A Union General de Trabajadores (UGT) espanhola considerou «lamentável» o anúncio, pelo primeiro-ministro do Governo de Espanha, Pedro Sánchez, «do reconhecimento do deputado Juan Guaidó como “presidente interino” de la República Bolivariana de Venezuela». A tradicional proximidade com o PSOE não fez a UGT poupar nas palavras críticas ao líder do mesmo partido, considerando o anúncio «uma péssima notícia para a busca de uma solução justa e pacífica» para a Venezuela.
Nem todos reconhecem Guaidó
O extenso comunicado da UGT escalpeliza e arrasa os diversos argumentos carreados pelo primeiro-ministro espanhol para a tomada da posição do país, incluindo a «presumida liderança», por Espanha, de uma «suposta posição comum» da União Europeia (UE). «Nem todos os países da UE se manifestaram nesse sentido», afirma a UGT, referindo-se ao reconhecimento de Guaidó. Efectivamente, apesar dos títulos da imprensa (incluindo a portuguesa) serem «países europeus reconhecem Guaidó», não o fizeram Itália, Grécia, Roménia, Irlanda, Bulgária, Chipre, Malta e Eslováquia.
Quanto ao permanente contacto que o primeiro-ministro espanhol refere ter mantido com países latino-americanos, a UGT assinala não ter Sánchez especificado com que países terá estado em contacto e elenca as diferentes posições na região. Não é a mesma coisa dialogar com «os presidentes de esquerda do México e do Uruguai», ou com «o grupo da Comunidade do Caribe (CARICOM)», que «desde há semanas propõem o estabelecimento de uma instância de diálogo» na Venezuela que evite «uma confrontação fratricida cujas consequências põem em risco a região». Acrescenta-se que também o Parlasur, o parlamento dos países do Mercosur, não reconhece outro presidente senão Nicolás Maduro. A UGT manifesta preocupação pela intenção de Sánchez de «coordenar o trabalho de Espanha com o Grupo de Lima» – «um péssimo indício», afirma o comunicado – devido a este incorporar «os governos de direita do continente americano» e ser «claramente dirigido pelas intenções do presidente norte-americano Donald Trump».
Guaidó ao serviço de Trump
A ausência de menção do governo espanhol ao «papel dos Estados Unidos no conflito» é motivo para outro reparo da UGT, para quem «a autoproclamação de Guaidó é o resultado de um plano elaborado com o apoio activo do governo de Donald Trump», verberando também a nomeação, por este, de Elliot Abrams como enviado especial para a Venezuela. Não só Abrams foi «condenado por crimes cometidos em intervenções norte-americanas na América Central, como esteve envolvido na tentativa de golpe de Estado contra o presidente Hugo Chávez, em 2002.
«Eludir o papel do governo norte-americano no conflito» implica, segundo a UGT, «uma mostra de inocência e debilidade política internacional por parte do governo espanhol». A central sindical considera que, «para trabalhar na situação venezuelana», é necessário «defender uma posição diferenciada do intervencionismo interessado de Donald e dos governos satélites da direita latino-americana (Bolsonaro, Macri, Duque, etc.)».
Compromisso verdadeiro com a democracia e respeito pelo direito internacional
«O compromisso expresso por Sánchez a favor da democracia, dos Direitos Humanos e da pluralidade política», prossegue o comunicado da UGT, «seria uma boa notícia se não fosse utilizado quando se fala de um único país». Problemas do género, recorda, afectam «uma enorme quantidade de países na região» e «muitos outros na Ásia, África e Europa», mas um «verdadeiro compromisso» para a sua solução não passa pelo «seguidismo da agenda do governo de Trump e dos governos de direita da região, liderados por Jair Bolsonaro».
O apoio de Sánchez a esta «ingerência política» é um «novo equívoco» do governo espanhol, a seguir ao «absurdo ultimato» dado ao governo de Maduro oito dias antes. Acções como estas «violam o direito internacional» e «favorecem uma das partes no conflito venezuelano», não favorecendo «a concórdia necessária no país caribenho», afirma a central sindical.
O comunicado da UGT pede «ao governo de Espanha que reconsidere a posição» e dirija os seus esforços para a construção de «um diálogo respeitador do Direito Internacional e da autonomía das partes, e no qual as organizações sindicais e sociais da Venezuela sejam parte fundamental do processo», «serão as únicas ferramentas que garantirão uma solução pacífica e duradoura.
Em Portugal, UGT cala-se e CGTP-IN pronuncia-se
Uma consulta à página da UGT nacional verifica que esta é omissa sobre a situação na Venezuela, nem é conhecida qualquer reacção sua à atitude seguidista do governo português, cuja posição foi em tudo semelhante à do governo espanhol.
Já a CGTP-IN condenou de forma clara a posição do governo português de apoio ao golpismo na Venezuela «e denuncia o grave passo na escalada golpista dirigida pelos EUA e apoiada pela União Europeia (UE) em que ela se insere». Em comunicado, a CGTP-IN sublinha que a posição do governo PS «viola princípios constitucionais que regem as relações internacionais do nosso país, nomeadamente os princípios da independência nacional, da igualdade entre os Estados, da não ingerência nos assuntos internos dos outros Estados e da paz e da justiça nas relações entre os povos». Mais, essa posição «atenta contra a Carta da ONU e o Direito Internacional, arrastando o nosso país para o campo dos subalternos de quem, como os EUA e a UE, procura voltar ao tempo em que apenas alguns países ricos e poderosos determinavam a sorte de toda a Humanidade».
O comunicado da CGTP-IN pronuncia-se contra a «estratégia de coacção da Venezuela e do seu povo» levada a cabo pelos EUA, impondo-lhe «sanções e um bloqueio que são fonte de enormes constrangimentos, nomeadamente no acesso a medicamentos e outros bens de primeira necessidade».
A decisão do governo português de reconhecer o autoproclamado “presidente interino” apoiado pelos EUA – os quais «não têm qualquer pejo em sancionar, bloquear e brandir a ameaça da agressão militar» – e pela oligarquia venezuelana, ambos responsáveis pela violência, terrorismo, açambarcamento de bens essenciais, destruição de meios de produção e serviços públicos essenciais».
O governo português «toma partido», acusa a CGTP-IN: primeiro, «por esse punhado de famílias que dominavam historicamente as riquezas naturais deste país, particularmente o petróleo, e as desbaratavam para servir os interesses do grande capital dos EUA e de outros países»; segundo, «pelos sectores que foram apeados pela Revolução Bolivariana, a qual devolveu ao povo a soberania sobre essas riquezas, distribuindo-as com mais justiça social, iniciando um caminho de desenvolvimento e progresso nos direitos, incluindo para a comunidade portuguesa aí residente»; terceiro, «pelos que, como a oligarquia Venezuelana, os EUA e a UE, estão a impedir medidas de desenvolvimento económico e social que solucionem os problemas deste país».
Também a CGTP-IN, à semelhança da UGT espanhola, «exige que o governo português tenha uma postura consentânea com os princípios definidos pela Constituição da República Portuguesa e no quadro do respeito pela Carta da ONU e do Direito Internacional, contribuindo para o desanuviamento da situação, para o diálogo e para a criação de condições que assegurem ao povo venezuelano o inalienável direito de continuar a exercer a sua soberania».
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