordo com os dados recolhidos pela organização não governamental (ONG) British-Palestinian Military Court Watch, 97% dos jovens palestinianos detidos pelas forças militares israelitas (IDF) vivem em pequenas localidades a menos de dois quilómetros de um colonato.

O advogado Gerard Horton, da ONG referida, afirma que a ideia é «assustar toda a aldeia» e que se trata de um «instrumento eficaz» para controlar uma comunidade. Acrescenta que, do ponto de vista dos ocupantes e opressores, a pressão «tem de ser constante»: «Cada geração tem de sentir a mão pesada das IDF.»

A experiência é traumática. O pai de Khaled Shtaiwi, preso com 13 anos em Novembro do ano passado, contou ao periódico que criou na sua aldeia o «dia da psicologia», porque o seu filho não é capaz de falar sobre o que se passou e porque quer ajudar todas as crianças que foram presas pelos israelitas.

Em Beit Ummar, Omar Ayyash foi preso com dez anos de idade, em Dezembro último. Agora, as crianças que brincam nas ruas da aldeia afastam-se assim que se apercebem da aproximação de soldados israelitas. Tornou-se um hábito desde que as tropas levaram Omar.

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Por seu lado, a organização Defense for Children International – Palestine (DCIP) destacou que todos os anos entre 500 e 700 menores palestinianos são processados em tribunais militares israelitas e que 85% das crianças palestinianas detidas em 2020 foram «submetidas a violência física».

Num comunicado, a DCIP afirma ter documentado 27 casos em que as crianças foram mantidas na solitária um ou dois dias, alegando as forças israelitas «objectivos de investigação». Esta prática é, segundo o organismo, uma forma de «tortura ou tratamento cruel, desumano e degradante».

Desde Outubro de 2015, a DCIP registou a 36 ordens de detenção administrativa decretadas contra menores palestinianos, dois dos quais se mantêm nesse regime.

Ainda de acordo com o organismo sediado em Genebra, em 2020, as forças israelitas mataram nove menores palestinianos na Cisjordânia ocupada, incluindo Jerusalém Oriental, e na Faixa de Gaza, seis dos quais com fogo real.

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O relatório divulgado este fim-de-semana informa que, entre os palestinianos detidos pelas forças israelitas, se incluem 854 menores e 107 mulheres, tendo sido emitidas na primeira metade do ano 680 ordens de detenção administrativa, incluindo 312 novas.

No mês de Junho foram presos 615 palestinianos, revela o texto, destacando que Maio foi de longe o mês em que se registou um maior número de detenções na primeira metade deste ano.

Então, mês de massacre contra Gaza e de múltiplas provocações sionistas no Complexo da Mesquita de al-Aqsa e em Jerusalém Oriental ocupada, as forças israelitas prenderam 3100 palestinianos, incluindo 2000 nos territórios ocupados em 1948 (actual Estado de Israel) e 677 em Jerusalém Oriental ocupada, informa a WAFA.

Vários presos em greve de fome contra a detenção administrativa

De acordo com a Comissão dos Assuntos dos Presos e ex-Presos Palestinianos, há actualmente nove presos em greve de fome nos cárceres israelitas como forma de protesto contra o regime de detenção administrativa que lhes foi aplicado.

A Comissão pediu às instâncias internacionais e regionais de defesa dos direitos humanos que pressionem as autoridades israelitas no sentido de acabar com os maus-tratos aos presos em greve de fome, que passam também pela sua reclusão na solitária.

Os presos palestinianos recorrem com frequência a esta forma de luta contra um regime de detenção ilegal, cujo fim exigem.

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Actualmente, revela o texto, 230 menores continuam atrás das grades. Três encontram-se presos ao abrigo do regime de detenção administrativa – sem acusações nem processo penal –, 102 foram condenados a várias penas de prisão e os restantes aguardam por julgamento.

O relatório denuncia que os menores palestinianos estão encarcerados em condições bastante severas nos centros penitenciários israelitas, onde são insultados, ameaçados e torturados, em violação das convenções internacionais de direitos humanos.

As autoridades israelitas – acusa o documento – aproveitaram a pandemia de Covid-19 como instrumento para reprimir e aterrorizar as crianças palestinianas nas cadeias, não lhes proporcionando medidas de protecção contra o vírus ou mantendo-as na «solitária» com o pretexto da quarentena.

As forças de ocupação prenderam no primeiro semestre deste ano mais de 5400 palestinianos, incluindo 854 menores e 107 mulheres, segundo um relatório divulgado em Julho pela Comissão dos Assuntos dos Presos e ex-Presos Palestinianos, a Sociedade dos Presos Palestinianos, a Addameer e o Centro de Informação Wadi Hilweh.

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Para além de não ter cumprido com a sua palavra, apresentando-se em territórios que Israel ocupa militarmente, a sua visita configura uma «afronta total aos valores de tolerância religiosa e convivência pacífica, príncipios basilares dos estatutos da FIFA».

Também a Liga Árabe e a Organização para a Cooperação Islâmica condenaram a desconsideração que Gianni Infantino demonstrou pelo sofrimento de milhões de palestinianos a quem Israel nega o acesso aos mais básicos direitos humanos.

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A Alemanha e a Espanha gozam de alargado favoritismo, mas a qualidade dos japoneses, que há quatro anos alcançaram os oitavos-de-final, não deverá fazer descansar o conjunto germânico. Por outro lado, a Croácia terá que evitar a quebra que a final de 2018 lhes poderá ocasionar, frente a uma seleção marroquina que se pacificou com a troca de treinador e se prepara para chegar a este Mundial com uma conjugação de craques das principais equipas mundiais, como Hakimi, Mazraoui, Ziyech ou En-Nesyri.

Finalmente, o Canadá aproveita uma nova geração de jogadores de múltiplas ascendências para regressar ao principal palco mundial. Steven Vitória e Stephen Eustáquio são os luso-descendentes que vão a jogo perante uma Bélgica que terá aqui uma derradeira oportunidade, para uma geração de sonho, de conquistar um grande título internacional.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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A vitória engendrada pelo Engenheiro ofereceu estatuto à representação nacional e catapultou-a para uma dimensão que o seu bom futebol, no passado, via apenas como mítica. Também assim se perceberá melhor que, apesar de ter somado ainda mais um triunfo internacional posterior, com a vitória na Liga das Nações em 2019, Fernando Santos tenha que lidar com um nível de exigência ímpar no que toca aos resultados. Sem dúvida que as últimas presenças em Mundiais, e no Europeu do ano passado, deixaram algum amargo de boca. Nesse sentido, o Catar dará à equipa portuguesa uma oportunidade de redenção. 

Esta é a geração de maior qualidade que Portugal alguma vez apresentou numa grande competição. Vinte e seis jogadores que atuam nas principais ligas europeias, com experiência competitiva, com conhecimento da realidade do jogo ao mais alto nível. Uma estrutura com profissionais de qualidade, com capacidade financeira para investir ao nível da ciência do desporto, com enquadramento nas mais altas instâncias de decisão do futebol mundial.

Em mais nenhuma área de negócios Portugal apresentará índices de semelhante alcance. Mas o futebol nem sempre tende a respeitar este tipo de lideranças. É preciso comprovar esta qualidade a cada noventa minutos. Perante uma equipa ganesa reforçada, com um técnico focado na estratégia e novos jogadores, também de grandes ligas, Portugal terá que dispor dos seus trunfos da melhor forma possível. Daí que Diogo Costa, Rúben Dias, Bernardo Silva e Bruno Fernandes, como espinha-dorsal desta equipa, precisem de estar nos seus dias para alcançar a desejada vitória. 

Os desafios que se jogam fora de campo

Como em todas as restantes seleções, o caminho para o Catar também se fez muito na forma como se discute um conjunto de polémicas que foram acontecendo fora de campo.

No caso português, as suspeitas lançadas sobre o contrato de trabalho realizado com a equipa técnica liderada por Fernando Santos obrigaram o selecionador a deixar o seu posto de especialista em futebol para se exibir na sua outra função, a de detentor e gestor de empresas. O sucesso que também aí alcança nem sempre deixou sossegado quem se quer focar apenas no futebol. Dos profissionais de elite espera-se um tipo de dedicação e exclusividade que o Engenheiro não revelou. Mas também para sarar essas feridas nada haverá como uma vitória em campo. 

«Trabalhadores da Embaixada portuguesa no Catar sofrem de mesma falta de direitos de que tanto temos ouvido falar relativamente aos migrantes no Catar. Que trabalhadores do Estado português passem por este tipo de situações é uma realidade que não podemos ignorar e que nos deve envergonhar.»

Cristiano Ronaldo foi outro dos elementos que esteve no foco mediático nas últimas semanas. A sua situação em Manchester, a entrevista concedida a Piers Morgan e a forma como a sua sombra aparece a cada canto de qualquer tema ou conversa sobre a seleção portuguesa parece já um quadro fora de tempo, tendo em conta a idade e o momento de forma do jogador. Mas Portugal ainda não sabe viver sem os seus heróis e, por enquanto, é o madeirense quem ainda pode e quer vestir essa capa. O campo será o seu tribunal. 

Não se fica pelas figuras da seleção a polémica portuguesa no que toca ao Mundial. Os reparos feitos em relação à organização do evento foram concentrados numa entrevista de Fernando Gomes, presidente da Federação Portuguesa de Futebol, ao jornal espanhol Marca. A importância das mesmas não tiveram grande eco em Portugal, nem através dos meios oficiais da Federação, o que será de lamentar. Seria importante esse contributo para melhor percebermos o impacto da presença das altas figuras do Estado no Catar durante estas semanas. O cumprir das suas funções não deve, em caso algum, fazer com que se desvalorize a importância das lutas que se travam em redor desta competição.

Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa, em diferentes momentos, não souberam equilibrar o apoio necessário à representação portuguesa com a necessidade de marcar uma posição perante a organização deste evento. Nos últimos dias ficámos ainda a saber, através do Sindicato dos Trabalhadores Consulares, das Missões Diplomáticas e dos Serviços Centrais do Ministério dos Negócios Estrangeiros (STCDE/CGTP-IN), que trabalhadores da Embaixada portuguesa no Catar sofrem de mesma falta de direitos de que tanto temos ouvido falar relativamente aos migrantes no Catar. Que trabalhadores do Estado português passem por este tipo de situações é uma realidade que não podemos ignorar e que nos deve envergonhar.

Dia de estreia também para o Brasil

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Primavera

De todas as imagens que guardo, esta é a imagem que quero preservar. Porque o resultado das eleições no Brasil não foi um fim.

CréditosSebastião Moreira / EPA

Para muitos, este domingo foi dia de ter os olhos postos no Brasil, carregados de receios e expectativas, no dia da segunda volta da eleição presidencial, na qual se enfrentavam dois homens que defendem ideias políticas e valores significativamente diferentes. Não nos é indiferente o que se passa ali, porque o que está em jogo não se resume apenas ao que pode ser visto de forma restritiva como uma dinâmica da política brasileira. O ali também é aqui – provavelmente, podemos fazer esta afirmação para, se não todas, pelos menos para uma parte muito significativa, das questões que enfrentamos.

Este acontecimento em concreto, a eleição presidencial no Brasil, que estamos a acompanhar, surge-nos como parte de um processo mais lato, em que articulamos os diferentes tempos, entre os antecedentes, o passado, e as diferentes possibilidades ou consequências do que nos surge como uma bifurcação no caminho. Trata-se de uma batalha pelo futuro. E esta implica escolhas políticas.

Sem prejuízo da necessária reflexão sobre o contexto da política brasileira, que requer tempo, podemos tecer breves considerações sobre este processo, em torno de acontecimentos que nos surgem como ultrapassando a sua singularidade. Há imagens que nos ficam gravadas na memória, momentos que guardamos porque, de alguma forma, romperam a tessitura do quotidiano e se constituem como extraordinários, por trazerem em si o desassossego, a inquietação, a alegria ou o pavor. Momentos que nos interpelam.

Abril de 2016. O deputado Jair Bolsonaro, na votação do processo de impeachment de Dilma Rousseff, evoca a memória de um torturador do DOI-CODI, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra. E diz: «(...) o pavor de Dilma Rousseff.» Bolsonaro foi aplaudido pela sua fala e pelo seu voto, mas também ouvimos as vaias na sala. Existiram, de imediato, variadíssimas posições de condenação e repúdio contra a evocação de Ustra – com tudo o que significava de tortura e morte –, mas as palavras foram ditas. E com elas, para todos os que foram torturados, o reavivar de uma ferida que, em rigor, talvez nunca tenha sarado.

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O Brasil dos votos, das balas e dos pobres

Neste domingo, os brasileiros vão às urnas. O candidato de esquerda, Lula, pode ganhar num país que está cada vez mais desigual e em que nem nos seus governos se conseguiu pôr em causa o poder dos muito ricos.

Lula em capanha em Fortaleza. 
CréditosJarbas Oliveira / EPA

«Eu quero saber do meu marido, eles [os polícias] não querem dar informações. Não querem deixar passar, não deixam as pessoas fazerem nada. Estou com bebé de uma semana», disse, à versão brasileira do site Intercept, assustada, uma moradora do Complexo da Maré, na zona norte do Rio de Janeiro, com uma criança ao colo.

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Um em cada quatro brasileiros convive com a fome

Segundo a pesquisa Datafolha divulgada esta segunda-feira, 26% dos brasileiros afirmam não ter comida suficiente em casa para alimentar os familiares. Desempregados e mais pobres são mais afectados.

Créditos / PCdoB

O resultado do levantamento realizado pela Folha de S. Paulo é revelador da insegurança alimentar no país sul-americano e pode estar relacionado com factores como agravamento da inflação, diminuição do rendimento da população e desemprego.

A este propósito, o Portal Vermelho comenta que «nos últimos anos, sob o governo Jair Bolsonaro e com o quadro de pandemia, a fome se espalhou». «O cenário de insegurança alimentar está em alta desde que o Datafolha passou a pesquisar esse tema, em Maio de 2021. Mesmo com os refluxos da crise sanitária e a reabertura da economia, a falta de alimento nos lares brasileiros não retrocedeu», acrescenta.

De acordo com a pesquisa agora realizada, apenas 62% dos brasileiros afirmam ter comida suficiente, enquanto 12% disseram que nas suas casas há comida de sobra.

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Mais de 19 milhões de pessoas passam fome no Brasil com a pandemia

Segundo o estudo da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, mais de metade dos domicílios brasileiros vivencia algum nível de insegurança alimentar.

A insegurança alimentar atinge mais de 166 milhões de brasileiros 
CréditosLeo Malafaia / Brasil de Fato

Cerca de 19 milhões de pessoas passam fome no contexto da pandemia do coronavírus no Brasil. Uma pesquisa realizada em Dezembro de 2020 mostra que, nos três meses anteriores à recolha de dados, mais de 116 milhões de pessoas conviveram com algum grau de insegurança alimentar, não tendo acesso pleno e permanente a alimentos.

Isto significa que mais de metade dos domicílios brasileiros sofreu algum tipo de privação. De acordo com o estudo da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede PENSSAN), a percentagem de famílias nesta situação era de 55,2%.

Destes, refere a pesquisa, 43,4 milhões (20,5% da população) não contavam com alimentos em quantidade suficiente (insegurança alimentar moderada ou grave) e 19,1 milhões (9% da população) estavam a passar fome (insegurança alimentar grave).

Um problema histórico, mas que chegou a ser combatido eficazmente

No relatório apresentado, afirma-se que «a fome no Brasil é um problema histórico, mas houve um momento em que fomos capazes de combatê-la. Entre 2004 e 2013, os resultados da estratégia Fome Zero, aliados a políticas públicas de combate à pobreza e à miséria, se tornaram visíveis».

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), realizada em 2004, 2009 e 2013, registou-se «uma importante redução da insegurança alimentar em todo o país», sendo que, em 2013, «a parcela da população em situação de fome havia caído para 4,2%» – levando a que a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) excluísse o Brasil do Mapa da Fome que divulgava periodicamente.

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Agravamento da fome deve reforçar luta pela reforma agrária no Brasil

A observação é de Kelli Mafort, dirigente do MST, que analisa o agravamento da crise no Brasil e fala do ano que termina, sublinhando que a «prioridade é salvar vidas».

O MST é o maior produtor de arroz orgânico da América Latina
Créditos / MST / Brasil de Fato

A perda de rendimentos das famílias brasileiras e o agravamento da fome no país devem fortalecer a luta pela reforma agrária em 2021. Esta é a avaliação do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), que este mês lançou o seu Caderno de Formação n.º 53, intitulado A luta de classes no campo e a luta por reforma agrária popular.

«Não é uma questão de escolha. É uma questão de necessidade», destaca Kelli Mafort, que faz parte da direcção nacional do movimento. «Com o fim do auxílio de emergência, os índices ligados à pobreza extrema devem aumentar, com a falta de perspectiva de trabalho e rendimento, e a reforma agrária virá com muita força no ano de 2021», prevê a digirente em declarações ao Brasil de Fato.

O MST reconhece que a pandemia continua a condicionar a organização popular, uma vez que impede as aglomerações e impõe a necessidade de distanciamento social. Em 2020, as ocupações de terras levadas a cabo pelo movimento foram interrompidas, de modo a evitar a propagação do novo coronavírus entre os camponeses.

«Para nós, a prioridade é salvar vidas, aquelas que estão sendo desprezadas pelo governo brasileiro numa campanha negacionista, antivacina», declara Mafort. «Estaremos com os movimentos na rua assim que a vacina [da Covid-19] nos assegurar essa possibilidade», acrescenta.

Lutas com maior repercussão em 2020

O MST participou em duas disputas frontais com o agronegócio que tiveram repercussão nacional no ano que agora finda.

A primeira ocorreu em meados de Agosto, com o despejo violento de duas áreas do acampamento Quilombo Campo Grande, em Campo do Meio (estado de Minas Gerais), onde viviam sete famílias. A região é ocupada há mais de 20 anos por 450 famílias camponesas, que se notabilizaram pela produção do Café Guaií, um dos líderes da produção agroecológica do MST, informa o portal brasileiro.

O principal beneficiário do despejo foi João Faria da Silva, dono da marca Terra Forte e um dos maiores exportadores de café do mundo.

«Essa disputa tem uma simbologia interessante, porque são duas produções de café com relações sociais completamente distintas», analisa Mafort. «Por um lado, trabalho análogo à escravidão, expropriação de terras, de direitos. Por outro, o Café Guaií, que representa a agroecologia, que brota de uma luta pela divisão de terras, contra o machismo».

O MST considera que o governador Romeu Zema (Novo), que autorizou o uso da força contra o acampamento, representa os mesmos interesses de Bolsonaro, e que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais foi subserviente ao projecto do agronegócio ao autorizar o despejo em plena pandemia.

O segundo episódio de grande repercussão foi protagonizado pelo secretário de Assuntos Fundiários do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, Nabhan Garcia. A Força Nacional foi enviada para assentamentos do MST no Sul da Bahia sem a autorização do governador do estado, Rui Costa (PT), e voltou sem alcançar o seu objectivo, depois de questionada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

«Na prática, o que eles tentam é dividir e cooptar as famílias», avalia Mafort. «Dessas duas acções, ficou a lição de muita resistência e organização da nossa base e de muita mobilização da sociedade brasileira, com forte apoio internacional nos dois episódios», disse.

Solidariedade no terreno

O ano de 2020 fica também marcado pela solidariedade, sendo que o MST doou quase 4000 toneladas de alimentos da agricultura familiar para famílias em situação de vulnerabilidade social. Só no estado do Paraná (Sul do Brasil), foram doadas 442 toneladas de alimentos, oriundos da produção de 52 acampamentos e 121 assentamentos da reforma agrária.


«A solidariedade se impôs como uma necessidade, e os movimentos populares foram os primeiros a perceber isso, antes do Estado ou de qualquer empresa», lembra a dirigente do MST. «Os nossos alimentos encontraram panelas vazias, numa situação desesperadora», sublinhou.

Luta pela reforma agrária

Plano Emergencial da Reforma Agrária Popular, lançado pelo MST em Junho, estabelece como medida urgente, por exemplo, a expropriação de terras de evasores fiscais para assentamento de famílias camponesas. O documento também propõe o uso de terras próximas a centros urbanos, em parceria com municípios, para produção de alimentos, garantindo terra, trabalho, tecto e alimentos saudáveis para famílias empobrecidas e criando um «cinturão verde» em torno das cidades.

Em 9 de Dezembro último, o MST registou uma Acção de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no STF, em que questiona a paralisação dos 413 processos de desapropriação e aquisição de terras para reforma agrária ao início do governo Bolsonaro, e pede a destinação de terras públicas para a reforma agrária, como previsto na Constituição brasileira.

«O ano de 2021 vai ser muito difícil, do ponto de vista dos embates que teremos. E, com certeza, a sociedade brasileira poderá contar com o MST, seja nas acções de solidariedade – que não pararam por nenhum dia e vão continuar –, seja nos trabalhos de base, organizando o povo para lutar e derrotar esse projecto de morte», afirmou Mafort.

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Mas o êxito alcançado na «garantia do direito humano à alimentação adequada e saudável foi anulado», revela o estudo. «Os números actuais são mais do que o dobro dos observados em 2009», precisa.

O retrocesso mais acentuado deu-se nos últimos dois anos. Entre 2013 e 2018, a insegurança alimentar grave teve um crescimento de 8% ao ano. Entre 2018 e 2020, a aceleração foi ainda mais intensa: a fome aumentou 27,6% ao ano.

De acordo com a pesquisa, que abrangeu 2180 domicílios nas cinco regiões do país, em áreas urbanas e rurais, a insegurança alimentar cresceu em todo o Brasil, com especial incidência nas regiões Norte e Nordeste, que registam índices de insegurança alimentar acima dos 60% e 70%, respectivamente. Já a insegurança alimentar grave (fome) esteve presente em 18,1% dos lares do Norte e em 13,8% do Nordeste.

Nada indica que a situação tenha melhorado

Renato Maluf, professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, especialista em segurança alimentar e coordenador Rede PENSSAN, afirma não existirem indícios de que a situação melhorou este ano. «Temos todas as razões para achar que nesses primeiros meses do ano a situação se agravou», disse, em declarações ao Brasil de Fato.

Para o especialista, nenhum dos factores que influenciam a segurança alimentar das famílias melhorou nos últimos meses, nomeadamente a garantia de emprego e o rendimento, cada vez mais debilitados.

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Brasil regista número recorde de desempregados

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em Janeiro havia cerca de 14,3 milhões de pessoas desempregadas no Brasil, o que significa um aumento de 19,8% num ano.

O trabalho informal aumentou no Brasil, representando quase 40% da força de trabalho no trimestre encerrado em Janeiro de 2021 
CréditosRoberto Parizotti / FotosPublicas

O país sul-americano iniciou 2021 atingindo um número recorde de desempregados. No trimestre encerrado em Janeiro, eram 14,272 milhões, mais 211 mil em relação a Outubro de 2020, mas com um acréscimo de 2,35 milhões (19,8%) face a igual trimestre do ano anterior, quando o desemprego atingia 11,9 milhões de brasileiros, segundo o IBGE.

Os dados foram divulgados esta quarta-feira e fazem parte da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do instituto referido. Embora a taxa de desemprego (14,2%) tenha ficado praticamente estável por comparação com o trimestre anterior, encerrado em Outubro, cresceu três pontos num ano e é a mais elevada para este período – um trimestre até Janeiro – alguma vez registada pelo Instituto.

O organismo responsável pelas estatísticas indicou igualmente que o contingente de pessoas com trabalho aumentou 2%, alcançando agora 86,025 milhões. Por comparação com o trimestre encerrado em Outubro, foram mais 1,725 milhão de pessoas integradas no mercado de trabalho, informa o Brasil de Fato.

Segundo a fonte, esse aumento verifica-se sobretudo em função da população com vínculo informal, ou seja, de pessoas que trabalham de forma autónoma ou sem contrato de trabalho.

O número de trabalhadores empregados nestas condições no sector privado cresceu 3,6% no trimestre encerrado em Janeiro face ao trimestre imediatamente anterior, o que representa um aumento de 339 mil pessoas. Já os trabalhadores por conta própria aumentaram 4,8% no mesmo período (mais 826 mil pessoas).

Assim, segundo os dados divulgados pelo IBGE, a taxa de trabalhadores informais no Brasil no trimestre encerrado em Janeiro foi de 39,7%.

Quase seis milhões de desencorajados

O número de desempregados desencorajados – trabalhadores que não procuraram trabalho, mas que estão disponíveis para trabalhar – foi estimado em 5,9 milhões, o maior número registado desde o início da série histórica da pesquisa, em 2012.

Em relação a igual período do ano passado, registou-se um aumento de 25,6% de desempregados desencorajados (mais 1,2 milhão).

Ainda segundo o IBGE, os subutilizados (pessoas que gostariam de trabalhar mais) são agora 32,380 milhões. A taxa de subutilização é de 29%, face a 29,5% no trimestre anterior e a 23,2% há um ano.

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«Outro indicador indirecto é verificar como aumentaram as manifestações de preocupação em relação à fome e as acções de solidariedade. Então, seja pelo agravamento dos determinantes, seja pela maior presença do tema nos debates públicos, tudo nos leva a crer que a situação só fez piorar», frisou.

Para travar o aumento da fome no Brasil, Renato Maluf aponta que é preciso retomar de imediato o auxílio de emergência, com valor suficiente para que o apoio ao sustento das famílias seja efectivo. «Esse auxílio que o governo está retomando essa semana não vai dar para muita coisa», alertou.

Além disso, entende ser necessário trabalhar politicamente com vista à retomada do emprego e preservação dos pequenos negócios. A longo prazo, Maluf defende que serão precisas iniciativas mais fortes nas políticas de abastecimento.

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A situação é mais grave para quem não tem emprego e para as camadas mais pobres da população: falta comida a 42% dos desempregados e a 38% dos que ganham até dois salários mínimos (2424 reais ou 437,5 euros).

Por regiões, o problema tem maior incidência no Nordeste (32%) e no Norte (30%). No Sul e no Sudeste, regiões mais ricas, a escassez de comida atinge 24% e 22% dos habitantes, respectivamente.

De acordo com a pesquisa Datafolha, a preocupação central dos brasileiros é o custo dos alimentos, o que encontra razão de ser no aumento dos preços, na precariedade laboral, nos baixos salários e nas incertezas que rondam o ambiente político e económico.

A Folha de S. Paulo lembra ainda que «33 milhões de pessoas passam fome no País, segundo apontou a segunda edição do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil – um patamar semelhante ao que havia sido registrado há três décadas».

Outro dado apontado pelo jornal é que numa «cidade como São Paulo, a renda dos 5% mais pobres não é suficiente para comprar dois pratos feitos ou um quilo de carne por mês».

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Estas cenas repetem-se várias vezes ao longo do tempo. Mais uma vez. O Complexo da Maré acordou às 5h da manhã de segunda-feira, dia 26 de Setembro, sob tiroteio, numa operação conjunta da Polícia Militar e da Polícia Civil.

Os moradores apavorados tentavam, em vão, convencer polícias que também havia pessoas cercadas numa casa que eram trabalhadores, e não criminosos. «Foda-se», respondeu um dos agentes do Estado.

A operação polícial decorreu a menos de uma semana das eleições, em que o actual governador, Cláudio Castro, é candidato à reeleição pelo PL, um total de 180 homens foi escalado para «impedir investidas de uma facção criminosa contra outra nesta região», segundo reza o comunicado oficial.

Essa foi a razão dada para a «operação de emergência» que envolveu o Batalhão de Operações Especiais, o Bope, e a Coordenadora de Operações e Recursos Especiais, o Core, as tropas de elite da PM e da Polícia Civil, além de blindados e helicópteros.

Pelo menos 35 escolas e quatro unidades de saúde foram fechadas. Duas das principais avenidas da cidade foram bloqueadas por carros, enquanto motoristas apavorados se refugiavam por baixo dos carros no meio das linhas de tiro. A operação na Maré terminou com sete mortos e oito feridos. Familiares de José Henrique da Silva, o Zé Careca, de 53 anos, um dos assassinados na operação, afirmam que ele era inocente e foi baleado.

No balanço da operação de segunda-feira, como declara o Intercept, os mortos e feridos foram tratados como «suspeitos». Como de costume, resta aos moradores lutar para provar que seus familiares, vizinhos e amigos eram trabalhadores. E limpar o rastro de sangue, que já se tornou cena cotidiana. Só naquele mesmo dia, aconteceram outras 11 operações policiais na Região Metropolitana do Rio de Janeiro.

Nas televisões gastam-se os últimos cartuchos

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Brasileiros em Portugal querem votar num «clima de segurança»

O Consulado de Lisboa acolhe o maior número de votantes fora do Brasil do mundo, 45 273, duas vezes mais do que nas anteriores eleições presidenciais de 2018, em que apoiantes do Bolsonaro ameaçaram eleitores.

Moradores do Jacarezinho protestam a 7 de Maio de 2021 contra a actuação da polícia durante a operação realizada na favela no dia anterior, que causou 25 mortos para prender 21 suspeitos e se tornou a mais letal da história do Rio de Janeiro. Testemunhas locais relataram execuções e a acção policial vai ser investigada 
CréditosANDRE COELHO / EPA

«O clima de violência política incentivado pelo actual presidente do Brasil também é uma evidência de que o aumento de cinco para dez seguranças privados do consulado é insuficiente para garantir o exercício democrático no dia das eleições em Lisboa, maior colégio eleitoral brasileiro no exterior», afirmou, em comunicado enviado ao AbrilAbril, o Coletivo Andorinha – Frente Democrática Brasileira.

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Incidentes neonazis cresceram todos os anos com Bolsonaro

Um relatório elaborado pelo Observatório Judaico dos Direitos Humanos no Brasil mostra que o número de acções neonazis no Brasil quase duplicou a cada ano do mandato presidencial de Jair Bolsonaro.

O presidente brasileiro Jair Bolsonaro é confesso admirador dos torturadores da ditadura militar. 
CréditosDR / DR

Desde 2019, o observatório registou 114 acontecimentos desse tipo. Se naquele ano houve menos 12 incidentes neonazis, no ano seguinte foram identificadas 21 delas, em 2021, 49, e, no primeiro semestre deste ano, 32. Segundo os autores do documento, não é esperada uma tendência de queda até o fim de 2022.

Foram consideradas acções neonazis, apenas aquelas que fizeram referências explícitas a Adolf Hitler, ao nazismo ou ao holocausto, incluindo com a utilização de símbolos nazis.

«Esse crescimento sinaliza a gravidade de um processo que, em nosso país, atinge sobretudo os grupos que historicamente sofrem racismo estrutural. Na Alemanha nazista, o foco principal foram os judeus. No Brasil, as vítimas são os povos indígenas e afro-descendentes», diz o estudo.

Entre os eventos mais graves apontados pelo grupo estão ataques a escolas como o ocorrido na cidade de Suzano (SP), em 2019, e em Saudades (SC), em 2021. Além de resultar em mortes, os episódios deram origem a investigações que desvendaram ligações de seus autores com grupos neonazis na internet e redes sociais.

O observatório foi uma das 15 entidades judaicas que, em Julho passado, divulgou um manifesto contra o genocídio dos indígenas no Brasil.

Segundo o relatório, os eventos antissemitas (contra os judeus) apresentaram um crescimento menos expressivo. Foram 12 ocorrências em 2019 e em 2020, 18 no ano passado e 11 no primeiro semestre de 2022.

Os casos foram contabilizados a partir de notícias divulgadas pela imprensa e anúncios de eventos nas redes sociais.

Os dados, segundo o Observatório Judaico dos Direitos Humanos no Brasil, «alertam para a normalização da desumanização e a licença para a violência característica do nazismo». O grupo foi criado em 2018, após as eleições, por judeus preocupados com o que entenderam como a «ascensão política no país de um projeto de extrema direita».

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Na primeira volta das eleições de 2018, em Lisboa, apoiantes de Bolsonaro atacaram eleitores dos outros candidatos, ameaçando e intimidando as pessoas que esperavam na fila das mesas de voto. Um eleitor de Bolsonaro acabou por ser detido, admitindo, em vídeo, ser «fascista, branco, de olhos claros e descendência italiana».

É inegável «a escalada da violência fomentada por Jair Bolsonaro que, sistematicamente, atacou as pessoas e as instituições, incitou agressões e disseminou discursos de ódio». A onda de violência inclui assassinatos políticos ocorridos nos últimos anos, como o do capoeirista Mestre Moa do Katendê, morto na Bahia, nas eleições de 2018.

Multiplicam-se relatos, nas últimas semanas, de eleitores de Lula da Silva agredidos, assassinados inclusive. No sábado, 24 de Setembro, Antônio Carlos Silva de Lima, de 39 anos, foi esfaqueado mortalmente num restaurante no Ceará, depois de ter assumido o apoio ao ex-presidente.

Cidadãos brasileiros a viver em Portugal reivindicam o «direito ao voto livre e em ambiente seguro»

«As brasileiras e os brasileiros que votam em Portugal e manifestam sua preferência democrática e antifascista têm medo de agressões físicas e psicológicas no dia das eleições e exigem um ambiente seguro e pacífico».

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Com Bolsonaro, existe «uma política anti-indígena sistemática e intencional»

A acusação é de Samara Pataxó, assessora jurídica da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), que no passado dia 9 denunciou o presidente brasileiro no Tribunal Penal Internacional (TPI).

Créditos / APIB

Pela primeira vez, os povos indígenas brasileiros uniram-se para denunciar um presidente no TPI. No Dia Internacional dos Povos Indígenas, 9 de Agosto, a APIB, em conjunto com a sua equipa de advogados, solicitou à procuradoria do Tribunal Penal Internacional, com sede em Haia (Países Baixos), que examine os crimes praticados contra os povos indígenas pelo presidente Jair Bolsonaro desde o início do seu mandato, em Janeiro de 2019.

A equipa jurídica entende que «estão em curso no Brasil actos que se configuram como crimes contra a humanidade, genocídio e ecocídio», e, «dada a incapacidade do actual sistema de justiça no Brasil de investigar, processar e julgar essas condutas», decidiu denunciar estes actos junto da comunidade internacional, através do TPI.

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Com Bolsonaro, «aumentaram as invasões a terras indígenas»

Dados preliminares divulgados esta terça-feira pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) apontam para um aumento das invasões de terras indígenas nos nove primeiros meses do governo de Bolsonaro.

Povo Yanomami realiza manifestação na região do Ajarani, em Roraima
Créditos / Blog da Funai

O organismo, ligado à Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), refere que entre Janeiro e Setembro deste ano foram registadas 160 «invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao património» a 153 terras indígenas em 19 estados brasileiros.

O Cimi sublinha que estes dados apontam para mais casos, mais terras originárias e mais estados relativamente a todo o ano de 2018, quando foram contabilizados 111 casos em 76 terras indígenas de 13 estados da federação, segundo informa o portal brasil247.com.

O relatório do Cimi, intitulado «Violência contra os Povos Indígenas do Brasil – dados de 2018», refere ainda que, no ano passado se registou um aumento no número de assassinatos de indígenas (135) em relação a 2017 (110).

De acordo com o organismo, o tipo de invasões alterou-se nos últimos anos. Enquanto, antigamente, os invasores entravam na terra, roubavam madeira, exploravam minérios e depois, em algum momento, se iam embora, agora tem havido a invasão com intenção de permanecer nos terrenos.

«Chama a atenção o aumento da prática ilegal de loteamento das terras indígenas, especialmente na região Norte», diz o documento, em que o Cimi dá conta de um novo modelo de apropriação das terras dos povos originários, mais agressivo.

O relatório refere ainda que 305 povos habitam em 1290 terras indígenas no Brasil. Na maioria dos casos – 821 (63%) –, os territórios estão ainda em fase de reivindicação ou regulamentação; destes, 528 não tiveram qualquer providência tomada pelo Estado, noticia a mesma fonte.

O presidente Jair Bolsonaro já anunciou que não pretende demarcar ou finalizar a demarcação de quaisquer novas terras indígenas durante o seu governo.

Em declarações ao Brasil de Fato, Roberto Antônio Liebgott, do Cimi região Sul, disse que «o discurso de Bolsonaro na ONU é sinal [de] que não há perspectiva. A Funai [Fundação Nacional do Índio] foi completamente desmontada. Dados preliminares de 2019 já indicam que houve mais invasões do que no período anterior. Todo período de construção da democracia. Agora é um período de desconstrução.»

O levantamento do Cimi apurou outros problemas, como ameaças de morte (oito), conflitos por terra (11), casos de disseminação de álcool e outras drogas (11; apesar de a venda de bebidas alcoólicas a indígenas ser proibida em todo território brasileiro).

Ainda relativamente a 2018, o relatório regista 101 casos de suicídios de indígenas e, no âmbito da mortalidade infantil, 591 falecidos até aos cinco anos de idade.

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O crime contra a humanidade e o genocídio estão previstos no Estatuto de Roma, o tratado que estabeleceu o TPI. O primeiro, refere o portal da APIB, consiste em «extermínio, perseguição e outros actos desumanos», enquanto o segundo – genocídio – é «causar severos danos físicos e mentais e deliberadamente infligir condições com vistas à destruição dos povos indígenas».

Na denúncia, a Articulação apresenta uma série cronológica de acções do presidente e do governo federal contra as populações indígenas desde que Jair Bolsonaro assumiu a Presidência da República.

Política anti-indígena no discurso e em actos administrativos

Para Samara Pataxó, assessora jurídica da APIB, «o que se tem assistido desde o primeiro dia de mandato é a construção de uma política anti-indígena sistemática e intencional».

Esta política pode ser observada não apenas no discurso, mas em actos administrativos, «que mostra evidentemente que as atitudes do presidente Jair Bolsonaro configuram crime de genocídio e crimes contra a humanidade», defende Pataxó.

Entre outros aspectos, o documento apresentado em Haia aponta o desmantelamento das infra-estruturas públicas de garantia dos direitos indígenas e socioambientais, estimulando a invasão e o desmatamento de terras indígenas, bem como o garimpo ilegal nesses territórios.

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Mineração ilegal aumenta devastação na Terra Indígena Yanomami

Em plena pandemia, a actividade do garimpo ilegal avançou 30% no território e, só em 2020, desmatou o equivalente a 500 campos de futebol. Indígenas enfrentam mais riscos de doenças, violência e álcool.

o garimpo ilegal avançou na Terra Indígena Yanomami
Créditos / isoambiental.org

Um relatório divulgado esta quinta-feira revela que a exploração ou extracção de substâncias minerais (garimpo) ilegal está a entrar de forma cada vez mais rápida nas terras indígenas e na floresta amazónica.

O levantamento aponta para a proliferação de novos núcleos de invasores, mais próximos dos povos originários, incluindo de grupos de índios isolados, bem como para a abertura de novas rotas para dentro do território.

Intitulado «Cicatrizes na floresta: evolução do garimpo ilegal na TI Yanomami em 2020», o estudo foi produzido pela Hutukara Associação Yanomami (HAY) e a Associação Wanasseduume Ye’kwana (Seduume), tendo revelado que, entre Janeiro e Dezembro do ano passado, foi devastada uma área equivalente a 500 campos de futebol na Terra Indígena Yanomami, localizada no extremo Norte do Brasil, entre os estados do Amazonas e de Roraima.

O total de área desflorestada é de 2400 hectares, sendo que em 2020 se registou um aumento de 30%. Ou seja, mesmo com a pandemia de Covid-19, a actividade ilegal nunca parou, antes pelo contrário.

O relatório agora publicado denuncia como a actividade criminosa prolifera na terra indígena, subindo os rios e aproximando-se cada vez mais das comunidades indígenas, com novas rotas de acesso ao interior da floresta.

O novo levantamento também alerta para o modo como o avanço dos garimpeiros em território indígena tem levado doenças às comunidades, sobretudo malária e Covid-19, e colocado em risco a sobrevivência de grupos de indígenas isolados, como os Moxihatëtëma, que são mais vulneráveis às enfermidades e correm sérios riscos de extinção com a exposição forçada pelos garimpeiros.

Outros problemas, como o álcool e o aumento da violência, também são consequência da maior presença de garimpeiros na Terra Indígena Yanomami e da maior proximidade dos invasores em relação aos povos originários.



«Homem garimpeiro é como um porco de criação da cidade»

De acordo com o estudo, a actividade garimpeira no Território Indígena Yanomami realiza-se sobretudo de duas maneiras: em dragas flutuantes, localizadas nos leitos de grandes rios (Uraricoera, Mucajaí, Catrimani e Parima), e em terra firme, de modo semi-mecanizado, com recurso a mangueiras e a motores de combustão para extrair o sedimento de cavas ou barrancos.

Com recurso à monitorização remota, foi possível examinar o conjunto das cicatrizes deixadas por esta segunda modalidade, que inclui desmatamentos recentes, solo exposto, áreas recém-abandonadas e pequenas lagoas de rejeito, revela o Brasil de Fato.

O rio Uraricoera concentra mais de metade (52%) de toda a área degradada pelo garimpo identificada pela monitorização remota. Também é possível verificar que os novos locais de garimpo, surgidos no ano passado, estão colados às comunidades Yanomami e Ye’kwana. As pistas clandestinas de aterragem, agora, ficam a poucos metros do lugares onde os indígenas vivem.

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Aumento da exploração mineira ilegal na Amazónia atinge em força as áreas indígenas

Um mapa recente com informações da actividade em terras demarcadas e protegidas mostra que a Amazónia brasileira abriga 453 explorações ilegais. O povo Yanomami prepara-se para a investida de Bolsonaro.

Área da Amazónia afectada pela extracção mineira
Créditos / RAISG

Não sendo ilegal no Brasil, a exploração ou extracção de substâncias minerais (garimpo) é proibida em áreas protegidas e reservas indígenas. No entanto, o mapa Amazónia Saqueada, realizado pela InfoAmazónia e pela Rede Amazónica de Informação Socioambiental Georreferenciada (RAISG) – organização que reúne técnicos de seis países da Amazónia –, mostra que existem pelo menos 2312 pontos e 245 áreas não autorizadas de extracção de ouro, diamantes e coltan no Brasil, na Bolívia, na Colômbia, no Equador, no Peru e na Venezuela.

A pesquisa inédita compilou dados sobre a situação de mineração ilegal nos sete milhões de metros quadrados do território amazónico, sublinha o Brasil de Fato numa peça hoje publicada. No que respeita ao Brasil, a RAISG aponta a existência de 453 «garimpos» em 132 áreas.

Sobre a pesquisa, os dados recolhidos e o seu significado, Alicia Rolla, geógrafa do Instituto Socioambiental (ISA), que coordena a RAISG, afirmou ao Brasil de Fato que «as informações obtidas sobre a exploração em áreas indígenas e de conservação são obtidas através das instituições que trabalham na Rede».

Em seu entender, o mapa é importante para a compreensão da dinâmica extractivista de minérios. «O garimpo está presente dos dois lados da fronteira, e os garimpeiros atravessam-nas inclusive para fugir de fiscalização. Outra coisa que conseguimos observar é que a prática ilegal possui uma proximidade com a legal», afirmou a geógrafa.

Outro aspecto sublinhado são as consequências ambientais da exploração mineira ilegal – bastante sentidas pelos pelos indígenas e comunidades ribeirinhas que dependem dos recursos naturais em áreas demarcadas e de preservação. «O uso do mercúrio para separar o ouro da areia contamina os rios e, consequentemente, os peixes. Além disso, a extracção de minérios provoca o desmatamento para chegar ao subsolo, e o assoreamento dos rios, causando distúrbios ambientais como o aumento de mosquitos transmissores de doenças», destaca o Brasil de Fato.

Terra Yanomami em Roraima

«A nossa terra está demarcada pelo governo federal desde 1992, mas não está a ser respeitada», denunciou Dário Vitório Kopenawa Yanomami, vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami, no estado de Roraima. «Várias doenças estão a surgir por conta da contaminação e de crimes ambientais feitos pelos garimpeiros», acrescentou.

Os abusos cometidos na área indígena do povo Yanomami, com cerca de 9 419 108 hectares, são encaminhados para «órgãos públicos como a Fundação Nacional do Índio (Funai), a Polícia Federal (PF), o Ministério Público Federal (MPF) e para o Exército Brasileiro, para que assumam as suas responsabilidades», afirma.

Em Julho último, dois índios isolados foram mortos por garimpeiros. «Fizemos a denúncia para a Procuradoria-Geral da República e o Ministério da Justiça, e pedimos investigação sobre o garimpo ilegal, além de [uma] investigação sobre as mortes para o MPF e Polícia Federal», revela Dário.

De acordo com a pesquisa da RAISG, a extracção de minérios começou a chegar à terra Yanomami em 2010, e tem vindo a aumentar: no final de 2016, já tinham sido identificadas 49 balsas na região.


Resistência ao governo de Bolsonaro

Tendo em conta as declarações do presidente eleito, no passado dia 12, relativas às «riquezas de Roraima» – o seu subsolo, a sua terra e os seus recursos hídricos – e a reafirmação, num encontro com deputados dos Democratas, também na quarta-feira, de que, se depender dele, não haverá «demarcações de terras para indígenas», o povo Yanomami «prepara-se para resistir».

É que 46% do estado de Roraima é território indígena e, face às ameças de Jair Bolsonaro, Dário Vitório Kopenawa Yanomami destaca: «Estamos a organizar-nos e vamos posicionar-nos para cobrar os nossos direitos que estão na Constituição. Ele precisa de respeitar as áreas demarcadas, não pode quebrar o protocolo e enfrentar as autoridades anteriores que fizeram as demarcações.»

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O líder Yanomami e xamã Davi Kopenawa, presidente da Hutukara Associação Yanomami, disse ao Instituto Socioambiental (ISA) estar preocupado e revoltado com a actual invasão garimpeira.

«Você vê a água suja, o rio amarelado, tudo esburacado. Homem garimpeiro é como um porco de criação da cidade, faz muito buraco procurando pedras preciosas como ouro e diamante», afirmou Kopenawa.

«Há vinte anos conseguimos mandar embora esses invasores e eles retornaram. Estão entrando como animais com fome, à procura da riqueza da nossa terra. Está avançando muito rápido. Está chegando no meio da terra Yanomami. O garimpo já está chegando na minha casa», alertou.

O xamã disse ainda temer um conflito com os invasores. «Estou muito preocupado, pois o garimpeiro não está sozinho, são grandes grupos, andam armados, apoiados por empresários, pelo governador de Roraima e pelo presidente Bolsonaro, assim como outros empresários do Brasil. Aqui em Roraima, os garimpeiros, empresários e políticos não respeitam os povos indígenas, só querem tirar as nossas riquezas», denunciou Kopenawa.

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A este cenário, afirma a organização, acresce a inacção do governo de Bolsonaro em relação à propagação da pandemia de Covid-19 no seio de comunidades indígenas. Como exemplo, Pataxó citou o incumprimento de uma medida liminar do Supremo Tribunal Federal, que obrigava o governo federal a prestar assistência aos povos indígenas no âmbito da pandemia.

 «É a primeira vez que os povos indígenas do Brasil vêem um presidente posicionar-se contrariamente à demarcação de terras, que incentiva a actuação ilegal de garimpeiros, grileiros, o desmatamento nas terras indígenas, associados a uma política anti-indígena, quando tem discurso discriminatório e violento contra os povos indígenas e que surte efeitos concretos», acusa Samara Pataxó, em declarações ao Brasil de Fato.

Agosto Indígena

As organizações que integram a APIB preparam mobilizações em Brasília contra a agenda anti-indígena no Congresso e no Supremo Tribunal Federal.

Entre as propostas, está o chamado «marco temporal», uma tese jurídica segundo a qual os territórios só podem ser demarcados se os povos indígenas conseguirem provar que estavam a ocupar uma determinada área antes da promulgação da Constituição Federal (5 de Outubro de 1988) ou se ficar comprovado que existia um conflito pela posse da terra.

Além de inviabilizar a demarcação, o «marco temporal» promove a abertura dos territórios ao agronegócio, à mineração e à construção de hidro-eléctricas e outras obras, denunciam os povos indígenas.

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Em ofício enviado ontem ao Consulado Geral do Brasil em Lisboa, o colectivo exigiu um reforço significativo da segurança no local, atendendo, também, à duplicação do número de eleitores.

A estrutura oferecida pelo Consulado limita-se a um «aumento de cinco para dez seguranças privados, deixando a cargo da PSP» os arredores da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. «Os eleitores e eleitoras também não sabem as regras que devem seguir ao se dirigir aos locais de votação, bem como os canais de denúncia e apoio em caso de descumprimento das mesmas».

O Coletivo Andorinha – Frente Democrática Brasileira exige, enquanto cidadãos e cidadãs no pleno exercício dos seus direitos individuais, que o Consulado do Brasil em Lisboa «esteja preparado para enfrentar quaisquer distúrbios e tentativas de tumultuar as eleições e que todas as eleitoras e eleitores possam se dirigir ao local de votação, dentro dos limites da lei eleitoral brasileira, sem medo de expressar suas preferências e sem serem alvo de constrangimentos, intimidação ou outras formas de violência».

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Depois do último debate televisivo entre os principais candidatos presidenciais a realidade do Brasil pouco mudou. Os pobres continuam mais pobres, os ricos mais ricos e a polícia continua a invadir as favelas, matando moradores e criminalizando todos os moradores dos bairros populares.

Nas favelas, controladas pelas milícias de ex-polícias e actuais agentes, as operações são menos frequentes e o tráfico de droga floresce na mesma. Por ano, morrem mais de 62 mil pessoas de morte violenta no Brasil, uma parte significativa delas cai vítima das balas da polícia.

O Brasil é quase um continente, em que coexistem várias realidades. Um dos fundadores da Teologia da Libertação dizia que o país se devia chamar «Belíndia», porque tem cerca de 10 milhões de pessoas com o poder de compra da Bélgica e o resto das centenas de milhões com a miséria existente na Índia.

Neste sentido, uma frase como «bandido bom é bandido morto» é escutada com agrado em muitos dos bairros da classe média alta e é temida como uma sentença de bala perdida para muitas das pessoas que moram nas favelas e nos bairros pobres que cercam as grandes cidades.

Apesar disso, as empresas de estudos tentam identificar as maiores preocupações dessa entidade mítica que seria «o brasileiro comum». Um estudo do instituto Atlas, desta terça, 27 de setembro, deixa claro quais são as principais preocupações referidas pelas pessoas inquiridas no estudo. Numa pergunta sobre os principais problemas do Brasil, o instituto ofereceu uma lista de opções para os entrevistados. Corrupção ficou em segundo lugar, com 16,6% das pessoas citando-a como o principal problema do país. Só ficava atrás de outro problema: a pobreza e desigualdade social, que ficou em primeiro com 19,7% das respostas. Inflação é a terceira preocupação, com 12%. O desemprego, a sexta, com 7,4%.

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Primeiro debate presidencial mostra um presidente que odeia mulheres

As questões que geraram as disputas mais acesas foram a corrupção, a interferência no sistema judicial, a falta de resposta do governo à pandemia, a fome e os insultos de Bolsonaro.

Um debate que pouco deve ter mudado nas sondagens. 
CréditosFernando Bizerra / EPA

Bolsonaro voltou a negar que existem 33 milhões de pessoas com fome no país e manipulou dados para indicar que o plano social actual é maior do que o pago pelos governos do Partido dos Trabalhadores (PT). O ex-presidente Lula da Silva, por seu lado, afirmou que o Brasil está destruído e prometeu reconstruí-lo como estava durante o seu governo, em que havia uma política de combate às desigualdades sociais e os trabalhadores viviam dignamente.

Lula disse que sob o seu mandato os pobres «serão novamente respeitados». O actual presidente Bolsonaro escolheu atacar o seu principal rival para as eleições de 2 de Outubro, acusando-o de dirigir o governo mais corrupto da história do Brasil.

O debate, que teve lugar no estúdio Bandeirantes em São Paulo, contou também com a presença dos candidatos Ciro Gomes do Partido do Trabalho Democrático (PDT); Soraya Thronicke do partido União Brasil do ex-juiz Sergio Moro; Felipe D'Avila do Partido Novo libertário; e Simone Tebet do Movimento Democrático Brasileiro (MDB) do ex-presidente Michel Temer.

Na sua primeira intervenção, a senadora SimoneTebet disse que Bolsonaro ataca a democracia e não respeita a liberdade de imprensa ou a divisão de poderes. A senadora concluiu que para o Brasil ser pacificado e voltar a crescer era preciso «trocar o presidente da República».O presidente garantiu que escolheu os seus ministros «com base em critérios técnicos» e afirmou que o poder judicial interfere com o seu mandato presidencial. Bolsonaro criticou a decisão do juiz do Supremo Tribunal Alexandre de Moraes, que pediu à polícia federal que autorizasse uma investigação aos empresários suspeitos de partilharem mensagens a favor dos golpes nas suas redes sociais privadas.

No primeiro confronto directo entre os principais candidatos presidenciais, Bolsonaro perguntou se o PT queria regressar ao poder para continuar a corrupção na Petrobras. «Tinha de ser ele a perguntar-me e eu sabia que essa pergunta estava para vir», respondeu Lula, que citou várias medidas anti-corrupção e de transparência decretadas durante o seu governo.

«As pessoas precisam de saber que as mentiras não valem a pena na televisão», disse o antigo líder dos metalúrgicos. Bolsonaro disse, citando umas declarações tiradas de um delatores premiados da Lava Jato (acusados que se livravam das acusações denunciando outras pessoas) que o governo de Lula era «baseado no roubo» e que «o seu governo era o mais corrupto da história do Brasil».

O antigo presidente contra-argumentou que foi durante os seus mandados que mais se gerou empregos, fez-se investimento na educação e aumentaram os lucros na Petrobras. «O país que deixei para trás é um país que as pessoas sentem falta», disse Lula, acusando Bolsonaro de «destruir o país» e «inventar números».

Ciro Gomes interrogou Bolsonaro sobre as suas declarações, na sexta-feira passada, em que o chefe do executivo negava a existência de fome generalizada no país: «Tem uma pedra no seu coração». Fiel ao seu estilo, Bolsonaro voltou a negar a existência de fome no Brasil: «Todos interpretam a informação como bem entendem».

O presidente afirmou que a inflação no Brasil é uma das mais baixas do mundo e que estão a ser criados novos empregos. «O nosso PIB está a crescer. Realizámos um milagre durante a pandemia», justificou ele. No entanto, Bolsonaro ignorou que o Brasil continua, segundo um relatório da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico), no topo do ranking dos países com as mais altas taxas de inflação entre as principais economias mundiais.

«O meu governo cuida dos mais necessitados», disse Bolsonaro, que admitiu que «alguns passam fome» embora o programa Auxilio Brasil pague mais do que o suficiente para tirar os mais pobres da linha da pobreza. O líder da extrema-direita enganou-se novamente ao afirmar que o seu governo aprovou o primeiro lote do programa de ajuda social, um substituto para o bem sucedido plano Bolsa Família implementado por Lula, no Congresso com o voto contra do PT. O Partido dos Trabalhadores votou sempre no Congresso brasileiro a favor dos apoios sociais.

Em relação à educação, Lula lamentou que o governo de Bolsonaro tenha deixado de divulgar os indicadores e que o desempenho da educação pública se tenha degradado a todos os níveis. «A primeira coisa que vou fazer é convocar uma reunião com todos os governadores e presidentes de câmara para travar uma verdadeira guerra contra o atraso da educação. Dupliquei o orçamento da educação e sei que preciso de o melhorar.»

Tebet, candidato presidencial do MDB, tornou-se um dos principais críticos de Bolsonaro durante o debate. "Não vi o Presidente da República entrar na sua mota e ir a um hospital para abraçar uma mãe", disse, recordando a sua participação na comissão parlamentar que investigou, entre outras questões, as suspeitas de corrupção na compra de vacinas. O Brasil é o país com o segundo maior número de vacinas do mundo.

As mulheres que se «vitimizam»

Num dos momentos mais tensos da noite, Bolsonaro atacou a jornalista da TV Cultura Vera Magalhães, que lhe fez uma pergunta sobre a campanha de vacinação da covid-19. «Penso que vai dorme a pensar em mim, não pode tomar partido num debate como este. É uma vergonha para o jornalismo», disse Bolsonaro visivelmente encolerizado.

Simone Tebet veio em defesa do jornalista e acusou o presidente de misoginia. Bolsonaro virou então as suas armas contra Tebet. «Sois uma vergonha para o Senado, não venha com esta história de que eu ataco as mulheres para se vitimizar», atacou a senadora.

As hostes de Bolsonaro têm tentado colocar a mulher do presidente na campanha para conseguirem diminuir a antipatia que a maioria das mulheres manifesta pelo actual ocupante do Palácio do Planalto. Um esforço que ficou dificultado neste debate.

Em 2018, quando ganhou as eleições, Bolsonaro participou apenas nos dois primeiros debates presidenciais. Um mês antes da primeira ronda, foi esfaqueado durante um comício de campanha e, após ter sido operado, não voltou ao debate. Lula, que governou o Brasil entre 2003 e 2010, lidera a corrida com 47% dos votos contra os 32% de Bolsonaro, de acordo com uma sondagem do Instituto Datafolha publicada a 18 de Agosto.

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As últimas sondagens dão, a Lula da Silva, 50% das intenções de voto, um valor que lhe garante já a vitória na primeira volta, enquanto os valores de Jair Bolsonaro rondam os 36%.

O debate da passada quinta-feira à noite, na rede Globo, não deverá ter tido grande influência na conquista de novos votos por parte dos dois grandes candidatos, segundo vários analistas citados na imprensa brasileira, já que acabou por se tornar num ‘campo de batalha sujo’ onde os ataques, acusações de corrupção mútuas e pedidos de defesa da honra foram a tónica.

Ainda assim, a acreditar nas sondagens, Lula não terá de ‘roubar’ mais votos à chamada terceira via política, personificada por Ciro Gomes (com 6% das intenções) e por Simone Tebet (5%), para poder festejar já no domingo.

Já na sua entrevista no programa do Ratinho [um popular programa sensacionalista da televisão do Brasil], no dia 19 de Setembro, Lula mostrou disposição para dar mais fôlego a um país que ficou sem ar. Se vencer a eleição, garante que vai aumentar o salário mínimo dos trabalhadores, estagnado há três anos. «E como é que o senhor vai aumentar o salário mínimo?», perguntou o apresentador do SBT, em sua série de entrevistas com presidenciáveis. «Aumentando!», respondeu o petista. Lula confirmou que terá no salário mínimo, uma das medidas básicas para a melhoria de vida da população, como foi já tinha acontecido com o seu governo e da sua companheira de partido Dilma Rousseff. Se sair vencedor, trará de volta a fórmula que ajudou a melhorar a distribuição do rendimento nacional durante o seu governo: vai ligar a expansão do PIB ao aumento real do salário mínimo.

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«A fome é uma opção deste governo», destaca dirigente do MST

Na audiência pública «Carestia, fome e segurança alimentar e nutricional no Brasil», defendeu-se que «uma das tarefas para acabar com a fome é derrotar o governo Bolsonaro».

Créditos / PCdoB

A iniciativa, realizada esta terça-feira na Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados, em Brasília, deu sequência ao requerimento do deputado Rogério Correia (Partido dos Trabalhadores; PT), e contou com a participação de movimentos populares, investigadores e deputados.

De acordo com a segunda edição do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, publicado em Junho, apenas quatro em cada dez famílias brasileiras têm acesso pleno à alimentação e 33 milhões de brasileiros passam fome.

Por comparação com os dados de 2020, houve um aumento de 7,2% no número de pessoas em algum estado de insegurança alimentar.

No total, 125 milhões de brasileiros vivem algum nível de insegurança alimentar, revelou a investigação levada a cabo pela Rede Penssan, integrada por especialistas em segurança alimentar, e executada pelo Instituto Vox Populi, com apoio de diversas entidades.

«O inquérito vem para dar nome e rosto a estes números», destacou Renato Sérgio Jamil Maluf, da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede Penssan). «O que o inquérito nos aponta foi que, em um ano, o equivalente à população de São Paulo entrou para o mapa da fome», apontou Maluf, citado pelo portal do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST).

«Como a fome está fazendo 33 milhões de pessoas sofrerem, se temos o famoso agro, que diz alimentar mil milhões de pessoas no mundo?», questionou Suzana Prizendt, do movimento Banquetaço e da campanha «Gente é pra brilhar, não para morrer de fome».

Segundo Prizendt, no ano passado, o agronegócio produziu o equivalente a uma tonelada de grãos por habitantes no Brasil. «Acontece que estes grãos, que utilizam nossa água, nosso solo, nossos recursos financeiros, além de não serem alimentos, mas mercadorias que enchem os bolsos de uma minoria, são destinados para o mercado internacional», explicou.

Alexandre Conceição, da direcção nacional do MST, intervindo durante a audiência / MST

Por seu lado, Alexandre Conceição, da direcção nacional do MST, apontou que «o império nos impôs a fome, a ditadura nos impôs a fome e, agora, estamos repetindo a tragédia de nossa história, por conta deste governo», ao destacar o aspecto estrutural da fome no Brasil.

«Sem combater o latifúndio não há o combate efetivo da fome. E o governo que aí está é de natureza latifundiária, por isso o Brasil voltou para o mapa da fome», sublinhou Conceição.

Rogério Correia, o deputado que solicitou a audiência, apontou também a acção e omissão do governo frente ao crescimento da fome. «O momento é grave e o poder público tem o dever de ser agente ativo para construção de políticas de combate à fome de forma mais robusta», afirmou. «Uma das tarefas para acabar com a fome é derrotar o governo Bolsonaro, mas precisamos discutir também o que vamos construir para o futuro», acrescentou.

Entre as diversas políticas adoptadas pelo governo de Jair Bolsonaro que contribuíram para o aumento da fome, o MST destaca o desmantelamento dos stocks de alimentos, que são fundamentais em momentos de inflação e fome.

Em 2013, o país sul-americano tinha 944 toneladas de arroz armazenadas e, em 2015, mais de um milhão de toneladas, informa o MST, acrescentando que, em 2020, esses stocks desceram para 22 toneladas, o que não garante nem uma semana de consumo no país. «Atualmente, não existem estoques governamentais de alimentos para contingência, para intervir nos preços nos mercados ou para apoio aos programas sociais», revela o portal dos sem-terra.

«A fome é um projeto político para estes que estão governando o país agora», afirmou a deputada federal Maria do Rosário (PT). «Se eles têm um projeto de fome, nós temos um projeto de vida», frisou.

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No país onde 37% da população trabalhadora ganha um salário mínimo, e 68% ganham até dois salários, as preocupações de muitos eleitores parecem elementares. Estamos a falar de mães de família que passaram a cozinhar à lenha quando o preço do gás subiu de uma forma brutal, ou dos trabalhadores informais que perderam emprego na pandemia e ficaram sem o dinheiro quando o governo Bolsonaro decidiu suspender o programa social Auxílio Brasil por dois meses.

Essas pessoas, as principais vítimas da exploração e da miséria, são maioritariamente os brasileiros que apoiam o ex-presidente Lula. Na pesquisa Atlas Intel, ele tem uma imagem positiva entre 63,8% nas famílias que ganham até dois salários mínimos. Bolsonaro, que aumentou muito o Auxílio Brasil em plena campanha eleitoral, enviou um orçamento para 2023 com um corte de 59% do programa de Farmácia Popular. Não reajustou o apoio às refeições escolares, a perderem verbas desde 2017. E o salário mínimo seguiu sem o aumento real para o ano que vem.

Lula acertou no alvo para comunicar com a maiorias das pessoas que trabalham e são pobres, e isso pode dar-lhe uma vitória, à primeira volta, já neste próximo domingo. Ou no dia 30, se houver uma segundo volta. Se voltar a ser presidente, o petista ainda terá a sua hora para encarar o Brasil de Moro e Bolsonaro, com uma imprensa pronta a morder qualquer medida que não dê mais lucros aos do costume. Mas um dia de cada vez.

Não é pelo risco de golpe militar que a grande massa vai às urnas, nem, infelizmente, para salvar a Amazónia, o maior pulmão verde do planeta em risco de ruptura sem retorno. É para matar a fome de 33 milhões de brasileiros que Lula pode vencer esta eleição.

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Quantas não são as questões que nas diferentes sociedades não são resolvidas e que tornam a emergir? Esta enunciação no espaço público é, em si mesma, uma insuportável manifestação de violência. Como foi, afinal, possível trazer para a arena política e para o debate a evocação da crueldade, do gesto bárbaro sobre o corpo torturado?

Outubro de 2022, sábado, nas ruas de São Paulo. Na véspera das eleições presidenciais, Carla Zambelli, deputada bolsonarista do Partido Liberal, de arma em punho, perseguindo um homem negro, apoiante de Lula. Passada apressada, as duas mãos a segurar a pistola, sem que pareça existir qualquer hesitação ou falta de familiaridade com a arma. O homem procura refugiar-se num bar e no vídeo que foi difundido nas redes sociais e nos vários canais de televisão podemos ouvir a invetiva: «Deita no chão. Deita no chão.»

Tudo isto nos evoca o inusitado clima de tensão e de violência (e de morte) que marcou esta campanha eleitoral. Mas aquele momento, feito visão inquietante, torna-se a imagem da submissão de corpos e vontades pela humilhação e pela força. Trata-se de uma arma e não de um argumento. E leva-nos a articular, a partir dele, as questões de raça e classe, num país de grandes desigualdades.

Dia da eleição. Começaram a circular as notícias de que a Polícia Rodoviária Federal (PRF) estava a fazer bloqueios de estradas e buscas a veículos. O receio de que se tratasse de uma tentativa de golpe de Estado tornava-se palpável, já que a dificuldade de mobilidade e circulação penalizava as regiões e os locais onde a votação em Lula seria mais expressiva. Sucediam-se as denúncias e os apelos.

«Como foi, afinal, possível trazer para a arena política e para o debate a evocação da crueldade, do gesto bárbaro sobre o corpo torturado?»

Crescia a inquietação: condicionar, evitar, restringir, dificultar a participação eleitoral não são estratégias aceitáveis num regime que se quer democrático. Talvez esta possa ser uma imagem de advertência: que nos faça pensar sobre as estratégias e os processos de destruição que ocorrem no interior dos regimes democráticos – sendo que nem estes acontecimentos, nem a realidade brasileira se constituem como únicos.

Dia das eleições: abertura dos portões de uma escola onde se votava na Baía. Gente que corria para poder fazer ouvir a sua voz, através do voto. A entrada que pode parecer desordenada, mas que foi feita de vontade. E de alegria. De corpos que se querem afirmar como sujeitos políticos. Contra todos os cerceamentos de liberdades e violências.

De todas as imagens que guardo, esta é a imagem que quero preservar. Porque o resultado das eleições no Brasil não foi um fim. E continuaremos de olhos postos na dinâmica política desse país. Porque continuamos a querer que chegue a Primavera. Porque não deixo de ter receio de dias infaustos nos tempos de crise que vivemos. Este texto podia ser sobre o Brasil, mas talvez seja, na verdade, sobre a esperança.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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As expetativas dos brasileiros à porta de cada Mundial são sempre enormes, mas talvez este ano essas possam ser encaradas como mais próximas da realidade. É um facto que a equipa liderada por Tite apresenta um número de soluções incrível, com dois dos melhores guarda-redes do mundo, um conjunto de centrais mais do que rodado ao mais alto nível e uma equipa de sonho do meio-campo para a frente.

Num grupo onde Sérvia e Suíça alimentam iguais ambições de alcançar um lugar nos oitavos-de-final, a equipa canarinha não pode correr riscos nesta jornada inaugural, em que os sérvios chegam com vontade de fazer esquecer as habituais distrações extra-futebol que têm condenado prestações ao melhor nível nestas provas.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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Crónica
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A derrota frente ao Equador acabou por ser natural. Mas o vencedor da Taça Asiática, com passagens aceitáveis na Copa América e na Gold Cup, terá que mostrar algo mais. O seu grupo, no entanto, não lhe permite facilidades. O Senegal fez uma interessante exibição perante os Paises Baixos, mostrando que há vida para lá de Sadio Mané.

A sua foi uma das derrotas com sabor de injustiça. Merecendo mais, não somou qualquer ponto. Pelo que com menos de uma semana de competição teremos um jogo de vida ou morte. Entre aqueles que jogam em casa e aqueles que tentam construir uma casa sem o apoio da sua maior estrela. O futebol não se deixa levar pela empatia, quando toca a eliminar os que não são fortes o suficiente.

O campeonato dos protestos e da diplomacia

O Irão não cantou o seu hino, Sardar Azmoun foi aplaudido por ter dado voz aos manifestantes, Mehdi Taremi e os seus companheiros não festejaram os golos marcados. No entanto, o seu treinador tentou reduzi-los a «rapazes que só querem jogar à bola». Há muitos casos em que não parece haver uma conexão direta entre o que vemos acontecer e aquilo que os intervenientes querem que nós vejamos acontecer.

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Não é a braçadeira, é o conhecimento

Uma investigação levou ao afastamento de vários focos de corrupção no seio da FIFA e das confederações continentais. Mas a bola rola no Catar... a sua riqueza permitiu-lhe ultrapassar todas as dificuldades.

Numa conferência de imprensa em Zurique, Suíça, a 20 de Julho de 2015, o antigo presidente da FIFA, Sepp Blatter, foi recebido por uma chuva de notas de dólares, atirados por um comediante inglês. Blatter esteve envolvido no processo corrupto que levou à escolha do Catar para a realização do Mundial de Futebol de 2022.
Créditos / Yahoo!

A tendência para medir os resultados das manifestações através das medidas concretas que são tomadas pelas instituições desvia-nos daquele que deve ser o caminho da transformação da sociedade. O que aqui está em causa não são as braçadeiras. O que está em causa é a informação que chega às pessoas. 

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O coração de Eriksen e o apelo dinamarquês

A 12 de Junho de 2021, o coração de Christian Eriksen parou. Um ano depois, Eriksen já encanta nos terrenos da Premier League e vai voltar a liderar a seleção da Dinamarca no Mundial do Catar.

Christian Eriksen usou uma braçadeira arco-irís em 2017, durante a qualificação para o Mundial de 2018, em apoio às pessoas LGBTI+ 
Créditos / @Squawka

A 12 de Junho de 2021, em Copenhaga, o coração de Christian Eriksen parou. Estava no centro do relvado, numa partida entre a sua seleção e a da Finlândia, a contar para o Euro 2020. O mundo inteiro assistiu à queda da estrela dinamarquesa, à união e ao desespero dos seus colegas e familiares, temendo uma tragédia televisionada. O jogo, no entanto, continuou. A Dinamarca, com Christian Eriksen já consciente e a recuperar numa cama de hospital, seguiu heroicamente até às meias-finais, acabando como uma das surpresas da prova.

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O grupo de todos os conflitos

Quis o sorteio que o Grupo B nos lançasse uma série de encontros que deixam água na boca a quem estuda e acompanha as grandes questões do mundo. Um grupo onde se joga muito mais do que apenas um resultado.

Mehdi Taremi, ponta-de-lança do FC Porto, vai representar a seleção do Irão no Mundial de 2022, no Catar 
CréditosJosé Sena Goulão / Agência Lusa

Quis o sorteio que o Grupo B nos lançasse uma série de encontros que deixam água na boca para quem estuda e acompanha as grandes questões do mundo. Inglaterra, Estados Unidos, Irão e País de Gales disputam duas posições no apuramento.

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O mundo no Mundial

O Mundial 2022, de uma forma cruelmente evidente, é muito mais do que uma competição de futebol. Outros valores se levantam no momento em que a bola começa a rolar. E parece ter pouco ou nada que ver com o futebol.

Luís Cristóvão, <em>Um Outro Mundial </em>
Créditos

Cada edição do Mundial de futebol é um momento de olhar o mundo e perceber como ele evolui. Para os cidadãos de 2022, o fato deste Mundial se realizar no Qatar trará mais reflexões sobre os problemas do que saudações sobre os avanços provocados pelo mesmo.

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O futebol, o Mundial e o nosso dever de intervenção

Contra aqueles que acreditam que os problemas do Mundo se resolvem com o cancelamento dos mesmos nas agendas pessoais, o envolvimento e a intervenção nos acontecimentos como uma resposta aos problemas que estes podem estar a gerar. Uma oportunidade para pensar no que é o futebol e onde somos colocados pela realização deste Mundial no Qatar.

CréditosWalter Bieri / EPA

O que é o futebol

Desde sempre que, em quase tudo no mundo, se pretendeu ter a capacidade de dividir as coisas em dois, polarizando as escolhas como adesões inquestionáveis a um dos lados da contenda. Ao longo da sua história, o futebol foi apenas mais uma dessas coisas do mundo que se ama ou se odeia. Muitos e muitas dos apaixonados pelo desporto encaram o futebol como o irmão velho e rico que parece encostar-se ao seu privilégio para se impor sem qualquer preocupação com os restantes. O futebol enquanto ópio do povo também é uma ideia muito partilhada por uma determinada elite, tendente apenas a entender as dinâmicas negativas criadas por um acontecimento que convoca paixões e multidões onde quer que ocorra. Por outro lado, muitos daqueles que se embrenham no acontecimento futebolístico também o tendem a fazer de forma absoluta, incapazes de o questionar ou de analisar as diferentes escalas em que as coisas do futebol, como as de todas as outras coisas da vida, se podem dividir.

Gostar de futebol não é um contrato exclusivo com uma construção ilusória a partir de um desporto que tende a embrenhar-se numa dinâmica de dinheiro e poder. É, na verdade, muito do seu contrário. Porque apesar de todos os movimentos que se podem gerar em volta do terreno de jogo, o futebol continua a ser muito semelhante àquilo que sempre foi. Um período de tempo predeterminado, onde duas equipas de número igual de elementos tentam vencer a outra, dentro de um quadro de regras simples aceites pelas duas partes. Neste intervalo de noventa minutos, podemos assistir a todas as grandes dinâmicas da vida. A importância da preparação e do planeamento. A força da organização coletiva. A inebriante esperança de podermos ser melhores do que qualquer rival que nos desafie. A capacidade de transformar fraquezas em forças. A emoção de um objetivo alcançado. O drama de uma derrota inesperada. Tudo dentro desse quadro controlado de quem sabe que, amanhã, o nosso pensamento já estará a focar-se no desafio seguinte.

Mas o futebol é também um meio de transformação social. Dos jogadores, que chegam quase todos de classes menos privilegiadas e, através do seu talento e do seu trabalho, conquistam uma ascensão social inimaginável em qualquer outra área profissional. Das comunidades, que se organizam em redor de um clube e crescem e se desenvolvem como exemplos de cooperação e sucesso. Dos adeptos, que aí encontram maneiras de expressar as suas raivas e as suas esperanças, concentradas numa prática de afirmação que lhes é impedida em muitas outras áreas da sua vida. E de tantos, tantos outros, que acabam por encontrar no futebol uma maneira de explicar o seu mundo através de uma língua franca que lhes abre portas em qualquer labirinto. Tudo isto é o futebol, o futebol que apaixona, o que futebol que se reinventa, o futebol ao qual continuamos a aspirar.


Onde nos coloca este Mundial

A realização do Mundial no Qatar coloca-nos uma série de questões que são muito relevantes no quadro do mundo em que vivemos no ano de 2022. A ausência de transparência na atribuição deste evento, a quebra da tradição no período do ano em que ocorre, o posicionamento do país que o recebe na defesa dos direitos humanos, largamente deficitário em relação aos padrões mínimos exigíveis, os condicionamentos impostos a todos aqueles que visitem o país, as opções na defesa do planeta perante as ameaças das alterações climáticas e outras tantas notícias que chegam do Qatar são pontos que merecem preocupação e análise. Os Mundiais de futebol têm um historial de debate em relação aos países que os organizam. Assim foi em Itália em 1934, na Argentina em 1978 ou na Rússia em 2018, apenas para citar os casos mais paradigmáticos e comparáveis com o que vai acontecer no Qatar. Importante que em todos esses casos seja a memória do que estava mal em cada um desses países aquela que perdura na mente da maioria das pessoas.

Parafraseando Jorge Valdano, o Mundial do Qatar pode ser uma oportunidade. Aliás, a mesma oportunidade que o futebol sempre nos ofereceu. Para reconhecer o mundo para além do limite do nosso alcance e entendimento, para nos colocar perante o desconhecido, mas também para debater, discutir e denunciar tudo aquilo que nos vários países que disputam esta prova é digno de ser transformado. O futebol sempre foi e sempre será isso mesmo. A chamada de atenção para algo que merece ser observado. Aliás, o Qatar está já a passar por isso mesmo. A forma como várias notícias e campanhas têm sido desenvolvidas – acompanho de mais perto aquelas realizadas pela Amnistia Internacional e a Human Rights Watch, mas existem mais organizações com trabalhos bastante meritórios, tal como vários jornalistas – já obrigou o país a modificar comportamentos que impedem que a situação dos trabalhadores seja tão má como já foi. Será preciso ir mais longe – o foco nunca deve ser apenas e só aquilo que é afetado pelo Mundial, mas em todos os cidadãos e habitantes, nas suas diferentes profissões e posicionamentos, merecem receber a nossa atenção e palavra. De maneira a que o Mundial seja uma janela onde a voz de quem tem algo a dizer encontre o palco que procura.

Os tempos que vivemos são particularmente tensos. Mas o esforço que fazemos terá de ser o de manter a capacidade para identificar as melhores maneiras de intervir em cada espaço. Compreendo perfeitamente quem prefere “cancelar”, nas suas agendas pessoais, a existência deste Mundial. No entanto, não alinho na opção de tapar os olhos e os ouvidos perante as injustiças do mundo. Bem pelo contrário. O Mundial será uma oportunidade para continuarmos atentos ao que acontece no mundo. Enquanto, no terreno de jogo, os melhores jogadores do mundo tentarão uma vez mais, através da expressão do seu talento, da sua inteligência e do seu trabalho, transformar o mundo a cada toque na bola. Poderão considerar isso uma utopia. Mas acredito ser um pouco mais do que isso. Acredito ser a minha obrigação de me envolver nas coisas para que delas se aproveite algo mais, através da observação e da análise. Daí que se entre, a partir de agora, em modo-Mundial, aqui por casa. Com a mesma dedicação de sempre.

Artigo publicado numa primeira versão no site luiscristovao.com 

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É inegável que o processo de escolha do país organizador esteve envolto em problemas de corrupção, tal como é inegável a fatura em vidas humanas do apressado desenvolvimento de um país que procura, num espaço de trinta anos, transformar a sua face. Por outro lado, joga-se pela primeira vez um Mundial num país árabe muçulmano, no que isso acaba por significar para as possibilidades de diálogo entre dois mundos que, na sua aparência, vivem de costas voltadas.

O Mundial 2022, de uma forma cruelmente evidente, é muito mais do que uma competição de futebol. Com a invasão militar russa na Ucrânia e as consequentes crises económicas e energéticas que afetam toda a Europa, as matérias-primas do Qatar conquistaram um peso ainda maior no equilíbrio do mundo em que vivemos. Não é por isso de espantar que tantos queiram virar a cara ao desrespeito pelos direitos humanos, direitos climáticos, direitos de trabalho, direitos das mulheres ou liberdade sexual neste país. Outros valores se levantam no momento em que a bola começa a rolar. E parece ter pouco ou nada que ver com o futebol.

O Qatar da bola

Apesar de ser apenas o segundo país a organizar um Mundial sem nunca antes ter participado num (sendo a Itália de Mussolini, em 1934, o outro exemplo), é difícil negar que o Qatar tem uma tradição futebolística.

«Apesar de ser apenas o segundo país a organizar um Mundial sem nunca antes ter participado num, é difícil negar que o Qatar tem uma tradição futebolística.»

Atuais campeões asiáticos, o Qatar participou, desde a sua independência, em onze, das trezes, edições da Taça Asiática. Conquistou a Taça do Golfo por três vezes. Participou nos Jogos Olímpicos de 1984. Foi finalista, vencido, no Mundial de Sub-20 em 1981, prova que organizou em 1985.

A caminho do atual Mundial, a seleção qatari aproveitou talento naturalizado para formar o seu grupo, com jogadores nascidos no Sudão, no Gana, no Egito, em França, em Portugal, no Iraque. Mas também encontra espaço para uma nova geração de qataris filhos de imigrantes. Apresentar-se ao nível dos rivais é um objetivo mínimo para a equipa orientada pelo espanhol Félix Sánchez.

Ainda há futebol de rua

Aos 23 anos, Moisés Caicedo é uma das figuras da seleção do Equador, que em 2014 atingiu os oitavos-de-final do Mundial. Nesse mesmo ano, Moisés deixou as ruas de Santo Domingo de los Tsáchilas, onde jogava com os seus dez irmãos, para entrar na academia do Independiente del Valle. Nesta equipa venceu a Taça dos Libertadores em Sub-20 e foi contratado pelo Brighton, da Premier League inglesa.

É um longo caminho para um jovem jogador que enche o meio-campo com uma personalidade e uma capacidade apenas ao alcance dos predestinados. Num momento em que, na Europa, se chora a ausência do futebol de rua, o Mundial marca a sua estreia com bons exemplos do que serve para fazer crianças pelo mundo inteiro sonhar. Talvez em alguma rua jogue agora alguém que, daqui a uns anos, cumprirá o seu sonho.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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Para os ingleses, uma passagem para esquecer nas Ligas das Nações parece ter refreado o entusiasmo. Os Estados Unidos, depois da ausência em 2018, lançam uma jovem geração em quem muito acreditam. Para os iranianos, envoltos em problemas sociais, cada Mundial é sempre uma ocasião para evidenciar a sua capacidade de luta e resistência. Para os galeses, apoiados no talento de Gareth Bale, trata-se do regresso a um Mundial sessenta e seis anos depois de muitas desilusões e de muitos craques que não tiveram a oportunidade de chegar a pisar este palco.

Um grupo onde se joga muito mais do que apenas um resultado.

Um Irão de face destapada

A forma como vários jogadores da seleção iraniana criticaram as autoridades do seu país e manifestaram o apoio às mulheres que exigem progresso e liberdade no Irão foi mais um rasgão na tradição de uma equipa fechada sobre si mesma. O elevar da voz em apoio à população demarcou uma geração de jogadores que têm realizado grande parte das suas carreiras na Europa, vivenciando outros enquadramentos e percebendo o lugar que ocupam como exemplos para os seus concidadãos.

Carlos Queiroz, chamado a atenuar o clima de conflito numa equipa onde já experienciou bastantes sucessos, parece ter optado por um caminho diferente no comentário pedido por um jornalista à situação no país. «Quanto é que me paga para responder a essa pergunta?», questionou o treinador português. Difícil de entender como se terão sentido Azmoun e Taremi ao ouvir o seu técnico expressar-se assim.

O Mundial das ausências

Dos muitos ausentes nesta competição, o senegalês Sadio Mané será aquele que mais custará não ver no Qatar. Depois de ter vencido tudo o que havia para vencer ao serviço do Liverpool e de ter conquistado a Taça das Nações Africanas com o seu país, o Mundial 2022 seria o momento de maior impacto da sua carreira, podendo conduzir o Senegal às eliminatórias, depois de uma saída frustrante na fase de grupos em 2018.

No entanto, uma lesão, sofrida a 8 de Novembro com a camisola do Bayern de Munique, acaba por impedi-lo de jogar a competição. A vida tornou-se, de repente, bem mais complicada para os senegaleses, que passam de candidatos a revelação a uma das equipas que pode acabar por ficar pelo caminho no Grupo A, que partilham com os Países Baixos, Equador e Qatar.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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Passou mais de um ano e Christian Eriksen já voltou a encantar nos terrenos da Premier League, primeiro ao serviço do Brentford, agora com o Manchester United. Vai voltar a ser ele a liderar a seleção da Dinamarca no Mundial do Catar. Uma seleção que tentou, pela via diplomática, abrir espaço para várias manifestações na defesa dos direitos humanos neste país.

Nas últimas conferências de imprensa, jogadores, treinador e dirigentes não deixaram de transmitir a sua mensagem. O patrocinador do equipamento quase apagou os símbolos do mesmo, tentando expressar a sua indignação perante os acontecimentos que rodeiam esta competição. Ao entrar em campo, a Dinamarca não estará calada perante as injustiças que outros tentam defender.

Karim Benzema, o ausente

O Mundial que iria ser o de Karim Benzema, o melhor jogador do mundo, já não será. Uma lesão roubou ao avançado do Real Madrid uma oportunidade que esperava desde o início da sua carreira. O seu único Mundial foi jogado no Brasil, em 2014. Uma longa ausência da seleção, devido a uma participação num esquema de chantagem sobre um colega, retirou expressão internacional a um jogador que sempre brilhou ao serviço do seu clube.

«A diversidade apresentada pela seleção campeã do mundo em 1998 nunca foi vivenciada com tranquilidade social num país (...) que também foi vendo crescer a expressão da extrema-direita na sua realidade política.»

A história de Benzema é um pouco a história da França nas últimas décadas. A diversidade apresentada pela seleção campeã do mundo em 1998 nunca foi vivenciada com tranquilidade social no país. Acusações de diferença de tratamento dado a descendentes de africanos nos escalões de formação, problemas de integração de jovens de ascendência magrebina nas seleções, são situações que se sentem num país que, neste período, também foi vendo crescer a expressão da extrema-direita na sua realidade política.

Não ter Karim Benzema neste Mundial é, para além disso, só mais um problema para Didier Deschamps. As lesões já haviam deixado de fora Presnel Kimpembe, Christophe Nkunku e N’Golo Kanté, todos com boas perspetivas de serem titulares. Paul Pogba, outra das estrelas, também fica de fora devido a problemas físicos, num ano em que os seus conflitos familiares extrapolaram para o público e demonstraram um entorno problemático para um jogador que ainda não encontrou tranquilidade na sua carreira. A caminhada da França até este Mundial é uma aventura feita de imensos labirintos.

A casa saudita

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Ataques aéreos sauditas provocam dezenas de mortos no Iémen

Aviões de guerra sauditas bombardearam diversas províncias iemenitas esta madrugada, incluindo zonas residenciais na cidade de Hudaydah e um centro de detenção em Saada.

A coligação liderada pelos sauditas comteue um novo massacre no Iémen, afirmam as autoridades iemenitas 
Créditos / Al Mayadeen

Os sauditas levaram a cabo mais de 70 ataques aéreos nas últimas horas. Ontem à noite, voltaram a violar o cessar-fogo na cidade costeira de Hudaydah, atingindo uma torre de telecomunicações e bairros residenciais, onde faleceram pelo menos seis pessoas, três delas crianças, e outras 18 ficaram feridas.

Ali al-Ahdal, director provincial da Saúde, disse ao canal iemenita al-Masirah que um edifício de três andares foi arrasado no ataque. As autoridades da estratégica cidade portuária, localizada cerca de 140 km a sudoeste da capital, Saná, continuam à procura de sobreviventes nos escombros.

Em Saada, no Noroeste do país, a aviação saudita atacou um centro de detenção temporário, provocando elevado número de vítimas. «Os hospitais estão cheios de mortos e feridos, e precisamos desesperadamente de medicamentos e de equipamento médico», disse o governador de Saada, Mohammed Jaber Awad, à al-Masirah.

O canal iemenita aponta para 180 vítimas mortais, enquanto o correspondentes da Al Mayadeen confirmou a existência, até ao momento, de 62 mortos e 120 feridos, referindo que o número de mortos aumenta à medida que as equipas de socorro efectuam buscas nos escombros.

A coligação liderada pelos sauditas intensificou os bombardeamentos no Iémen desde terça-feira, depois de as forças iemenitas terem lançado um ataque com mísseis e drones contra «infra-estruturas estratégicas» nos Emirados Árabes Unidos.

«Desespero da coligação saudita»

Mohammed Ali al-Houthi, membro do Conselho Político Supremo do Iémen, afirmou que os ataques a zonas residenciais de Hudaydah são um «crime de guerra».

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Intensos bombardeamentos da coligação saudita sobre Saná

O ataque de retaliação levado a cabo pela Arábia Saudita esta madrugada parece ser o mais mortífero desde 2019 na capital do Iémen, tendo provocado cerca de duas dezenas de mortos.

Casa destruída pelos bombardeamentos sauditas desta madrugada 
Créditos / Al Jazeera

Uma das zonas atingidas pela aviação saudita foi o bairro residencial de Al-Libi, em Saná, onde esta manhã o número de vítimas mortais ascendia a 23, segundo o correspondente no local da Al Mayadeen.

Por seu lado, a cadeia de TV iemenita al-Masirah refere que várias casas foram destruídas ou ficaram danificadas e que prossegue a busca por sobreviventes no meio dos destroços. Até ao momento, há registo de uma dezena de feridos.

Nas últimas 24 horas, a aviação da coligação militar liderada pelos sauditas levou a cabo mais de meia centena de raides em várias zonas da capital e províncias iemenitas, segundo a mesma fonte.

Em comunicado, citado pelo canal libanês Al Mayadeen, a coligação referiu que os ataques aéreos sobre Saná, levados a cabo ontem à noite e hoje de madrugada, surgem como «resposta à ameaça e são dedicados à necessidade militar», acrescentando que «a situação no terreno requer ataques contínuos em resposta à ameaça».

De acordo com as autoridades iemenitas, prosseguem as buscas por sobreviventes nos escombros das casas destruídas e danificadas em Saná / @sadam_alqudami / Al Mayadeen

Retaliação pelo ataque iemenita contra «infra-estruturas estratégicas» em Abu Dhabi

Tudo parece indicar que os intensos bombardeamentos desta noite são um acto de retaliação pelo ataque que o Exército iemenita lançou, ontem, contra «infra-estruturas estratégicas» nos Emirados Árabes Unidos (EAU), em virtude do seu papel na guerra de agressão contra o Iémen.

De acordo com as autoridades emiradenses, os ataques levados a cabo com mísseis e drones atingiram as instalações da empresa petrolífera nacional na zona industrial de al-Musaffah e uma zona de construção perto do Aeroporto Internacional de Abu Dhabi, provocando três mortos – um cidadão paquistanês e dois de nacionalidade indiana – e seis feridos.

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Venda de armas aos sauditas é sinal «preocupante» do arrastar da guerra no Iémen

O Departamento de Estado dos EUA aprovou o primeiro grande negócio de venda de armas aos sauditas na administração de Biden, algo que pode revelar a intenção de Riade de prolongar a agressão ao Iémen.

Edifícios destruídos e danificados após um bombardeamento saudita no Iémen; a agressão da coligação liderada pelos sauditas começou em Março de 2015 
Créditos / PressTV

Num comunicado emitido quinta-feira passada, o Pentágono deu conta da aprovação, pelo Departamento de Estado norte-americano, da venda de 280 mísseis ar-ar à Arábia Saudita, no valor de 650 milhões de dólares, para que Riade pudesse fazer frente a ameaças actuais e futuras.

Para o académico norte-americano Richard Falk, especialista em direito internacional e relações internacionais, o primeiro grande negócio de vendas de armas da era Biden aos sauditas, «os chamados mísseis defensivos ar-ar», constitui «um sinal preocupante das intenções sauditas de prosseguimento das suas políticas cruéis de devastação do Iémen».

Numa entrevista à PressTV, Falk, que foi professor na Universidade de Princeton durante mais de três décadas, afirmou que «a posse de uma defesa anti-mísseis mais segura permite aos sauditas continuarem a sua intervenção armada no Iémen, e possivelmente noutros locais, com menor temor de ataques de retaliação».

Richard Falk destacou as «relações especiais» entre Washington e Riade, afirmando que os EUA procuram defender os interesses sauditas e desviar as críticas que são dirigidas a Riade nas Nações Unidas.

EUA usam a sua influência para proteger a Arábia Saudita

«Os Estados Unidos estão a usar a sua influência geopolítica para proteger a Arábia Saudita da crítica na ONU e noutros lugares, gozando novamente com os compromissos colectivos de segurança e com a proibição incondicional da Carta das Nações Unidas do uso de força não defensiva. Estas relações especiais deixam claro que as relações internacionais continuam a ser moldadas pela primazia da geopolítica e não pelas normas internacionais», disse o académico.

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EUA são o maior exportador de armas e a Arábia Saudita o maior importador

Um relatório recente revelou que os EUA foram responsáveis por mais de um terço da venda de armamento a nível mundial nos últimos cinco anos, enquanto os sauditas foram os que mais importaram.

Donald Trump, president dos EUA, num encontro na Casa Branca com Mohammed bin Salman, príncipe herdeiro da Arábia Saudita, em Washington, Março de 2018
Créditos / CGTN

As exportações de armas que tiveram como origem os EUA, entre 2016 e 2020, representaram 37% de todos os negócios registados pelo Instituto Internacional de Estudos para a Paz de Estocolmo (SIPRI, na sigla em inglês).

Metade das exportações norte-americanas de armamento teve como destino o Médio Oriente, e a Arábia Saudita foi de longe o principal parceiro de negócio no período referido, representando quase um quarto de todas as vendas dos EUA (24%).

O instituto sediado em Estocolmo afirma que, entre 2016 e 2020, as exportações de armas dos EUA aumentaram 15% em comparação com o período 2011-2015.

A Rússia foi o segundo maior exportador de armas a nível global, representando um quinto do total de exportações registadas (com menos 22% de vendas que no período 2011-2015).

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Empresas francesas continuam a treinar tropas sauditas para matar no Iémen

Várias empresas francesas especializadas em treino militar participam na formação de oficiais sauditas e nunca deixaram de o fazer desde o início da guerra de agressão ao Iémen, revela uma reportagem.

Quartel da Polícia destruído após o bombardeamento da aviação saudita
A guerra de agressão ao Iémen tem dado lucros de milhares de milhões às empresas de armamento Créditos / mintpressnews.com

A notícia foi divulgada esta segunda-feira no portal da cadeia iemenita al-Masirah, que cita uma reportagem realizada conjuntamente pelos órgãos Lighthouse Reports, Arte e Mediapart, em parceria com o EUobserver.

De acordo com a investigação, o DCI Groupe, detido maioritariamente pelo Estado francês, está a dar treino de artilharia a membros da Guarda Nacional da Arábia Saudita numa escola militar em Draguignan, no Sudeste de França.

As mesmas fontes revelam que a multinacional francesa Thales Group e a filial francesa da RUAG, com sede na Suíça, estão envolvidas no treino de tropas sauditas, facultando-lhes o equipamento de simulação necessário à operação do sistema de artilharia Caesar, desenvolvido pela França, e que pode atingir quase meio milhão de iemenitas.

A al-Masirah refere ainda uma reportagem do meio de comunicação Disclose, de acordo com a qual um cargueiro deverá carregar munições para o sistema Caesar. O mesmo órgão revelou que a França irá entregar mais de cem caesars à Arábia Saudita até 2023.

Este sistema de artilharia é produzido pela Nexter Systems, uma empresa estatal francesa de fabrico de armamento. No final de 2018, 48 destes sistemas móveis estavam posicionados na fronteira da Arábia Saudita com o Iémen.

A reportagem refere que um documento interno filtrado pela agência militar francesa de inteligência – DRM – já então alertava para os riscos que os Caesars representavam para a população civil no Iémen. «A população abrangida por potencial fogo de artilharia: 436 370 pessoas», referiu o documento, datado de 25 de Setembro de 2018.

O mesmo documento dizia que os Caesars também desempenham um papel no apoio às «tropas lealistas e Forças Armadas sauditas no seu avanço em território iemenita».

Se não fosse o negócio das armas...

No ano seguinte, o fogo da artilharia das forças da coligação liderada pelos sauditas atingiu um mercado iemenita perto da fronteira, provocando a morte a 89 civis. Em Setembro, o Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas, debruçando-se sobre o Iémen, sublinhou que a venda de armamento apenas serve para perpetuar o conflito.


«Se não fosse o negócio das armas, a guerra não se prolongaria como está a acontecer, a guerra não continuaria a destruir o povo do Iémen como o tem feito», disse Ardi Imseis, um dos autores da reportagem.

A comunicação social britânica já tinha revelado informações semelhantes sobre a ampla participação de empresas do Reino Unido na monitorização dos ataques aéreos e na preparação de aviões, armas e munições da coligação invasora, refere a al-Masirah, notando que o mesmo é válido para os EUA, cujo envolvimento se tornou público e documentado.

Para a cadeia iemenita, esta reportagem vem confirmar que a «coligação» liderada pelos sauditas foi desde o início uma fachada para as potências ocidentais, que dirigem as operações que atingem o Iémen.

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A França, com 8% das vendas, é o terceiro maior exportador. Seguem-se a Alemanha (5,5%) e a China (5,2%), para fechar a lista dos cinco países que mais armas venderam entre 2016 e 2020. Na parte inferior do «top dez» situam-se Reino Unido, Espanha, Israel, Coreia do Sul e Itália.

O SIPRI nota que, por comparação com 2011-2015, os últimos cinco anos registaram um pequeno decréscimo no volume de vendas de armamento (menos 0,5%), pondo fim a mais de uma década de aumentos sucessivos.

Foi a primeira vez desde o período 2001-2005 que o volume de trocas de armas entre países – um indicador da procura – não registou um aumento por comparação com o período anterior de cinco anos.

Arábia Saudita, o maior importador

Os países do Médio Oriente registaram o maior aumento de importações de armas a nível mundial entre 2016 e 2020, importando mais 25% que nos cinco anos anteriores. Arábia Saudita (61%), Egipto (136%) e Catar (361%) registam os maiores aumentos.

Quatro dos dez maiores importadores de armas são desta região, que representa 33% das importações a nível global: aos três países referidos juntam-se os Emirados Árabes Unidos. Só a Arábia Saudita representa 11% de todo o volume de armas importadas mundialmente nestes cinco anos.

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Sauditas usaram mais de 3000 bombas de fragmentação no Iémen

A coligação liderada pelos sauditas recorreu a bombas de fragmentação de fabrico diverso ao longo da guerra de agressão contra o Iémen, desde 2015, provocando centenas de vítimas civis.

Crianças numa zona bombardeada no Iémen
Créditos / Sputnik News

«As informações e os dados que temos mostram que foram utilizados oito tipos de bombas de fragmentação, de fabrico norte-americano, britânico e brasileiro, durante a guerra no Iémen», revelou Ali Sofra, director-geral do Centro Executivo de Desminagem do Iémen, informaram este domingo os canais de notícias al-Maloumeh e al-Masirah.

O responsável precisou que a Arábia Saudita e os seus aliados lançaram 3179 bombas de fragmentação no Iémen desde o início da campanha de agressão, em Março de 2015, e que as vítimas civis, na sua maioria mulheres e crianças, são mais de mil. Muitas delas perderam a vida quando se encontravam em campos agrícolas e áreas de pasto.

«A monarquia árabe utilizou esse armamento, cujos efeitos são intrinsecamente indiscriminados, nos ataques aéreos que levou a cabo nas províncias de Saada, Saná, Hajjah, Hudayda, Jawf, Amran, Taizz, Dhamar e Mahwit», disse ainda Sofra, citado pela HispanTV.

Em Junho do ano passado, o Ministério iemenita dos Direitos Humanos alertou para os riscos que este tipo de armamento colocava à população civil, uma vez que é pouco preciso, abrange extensas áreas e constitui um perigo mortal para os civis mesmo depois de terminado o conflito. O Ministério acusou então a coligação liderada pela Arábia saudita de ter usado milhares de bombas de fragmentação em áreas residenciais, provocando inúmeras vítimas mortais.


A Organização das Nações Unidas (ONU) condenou a utilização destas munições no Iémen, considerando que se trata de «um crime de guerra». Em 2010 entrou em vigor a Convenção contra as Bombas de Fragmentação, que havia sido assinada dois anos antes por mais de uma centena de países.

Num tweet publicado esta segunda-feira, Ali Sofra criticou as organizações internacionais e de direitos humanos por evitarem falar sobre a existência de ataques aéreos e a utilização de bombas de fragmentação no Iémen. «Quaisquer vítimas de bombas de fragmentação no Iémen não são referidas nos seus relatórios anuais humanitários e de direitos humanos», escreveu, citado pela PressTV.

EUA «congelam» venda e Itália deixa de vender armamento aos sauditas

Joe Biden, o presidente recentemente empossado dos EUA, um dos grandes fornecedores de armamento à coligação liderada pelos sauditas e um dos principais envolvidos no Ocidente, juntamente com o Reino Unido, na guerra de agressão ao Iémen, anunciou na quarta-feira da semana passada o congelamento da venda de armas à Arábia Saudita e aos Emirados Árabes Unidos, cujo volume de negócio tinha incrementado fortemente sob os auspícios de Donald Trump.

Na sexta-feira, a Itália – um de vários países ocidentais envolvidos na venda de armas à Arábia Saudita e que muito lucram com a guerra de agressão ao Iémen – anunciou o fim da exportação de armamento à Arábia Saudita e e aos Emirados Árabes Unidos.

Luigi Di Maio afirmou que se tratava de um «acto necessário», de uma «clara mensagem de paz do nosso país» e que, para a Itália, o «respeito pelos direitos humanos é um compromisso inquebrável». Se for para valer, mais vale tarde que nunca. A guerra e o martírio do povo iemenita começaram há seis anos.

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Os EUA foram responsáveis por mais de metade das armas exportadas para a região (52%), seguindo-se a Rússia (13%) e a França (12%).

A região do mundo que mais armas importou foi a Ásia e Oceânia (42%). Índia, Austrália, China, Coreia do Sul e Paquistão foram os países que mais armas importaram na região.

O SIPRI afirma que é cedo para dizer se uma recessão associada à pandemia de Covid-19 pode fazer abrandar os negócios de armas. «O impacto económico da Covid-19 podia levar alguns países a diminuir as importações de armas nos próximos anos. No entanto, ao mesmo tempo, mesmo no auge da pandemia, em 2020, vários países assinaram grandes contratos de armamento», releva o SIPRI.

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Questionado sobre se este negócio «é consistente com a promessa do governo dos EUA de liderar a diplomacia com vista a pôr fim ao conflito no Iémen», Falk respondeu que não, rejeitando a declaração como uma alegação «falsa».

«Esta é uma afirmação claramente falsa», acusou, acrescentando que os mísseis ar-ar protegem o espaço político nacional saudita, dando ao reino a liberdade de fazer a guerra fora de seu território com expectativas substancialmente reduzidas de ver o seu país atacado. «Por outras palavras, o objectivo do armamento defensivo é muitas vezes isolar a guerra ofensiva da retaliação e, dado o historial saudita, esse parece ser o caso», frisou Richard Falk.

Não há «incentivo para a via diplomática»

«Tal militarismo parece fazer aumentar a capacidade de combate da Arábia Saudita e não apresenta nenhum incentivo para acabar com o conflito no Iémen pela via diplomática. Se a intenção fosse uma mudança no sentido da diplomacia, poderia ter sido sinalizada oferecendo às forças opositoras iemenitas capacidades militares equivalentes ou condicionando a venda dos mísseis a um esforço de boa-fé para resolver o conflito através de negociações. Não houve nenhum esforço tangível ou credível nessa direcção», acrescentou.

O académico norte-americano criticou a incapacidade da ONU para pôr fim ao conflito no Iémen, afirmando que «estamos a assistir a mais um caso em que a ONU e a segurança internacional são incapazes face aos alinhamentos geopolíticos que se dedicam a encontrar soluções militares para conflitos políticos».

«Nesta perspectiva, não há um ponto final à vista para o conflito e o sofrimento humano no Iémen, e é provável que não surja nenhum, a não ser que a Arábia Saudita se sinta ameaçada por outras fontes ou enfrente pressões internas significativas. A morte dos iemenitas, infelizmente, não faz parte dos cálculos políticos realizados pelos cínicos criadores dos objectivos da política externa de Riade», sublinhou.

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Numa declaração realizada ontem à noite, Yahya Saree, porta-voz das Forças Armadas do Iémen, afirmou que se tratou de uma «operação qualitativa […] em resposta à escalada de agressão contra o país».

O militar iemenita pediu às empresas e aos cidadãos estrangeiros, bem como aos residentes no «Estado inimigo dos Emirados» que «permaneçam longe de instalações vitais», tendo em conta que «os EAU são um Estado inseguro enquanto prosseguir a escalada de agressão contra o Iémen».

Navio dos Emirados apreendido em Hudaydah

No passado dia 3, Yahya Saree informou que as tropas iemenitas e combatentes dos comités populares tinham conseguido apreender um navio de bandeira iemenita ao largo do porto de Hudaydah, transportando diverso material militar.

Hussein al-Azi, vice-ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo de Salvação Nacional do Iémen, destacou que o navio não trazia «tâmaras ou brinquedos», mas «armas destinadas a grupos extremistas que põem em risco a vida de cidadãos comuns».

Numa declaração efectuada ontem à tarde, Jake Sullivan, Conselheiro de Segurança Nacional dos EUA – um dos países ocidentais mais envolvidos na guerra de agressão ao Iémen desde Março de 2015 – classificou os ataques a Abu Dhabi como «terroristas».

Sublinhando que o compromisso dos EUA com a segurança dos EAU é «inabalável», prometeu trabalhar no sentido de «responsabilizar» os Hutis, que assumiram a autoria do ataque.

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Por seu lado, o governador da província de Hudaydah, Muhammad Ayyash Qahim, destacou que estes ataques evidenciam o nível de «desespero e frustração» da coligação saudita.

«Os Emirados Árabes Unidos, a Arábia Saudita e os seus mercenários serão responsabilizados pelos crimes que perpetraram contra cidadãos comuns», disse, citado pela PressTV.

Esta quinta-feira, o secretário-geral das Nações Unidas reiterou «o apelo às partes para que exerçam a máxima contenção e evitem qualquer escalada, por entre o aumento das tensões na região, bem como para que respeitem as suas obrigações ao abrigo do direito humanitário internacional».

Guerra de agressão há quase sete anos

A Arábia Saudita, com o apoio dos EUA, do Reino Unido e de outras potências ocidentais e regionais, lançou, em Março de 2015, uma grande campanha militar de agressão contra o Iémen, tendo como objectivo declarado suprimir a resistência do movimento Huti Ansarullah e recolocar no poder o antigo presidente Abd Rabbuh Mansur Hadi, aliado de Riade, sem sucesso.

A agressão militar provocou milhares de mortos, feridos e deslocados, destruiu as infra-estruturas do mais pobre dos países árabes e esteve na origem da mais grave crise humanitária dos tempos modernos, segundo as Nações Unidas.

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O primeiro Mundial num país árabe e muçulmano não se realizará no gigante regional, a Arábia Saudita, mas no pequeno e disruptor Catar. O crescimento, no quadro mundial, das influências das forças cataris tem utilizado o desporto como meio para expressar a sua existência perante um vizinho que tem adotado diferentes estratégias para o controlar. Entre 2017 e 2021, o embargo imposto pelos sauditas colocou tudo em causa, não só a realização deste Mundial mas a própria subsistência do país. O Catar, ainda assim, resistiu.

Nessa prova de força dos cataris nasceu uma nova atitude dos sauditas, cada vez mais envolvidos em negócios e ações diplomáticas com os seus vizinhos. Não será, por isso, de espantar que os jogos da Arábia Saudita passem a imagem de ser jogados em casa. Num grupo de enorme exigência, e com uma estreia frente à Argentina de Messi, o sucesso desportivo da equipa saudita parece um objetivo difícil de concretizar. Mas a transformação deste Mundial, um ano depois do Estado da Arábia Saudita ter adquirido o Newcastle United, da Premier League, numa oportunidade de demonstração de força saudita em território catariano não será desperdiçada.

O futebol é, aqui, apenas um meio para alcançar outros fins.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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Crónica
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Nesta medida, o Mundial 2022 é um fenómeno de sucesso no que toca a alertar mentalidades, um pouco por todo o mundo, para questões que importa ter em conta no futuro do planeta. O excessivo peso colocado pela extração de combustíveis fósseis e a forma como este coloca em causa o nosso planeta. Os desequilíbrios daí resultantes em alargados territórios do planeta e a forma como a riqueza de um determinado país não é distribuída por todos aqueles que aí vivem e trabalham.

Também não se tem deixado de focar, de maneira regular, a importância da igualdade de direitos e a falta de senso que tem discriminar alguém pelo seu género, origem ou opção sexual. Não se mede nada disto por uma bola que rola ou por uma braçadeira que se usa. Mede-se pela capacidade que temos para dar eco às nossas mensagens. 

Daí que o futebol seja revolucionário. Porque mesmo no momento em que todo o seu aparato financeiro e simbólico se foca na organização de um evento que pretende limpo de mensagens políticas, são essas mesmas palavras e gestos que não deixam de ecoar a cada instante. Na forma como os jogadores ingleses se ajoelham antes do início de uma partida. Na liberdade concedida às mulheres iranianas para assistirem aos jogos num estádio. Pela maneira como jogadores, adeptos e jornalistas têm enfrentado as restrições impostas pelo Catar por não deixarem de expor as suas ideias, aproveitando o palco e o microfone para as fazer ecoar. Aos que se sentem fracos por ceder à beleza de um golo, insisto que essa beleza não nos faz esquecer aquilo por que importa lutar nestes meses de Novembro e Dezembro de 2022. 

Doze anos e muitos mais

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Proibida a entrada a animais, russos e à solidariedade com a Palestina

A disparidade na abrangência e alcance de sanções desportivas face a outros dramas humanitários revelam, mais do que um suposto humanismo e solidariedade, a hegemonia cultural, racismo e xenofobia do «Ocidente».

Equipa russa nos Jogos Paralímpicos de 2018 em Sochi
CréditosKirill Kudryavstev / AFP

Na sequência de mais um cenário de guerra no nosso planeta, diversas agências desportivas têm tomado medidas de afastamento de federações, clubes e atletas russos das competições. A disparidade na abrangência e alcance destas sanções desportivas face a outros dramas humanitários, particularmente sobre a Palestina, revelam mais do que um suposto humanismo e solidariedade: sobressai a hegemonia cultural, racismo e xenofobia do «Ocidente».

Desporto: uma frente de combate

Com a invasão do exército russo no território ucraniano, entrou-se numa nova e mais dramática fase do conflito que desde 2014 tem lavrado naquela zona, opondo a Rússia e, mais do que a própria Ucrânia, os EUA e a União Europeia. Para além das operações militares, esta guerra estende-se a todas as facetas da vida. É uma guerra travada no campo económico, informativo e também cultural.

Na frente desportiva, as chamadas potências ocidentais levam clara vantagem, com a sua hegemonia a verter-se na direcção dos organismos e federações desportivas. O objectivo é claro: expulsar tudo o que cheire a russo da dita «comunidade internacional». Entre as inúmeras sanções, salienta-se as seguintes:

- Nos recentes Jogos Paralímpicos de Inverno de Pequim, símbolo maior da inclusividade no desporto, os atletas russos e bielorussos foram impedidos de participar na competição.

- A Rússia e Bielorrússia também foram afastadas do Mundial de Futebol do Qatar e de diversas outras competições internacionais.

- Clubes como o Spartak Moskva, CSKA Moskva, Tyumen ou Zenit foram retiradas das competições europeias. Voltada para provas no estrangeiro, a equipa de ciclismo Rusvelo não tem um único dia de competição este ano, por impedimento da federação mundial.

- O Grande Prémio da Rússia da Fórmula 1 ou a final da Liga dos Campeões em São Petersburgo foram cancelados, assim como diversos outros eventos no ténis, ski, curling, etc.

- O tenista número um do mundo, Daniil Medveded, poderá estar impedido de competir em Wimbledon. O piloto Nikita Mazepin foi despedido da equipa Haas. A própria recém-estrela da patinagem no gelo Kamila Valieva poderá estar impedida de competir. Tem-se exigido aos atletas que se demarquem de Putin e do Governo, mesmo que nunca tenham tido ligações, recriando em pleno século XXI os autos de fé da Inquisição.

Chega-se ao absurdo de sites desportivos removerem as bandeiras dos países dos atletas, sites de apostas terem retirados eventos desportivos russos ou jogos electrónicos removerem as equipas russas.

Atletas, clubes, treinadores e demais staff são tratados como párias e vêem o seu esforço e ambições atirados ao lixo por terem o atrevimento de terem nascido na Rússia ou de trabalharem no país. Relembra-se que a última vez que sanções tão abrangentes foram tomadas contra um país foi contra o regime de Apartheid da África do Sul, como resposta ao próprio segregamento da população negra.

A Rússia tem oligarcas, o Ocidente empreendedores

Da mesma forma que a guerra não se iniciou em 2022, também esta tentativa de isolar a Rússia não começou agora. O tratamento que é feito à Rússia, pela sua ameaça à hegemonia estado-unidense, sempre foi distinta, colocando o seu papel no desporto sob um escrutínio que raramente existe para outros países.

Apesar de durante anos o dinheiro da Gazprom ter sido bem recebido pelos dirigentes desportivos de diversas modalidades, sempre houve uma percepção que esse dinheiro seria mais «sujo» do que outras empresas que movem milhares de milhões à custa de práticas monopolistas, de infracções de direitos humanos e/ou de exploração de vícios, como a Coca-Cola, Heineken ou a Bridgestone.

Também a figura do oligarca Roman Abramovich é vista como sinónimo da entrada dos grandes magnatas no futebol e da redução deste a uma brincadeira de ricos. No entanto, o epíteto de oligarca e magnata a brincar aos clubes nunca é aplicado a Ken Bates, homem que vendeu o Chelsea a Abramovich, e que antes disso já tinha sido dirigente de três outros clubes e da federação inglesa de futebol, e que ainda compraria o Leeds United. Não de somenos, Bates recebeu autorização da coroa britânica para explorar por 199 anos uma ilha nas Caraíbas contra a vontade do povo autóctone, e era próximo de Ian Smith, dirigente da Rodésia do Sul, estado supremacista branco, a par da África do Sul. Para a sua sorte na imprensa, calhou não saber escrever em cirílico.

Doping: o colectivismo russo vs. o pecado individual ocidental

Também na relação com o doping vemos tratamentos diferenciados. A cruzada iniciada em 2014 com um documentário alemão (por «coincidência») levou a que a WADA, agência mundial de antidopagem, tivesse impedido a Rússia de competir usando os seus símbolos nacionais, em competições por selecções. Não estando em causa a veracidade da acusação, parece que a WADA tem dificuldades em encontrar mais casos de programas de doping patrocinados pelo poder central, argumento central para esta medida. No entanto, casos não faltam, e fica aqui uma pequena amostra de um problema no desporto que só por conveniência não é mais falado.

Cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2018, em Pyeongchang

Quando os contornos começar a ficar cada vez mais sinistros e públicos, a justiça dos EUA viu-se obrigada a desvendar a rede de doping capitaneada por Lance Armstrong. Sustentada a partir de dinheiro público através do patrocínio da US Postal, agência federal do Governo dos EUA que dava nome à equipa, a rede conseguiu tornar Armstrong num embaixador dos valores estado-unidenses e um ídolo mundial, obtendo os seus resultados com recurso ao maior e mais sofisticado sistema de dopagem à data e fazendo questão de destruir carreiras e vidas de outros ciclistas. Mas aparentemente o maior esquema de dopagem e gangsterismo da história do ciclismo sob égide de entidades públicas não parece ter provocado sinais de alerta na WADA.

Também no atletismo, a lista alargada de atletas medalhados dos 100 metros apanhados por doping, como os estado-unidenses Carl Lewis, Tim Montgomery, Tison Gay, Justin Gatlin e Marion Jones, o canadiano Ben Johnson (que treinava com o mesmo homem que treinou Montgomery ou Jones) e os jamaicanos Yohan Blake, Asafa Powell, Shelly-Ann Fraser-Pryce e Sherone Simpson, treinados pela equipa MVP, criam um quadro que para a WADA apenas indica prevaricação pessoal, nunca as federações tendo sido responsabilizadas pelas transgressões.

Em 2017, um tribunal espanhol anulou a possibilidade de se identificarem 211 sacos de sangue que estavam na posse do médico Eufemiano Fuentes aquando uma busca da Guardia Civil em 2006, personagem central de uma rede de dopagem de que ainda hoje se desconhece a sua extensão. A justiça espanhola nunca se mostrou disponível para divulgar a identidade de todos os clientes de Fuentes que, segundo o próprio, remonta pelo menos aos Jogos Olímpicos de 1992 em Barcelona, e que para além de ciclistas (os únicos cujos nomes vieram à luz do dia) estendia-se, pelo menos, também ao futebol e ao ténis. Ocupada com a Rússia, a WADA pouco ou nada fez para desvendar este mistério, com as dúvidas sobre a performance de diversas gerações de ouro do desporto espanhol nos últimos 30 anos votadas a mera especulação.

A frieza oriental

Também o suposto tratamento dado aos atletas, sobretudo mulheres, mostra uma dualidade de critérios. Neste aspecto, geralmente, o alvo preferencial da comunicação social é a China e as suas atletas. Mas à boleia do aumento da tensão no Donbass, a mira temporariamente mudou. O alvo foi Kamila Valieva.

Pelo pecado de ter executado performances brilhantes nos recentes Jogos Olímpicos de Inverno em Pequim, logo surgiram as alegações de doping. A trama adensa-se quando, após uma performance menor, o acompanhamento dos treinadores e da comitiva russa foi imediatamente posto em causa por pressão psicológica sobre a agora pobre vítima, com direito a conferência de imprensa do Presidente do Comité Olímpico Internacional (COI). A Rússia, de novo, é vilificada.

Já quando em 2015 rebentou o maior escândalo de abusos sexuais na história do desporto, praticado pelo treinador da equipa de ginástica dos EUA e encoberto pela federação, o COI não teve nenhuma acção. Quando Simone Biles desistiu de provas de ginástica nos Jogos Olímpicos de Tóquio por questões de saúde mental, o mesmo Presidente do COI apenas afirmou que ela era uma lutadora. Não se encontrou espaço para considerações de problemas estruturais num organismo que encobriu cerca de meio milhar de abusos sexuais.

Ainda no campo da patinagem artística, o drama de Valieva leva a grande escrutínio e reflexões sobre como os russos treinam os seus atletas. Já o resultado do drama de Tonya Harding, patinadora estado-unidense que procurou fisicamente incapacitar uma atleta rival, são diversos prémios de cinema com uma das piores condutas desportivas transformada em entretenimento e personalizado na figura da ex-patinadora.

Quando a Palestina se deparou com um desporto apolítico

Se a dureza com que o desporto russo (e bielorrusso) tem sido tratado é justificada aos olhos de alguns como resposta às injustiças cometidas pelos Governos, não deixa de ser gritante como estas sanções desportivas são díspares com o tratamento dado a outros países noutros contextos.

Poderíamos falar dos regimes fascistas e das brutais ditaduras da América Latina no passado ou das monarquias absolutas do estados do Golfo e das aventuras imperialistas dos países da NATO. Ainda assim, o exemplo mais gritante na actualidade é a agressão e genocídio do povo palestino às mãos de Israel, que o submete a um regime de apartheid. Mas em vez de nos focarmos sobre a ausência de sanções sobre Israel e como este país está plenamente integrado no circuito desportivo internacional, atente-se antes às penalizações que os organismos que regulam o desporto têm tido contra aquelas que aproveitam o palco desportivo para mostrar solidariedade com a Palestina.

Caroon de Latuff

O clube escocês Celtic tem nos últimos anos recebido multas na ordem das dezenas de milhares de euros por os seus adeptos mostrarem a bandeira da Palestina durante jogos das competições internacionais. A bandeira da Palestina é considerada um adereço ilícito pela UEFA. Também a federação espanhola de futebol multou o jogador Kanouté por ter mostrado uma camisola de apoio à Palestina. O jogador Aboutrika recebeu um cartão amarelo durante um jogo para a Taça das Nações Africanas por ter violado as regras da FIFA sobre slogans políticos, sendo que o slogan de Aboutrika pedia simpatia para com Gaza. Também o clube chileno Palestino, criado por imigrantes, foi penalizado e obrigado a mudar o design da sua camisola, em que o número 1 tinha o desenho das fronteiras da Palestina de 1947.

O judoca Fathi Noureen foi suspenso durante 10 anos por se recusar a lutar contra um judoca israelita nos Jogos Olímpicos de Pequim por solidariedade com a causa palestiniana. Sorte semelhante teve Saeid Mollaei em 2019, tendo apenas voltado a competir após se mudar para a Alemanha e participar na equipa de refugiados. No xadrez, as federações mundiais têm repetidamente ameaçado países de suspensão caso não permitam a participação de atletas israelitas.

O número dois do squash, Ali Farag, assim como dezenas de outros jogadores e personalidades do desporto, têm vindo a público denunciar os dois pesos e duas medidas quando o assunto foi expressar solidariedade com a causa palestiniana e agora com a Ucrânia. Sempre se tentou impedir que os atletas pudessem abertamente demonstrar as suas opiniões acerca do genocídio alegando as organizações e federações que a política se devia manter fora do desporto e que não tem lugar dentro dos recintos. Subitamente, com a avalanche de expressões solidárias com o povo ucraniano, o que se realça é que o drama da Palestina não cabe na empatia de quem gere o desporto.

Por baixo da pele de cordeiro

Mais do que uma pretensa solidariedade com as dificuldades que o povo ucraniano passa, as recentes sanções sobre a Rússia e a Bielorrússia demonstram duas coisas: a hegemonia cultural do imperialismo dos EUA e da UE e a xenofobia e racismo presente na ideologia dos dirigentes «ocidentais».

Destruído o sonho, após a queda do bloco socialista, de um mundo submisso sob a batuta dos EUA, as principais potências imperialistas vêem-se incapazes de contrariar a emergência de um mundo multipolar, perdendo na esfera política e económica a capacidade de impor a sua política de rapina, opondo-se-lhes a resistência dos povos e dos interesses das potências regionais. A solução militar directa também não é viável em confronto com potências nucleares, como é o caso da Rússia. A mais eficaz arma que lhes resta é a hegemonia cultural criada ao longo de décadas. O controlo dos principais meios de comunicação, tanto de informação como de entretenimento, assim como dos supostos organismos independentes, não-governamentais, neutros e apolíticos permite este ataque concertado e rápido à Rússia na esfera desportiva, apagando esta nação (mais do que o país e o seu governo) do planeta.

O sofrimento que se vive na Ucrânia em 2022 não é maior nem menor que o sofrido nos últimos oito anos, quando os russófonos foram reprimidos pelo estado ucraniano, mas, enquanto as equipas russas são afastadas das competições, fez-se questão que o Shaktar Donetsk tivesse um lugar seguro onde jogar. Uma bomba detonada em Kiev não causa mais nem menos luto que uma que caia em Damasco ou Mossul, mas enquanto a bandeira e hino russo são banidos, nunca o COI pensou em retirar a Estrela de David ou a Star-Spangled Banner do pódio olímpico. O que marca as sanções em 2022 não é a solidariedade, é a agenda política.

À semelhança das sanções económicas, o ataque à cultura russa, como visto nas sanções desportivas, atingem mais o povo russo do que Putin ou a burguesia dirigente. A imagem criada sobre o desporto russo e os seus protagonistas ao longo dos anos não se desvia do guião criado para ostracizar outros povos. O atleta batoteiro, o dirigente manipulador, o dinheiro sujo, a máquina fria e sem escrúpulos, todos coniventes com o regime autocrático, criam uma percepção emotiva primária de rejeição, da criação de um «outro» que não pode estar «connosco». Mais uma machadada nos princípios do olimpismo. Só falta retirar um dos anéis…

A falha técnica dos Jogos de Sochi soou a premonitória em 2022

Neste processo a vítima não é o Governo russo, somos todos nós.

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Desde 2010, a realização do Mundial no Catar levantou suspeição e criou polémica. Mas doze anos não são suficientes para criar condições de ter, num mundo mediático, o espaço suficiente para alterar o curso da história. Na verdade, muito se realizou neste período. Uma profunda investigação levou ao afastamento de vários focos de corrupção no seio da FIFA e das confederações continentais. Anos e anos de trabalho e investigação no território catariano permitiram o conhecimento da realidade no local e a instauração de novas leis. Um extenso trabalho de consciencialização permitiu que dirigentes, treinadores e jogadores sejam, hoje, agentes de mensagens de liberdade e de defesa dos direitos humanos, numa escala nunca antes vista no futebol profissional. 

Mas a bola rola no Catar. Rola porque, na prática, os novos dirigentes da FIFA nunca encontraram base jurídica para reverter a entrega da competição a este país. Rola porque a sua riqueza lhe permitiu continuar a ultrapassar as dificuldades que teve pela frente. Rola, também, porque o Catar não é o outro lado do nosso mundo. 42º classificado no Índice de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas, apesar dos largos reparos registados no relatório da Amnistia Internacional quanto aos direitos dos trabalhadores migrantes, o direito ao sindicalismo, as liberdades de expressão e reunião, os direitos das mulheres e das pessoas LGBTI+ e às pena de morte, o Catar demarca-se de vários outros países do Médio Oriente.

Na prática, os valores do Catar estarão mais próximos da média dos valores dos países que integram a FIFA do que a ideia europeia de direitos. É esse confronto que o Mundial nos obriga a ter. O de ver o mundo como ele é, para melhor sabermos como nele fazer as nossas lutas. 

Os favoritos também se abatem

A derrota da Argentina perante a Arábia Saudita é a primeira grande surpresa deste Mundial e, em consequência, o primeiro grande aviso, sobretudo para as equipas que vão entrar hoje em campo.

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Presidente da FIFA ignora os estatutos e dá respaldo a Israel e Arábia Saudita

Gianni Infantino tinha reuniões preparadas com a Associação de Futebol da Palestina (AFP) mas, apesar de reiterados avisos, insistiu em participar em acções do governo Israelita em territórios ocupados.

26 crianças palestinianas, da Faixa de Gaza, que pertencem à Associação de Futebol de Palestinianos Amputados, preparam-se para participar no torneio de sub-16 para pessoas amputadas em bombardeamentos, por míssil, israelitas. Cerca de 80 homens amputados participam no torneio para adultos. <br />
 
CréditosSuhaib / Reuters

À margem de uma conferência organizada pelo Jerusalem Post, um diário israelita, no Museu da Tolerância, em Jerusalém, o Presidente da FIFA, Federação Internacional de Futebol, admitiu a possibilidade de organizar um Campeonato do Mundo de Futebol conjunto entre Israel e Arábia Saudita, «porque não Israel?».

A tentativa ingénua, por parte de Infantino, de incluir a Palestina numa futura iniciativa, em colaboração com Israel, foi muito mal recebida pela comunidade palestiniana, em contraste com os aplausos da audiência, composta por vários antigos membros do gabinete de Donald Trump, como Ivanka Trump e Mike Pompeo e por Benjamin Netanyahu, responsáveis pelo escalar das agressões e ocupações contra a Palestina nos últimos anos.

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Não abrandam os protestos contra a ocupação e os colonatos

As tropas israelitas reprimiram os protestos desta sexta-feira contra os colonatos. Um rapaz não resistiu aos ferimentos em Gaza. A Unicef informou que Israel matou 9 crianças palestinianas em 2 meses.

Manifestantes palestinianos repelem latas de gás lacrimogéneo disparadas por forças israelitas durante os confrontos que se seguiram à manifestação contra o colonato de Eviatar, na localidade de Beita, no Norte da Cisjordânia ocupada, a 27 de Agosto de 2021 
Créditos / PressTV

Pelo menos dois manifestantes foram atingidos com balas de borracha disparadas pelas tropas israelitas na localidade de Beita, a sul de Nablus. O serviço de ambulâncias do Crescente Vermelho Palestiniano revelou que outros 26 palestinianos sofreram problemas respiratórios devido à inalação de gás lacrimogéneo.

Desde Maio, Beita tem sido palco de fortes confrontos entre as forças de ocupação e a população palestiniana, que protesta contra a construção do colonato judaico de Eviatar no cimo do Monte Sabih, bem como contra o confisco de terras dos aldeãos da região.

Também na sexta-feira, as forças israelitas dispararam numerosos cartuchos de gás lacrimogéneo, balas de borracha e granadas de atordoamento contra manifestantes palestinianos em Kafr Qaddum, no distrito de Qalqiliya (Margem Ocidental ocupada), ferindo dezenas deles.

Pelo menos oito foram atingidos por balas de borracha e dezenas sofreram de asfixia devido à inalação de gás lacrimogéneo lançado pelas forças israelitas, refere a PressTV.

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Dezenas de palestinianos feridos por forças israelitas em protestos contra colonatos

As forças israelitas reprimiram com violência, esta sexta-feira, os protestos dos palestinianos contra os colonatos na localidade de Beita, perto da cidade de Nablus, na Margem Ocidental ocupada.

Palestinianos durante os protestos em Beita contra a ocupação israelita, 25 de Junho de 2021 
CréditosAyman Nubani / WAFA

Pelo menos 18 palestinianos foram atingidos com balas de aço revestidas de borracha, incluindo dois paramédicos, durante um protesto realizado esta sexta-feira para denunciar a construção do novo colonato judaico de Eviatar no cimo do Monte Sabih, perto da localidade palestiniana de Beita, revelaram fontes locais e médicas.

Várias dezenas de manifestantes sofreram ainda sintomas de asfixia devido às granadas de gás lacrimogéneo lançadas pelas forças de ocupação, que, nas últimas semanas, têm reprimido com violência os protestos crescentes dos residentes contra a criação do colonato referido.

A população de Beita e das aldeias circundantes, informa a WAFA, tem levado a cabo marchas semanais, todas as sextas-feiras, denunciando igualmente o confisco de terras dos aldeãos de Beita, Huwarra e Za'tara para que as autoridades israelitas possam ali inaugurar uma estrada apenas para colonos judeus.

De acordo com a WAFA, em quase um mês de protestos, as forças de ocupação israelitas usaram fogo real para dispersar as marchas, tendo morto cinco palestinianos de Beita e ferido 618.

Além do colonato no Monte Sabih, as forças israelitas criaram, há alguns meses, um posto avançado no cimo do Monte al-Arma, a norte de Beita, na medida em que ambas as elevações gozam de uma localização estratégica, com vista para o distrito de Nablus e o Vale do Jordão, uma faixa de terra fértil a oeste do Rio Jordão que representa aproximadamente 30% da Cisjordânia ocupada.

O controlo dos montes a sul e a norte de Beita, e a construção de uma estrada só para colonos são medidas com as quais, nota a agência, as forças israelitas pretendem tornar as aldeias e vilas palestinianas em «enclaves e guetos apinhados, cercados por muros, colonatos e instalações militares», cortando a contiguidade geográfica com outras partes da Margem Ocidental ocupada.

Um manifestante palestiniano é evacuado do local dos protestos durante os confrontos com as forças israelitas no contexto de uma mobilização contra o colonato de Eviatar, recentemente construído, perto da localidade de Beita, a sul de Nablus, a 25 de Junho de 2021 / PressTV

Outros protestos anti-colonatos e mais repressão

Também esta sexta-feira, as forças israelitas atacaram os manifestantes no protesto semanal contra os colonatos na aldeia de Kafr Qaddum (distrito de Qalqiliya). Durante os confrontos, as forças de ocupação israelitas atingiram dois palestinianos com fogo real e prenderam um deles, refere a PressTV.

Dezenas de manifestantes sofreram dificuldades respiratórias devido à inalação de gás lacrimogéneo, enquanto outros quatro, incluindo dois jornalistas, foram atingidos com balas de borracha, indica a mesma fonte.

Houve ainda protestos contra os colonatos na região de al-Ras, perto da cidade de Salfit, onde dezenas de palestinianos sofreram dificuldades respiratórias devido à inalação de gás lacrimogéneo.

A sul de Hebron (al-Khalil), as tropas israelitas atacaram uma mobilização contra a expansão dos colonatos israelitas, a ocupação e a limpeza étnica em Masafer Yatta.

Mais de 600 mil israelitas vivem colonatos só para judeus em Jerusalém Oriental e na Margem Ocidental ocupada. Todos os colonatos israelitas são considerados ilegais à luz do direito internacional.

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As tropas israelitas também atacaram um protesto na aldeia de Umm al-Shaqhan, a sul de al-Khalil (Hebron), contra a expansão de um colonato e os ataques frequentes de colonos israelitas tanto a palestinianos como às suas propriedades.

No protesto, revela a fonte, os manifestantes vincaram a sua determinação em proteger a terra e minar os planos israelitas de expandir os colonatos, que são ilegais à luz do direito internacional. Vários palestinianos, activistas solidários estrangeiros e oito jornalistas foram presos.

Rapaz de Gaza, atingido a tiro por forças israelitas, sucumbe aos ferimentos

Omar Hasan Abu an-Neel, de 12 anos, faleceu este sábado, depois de ter ficado gravemente ferido na semana passada, em protestos junto à vedação com que Israel cerca a Faixa de Gaza.

Fontes médicas disseram à WAFA que o rapaz, residente no bairro de Tuffah, na cidade de Gaza, não resistiu aos ferimentos, depois de ter sido atingido a tiro pelas forças israelitas, uma semana antes, num protesto no Nordeste do enclave cercado, junto à vedação.

O jovem, ferido na cabeça, foi levado de imediato para um hospital, onde foi operado e se manteve em estado crítico.

Abu an-Neel é o segundo palestiniano a morrer dos ferimentos sofridos naquele protesto, em defesa de Jerusalém, contra os ataques frequentes dos israelitas à mesquita de al-Aqsa e para assinalar o incêndio desta mesquita, há 52 anos.

Osama Khaled Deij, de 32 anos, do campo de refugiados de Jabaliya, perto da cidade Gaza, faleceu no Hospital al-Shifa poucos dias de ter sido atingido a tiro pelas tropas israelitas, não resistindo aos ferimentos.

Pelo menos 41 palestinianos ficaram feridos no protesto de 21 de Agosto, a maior parte dos quais com disparos nos membros, nas costas e no abdómen, informou o Ministério da Saúde em Gaza.

Mais de quatro dezenas de palestinianos ficaram feridos e dois faleceram na sequência dos disparos efectuados pelas forças israelitas contra o protesto junto à vedação do enclave no passado dia 21 / Al Jazeera

Unicef: Israel matou nove crianças e feriu 556 na Margem Ocidental em dois meses

Num relatório divulgado esta semana, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) revelou que nove crianças palestinianas tinham sido mortas na Margem Ocidental ocupada e Jerusalém Oriental pelas forças israelitas entre 7 de Maio e 31 de Julho.

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ONU refere «graves» violações cometidas por Israel contra menores palestinianos

O relatório do secretário-geral da ONU sobre crianças e conflitos regista mais de mil «violações» contra crianças palestinianas. Mas Israel, como a Arábia Saudita, volta a ficar de fora da «lista negra».

De acordo com o Ministério palestiniano da Informação, 12 mil crianças foram detidas pelos israelitas nos últimos 17 anos
Jovem palestiniano é detido pelas forças israelitas (imagem de arquivo) Créditos / addameer.org

Em Junho de 2020, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, anunciou que a a Arábia Saudita seria retirada da «lista negra» onde foi incluída em 2017 por matar e ferir crianças no decurso das suas operações militares de agressão ao Iémen. E este ano voltou a não ser incluída na «lista das partes que violam os direitos dos menores durante os conflitos». Esse facto, bem como a não inclusão de Israel «na lista de regimes que matam crianças», mereceu a condenação do Irão.

Por seu lado, o Estado da Palestina lamentou que «o relatório anual mais uma vez falhe ao não incluir, de forma justa, as forças de ocupação de Israel na lista das partes que cometem violações graves contra as crianças» – uma realidade que o relatório refere nos seus próprios termos.

«Esta falha persiste – nota a agência WAFA –, apesar da documentação exaustiva e provas dos crimes de Israel contra os menores palestinianos», e do facto de que esses «crimes não só continuam, como estão aumentar», tendo-se registado a morte de 69 crianças palestinianas nos últimos dois meses (66 das quais no «massacre a Gaza», em Maio último»).

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A «viagem ao inferno» dos jovens palestinianos detidos por Israel

Uma comissão da ONU reafirmou denúncias expostas em vários relatórios sobre detenções de menores palestinianos por Israel – quase sempre presos de noite, algemados e vendados. É o início da «viagem ao inferno».

Um jovem palestiniano é preso na Cisjordânia, na sequência dos protestos contra a decisão norte-americana sobre Jerusalém
Créditos / palestinalibre.org

A instância, composta por especialistas independentes das Nações Unidas, expressou particular preocupação pela expansão dos colonatos e o aumento da violência dos colonos israelitas, em que se incluem ataques a crianças e às suas escolas.

Segundo se pode ler no portal oficial de notícias da ONU, na semana passada diversas organizações informaram a comissão sobre as operações nocturnas levadas a efeito pelas forças israelitas com o propósito de deter crianças e adolescentes na Cisjordânia ocupada, com «graves consequências para o seu bem-estar e gozo dos seus direitos».

«Mais de 300 crianças estão detidas no sistema militar israelita. A maioria por delitos menores, como atirar pedras e publicações nas redes sociais», assinala a comissão, que denuncia o facto de os menores serem «levados para locais desconhecidos, presos em viaturas militares e sujeitos a ameaças e abusos verbais», bem como o facto de, por vezes, serem «obrigados a assinar confissões em hebraico, uma língua que não costumam entender».

Estas preocupações reafirmam as que têm sido veiculadas, ao longo do tempo, por várias entidades, nomeadamente a Comissão dos Prisioneiros Palestinianos, órgão dependente da Autoridade Palestiniana que, em diversas ocasiões (também este ano), alertou para o facto de os menores serem torturados e sofrerem abusos nos cárceres israelitas, bem como para o facto de serem espancados, insultados e pressionados no momento da detenção.

No final de Março, um relatório publicado pelo Ministério palestiniano da Informação denunciava também esta realidade, afirmando que «95% das crianças palestinianas presas pelas autoridades israelitas foram torturadas durante a detenção».

De acordo com o relatório, até 2015 foram documentadas anualmente 700 detenções de menores palestinianos. Já em 2017, Israel prendeu 1467 crianças e adolescentes; 1063 no ano seguinte e, nos dois primeiros dois meses deste ano, 118. Entre 2000 e 2018, foram presos mais de 16 mil menores.

Uma «viagem sem fim ao inferno»

Numa peça intitulada «“Endless Trip to Hell”: Israel Jails Hundreds of Palestinian Boys a Year. These Are Their Testimonies», publicada em Março e plenamente actual, o periódico israelita Haaretz aborda esta realidade, em que as crianças, algumas com idades inferiores a 13 anos, «são detidas pela calada da noite, vendadas e algemadas, alvo de abusos e constrangidas» a confessar «crimes» que não cometeram.

A peça, que reúne testemunhos de sete jovens da Margem Ocidental ocupada com idades compreendidas entre os dez e os 15 anos, revela as diversas fases do processo de detenção, que começa nas operações nocturnas e passa pelo interrogatório, a prisão, o julgamento e a proposta de um acordo.

Na sua maioria, os jovens são presos por, alegadamente, terem atirado pedras ou queimado pneus, mas, como sublinha a advogada Farah Bayadsi o objectivo das detenções «é mais para mostrar controlo do que para aplicar a lei».

A experiência traumática é fundamentada por tudo aquilo por que as crianças passam durante uma detenção. Arrancadas de casa quando dormem, são algemadas e vendadas, levadas em veículos militares para colonatos e bases israelitas, passando por todo um processo que envolve intimidação, ameaças, agressões físicas, afastamento da família e pressão para «confessar».


O nível de brutalidade varia. Khaled Mahmoud Selvi, preso quando tinha 15 anos, foi levado para a prisão e despido (o que, de acordo com o jornal, ocorre em 55% dos casos), tendo sido obrigado a permanecer dez minutos nu, em pé, durante o Inverno.

De acordo com os dados recolhidos pela organização não governamental (ONG) British-Palestinian Military Court Watch, 97% dos jovens palestinianos detidos pelas forças militares israelitas (IDF) vivem em pequenas localidades a menos de dois quilómetros de um colonato.

O advogado Gerard Horton, da ONG referida, afirma que a ideia é «assustar toda a aldeia» e que se trata de um «instrumento eficaz» para controlar uma comunidade. Acrescenta que, do ponto de vista dos ocupantes e opressores, a pressão «tem de ser constante»: «Cada geração tem de sentir a mão pesada das IDF.»

A experiência é traumática. O pai de Khaled Shtaiwi, preso com 13 anos em Novembro do ano passado, contou ao periódico que criou na sua aldeia o «dia da psicologia», porque o seu filho não é capaz de falar sobre o que se passou e porque quer ajudar todas as crianças que foram presas pelos israelitas.

Em Beit Ummar, Omar Ayyash foi preso com dez anos de idade, em Dezembro último. Agora, as crianças que brincam nas ruas da aldeia afastam-se assim que se apercebem da aproximação de soldados israelitas. Tornou-se um hábito desde que as tropas levaram Omar.

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No seu relatório, relativo a 2020, o secretário-geral das Nações Unidas reporta 1031 casos confirmados de violência das forças israelitas contra 340 crianças palestinianas. Dá ainda conta de 11 mortos e 324 feridos, bem como de 361 detenções (87 crianças reportaram maus-tratos e violações ao processo legal devido, sob custódia, por parte das forças israelitas, e 83% referiram violência física). Foram ainda registados 30 ataques a escolas e hospitais, perpetrados pelas forças israelitas de ocupação e colonos judeus, de acordo com o relatório.

O Estado da Palestina, refere a WAFA, lamenta que o secretário-geral da ONU, reunindo estes dados, «ignore» as «provas das graves violações e crimes cometidos por Israel», sublinhando que «esta omissão voluntária» de Israel da lista só reforça a sua «impunidade».

Constitui, além disso, um «desvio grave das responsabilidades confiadas ao secretário-geral», que o Estado da Palestina insta «a corrigir sem demora», porque as «crianças palestinianas têm direito à protecção, segurança, dignidade e liberdade».

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«As tensões continuam na Margem ocidental, incluindo Jerusalém Oriental. Nove crianças palestinianas foram mortas entre 7 de Maio e 31 de Julho, e 556 crianças foram registadas como feridas, também por fogo real, balas de aço revestidas de borracha, granadas de atordoamento e gás lacrimogéneo», aponta o informe da Unicef.

No mesmo período, pelo menos 170 crianças foram presas em Jerusalém Oriental ocupada, segundo o documento.

De acordo com a agência das Nações Unidas, 2,5 milhões de pessoas, incluindo 1,2 milhões de crianças, a viver na Faixa de Gaza cercada e na Margem Ocidental ocupada, incluindo Jerusalém Oriental, necessitam actualmente de ajuda humanitária.

O organismo sublinhou que a situação humanitária se deteriorou recentemente com a escalada da tensão em Jerusalém Oriental, a agressão israelita a Gaza em Maio e a pandemia de Covid-19.

«Tendo em conta a escalada recente, o apelo humanitário para as necessidades das crianças em 2021 aumentou para 46,2 milhões de dólares no total, sendo que 31,5 milhões (68%) estão por financiar», referiu.

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A AFP tinha ficado agradavelmente surpreendida com a intenção, manifestada pelo presidente da FIFA, de reunir com as autoridades desportivas da Palestina, deixando o alerta de que, embora compreendendo que ele também se encontrasse e participasse com insituições israelitas, não iriam tolerar a visita a territórios ocupados militarmente por Israel.

O Museu da Tolerância, em contrassenso com o seu nome, foi construído nos «terrenos confiscados do histórico cemitério Ma’manullah, declarado um local históricos para os muçulmanos. Neles estão enterrados os restos mortais de milhares de palestinianos, árabes e muçulmanos, cujos sepúlcros foram profanados pela construção do edifício no local».

O Futebol palestiniano não abdica da sua dignidade

Esperávamos que a visita do Presidente da FIFA trouxesse esperança aos futebolistas palestinianos, começando a resolver alguns dos muitos problemas que impedem o desenvolvimento deste desporto na Palestina, um país que sofre, ainda, sob ocupação israelita. Não esperávamos uma visita de apoio a grupos evangélicos sionistas que defendem a negação de direitos aos palestinianos», afirmou, em comunicado, a AFP.

«A decisão [de Infantino] de ignorar as nossas preocupações, e tendo em conta que não temos o direito de interferir na agenda do Presidente da FIFA, só nos deixa como alternativa anunciar que, com muito pena nossa, não estaremos disponíveis para receber uma delegação da FIFA, nestas circunstâncias».

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Israel prendeu cerca de mil menores palestinianos em 2021

Cerca de mil jovens e crianças, 73 deles menores de 14 anos, foram presos este ano pelas forças israelitas, revelou o Centro de Estudos dos Prisioneiros Palestinianos.

Um jovem palestiniano é preso na Cisjordânia, na sequência dos protestos contra a decisão norte-americana sobre Jerusalém
Créditos / palestinalibre.org

Sob instrucções directas dos seus superiores, as forças de ocupação visam sistematicamente os menores, para os dissuadir de resistir à ocupação, negando-lhes assim o seu direito à educação, informa o relatório apresentado na semana passada.

O texto, assinado pelo director do Centro de Estudos dos Prisioneiros Palestinianos, Riyad al-Ashqar, regista a escalada no número de detenções de menores palestinianos por parte das forças israelitas e destaca que todos os menores foram submetidos a diversas formas de tortura e maus-tratos a partir do momento da detenção, informam as agências Safa e Prensa Latina.

O texto denuncia igualmente que as tropas de Telavive prenderam diversos menores depois de os atingir a tiro, por vezes de forma grave, tendo interrogado alguns deles no hospital – procurando obter «confissões» em troca do acesso a medicamentos.

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Israel prendeu 5426 palestinianos na primeira metade do ano

Grupos de defesa dos presos apresentaram um relatório sobre o primeiro semestre de 2021. Nas cadeias israelitas, há actualmente 4850 palestinianos, 540 dos quais ao abrigo da «detenção administrativa».

Os palestinianos estão a ser detidos em aldeias e cidades dos territórios ocupados em 1948 por terem apoiado Gaza 
As forças israelitas prenderam mais palestinianos no primeiro semestre deste ano do que em todo o ano de 2020 Créditos / Middle East Monitor

Entre os palestinianos que se encontram nos cárceres de Israel, contam-se 43 mulheres e 225 menores, segundo o documento conjunto divulgado este fim-de-semana pela Comissão dos Assuntos dos Presos e ex-Presos Palestinianos, a Sociedade dos Presos Palestinianos, a Addameer e o Centro de Informação Wadi Hilweh.

Os organismos referidos precisaram que 12 presos são membros do Conselho Legislativo Palestiniano (Parlamento), 70 são provenientes dos territórios ocupados em 1948, 350 são originários de Jerusalém ocupada e 240 da Faixa de Gaza cercada.

O informe destaca a existência de 540 prisioneiros palestinianos em detenção administrativa, sem acusação formada ou julgamento, por períodos de seis meses indefinidamente renováveis.

Quase 5500 detidos em seis meses

No que respeita a detenções, os organismos de defesa dos presos revelaram que Israel prendeu 5426 palestinianos entre 1 de Janeiro e 30 de Junho deste ano – um número superior a todas as detenções efectuadas pelas forças israelitas em 2020 e registadas por estas organizações: 4636.

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Forças israelitas prenderam 230 menores palestinianos desde Janeiro

Por ocasião do Dia da Criança Palestiniana, que se assinala a 5 de Abril, a Comissão dos Assuntos dos Presos e ex-Presos Palestinianos revelou também que 140 menores permanecem em cadeias israelitas.

Um soldado israelita detém um rapaz palestiniano, juntamente com outros quatro, perto do posto avançado de Havot Maon, na Margem Ocidental ocupada, a 11 de Março de 2021 
Créditos / Anadolu

Os menores palestinianos, alguns dos quais crianças, continuam a ser alvo das forças militares israelitas, que os prendem, muitas vezes de forma violenta, nos territórios ocupados.

De acordo com um relatório publicado este domingo pela Sociedade dos Prisioneiros Palestinianos, pelo menos 230 foram detidos desde o início do ano, a maioria dos quais em Jerusalém Oriental ocupada.

O grupo de defesa dos direitos dos presos sublinhou que «as crianças encarceradas são submetidas a vários tipos de abusos, incluindo «a recusa de comida e de bebida por longas horas, abuso verbal e a detenção em condições duras».

O informe veio a lume na véspera do Dia da Criança Palestiniana, que se assinala a 5 de Abril, com actividades culturais, educativas e mediáticas que, refere a PressTV, visam reforçar a consciência sobre o sofrimento dos menores palestinianos.

Detenção administrativa e maus-tratos

Também no âmbito do Dia da Criança Palestiniana, a Comissão dos Assuntos dos Presos e ex-Presos Palestinianos revelou que 140 menores permanecem em cadeias israelitas, incluindo dois que se encontram presos ao abrigo do regime de detenção administrativa.

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A «viagem ao inferno» dos jovens palestinianos detidos por Israel

Uma comissão da ONU reafirmou denúncias expostas em vários relatórios sobre detenções de menores palestinianos por Israel – quase sempre presos de noite, algemados e vendados. É o início da «viagem ao inferno».

Um jovem palestiniano é preso na Cisjordânia, na sequência dos protestos contra a decisão norte-americana sobre Jerusalém
Créditos / palestinalibre.org

A instância, composta por especialistas independentes das Nações Unidas, expressou particular preocupação pela expansão dos colonatos e o aumento da violência dos colonos israelitas, em que se incluem ataques a crianças e às suas escolas.

Segundo se pode ler no portal oficial de notícias da ONU, na semana passada diversas organizações informaram a comissão sobre as operações nocturnas levadas a efeito pelas forças israelitas com o propósito de deter crianças e adolescentes na Cisjordânia ocupada, com «graves consequências para o seu bem-estar e gozo dos seus direitos».

«Mais de 300 crianças estão detidas no sistema militar israelita. A maioria por delitos menores, como atirar pedras e publicações nas redes sociais», assinala a comissão, que denuncia o facto de os menores serem «levados para locais desconhecidos, presos em viaturas militares e sujeitos a ameaças e abusos verbais», bem como o facto de, por vezes, serem «obrigados a assinar confissões em hebraico, uma língua que não costumam entender».

Estas preocupações reafirmam as que têm sido veiculadas, ao longo do tempo, por várias entidades, nomeadamente a Comissão dos Prisioneiros Palestinianos, órgão dependente da Autoridade Palestiniana que, em diversas ocasiões (também este ano), alertou para o facto de os menores serem torturados e sofrerem abusos nos cárceres israelitas, bem como para o facto de serem espancados, insultados e pressionados no momento da detenção.

No final de Março, um relatório publicado pelo Ministério palestiniano da Informação denunciava também esta realidade, afirmando que «95% das crianças palestinianas presas pelas autoridades israelitas foram torturadas durante a detenção».

De acordo com o relatório, até 2015 foram documentadas anualmente 700 detenções de menores palestinianos. Já em 2017, Israel prendeu 1467 crianças e adolescentes; 1063 no ano seguinte e, nos dois primeiros dois meses deste ano, 118. Entre 2000 e 2018, foram presos mais de 16 mil menores.

Uma «viagem sem fim ao inferno»

Numa peça intitulada «“Endless Trip to Hell”: Israel Jails Hundreds of Palestinian Boys a Year. These Are Their Testimonies», publicada em Março e plenamente actual, o periódico israelita Haaretz aborda esta realidade, em que as crianças, algumas com idades inferiores a 13 anos, «são detidas pela calada da noite, vendadas e algemadas, alvo de abusos e constrangidas» a confessar «crimes» que não cometeram.

A peça, que reúne testemunhos de sete jovens da Margem Ocidental ocupada com idades compreendidas entre os dez e os 15 anos, revela as diversas fases do processo de detenção, que começa nas operações nocturnas e passa pelo interrogatório, a prisão, o julgamento e a proposta de um acordo.

Na sua maioria, os jovens são presos por, alegadamente, terem atirado pedras ou queimado pneus, mas, como sublinha a advogada Farah Bayadsi o objectivo das detenções «é mais para mostrar controlo do que para aplicar a lei».

A experiência traumática é fundamentada por tudo aquilo por que as crianças passam durante uma detenção. Arrancadas de casa quando dormem, são algemadas e vendadas, levadas em veículos militares para colonatos e bases israelitas, passando por todo um processo que envolve intimidação, ameaças, agressões físicas, afastamento da família e pressão para «confessar».


O nível de brutalidade varia. Khaled Mahmoud Selvi, preso quando tinha 15 anos, foi levado para a prisão e despido (o que, de acordo com o jornal, ocorre em 55% dos casos), tendo sido obrigado a permanecer dez minutos nu, em pé, durante o Inverno.

De acordo com os dados recolhidos pela organização não governamental (ONG) British-Palestinian Military Court Watch, 97% dos jovens palestinianos detidos pelas forças militares israelitas (IDF) vivem em pequenas localidades a menos de dois quilómetros de um colonato.

O advogado Gerard Horton, da ONG referida, afirma que a ideia é «assustar toda a aldeia» e que se trata de um «instrumento eficaz» para controlar uma comunidade. Acrescenta que, do ponto de vista dos ocupantes e opressores, a pressão «tem de ser constante»: «Cada geração tem de sentir a mão pesada das IDF.»

A experiência é traumática. O pai de Khaled Shtaiwi, preso com 13 anos em Novembro do ano passado, contou ao periódico que criou na sua aldeia o «dia da psicologia», porque o seu filho não é capaz de falar sobre o que se passou e porque quer ajudar todas as crianças que foram presas pelos israelitas.

Em Beit Ummar, Omar Ayyash foi preso com dez anos de idade, em Dezembro último. Agora, as crianças que brincam nas ruas da aldeia afastam-se assim que se apercebem da aproximação de soldados israelitas. Tornou-se um hábito desde que as tropas levaram Omar.

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Por seu lado, a organização Defense for Children International – Palestine (DCIP) destacou que todos os anos entre 500 e 700 menores palestinianos são processados em tribunais militares israelitas e que 85% das crianças palestinianas detidas em 2020 foram «submetidas a violência física».

Num comunicado, a DCIP afirma ter documentado 27 casos em que as crianças foram mantidas na solitária um ou dois dias, alegando as forças israelitas «objectivos de investigação». Esta prática é, segundo o organismo, uma forma de «tortura ou tratamento cruel, desumano e degradante».

Desde Outubro de 2015, a DCIP registou a 36 ordens de detenção administrativa decretadas contra menores palestinianos, dois dos quais se mantêm nesse regime.

Ainda de acordo com o organismo sediado em Genebra, em 2020, as forças israelitas mataram nove menores palestinianos na Cisjordânia ocupada, incluindo Jerusalém Oriental, e na Faixa de Gaza, seis dos quais com fogo real.

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O relatório divulgado este fim-de-semana informa que, entre os palestinianos detidos pelas forças israelitas, se incluem 854 menores e 107 mulheres, tendo sido emitidas na primeira metade do ano 680 ordens de detenção administrativa, incluindo 312 novas.

No mês de Junho foram presos 615 palestinianos, revela o texto, destacando que Maio foi de longe o mês em que se registou um maior número de detenções na primeira metade deste ano.

Então, mês de massacre contra Gaza e de múltiplas provocações sionistas no Complexo da Mesquita de al-Aqsa e em Jerusalém Oriental ocupada, as forças israelitas prenderam 3100 palestinianos, incluindo 2000 nos territórios ocupados em 1948 (actual Estado de Israel) e 677 em Jerusalém Oriental ocupada, informa a WAFA.

Vários presos em greve de fome contra a detenção administrativa

De acordo com a Comissão dos Assuntos dos Presos e ex-Presos Palestinianos, há actualmente nove presos em greve de fome nos cárceres israelitas como forma de protesto contra o regime de detenção administrativa que lhes foi aplicado.

A Comissão pediu às instâncias internacionais e regionais de defesa dos direitos humanos que pressionem as autoridades israelitas no sentido de acabar com os maus-tratos aos presos em greve de fome, que passam também pela sua reclusão na solitária.

Os presos palestinianos recorrem com frequência a esta forma de luta contra um regime de detenção ilegal, cujo fim exigem.

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Actualmente, revela o texto, 230 menores continuam atrás das grades. Três encontram-se presos ao abrigo do regime de detenção administrativa – sem acusações nem processo penal –, 102 foram condenados a várias penas de prisão e os restantes aguardam por julgamento.

O relatório denuncia que os menores palestinianos estão encarcerados em condições bastante severas nos centros penitenciários israelitas, onde são insultados, ameaçados e torturados, em violação das convenções internacionais de direitos humanos.

As autoridades israelitas – acusa o documento – aproveitaram a pandemia de Covid-19 como instrumento para reprimir e aterrorizar as crianças palestinianas nas cadeias, não lhes proporcionando medidas de protecção contra o vírus ou mantendo-as na «solitária» com o pretexto da quarentena.

As forças de ocupação prenderam no primeiro semestre deste ano mais de 5400 palestinianos, incluindo 854 menores e 107 mulheres, segundo um relatório divulgado em Julho pela Comissão dos Assuntos dos Presos e ex-Presos Palestinianos, a Sociedade dos Presos Palestinianos, a Addameer e o Centro de Informação Wadi Hilweh.

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Para além de não ter cumprido com a sua palavra, apresentando-se em territórios que Israel ocupa militarmente, a sua visita configura uma «afronta total aos valores de tolerância religiosa e convivência pacífica, príncipios basilares dos estatutos da FIFA».

Também a Liga Árabe e a Organização para a Cooperação Islâmica condenaram a desconsideração que Gianni Infantino demonstrou pelo sofrimento de milhões de palestinianos a quem Israel nega o acesso aos mais básicos direitos humanos.

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A Alemanha e a Espanha gozam de alargado favoritismo, mas a qualidade dos japoneses, que há quatro anos alcançaram os oitavos-de-final, não deverá fazer descansar o conjunto germânico. Por outro lado, a Croácia terá que evitar a quebra que a final de 2018 lhes poderá ocasionar, frente a uma seleção marroquina que se pacificou com a troca de treinador e se prepara para chegar a este Mundial com uma conjugação de craques das principais equipas mundiais, como Hakimi, Mazraoui, Ziyech ou En-Nesyri.

Finalmente, o Canadá aproveita uma nova geração de jogadores de múltiplas ascendências para regressar ao principal palco mundial. Steven Vitória e Stephen Eustáquio são os luso-descendentes que vão a jogo perante uma Bélgica que terá aqui uma derradeira oportunidade, para uma geração de sonho, de conquistar um grande título internacional.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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O Irão joga bem perto de casa, o que permitiu que algumas mulheres pudessem, pela primeira vez, ver um grande jogo de futebol nas bancadas de um estádio. É inegável que os iranianos e iranianas anseiam por respirar ares de liberdade. Nada adianta que uns quantos atores tentem tapar os nossos olhos às evidências.

Os jogadores alemães taparam as bocas para a fotografia, os jogadores dinamarqueses entraram com camisolas onde os seus emblemas apareceram quase apagados, mas a braçadeira da One Love não entrou em campo, apenas nos braços de uma comentadora inglesa e de uma ministra alemã. No entanto, dirigentes e políticos ingleses, alemães e dinamarqueses foram consistentes e insistentes na maneira de expressar as suas ideias e posições, colocando-se como porta-vozes de uma sensibilidade que tem tocado este Mundial, visto da Europa. Nesse campo, já há vencedores a agraciar.

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O inchaço no tornozelo, quando saiu do relvado, já sem bota nem meia, fala de uma forma que o olhar de Neymar não saberia explicar melhor.

O médico da seleção brasileira veio pedir calma, no final do encontro frente à Sérvia. Não havia como ditar uma sentença sobre a situação física do líder da equipa brasileira. É preciso esperar. Talvez seja o mais difícil de pedir aos adeptos que vivem este jogo como uma religião. Não adianta fazer nada - fazer gelo, talvez. Terá de ser o corpo a sentenciar como recupera e se permitirá a Neymar voltar a jogar neste Mundial. Entretanto, o Brasil segura a sua respiração, assiste, condicionado, aos festejos de uma vitória que ameaça ser a crónica de uma ausência anunciada. No silêncio do seu quarto de hotel, o corpo de Neymar tem um caminho a percorrer.

Messi e o feiticeiro

O anunciado último Mundial de Lionel Messi começou com uma derrota. Do outro lado estava um francês com fama de feiticeiro. Hervé Renard fez a sua fama em África. Depois de uma carreira de jogador sem grande expressão e um início de caminho enquanto técnico nas divisões secundárias de França e Inglaterra, o treinador fez as malas para a Zâmbia, um país que na década de 90 conjugou os seus tempos mais áureos com os seus tempos mais negros. Faltava a esta seleção um título e Renard entregou-o em 2012. Três anos mais tarde, repetiu o feito com a Costa do Marfim. Só em Marrocos acabou por falhar a sua missão. O que acabou por o fazer mudar de continente.

Na Arábia Saudita encontrou uma realidade diferente. O talento disponível não parece tão natural, não nasce tão solto nas ruas de uma país fechado e desconfiado de si próprio. No entanto, as estruturas e os clubes existentes oferecem condições que não se encontram em África. Tal como os meios oferecidos por um Estado que trouxe o futebol para tentar aliviar o que as suas políticas e as suas ameaças regionais parecem não permitir: um certo encanto para lá da obediência.

O feitiço de Renard voltou a revelar-se. Depois de uma primeira parte sofrível, os sauditas responderam com uma qualidade poucas vezes vista. E bateram a Argentina, do seu embaixador para o Turismo, Lionel Messi. Coração, história e dinheiro, dentro de campo, nem sempre têm o destino traçado da forma como se espera.

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A segurança de Luis Enrique nas decisões que toma fazem muito lembrar aquilo que foi como jogador. Ao comando da seleção espanhola, impôs uma rotação nas convocatórias, demonstrando de forma clara uma tendência de distribuição de oportunidades que quebrou o mito do “grupo da seleção”. A juventude que impregna no seu grupo também marca diferenças. Pedri, depois de ter sido figura no Europeu do ano passado, volta a estar no onze, onde tem agora a companhia do ainda mais jovem Gavi. Mas na sua equipa também há lugar para experiência, com o meio-campo do Barcelona a ter enquadramento completo na “La Roja” com Sergio Busquets a entrar na equipa. O jogo de estreia deixou o sabor a delícia, com uma goleada sobre a Costa Rica. Hoje o teste terá outras exigências, perante a Alemanha. Mas na forma como Luis Enrique quebra barreiras, dá vontade de respirar o mesmo ar que a seleção espanhola respira por estes dias. 

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