Segundo dados da CGTP-IN, a precariedade em Portugal atinge hoje mais de 22% dos trabalhadores de todas as idades, é cada mais abrangente e particularmente grave entre os mais jovens. Uma realidade que se expressa não só em baixos salários mas também numa vida repleta de insegurança e em horários desgastantes.
«Mais de 42% dos jovens com menos de 35 anos têm vínculos precários, sendo as jovens trabalhadoras as principais visadas (mais de 44%), sobretudo as com menos de 25 anos (mais de 71% face a 62% entre os jovens trabalhadores da mesma idade)», lê-se no documento.
Eduardo Veríssimo é trabalhador no call center da NOS, em Lisboa, e diz estar nesta situação há cerca de três anos. Ao AbrilAbril relata que as condições de trabalho são «de uma precariedade autêntica».
«É de facto a definição da palavra. Nós temos, relativamente à malta antiga, cerca de quatro a cinco pessoas numa sala com 200 pessoas novas. Há uma constante rotatividade do pessoal que garante diariamente o funcionamento dos serviços. A empresa não dá a possibilidade aos trabalhadores de atingirem os seus objectivos de vida», frisou.
Por outro lado, Eduardo Veríssimo afirma que, apesar de «ser a empresa que é», os «salários são baixos», havendo «um constante recurso ao salário mínimo, que é inadmissível para as funções que asseguramos».
O jovem trabalhador salientou ainda estar surpreendido com o ambiente em redor: «uma manifestação bastante forte, com muita gente. Como estamos a ver, o Marquês está bastante cheio e esperamos que a mensagem seja transmitida. É urgente uma mudança efectiva na vida das pessoas», reiterou.
«Um trabalho completamente precário»
Um outro jovem com quem falámos foi Dinis Lourenço, que é monitor de ATL numa escola primária e jardim de infância, há cerca de um ano.
«Tenho um trabalho completamente precário, estou a recibos verdes e não tenho grande expectativa de deixar de estar. Tenho colegas que estão há quatro anos no local de trabalho na mesma situação, não os passam a contrato. E com salários baixos», só recebendo 11 meses por ano.
«É um trabalho a recibos verdes e não tenho um contrato, ou seja, não tenho direito aos subsídios de férias, se estou doente e não posso ir trabalhar não recebo, portanto sem qualquer protecção social», frisou, acrescentando que «são muitas horas de trabalho, com horários desregulados. Eu, por exemplo, trabalho duas horas, depois tenho três horas de intervalo e mais duas de trabalho. Isto cinco dias por semana, o que é insustentável».
Dinis Lourenço considera que o seu caso nem é o pior, salientando que há «colegas com filhos, com famílias para sustentar e estão na mesma situação que eu. Isto leva a um desgaste muito grande, numa profissão que é muito importante. Estamos a lidar com crianças».
«Não deixa de ser uma situação muita injusta, onde os meus colegas não têm tempo para os próprios filhos, quando passam o dia a cuidar dos filhos de outras pessoas», sublinhou.
«Estamos sempre numa situação limite, é desgastante»
Já Ana Cruz, uma jovem trabalhadora, explica que está na Zara há 16 anos e que o trabalho na loja não é pêra-doce.
«São ritmos de trabalho alucinantes, cada vez mais intensos e acham que temos de ser polivalentes, temos de fazer tudo. Muitas das vezes temos tão poucas pesssoas de serviço, acabamos a fazer o nosso trabalho e o de mais duas pessoas. Estamos sempre numa situação limite, é desgastante», reiterou.
Perante tal situação, Ana Cruz realçou que não é fácil gerir a vida pessoal com o trabalho, em grande parte devido aos «horários desregulados. As pessoas não sabem quando podem marcar uma consulta porque não têm a certeza se vão estar de folga ou não, especialmente os part-time».
«Se numa semana têm folga à terça e quinta-feira, na próxima já têm à segunda e sexta-feira. Nunca sabem quando vão ter folga para a semana, os horários saem tarde e a más horas», afirmou a trabalhadora, que explicou ser mãe e que tem «enorme dificuldade em conciliar a vida profissional com a familiar. Eu, como mãe, se tiver que sair mais cedo, porque o meu filho tem febre, é muito complicado».
Sendo uma trabalhadora com maior experiência, Ana Cruz realça que ao longo dos anos têm-se deparado com uma realidade de trabalho «extremamente difícil e precária», e deu exemplos de situações de outros jovens.
«Trabalham um ano e meio, vão-se embora e depois voltam a ser contratados por mais uns meses. Não ficam efectivos porque são mandados embora e depois voltam a ser contratados a prazo outra vez. Há muitos trabalhadores precários e um fluxo grande, há muita gente nova a entrar e a sair», explicou.
Além disso, afirma que «os salários são baixos» e «há muita discriminação no que toca ao subsídio de alimentação. Conheço colegas da Zara que recebem 7,5 euros e em Setúbal pagam dois euros mas trabalhamos todos para a mesma marca».
A jovem trabalhadora deixa um alerta: «espero que as empresas comecem a abrir bem os olhos, porque isto não é sustentável. As próprias pessoas não aguentam serem sujeitas uma vida toda a estas condições, isto tem de mudar».
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