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Habitação «financeirizada» reproduz desigualdades sociais

O crescimento do mercado imobiliário, com 46 mil transações verificadas no segundo trimestre de 2018, está a contribuir para o agravamento das desigualdades sociais.

Créditos / Idealista

«A nova questão da habitação em Portugal» é o tema do 4.º relatório do Observatório sobre as Crises e as Alternativas, divulgado esta segunda-feira, que resulta da pesquisa realizada por investigadores do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra e do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território (IGOT) da Universidade de Lisboa.

Para a coordenadora do estudo, Ana Santos, o mercado imobiliário «está a atravessar um momento sem precedentes históricos, com os preços da habitação a crescerem ininterruptamente e substancialmente acima da evolução salarial, tornando a habitação cada vez menos acessível a camadas cada vez mais significativas da população».

«A habitação financeirizada vem transformando-se num mecanismo cada vez mais determinante de reprodução de desigualdades sociais, resultado do reforço do peso económico e político do imobiliário», disse a investigadora no estudo a que a Lusa teve acesso.

Ana Santos lembrou o contexto da mais recente crise internacional, marcado em Portugal pelo programa da troika, que assentou numa política económica de desvalorização interna, no âmbito da qual a relação habitação-finança conheceu alterações significativas provenientes do crescimento do investimento estrangeiro no imobiliário. Referiu ainda a nova Lei do Arrendamento Urbano, aprovada em Agosto de 2012, como um factor de aceleração de venda de imóveis para alojamento local. 

Segundo a investigadora, desde 2014 que se regista um crescimento acelerado do número de transações, na sua grande maioria de apartamentos existentes, tendo-se multiplicado por duas vezes e meia em apenas quatro anos, chegando às 46 mil transações no segundo trimestre de 2018, ao mesmo tempo que o número de apartamentos registados como alojamento local se multiplicou por cinco, chegando aos 14,5 mil apartamentos.

Ana Santos salientou ainda um conjunto de medidas que tem incentivando a procura externa, como o Regime de Autorização de Residência para Actividade de Investimento (ARI), que entrou em vigor em Outubro de 2012, permitindo que cidadãos de Estados terceiros possam obter uma autorização de residência temporária para actividade de investimento com a dispensa de visto de residência para entrar em território nacional (conhecidos por vistos dourados ou vistos gold).

«Embora esta medida tivesse em vista o investimento produtivo gerador de novos postos de trabalho num período de forte crise económica e financeira no país, o facto é que, entre Outubro de 2012 e 30 Setembro de 2018, das 6562 autorizações de residência concedidas, 95% foram obtidas por via do requisito da aquisição de bens imóveis», afirmou, acrescentando que esta medida terá gerado um investimento total de cerca de 4 mil milhões de euros.

A investigadora sublinha o contributo destes factores para que, desde 2014, os preços da habitação tenham crescido continuamente em Portugal, em especial em Lisboa, Porto e na região do Algarve.


Com Agência Lusa

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